“Apeadeiro” da injustiça

(Créditos fotográficos: CGTP-IN)
Junto às entradas das estações ferroviárias de Lisboa-Santa Apolónia e de Porto-Campanhã, há trabalhadores que clamam pelos seus salários. Fazem-no há vários dias e à “boca” das tendas que ali montaram. A empresa caloteira chama-se Apeadeiro 2020. E é a “baiuca” a quem a CP-Comboios de Portugal entregou a concessão dos bares dos comboios Alfa Pendular e Intercidades e um “totoloto” de 1,8 milhões de euros, entre Agosto de 2021 e Fevereiro deste ano, o que, segundo revela a revista Visão, corresponde a cerca de 95 mil euros mensais, no âmbito do contrato em vigor. Uma “ninharia” que a impediu de pagar os salários aos seus trabalhadores, bem como às Finanças (AT – Autoridade Tributária e Aduaneira) e à Segurança Social.

A Apeadeiro 2020 tem como patrão um funcionário da CP e foi essa empresa de “vão de escada” a escolhida para render a LSG Sky Chefs (nome da marca LSG Lufthansa Service Holding AG), que é “o maior fornecedor mundial de catering, que pertence ao grupo Lufthansa”. A revista Visão adianta, a este propósito, que o contrato foi rescindido por “desacerto entre as partes, na sequência das interrupções na pandemia” da covid-19. Com a saída da LSG, a Apeadeiro 2020 “apanhou o comboio” e tornou-se “dona” dos bares dos Alfa-pendular e Inter-cidades. José Alegria, o inspector maquinista da CP (que terá apresentado baixa médica e desapareceu “sem deixar rasto nem explicações”, como escreve o jornalista João Amaral Santos), é patrão de 130 trabalhadores a quem deixou de pagar os salários, apesar do referido “totoloto” e das “receitas do negócio, que terão disparado em 2022, superando, até, níveis pré-covid”.
Estranho também é o facto de a administração da empresa ferroviária ter entregue tal responsabilidade a um seu funcionário, mesmo que invoque a realização de um “concurso público” e de a Apeadeiro 2020, uma empresa com capital social de cinco mil euros, ter sido a única que aceitou as regras impostas. Há quem diga, porém, que as relações próximas entre José Alegria e um ex-presidente da CP terão tido um significativo peso na decisão.

Uma coisa é certa: há 130 trabalhadores com salários em atraso e urge arranjar uma solução que evite a sua permanência no “apeadeiro da injustiça”, não pagando a quem produz a riqueza. Os gritos de revolta desses trabalhadores fazem-nos sentir vergonha alheia e chocam de frente com a propaganda que apresenta Portugal como um “país do pelotão da frente”.
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20/03/2023