A segunda volta no Brasil

 A segunda volta no Brasil

Créditos de imagem: Alan Santos-PR / Ricardo Stuckert / Montagem Brenda Silva (www.seudinheiro.com)

Neste lado do Atlântico, escuto com frequência: “Como o Brasil chegou neste ponto?”

Poderia responder de várias formas. Por exemplo: há 522 anos, um certo navegador de Belmonte perdeu-se a caminho das Índias e deparou-se com o Pindorama (como o Brasil era chamado pelos povos originários).

Invasão do Pindorama ou “Descobrimento do Brasil”. (www.orientarcentroeducacional.com.br)

No entanto, apesar de ser necessária uma análise abrangente, que resgate os alicerces fundamentais da construção da sociedade brasileira, voltemos à última década, nomeadamente a junho de 2013. Desde então, é preciso pontuar e avaliar os desdobramentos de alguns eventos.

As Jornadas de Junho1 eram, para muitos, a Primavera Brasileira, nesta oportunidade motivadas inicialmente pelo aumento das passagens dos transportes públicos e pelos gastos com os eventos esportivos (Copa do Mundo e Olimpíada), que levaram milhares de populares às ruas, a reivindicar seus direitos. A proposta de convocar uma Constituinte foi descartada pelo governo. A efusividade das ruas foi taxada pelos meios de comunicação tradicionais como um conjunto de manifestações de baderneiros, e as ruas logo se esvaziaram. Mas a indignação, a rebeldia e o sentimento de ruptura do sistema foram muito bem capitalizadas pela direita – e, pela sua destreza com as novas ferramentas de tecnologia de informação, surge o mediativismo.

Desdobramentos de Junho de 2013. (Créditos da imagem: https://midiainformal.files.wordpress.com/)

Em Outubro de 2014, a presidente Dilma Rousseff reelegeu-se, em uma campanha bastante renhida. A polarização ficou evidente, e o lado perdedor, social-democrata de centro, iniciou sua guinada à direita. O principal opositor, escolhido por quase 49% dos brasileiros e brasileiras, questionou a lisura das eleições. O processo eleitoral credível, com apuração rápida e transparente, reconhecido internacionalmente como referência, é posto em xeque.

Em Agosto de 2016, assiste-se ao golpe de impedimento do segundo mandato de Dilma Rousseff e ao início de uma agenda que não foi escolhida pelo voto popular. O afastamento da presidente em exercício, através do processo de impeachment (ou destituição), deu verossimilidade ao golpe parlamentar, mediático e jurídico. Como disse um velho camarada, “primeiro como tragédia, depois como farsa”. O segundo e terceiro ato do golpe foram as eleições municipais de 2016 e gerais de 2018. O exercício democrático foi conduzido, ou seja, a narrativa golpista foi travestida, e candidaturas ditas anti-sistema, de extrema-direita, saíram dos esgotos e ganharam terreno.

A ex-presidente brasileira Dilma Rousseff e a ex-presidente sul-coreana Park
Geun-Hye sofreram processos de impeachment e foram ambas destituídas
dos seus cargos em 2016. (Antonio Cruz/Agência Brasil – pt.wikipedia.org)

O bolsonarismo é um acidente humanitário, vil, desumano e retrógrado. O lulopetismo busca a redenção, a correção, o diálogo com a base.

Nas eleições, levamos e depositamos nas urnas muitos sentimentos. Aqueles mais passionais, em especial, também somos convidados a rever a esperança. A sociedade brasileira nos deu a oportunidade de refletir novamente sobre “a que ponto chegamos”. Aos indecisos, este pleito ganha ares definitivos de plebiscito: de um lado, a democracia; do outro, o nazi-fascismo miliciano.

A primavera sempre vem, mesmo com intempéries. Pra não dizer que não falei das flores2, deixo cá um pensamento de Rosa Luxemburgo: “Por um mundo onde somos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres.” No dia 30 de Outubro, vote!

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1 – As Jornadas de Junho consistiram em diversas mobilizações de massa ocorridas, simultaneamente, em mais de 500 cidades do Brasil, no ano de 2013.

2 – Canção de Geraldo Vandré, considerada um hino de resistência à ditadura militar brasileira.

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Nota do Director:

O jornal sinalAberto, embora assuma a responsabilidade de emitir opinião própria, de acordo com o respectivo Estatuto Editorial, ao pretender também assegurar a possibilidade de expressão e o confronto de diversas correntes de opinião, declina qualquer responsabilidade editorial pelo conteúdo dos seus artigos de autor.

17/10/2022

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Guilherme Teixeira

Brasileiro de São Leopoldo, no estado de Rio Grande do Sul. Vive na Covilhã (em Portugal) desde 2018. É gestor do Ambiente (pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos) e mestre em Sociologia: Exclusões e Políticas Sociais (pela Universidade da Beira Interior).

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