Querida Ana Efe,

Conheço-te há quase vinte anos e devo-te muito mais do que possas imaginar. Se a memória não me falha, em 2002, andava eu nos 49 anos, fui ver como funcionava uma oficina de artes plásticas para seniores que orientavas em Matosinhos. Alguém sinalizara essas tuas “aulas” e eu fui reportar o que estava a acontecer para dar corpo a uma reportagem que viria a ser publicada num suplemento, dedicado aos seniores, que o Jornal de Notícias então editava.

Gostei tanto do que vi que atrevi-me a perguntar se podia inscrever-me nesse grupo, apesar de ter menos de 50 anos e de julgar-me incapaz de qualquer manifestação nas áreas do desenho ou da pintura. Foi assim, graças a ti, que descobri o prazer do desenho e da pintura com aquele entusiasmo de um amador tardio, quase envergonhado. Foi assim que descobri que teria sido muito mais feliz se tivesse descoberto as artes plásticas mais cedo.

Frequentei a escola primária e o liceu no chamado ensino particular, mas nem por isso tive a sorte de ser incentivado a desenvolver nas artes algumas competências no mínimo técnicas. A formação integral que uma tal opção implicava não era minimamente contemplada nem no Ensino Público nem no Ensino Privado. A Educação Física e a Educação para as Artes eram, quando fui jovem estudante, muito desprezadas.

Só quase aos 50 anos, quando te conheci e fui teu aluno informal, descobri esse universo mágico das artes plásticas que também ajuda à nossa formação enquanto cidadãos. Devo-te isso, o que não é dívida menor. Isso e algumas técnicas que ajudam à criação artística, embora deva sempre considerar-me um amador no desenho e na pintura, sem preconceito nem ambição. Como gosto de aguarelar, dir-me-ei um aguarelista em tempo de seca, cujas aguarelas, às vezes, ganham alguma graça.

Não será o caso da aguarela que hoje transformo em postal. Ainda tenho dificuldade em limpar o desenho retirando muito do que está, quase sempre, a mais. Sempre disseste que, às vezes, é mais importante tirar do que pôr. Um desenho, uma pintura não são fotografias nem, a meu ver, devem tentar assemelhar-se a fotografias. Digo eu que sei pouco disto, mas que tenho sempre muito prazer quando me ponho a esquissar desenhos e a aguarelar mundos imaginários.

Obrigado pelo que me ensinaste.

Júlio Roldão

22/11/2021

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Júlio Roldão

É jornalista desde 1977. Nasceu no Porto, em 1953, e estudou em Coimbra, onde passou, nos anos 70, pelo Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC) e pelo Círculo de Artes Plásticas (CAPC), tendo, em 1984, regressado ao Porto, onde vive.

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