Anne Frank volta a morrer
Anne Frank (1929-1945) e a sua irmã Margot morreram há 78 anos, no campo de concentração de Bergen-Belsen1. Anne e Margot foram duas das 70 mil vítimas que os nazis ali condenaram à morte. Agora, a adolescente alemã de origem judia, morre pela segunda vez.
Desta feita, nos Estados Unidos da América (EUA), a versão gráfica do seu “Diário”2 acaba de ser banida das prateleiras da biblioteca da Vero Beach High School (VBHS), na Florida, que é a maior escola pública de ensino médio (secundária) do Distrito Escolar de Indian River. Tal aconteceu devido aos protestos de um grupo de mães que se manifestaram contra o facto de Anne Frank ser desenhada “a passear entre estátuas de nus”.
“O Diário de Anne Frank”, escrito (entre 12 de Junho de 1942 e 1 de Agosto de 1944) num pequeno anexo secreto de uma casa holandesa, dá-nos a conhecer a história de uma família judia a viver em Amesterdão, que foi obrigada a esconder-se, quando as tropas de Hitler invadiram a cidade. A obra de Anne Frank (publicada pela primeira vez em 1947, por iniciativa do seu pai) “retrata” os horrores que vitimaram milhares de judeus, de ciganos, de homossexuais e de comunistas.
O cineasta Ari Folmam e o ilustrador David Polonsky são os autores da banda desenhada (da mais recente adaptação fiel de “O Diário de Anne Frank”, em BD) agora retirada da biblioteca da Vero Beach High School e que foi editada para celebrar os 70 anos da primeira edição do “Diário” da adolescente alemã de origem judia.
A censura protagonizada pelo director da escola norte-americana surgiu após um grupo de mães, autodenominado “Moms for Liberty” (“Mães pela Liberdade”, em tradução literal), ter mostrado preocupação com algumas imagens do livro. Sobretudo, em relação a uma imagem que mostra Anne Frank a passear entre estátuas de “estilo clássico em que o nu predomina, e [a] outra que retrata uma cena em que a adolescente pede a uma amiga para se despir e demonstra desejo de beijar o seu corpo”.
Para as aludidas mães, estas ilustrações têm “conteúdo sexual implícito”. E, como tal, dizem que “não deve estar acessível” aos seus filhos.
Este acto censório segue-se a outros. Como aquele que se abateu sobre uma professora da Florida (EUA) que teve a ousadia de mostrar uma imagem da estátua de David, criada pelo artista renascentista Michelangelo3. A polémica foi tão grande que a docente acabou por se demitir.
Os norte-americanos brancos, que glorificam Donald Trump e que aplaudem os polícias que matam afro-americanos, não estão sós nesta “cruzada pela higienização” do Mundo. Outros há. E ameaçam-nos, a todos. É bom que não nos esqueçamos de que os campos de concentração “apenas” foram extintos há 78 anos.
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Notas:
1 – O campo de concentração de Bergen-Belsen, também referido apenas como Belsen, situava-se no actual estado alemão da Baixa Saxónia. Começou a funcionar em 1940, imediatamente após as tropas de Hitler terem invadido a Bélgica, os Países Baixos e a Polónia. Dois anos depois, tornou-se um verdadeiro campo de concentração. Bergen-Belsen não tinha câmaras de gás, mas ali pereceram 70 mil pessoas. Judeus, homossexuais, ciganos e comunistas foram ali torturados. Outros morreram à fome e foram vitimados por tifo, disenteria (tipo de gastroenterite que causa diarreia com sangue) e hipotermia. As tropas britânicas libertaram Bergen-Belsen a 15 de Abril de 1945. À sua espera estavam milhares de corpos por enterrar. Actualmente, o campo está aberto ao público, contém um centro de visitantes e uma “Casa do Silêncio” para reflexão. Foi, aí, construído um grande obelisco.
2 – Anne Frank escreveu o seu “Diário” entre Junho de 1942 e Agosto de 1944, durante a Segunda Guerra Mundial. A editora “Contact Publishing”, de Amesterdão, fez a primeira edição da obra em 1947, que teve como título: Het Achterhuis. Dagboekbrieven 14 Juni 1942 – 1 Augustus 1944. Mas foi após a sua publicação em inglês – “Anne Frank: The Diary of a Young Girl” – que “mereceu ampla atenção popular e da crítica.” Hoje, é um dos livros mais lidos em todo o Mundo.
3 – Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni (1475-1564), mais conhecido simplesmente como Michelangelo ou Miguel Ângelo, foi um pintor, escultor, poeta, anatomista e arquitecto italiano. Viveu entre Florença e Roma e foi considerado um genial criador de arte. A família Medici protegeu-o, mas foi na Cidade Eterna (Roma) que deixou a maior parte da sua obra pública. Transitou do Renascimento para o maneirismo. Retratou o nu masculino como nenhum outro artista, talvez devido aos seus ideais de humanismo e de neoplatonismo.
Fonte consultada: Wikipédia.
17/04/2023