Caro Dr. Pacheco Pereira,
Este septuagésimo quinto postal da série de postais que todas as semanas envio, neste espaço do sinalAberto, a destinatários prováveis ou improváveis, até para mim é uma surpresa.
Quando cheguei ao jornalismo, em 1977, via-me difícilmente a enviar-lhe um postal – cresci a olhar para o doutor Pacheco Pereira com algum distanciamento gerado por alguns vícios de sectarismo.
Já jornalista com uns dez anos de trabalho, fui destacado para reportar no Jornal de Notícias uma intervenção sua, proferida no Porto, e surpreendi-me a gostar muito do que então disse.
Lembro-me de ter titulado a nota que então publiquei no JN sobre a sua palestra com um “Oiçam como respira Pacheco Pereira”, parafraseando o título de uma peça de teatro que então estava em cena em Portugal.
Esta tentação de fazer títulos jornalísticos que se inspiram em títulos de livros, filmes ou peças de teatro que estão a ter grande impacto não é uma solução muito gloriosa mas é um truque mediático com resultados e eu também o utilizei. Lembra-se do filme “Quem Tramou Roger Rabbit”? E dos títulos jornalísticos que ele inspirou?
Ter assistido, como jornalista, a essa sua intervenção ajudou bastante a limar arestas de algum sectarismo intelectual que ainda pudesse tolher-me. Claro que passei a estar muito mais atento às suas intervenções cívicas e culturais. Na semana passada comprei um livro seu e de outros ephemeros que também já me surpreendeu – “Diário dos Dias da Peste”.
A sua paixão por livros e por arquivos, mais do que evidente na criação da Ephemera, uma das mais respeitáveis bibliotecas com arquivo de Portugal, merece grande aplauso e também justifica este postal.
Por sinal um postal de que tem por base um rótulo de uma garrafa de vinho. Eu tenho este hábito de arrancar rótulos de vinhos bebidos com os amigos para os reutilizar num qualquer exercício plástico. Às vezes só como memória do encontro de amigos onde tal garrafa teve algum papel.
No caso, este branco Cabeço do Mocho poderia ter servido para um brinde aos livros, à mais do que urgente cultura bibliográfica, neste tempo de informações fragmentadas, em mosaico e outras efémeras desinformações em rede.
Obrigado pelo seu contributo,
Júlio Roldão
01/11/2021