As primeiras deputadas de “Abril”

 As primeiras deputadas de “Abril”

Mulheres festejam, em Lisboa, o 1.º de Maio de 1974. (Créditos fotográficos: Miranda Castela – Arquivo Fotográfico da Assembleia da República – AF-AR / parlamento.pt)

Foram 27 as primeiras mulheres eleitas deputadas, após o derrube do Estado Novo. Dezasseis pelo Partido Socialista (PS), cinco pelo Partido Comunista Português (PCP), cinco pelo Partido Popular Democrata (PPD, passando a designar-se, a 3 de Outubro de 1976, como Partido Social Democrata – PSD) e apenas uma pelo Partido do Centro Democrático Social (CDS, que, posteriormente, mudaria o nome para, somente, Partido Popular, mantendo a sigla CDS-PP).

Como regista a página electrónica do Parlamento, nas eleições realizadas a 25 de Abril de 1975, para a Assembleia Constituinte (AC, de 1975-1976), foram eleitas 20 deputadas, num total de 250 deputados. Porém, “devido a renúncias ou substituições”, 27 deputadas assumiram funções, num universo global de 327 deputados.

Importa, pois, sublinhar que as primeiras eleições, em Democracia, ocorreram a 25 de Abril de 1975, isto é, um ano após o “25 de Abril”: o dia mais lindo das nossas vidas.

Deputadas da Constituinte: Alda Nogueira, Amélia Azevedo, Assunção Vitorino, Augusta Simões, Beatriz Cal Brandão, Carmelinda Pereira, Dália Ferreira, Emília de Melo, Etelvina Lopes de Almeida, Fernanda Peleja Patrocínio, Fernanda Seita Paulo, Georgette Ferreira, Helena Roseta, Hermenegilda Pereira, Laura Cardoso, Maria da Conceição Rocha dos Santos, Maria Helena Carvalho dos Santos, Maria Hélia Câmara, Maria José Sampaio, Maria Pilar Barata, Maria Rosa Gomes, Nívea Cruz, Raquel Franco, Rosa Rainho, Sophia de Mello Breyner Andresen, Teresa Vidigal e Virgínia  Ferreira (Créditos fotográficos: Arquivo Fotográfico da Assembleia da República – AF-AR / parlamento.pt)

O acto eleitoral de 25 de Abril de 1975 visou a instalação da Assembleia Constituinte, que teve como objectivo primordial elaborar e aprovar a nova Constituição – a Lei Fundamental da República Portuguesa que, hoje, alguns querem alterar. Para pior.

A eleição das primeiras mulheres deputadas, há 49 anos, num universo de 327 deputados, motivou uma chamada de atenção por parte da Comissão da Condição Feminina. Justificadamente, as mulheres eleitas constituíam uma “imensa minoria” nas escolhas dos quatro maiores partidos políticos. Ocupando, também, os últimos lugares das listas.

Sophia de Mello Breyner Andresen (blogletras.com)

Mais: a poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen1 (1919-2004), eleita pelo PS, foi a única das mulheres da Assembleia Constituinte que presidiu a uma Comissão, a da Redacção do Preâmbulo da Constituição. E apenas seis deputadas participaram em comissões. Apesar do seu reduzido número, as primeiras deputadas de “Abril” fizeram ouvir as suas vozes e convicções. Um exemplo: Beatriz Cal Brandão2 (1914-2011) foi a primeira a defender o direito à interrupção voluntária da gravidez (IVG).

As parlamentares tinham entre “os 24 e os 61 anos, registando-se uma média de idades de 39” anos. Só “nove das deputadas eleitas detinham o grau de licenciatura (três em Filologia Germânica e as restantes em Filologia Românica, Direito, Ciências Físico-Químicas, Arquitetura, Ciências Geológicas e Ciências Matemáticas)”. Entre as mulheres que, então, integraram a Assembleia Constituinte, oito tinham cursos médios ou frequência universitária, quatro deputadas o ensino secundário “e as restantes outras habilitações (frequência do liceu, ensino preparatório ou ensino primário)”.

Sessão inaugural da Assembleia Constituinte, em 2 de Junho de 1975. (Créditos fotográficos: Miranda Castela, Arquivo Fotográfico da Assembleia da República – AF-AR / parlamento.pt)

Os sectores da Educação e da Cultura dominavam entre as profissões: quatro professoras do ensino secundário, duas professoras do ensino primário, uma regente escolar da “primária”, uma professora do ensino superior, duas escritoras, uma conservadora de museu, uma tradutora e uma bibliotecária. “A par de duas domésticas, duas funcionárias públicas e de duas operárias”, a Assembleia Constituinte contou ainda com uma “arquitecta, uma geóloga, uma informática, uma engenheira técnica, uma promotora de vendas, uma empregada de escritório, uma funcionária de partido político e uma estudante”.

Maria Alda Barbosa Nogueira foi uma política revolucionária comunista,
feminista e antifascista portuguesa, militante do Partido Comunista
Português.  (pcp.pt)

Hoje, como se sabe, a esmagadora maioria das deputadas saiu das “jotas” (ou movimentos de juventudes) partidárias ou esteve ao serviço dos grandes escritórios de advogados. Falta-lhes “a linguagem poética quase transparente e íntima, ao mesmo tempo ancorada nos antigos mitos clássicos” de Sophia de Mello Breyner Andresen; o exemplo de cidadania de Beatriz Cal Brandão; ou uma vida recheada de passado como a de Maria Alda Nogueira (1923-1998) que “foi a presa política que mais tempo seguido esteve encarcerada no mesmo estabelecimento prisional, num total de 9 anos e três meses da sua vida”.

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Fonte consultada:

“As mulheres na Constituinte de 1975-1976”, na página electrónica Parlamento.

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Notas da Redacção:

1 – Aconselhamos a (re)leitura do artigo “Contos Exemplares”, da autoria de Elsa Ligeiro, publicado na edição de 18/01/2024 do sinalAberto.

2 – Sugerimos também a (re)leitura dos artigos “Respeitem o legado moral dos Cal Brandão” e “Três mulheres exemplares”, ambos da autoria de Soares Novais e publicados nas edições de 09.01.2023 e de 20.07.2023 do sinalAberto.

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22/04/2024

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Soares Novais

Porto (1954). Autor, editor, jornalista. Tem prosa espalhada por jornais, livros e revistas. Assinou e deu voz a crónicas de rádio. Foi dirigente do Sindicato dos Jornalistas (SJ) e da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto (AJHLP). Publicou o romance “Português Suave” e o livro de crónicas “O Terceiro Anel Já Não Chora Por Chalana”. É um dos autores portugueses com obra publicada na colecção “Livro na Rua”, que é editada pela Editora Thesaurus, de Brasília. Tem textos publicados no "Resistir.info" e em diversos sítios electrónicos da América Latina e do País Basco. É autor da coluna semanal “Sinais de Fogo” no blogue “A Viagem dos Argonautas”. Assina a crónica “Farpas e Cafunés”, na revista digital brasileira “Nós Fora dos Eixos”.

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