Até vir a mulher da fava-rica

A mulher da fava-rica, em Lisboa, no final do século XIX. (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Histórias, Lisboa”, esta fotografia apresenta-
nos, provavelmente, a “última vendedeira de
fava-rica” conhecida na capital portuguesa.
Com dois filhos e quatro netos, a senhora
Deolinda Neves era a ilustre fornecedora de
fava-rica à população que cercava a Rua
Capitão Roby. Nascida em Lisboa, por aí vivia.
Há 30 anos (considerando a data da fotografia,
em meados dos anos 60 do século XX), esta
vendedeira fazia da concha e da panela o seu
emblema profissional. Cada medida valia cinco
tostões. Ela comprava por 3$50 (três escudos e
cinquenta centavos) cada um dos vinte litros
de fava-rica que vendia aos domingos. “Mas,
p’ra isso, é peciso ter pergão suável”, disse a
vendedeira à Revista Flama.
A fava-rica é uma fava seca que, depois de cozida, é refogada com azeite, alhos e pimenta – como confirma o “Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa” –, constituindo a base de sopas deliciosas.
A sopa era muito nutritiva e representava um alimento muito apreciado, ainda no século XX, pelas classes populares. Muitas vezes, era tragada ao pequeno-almoço e, como os tempos eram duros, consistia num dos poucos alimentos comidos durante o dia.

XIX, representada por Roque Gameiro.
(historiaschistoria.blogspot.com)
A fava-rica era vendida por vendedoras ambulantes que percorriam, de manhã cedo, os bairros populares, trazendo na cabeça uma panela de sopa dentro de um cesto, calcorreando as ruas e entoando, alto e em bom som, o característico pregão matinal: “Fava riiiiiiiiiiiiiiiiiica!”
Ao ouvirem o pregão da mulher da fava-rica, as clientes desciam à rua com uma panela para comprar tão nutritivo alimento. Certamente, muita gente tinha de esperar, para tomar o pequeno-almoço, até vir a mulher da fava-rica. De facto, a expressão “… até vir a mulher da fava-rica” foi utilizada para descrever algo que iria demorar muito tempo a realizar-se. Porém, como regista a página electrónica Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, a mesma expressão significa que “poderemos ter de esperar muito tempo, mas vai valer a pena”.
Eu também estou à espera da mulher da fava-rica para matabichar.
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07/09/2023