Meu caro Amadeu,
Quando ontem passei pelo teu novo atelier para assistir ao início da tua mais recente criação artística (a que integra aquele tapete de retalhos de mais de 800 metros de comprimento que começou a ser acabado), quando ontem, finalmente, visitei o teu novo espaço estava longe de imaginar a dimensão desse teu “castelo”, uma oficina que poderia, pela volumetria, ser uma oficina de escultura.
Pelo que vi, sei que não desdenharias ter o dobro do espaço que já tens mas neste país, neste país pequenino, o espaço é caro, mesmo quando falamos de espaço mínino necessário, um conceito que varia de pessoa para pessoa e mais ainda se estivermos a falar de pessoas que desenvolvem projectos artísticos.
Se a memória não me falha, tu atravessaste a Pont Neuf, em Paris, quando esta emblemática obra foi embrulhada em tela grossa por Christo, o artista búlgaro que se naturalizou americano e ficou famoso por embrulhar coisas de grandes dimensões.
O Arco do Triunfo, em Paris, está, como sabes, neste momento embrulhado em panos, em cerca de 25 mil metros quadrados de panos, numa homenagem póstuma a Christo e à sua mulher Jeanne-Claude que tinham projectado esta instalação artística.
A iniciativa, leio nos jornais, partiu de um sobrinho do artista, Vladimir Yavachev, que seguiu rigorosamente os planos e as instruções do tio para este projecto com a escala mais habitual das obras de Christo.
A propósito, devo recordar que tu és um dos artistas portugueses com um trabalho numa “love box” de 58 artistas entre os quais está Christo. Dos portugueses desta “colectiva” estão nomes como os de Emerenciano e de Abílio. Como Christo, projectas e crias obras de pequeníssimo formato, como essa “love box” de 1988, mas também, como ele, de dimensões enormes. Daí que o teu enorme atelier possa ser, às vezes, pequeno.
A visita ao teu atelier e a coincidência de estar em exposição em Paris uma obra póstuma de Christo são bons pretextos para reflectirmos em torno dos conceitos de espaço, do espaço que cada um necessita. Este é o único tema deste postal.
Fica bem.
Um abraço do teu amigo
Júlio Roldão