Meu caro Tozé Brito,
Estou a vê-lo na Casa d’Amália, esse programa da RTP 1 tão bem conseguido, e a pensar que o Tozé Brito é talvez a única pessoa capaz de resolver uma das minhas frustrações crónicas – não saber cantar nada apesar de ter esta minha bela voz para, dizem, escrever à máquina.
Fiquei a saber que aquele grande êxito do Espadinha – “Recordar é Viver” – foi escrito por si e tem o desenho que tem por ser uma canção escrita especificamente para quem foi, um homem de voz cheia mas com alguns condicionalismos em matéria de canto.
O Tozé – desculpe este tom quase familiar – disse que escreve em função de quem vai cantar o que escreve e do público alvo desse cantor ou cantora. As suas músicas e letras são sempre, atrevo-me a dizer, personalizadas e este poderá ser o segredo de tantas e tão duradouras modas que vão ficando como canções das nossas vidas. Por tudo isto, quero acreditar que só o Tozé será capaz de escrever um fadinho que eu consiga cantar. Ou apenas dizer sem desafinar, o que já seria um feito.
Este meu esperançoso pedido segue num postal que ostenta um pormenor do banjo do meu pai, um instrumento de oito cordas (actualmente só com sete) que terá, seguramente, mais de oitenta anos. O meu pai, que tinha mãos pequenas e dedos grossos, tocava no banjo modinhas que eu, em menino, adorava ouvir, como aquela do mar que enrola na areia ou a do hidroavião que foi parar à Nazaré.
Mais tarde, quando eu já era adulto e celebrava o dia dos meus anos sem a presença dos meus pais, estava sempre à espera do telefonema deles e daquela melodia dos parabéns que me chegava, via telefone, tocada a banjo pelas mãos do meu pai. A música, de facto, é muito importante para todos nós. Até mesmo para os muito desafinados como eu. Daí este meu sonho quase impossível – saber cantar e tocar banjo. Ou piano. Concertina. Guitarra portuguesa.
E se eu me fizesse maestro?
Com admiração e gratidão,
Júlio Roldão
(até rima)