Diário de guerra (IX)
1 – Yevgeny Prigozhin, o cozinheiro de Putin que quer ser “chef”(e) (Público); O manipulador eleitoral e chefe dos mercenários ao serviço do Kremlin (Diário de Notícias); Sombra de Prigozhin ameaça Putin: líder do Grupo Wagner tem aproveitado invasão da Ucrânia para subir no Kremlin (Multinews – SAPO).
Se ainda desconfiávamos que existisse um centro a debitar, como hei-de dizer, coisas sobre o governo russo, eis que os jornais e sites cá do sítio não enganam. Ou, então, tiveram os três a mesma revelação: Prigozhin é um perigo, vamos lá avisar Putin para se pôr a pau. O aparecimento simultâneo de uma coisa sobre o responsável do grupo Wagner, que combate na Ucrânia ao lado das tropas russas, terá decerto a ver com as crescentes dificuldades que o exército ucraniano está a experimentar no que o governo de Kiev designou de contra-ofensiva a leste, na região do Donbass, e em conseguir controlar a recém-abandonada Kherson.
Na ausência de ganhos militares, procura-se um substituto do sucesso, procurar introduzir a desconfiança na engrenagem do Kremlin. Sempre solícita, a comunicação social portuguesa, sem qualquer tipo de critério, engole o que lhe chega, basta que receba a ordem, publique-se! Como se o assunto tivesse suficiente importância para fazer parte do rosto dos jornais e dos sites. Valha-me Deus!
2 – Em que parágrafo paro a leitura de qualquer notícia sobre a guerra na Ucrânia? Geralmente no penúltimo, umas vezes começo logo no antepenúltimo. É que o(a) jornalista depois de procurar redigir, tão bem quanto lhe é possível, os factos que são notícia, o remate é feito sempre com a resenha histórica do acontecimento, com início em 24 de Fevereiro e vai por aí fora. Não sei, mas não sei mesmo, se isto é uma boa prática jornalística, se isto se aprende nas escolas de jornalismo, ou se é a rotina imposta pelos chefes.
Acho que este tipo de conclusão é impróprio de quem dá notícias de uma situação cujo enquadramento está mais do que feito, toda a gente o conhece. Direi que tem como exclusivo objectivo estimular o locus do ódio, fazer dos leitores de jornais outros tantos voluntários para se oporem a uma solução pacífica. Se os Europeus, incluindo os Ucranianos, estão com as condições de vida já insuportáveis, com tendência a agravar-se em cada dia que passa, a raiar os anos negros da austeridade, todos os esforços no sentido de se encontrar uma solução pacífica não são de menos. Já basta que quem tem a obrigação de pôr em movimento os mecanismos de negociação continuem a manter-se ainda longe da mesa. O bloco euro-saxónico enquanto não gastar as balas todas que tem de reserva e o dinheiro que é dos povos não fica descansado. Tudo para que os Russos não venham por aí abaixo e nos comam as alheiras, os chouriços, os presuntos, os patés, as pizzas, a moussaka, a choucroute, a paella, o tinto, o branco, o clarete, o cheirinho mais os brandys, como se as suas melhores fantasias fossem vir tomar conta do nosso quintal. E, no entanto, a comunicação social, para ter preocupações sociais, havia de pugnar pela exigência do fim da guerra, seria assim que deveria ser o último parágrafo de cada lauda sobre o assunto.
3 – A agência de notícias Associated Press avança na manhã de quarta-feira (16 de Novembro), citando autoridades dos Estados Unidos da América (EUA), que as informações iniciais apontam para que o míssil que atingiu a Polónia na tarde desta terça-feira (15 de Novembro) foi disparado pelas forças ucranianas contra um míssil russo, citando autoridades dos EUA. E, no entanto, ainda sem qualquer análise do sucedido, os falcões dos comentadores das televisões portuguesas saltaram todos da gaiola, em que se destacou a incendiária Márcia Rodrigues, declarando que era o suspeito do costume o responsável do lançamento do par de mísseis; desta vez, a pontaria estava de tal maneira que acertaram numa plantação de batatas.
Sobre os apresentadores e comentadores, a História está toda contada, o seu grau de profissionalismo e isenção ficou escrito na pedra, desde 24 de Fevereiro. Porém, há quem esteja obrigado a outro recato, a outra ponderação; ainda nada se sabia sobre o responsável pelo lançamento, já Gomes Cravinho vinha fazer coro com os falcões para legitimar o seu ódio, apontando de imediato o responsável, sem reserva, porventura sem ter ouvido o que os seus colegas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e do Pentágono iam dizendo sobre o assunto. É esta a contribuição que o governo português quer dar ao estabelecimento da paz na região, é tendo no seu seio quem não perde uma para lançar gasolina no incêndio. Por este caminho, temo que António Costa, com os quatro anos que ainda lhe restam, tenha de transferir o gabinete para as ruínas romanas da Baixa da cidade, tantos são os mísseis que lhe estão a cair na cabeça.
4 – “Como legisladores responsáveis pelo gasto de dezenas de biliões de dólares dos contribuintes dos EUA em assistência militar […], acreditamos que tal envolvimento nesta guerra também cria uma responsabilidade para os Estados Unidos explorarem seriamente todos os caminhos possíveis, incluindo o envolvimento direto com a Rússia”, escreveram 30 democratas do Congresso dos EUA, em carta dirigida a Joe Biden, por forma a explorarem-se caminhos que possam levar à paz no conflito da Ucrânia.
Qualquer que tenha sido a razão para tal tomada de posição, pode muito bem acontecer que este comece a ser um exemplo para os ocidentais europeus também escreverem cartas aos seus governos para se envolverem na procura de outras alternativas ao envio do dinheiro dos cidadãos para o governo da Ucrânia, cujos resultados estão à vista, criar uma situação em que o nuclear se torne a última arma para a NATO não sofrer uma humilhação.
É avisado que, à medida que esse cenário se vai tornando mais próximo, haja quem deixe de só olhar para a ponta do nariz e tome a iniciativa de apontar a porta de saída quando os pirómanos já entraram no edifício. Até agora, os parlamentos têm-se limitado a ouvir com enlevada admiração o chefe do governo ucraniano, convidando-o para tudo quanto possa contribuir para manter a chama da guerra acesa, com o argumento de que vêm aí os Russos. Nunca tendo isso estado em causa, nem quero imaginar o que aconteceria aos que se têm batido pela paz, caso, de facto, os Russos se dessem por vencidos. Se por ora a fúria não tem ultrapassado as pontas dos dedos, bem poderiam fugir e pedir asilo político algures, bem longe, todos quantos nestes oito meses tiveram a coragem de se opor ao pensamento dominante. Às vezes, de onde menos se espera, surgem notícias sensatas. Aquela é uma delas, que cresça e seja escutada por quem pode decidir sobre o que está em jogo.
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Nota do Director:
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08/12/2022