A visita dos direitos (3)
(*)
A certa altura, as crianças foram surpreendidas por barulhos estranhos e algo assustadores. Sons estrondosos e terríficos soavam no corredor. Entreolharam-se assustadas. A professora foi à porta e eis que entra uma menina enfarruscada, com um vestido esfarrapado, da cor da terra, segurando na mão um rádio, do qual ecoavam uns sons medonhos.
A menina desligou o botão do rádio e disse: – Eu sou o direito a ser socorrido em primeiro lugar, em caso de catástrofes ou de guerra! As crianças devem, em todas as circunstâncias, ser as primeiras a receber proteção e auxílio, tendo sempre um tratamento especial, além de serem protegidas de todas as formas de violência.
Em seguida, a menina rodou o botão do rádio e de novo se ouviu o som triste da guerra, de gritos e lamentos, dos tremores de terra, das chuvas torrenciais, das enxurradas e de outras catástrofes. Depois, fez-se silêncio e as crianças terão pensado que bom seria se todos vivessem tranquilamente, em harmonia, dialogando e respeitando a Humanidade e a Natureza.
Olhando para a menina triste e para os alunos na sala, a professora afirmou: – Toda a violência causa dor e sofrimento. Há meninos maltratados e que sofrem com atitudes de adultos que os deixam muito magoados. Não se esqueçam de que não devem ter medo nem vergonha. Devem, sempre, contar a alguém o que vos aconteceu. Só assim podem ser ajudados e protegidos.
Após estas palavras da professora, a menina distribuiu um papel da cor da paz, onde estava escrito: “Todas as crianças devem ser socorridas em primeiro lugar e protegidas de todas as formas de violência.”
Quando se preparava para sair, ainda disse: – Não se esqueçam de que as crianças não podem ser soldados! Obrigar uma criança a usar uma arma é uma forma de violência!
Os meninos ficaram um pouco intrigados. Crianças soldado?
Então, a professora explicou que, em alguns países, as crianças são chamadas a combater com uma arma na mão. Estas crianças vivem experiências cruéis e muitas morrem nos combates. É muito triste!
Manuel sentiu-se invadido por uma onda de indignação e revolta. “Como era possível existir tanta crueldade no Mundo?”, interrogava-se, quase incrédulo com tanta injustiça.
– Truz, truz! Posso entrar? Sou o direito a ser protegido contra o abandono e a exploração no trabalho! – disse o menino de cabelo preto espetado e com olhos de safira, entreabrindo a porta.
– Entra direito, podes entrar, estamos à tua espera! – respondeu a professora.
O menino trazia um lindo fato amarelo, cor de limão, com muitas letras escuras formando palavras. Podia ler-se: “abandono”, “crueldade”, “exploração”, “tráfico”, “emprego”. E o menino desenrolou um grande cartaz onde se lia: “NÃO!”
Imediatamente, com uma voz firme e clara, declarou:
– As crianças devem ser protegidas contra todas as formas de abandono e de exploração. Nenhuma criança deve trabalhar antes da idade mínima e não pode ter emprego ou outra ocupação que a impeça de ir à escola. Sabemos que, no Mundo, há tráfico de crianças. Não podemos permitir tal crueldade!
Depois, como por magia, do fato amarelo da cor do limão, desprenderam-se todas as letras e palavras, as quais caíram dispersas no chão. O fato resplandecia, como o olhar dos meninos brincando num dia de sol. Dos bolsos das suas calças, tirou então papéis da cor da areia fofa da praia que diziam: “Todas as crianças têm direito a ser protegidas contra o abandono e a qualquer forma de exploração.”
O menino despediu-se de todos, saindo apressado, pois era uma espécie de vigilante deste direito e tinha muito que fazer.
Foi então que se ouviu o rufar de tambores e outros instrumentos de percussão.
Quatro meninos, com olhos de pássaros felizes, entraram na sala. Vinham vestidos de céu estrelado. Cada um tinha um chapéu e em cada chapéu estava escrita uma palavra. Podia ler-se: “SOLIDARIEDADE”, “COMPREENSÃO”, “AMIZADE” e “JUSTIÇA”.
Os meninos deram as mãos e, sem se saber como, brilharam muito intensamente. Das suas mãos, desprenderam-se finos fios de prata e os meninos fizeram uma roda e as suas vozes cantaram uma bela canção. Falava da esperança nos olhos, da serenidade das águas em que chapinham sonhos, do cheiro da terra da paz e do tesouro da justiça afagando as crianças de todas as cores, de todas as nacionalidades e de todas as religiões.
– Fraternidade! Tolerância! Dignidade! – entoavam os meninos, enquanto das suas mãos brotavam papéis da cor do dourado deserto em que se lia: “Todas as crianças têm direito a crescer dentro de um espírito de solidariedade, compreensão, amizade e justiça entre os povos.”
Sempre a dançar e a cantar, os quatro meninos afastaram-se, saindo da sala.
A professora estava realmente satisfeita. Olhou para toda a turma e disse, com a sua voz calma e pausada: – Hoje conheceram os Direitos da Criança. Pois, saibam que a Convenção diz também, no seu artigo 17.º, que todas as crianças têm direito a ser informadas. E saibam, igualmente, que há um direito muito importante que a Convenção prevê e que eu espero que vocês exerçam.
– Nós? Um direito para exercermos? Mas… como? – perguntou o Tomás.
– Pois, é o direito de todas as crianças dizerem o que pensam! É o direito da criança à liberdade de expressão. Está previsto no artigo 13.º da Convenção. E é isso o que eu espero de vós! Que saibam exprimir, com respeito pelos outros, a vossa opinião!
As crianças entreolharam-se, parecendo compreender o que a professora acabara de dizer.
– Estão a ver as folhas que têm nas vossas mesas? – continuou a professora. – São folhas de papel de muitas cores, como coloridos são os sonhos da liberdade, da justiça, do amor e da amizade. Nessas folhas, estão escritos os vossos direitos, mas o mais importante é que eles fiquem guardados como um tesouro dentro de cada um de vós. No vosso coração morará a ternura e a dignidade!
E, já agora, convém não esquecer que não basta ter Direitos, é preciso saber utilizá-los com responsabilidade e também cumprir deveres.
Estava na hora do intervalo! Com o sorriso estampado no rosto, os meninos foram para o recreio e, na sua memória fresca, levavam palavras de oiro. Naquele dia, os pássaros adormeceram no coração das crianças.
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(*) In “Os Direitos Vão à Escola”
14/11/2022