Comida tradicional
As vantagens do nosso mundo intensamente tecnológico são tantas e tão grandes que é impossível enumerá-las todas aqui, mas permita-me o leitor a ousadia de realçar apenas algumas, a título de exemplo e sem qualquer pretensão de exaustividade. Com as tecnologias da informação e comunicação (TIC), multiplicamos, de forma explosiva, as nossas aptidões em três vertentes: quantidade, qualidade e rapidez.
Com as TIC, temos acesso a quantidades incomensuráveis de dados e de informação, o que, consequentemente, nos permite ver mais, saber mais e fazer mais. É claro que, se não tivermos alguma “arte”, de pouco nos adianta ter tantos dados e tanta informação, mas, se soubermos o que fazer com isso, poderemos obter grandes benefícios. É um pouco como estar numa biblioteca com um milhão de volumes: com algum método, poderemos de aí extrair alguma vantagem. Por outro lado, se tentarmos ler todos os livros ao acaso, depressa nos afogaremos com tanta informação e nunca chegaremos a lado nenhum.
De facto, é o método que nos pode abrir as portas para o segundo grupo de vantagens que nos oferecem as TIC: a qualidade. Com discernimento e inteligência, podemos encontrar, selecionar e estudar informação de grande qualidade, produzida por especialistas e, até há pouco, apenas acessível a um número limitado de pessoas. É claro que também existe todo o tipo de informação não fundamentada, errada e enganadora, de forma intencional ou não. Separar o trigo do joio é, também neste caso, essencial. Não é tarefa fácil, podendo exigir um esforço considerável e bastante tempo. Como sempre, a qualidade paga-se, mas o custo da falta dela pode ser muito maior.
Tempo para encontrar a qualidade na esmagadora quantidade de dados e informação disponível através das TIC é, precisamente, o que a vasta maioria das pessoas não tem. O terceiro grupo de vantagens que as TIC oferecem é, precisamente, aquilo que todos querem: rapidez. Se não sabemos a resposta a uma questão, queremos encontrá-la em poucos segundos. O problema é que a rapidez não é uma vantagem por si só, podendo dar origem a muitos “efeitos secundários”.
De um momento para o outro, deixamos de querer gastar tempo a procurar e a entender, abdicamos de tentar compreender a pergunta e os motivos por detrás dela, querendo apenas que alguém ou algo nos diga qual é a resposta certa. Procuramos, meramente, saber o que todos os outros dizem que sabem, o que é voz corrente, o que alguém diz que é verdade. Abdicamos de pensar, contentando-nos com a informação já digerida e processada, tal como apresentada pela Internet, pronta a consumir. No fundo, passamos a consumir informação como se de fast food se tratasse – sem gosto, fácil de obter e de ingerir – e encaramos a Internet como um ponto de venda de uma cadeia mundial de franchising.
Nos dias contemporâneos, talvez o nosso maior desafio seja o de abandonarmos esta abordagem redutora e superficial, e tirarmos muito melhor partido da incrível quantidade e qualidade da informação que está ao nosso dispor. Se o conseguirmos, a informação deixará de ser fast food e passará a alimentar-nos de forma saudável e a saber-nos tão bem como a verdadeira comida tradicional.
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12/10/2023