Diário de guerra (XII)

O presidente da Bielorrússia, Alexander Lukashenko, aliado de Moscovo, disse que o seu país está disponível para receber “armas nucleares”, caso haja uma ameaça do Ocidente, no âmbito da crise na Ucrânia. (Créditos fotográficos: Maxim Guchek / BELTA / AFP – jn.pt)
1 – Na Ucrânia, a situação é esta. Os governantes europeus e o senhor Stoltenberg1, se não se pronunciarem todos os dias sobre o assunto, agora sobre a instalação de armas nucleares na Bielorrússia, devem ficar com um sentimento de culpa, por não terem afirmado que Vladimir Putin é isto e aquilo. Que ninguém pense que baixaram a guarda ou que estão distraídos; e que o que se passa em França e em Israel não estaria a preocupá-los. Está, mas fazem de conta que não está. Quem sabe se o seu país não será o próximo com uns largos milhares na rua, o que interessa é mostrar ferocidade para com o Kremlin. Sempre serve para distrair as pessoas. O que seria se, por um dia, se deixasse de falar no assunto? Seria uma traição aos azovs2. E os azovs têm de ser acarinhados, apoiados, bem pagos, não vão eles virar a espingarda para quem lhes paga. Portanto, se os Estados Unidos da América (EUA) têm, há muitas dezenas de anos, instalações nucleares na Europa, têm direito a isso. Se não fossem eles, a Europa já tinha sido engolida pelo exército russo.

Assim, podemos continuar a fazer a nossa vidinha, acordar a horas, levar os filhos à escola, passear no campo no fim-de-semana… Enfim, tem de se estar sempre com um olho no Putin e outro em Ursula von der Leyen3 – se ela desfalecesse, seria o cabo dos trabalhos, não há quem a substitua. É esta a situação quanto aos altos magistrados das nações europeias.
2 – Em plena situação de guerra, um dos beligerantes, neste caso a Rússia, resolve prevenir a morte ou os ferimentos de uns milhares de crianças que habitavam as zonas de guerra, ou que corriam o risco de poderem ficar abandonadas, levando-as para o seu território, ficando, assim, a coberto de qualquer eventualidade. É este o argumento do Tribunal Penal Internacional (TPI) para lançar um mandato de captura contra de Putin.

(Créditos fotográficos: AP – sicnoticias.pt)
Se estavam a obedecer a ordens da Casa Branca, ao menos que apresentassem um argumento de jeito, alguma coisa verosímil, em que as pessoas ficassem a pensar, em que acreditassem. Ao presentarem este caso – o salvamento ou a protecção de crianças de poderem morrer –, pensarão, por acaso, que convence alguém, a não ser os fanáticos da guerra? Seria preferível deixá-las ao abandono, à sorte dos bombardeamentos? Acaso foram retiradas dos braços dos pais? O que sabe o TPI das condições em que essas crianças estão a viver, como estão a ser tratadas e sobre os cuidados de que estão rodeadas? Nada. Não existe qualquer informação a dar conta de que foram lançadas em orfanatos miseráveis, sem condições sequer para abrigar gado, quanto mais seres humanos.

O que é feito dos tais crimes de guerra, do genocídio, do massacre de Bucha4, e todos os outros de que a comunicação social do Ocidente diariamente noticia? Em desespero de causa, o Ocidente resolve lançar mão de um caso que supostamente iria partir os corações dos 500 milhões de ocidentais, imaginando que era tal a sua alienação que engoliam esta acusação. Ao ponto de o governo francês declarar que isso iria ajudar a Ucrânia. De facto, estamos perante a mais desacreditada composição de governos europeus. Foi preciso que a Rússia invadisse a Ucrânia para que a democracia liberal europeia mostrasse de que é feita: ganância e incompetência.
3 – Até agora, tanto a Casa Branca como o Kremlin têm conseguido intervir na guerra da Ucrânia, evitando que ela fique fora de controlo e que evolua para uma guerra generalizada, vulgarmente designada Guerra Mundial.

As várias tentativas feitas por vários países de parar a guerra têm chocado com a intransigência do presidente da Ucrânia, cuja condição é a derrota da Rússia para haver paz. Esta condição decorre do envio permanente de material de guerra e de dinheiro para manter as forças armadas daquele país aptas a responderem ao outro lado. Podemos afirmar que é a lei da guerra: procurar atacar e resistir até que uma das partes, ou terceiros, considere chegada a altura de calar as armas e de se porem a negociar. Era nesta situação que nos encontrávamos, até que o Tribunal Penal Internacional (de que nem a Rússia nem os EUA fazem parte) tomou a decisão de emitir um mandado de captura a Putin para ser julgado por aquele tribunal. Não fosse aquele mandato de captura mais uma peça de propaganda do Ocidente e estaríamos perante um caso sério, porventura o caso mais sério desta guerra. Pelo acto em si – a captura, em pleno exercício das suas funções, do chefe de Estado da Rússia –, mas principalmente pelas suas consequências, na hipótese de que a ficção norte-americana é pródiga, de um comando da CIA conseguir capturar aquela personalidade. Terá, mesmo assim, o TPI (e todos os que agora se regozijam) reflectido nos efeitos que isso teria, nas horas imediatas ao acontecimento?

mandado de captura contra Vladimir Putin vai limitar a liberdade do
presidente russo. (© RTP)
Basta pensar-se na vontade dos que, no Kremlin, estão a aguardar uma oportunidade para endurecer a situação, dos que consideram que Putin não está a fazer tudo o que deve ser feito, tendo em conta os milhares de mortos de soldados russos, o cerco de que a Rússia está a ser alvo e as sanções que lhe estão a ser aplicadas. Agora, junte-se a este pacote a captura do seu chefe de Estado e não será precisa muita imaginação para chegar à conclusão do que iria acontecer a seguir. Então, que o TPI pegue no mandato e lhe dê o destino das brincadeiras de mau gosto – o lixo – e não fale mais no assunto.
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Notas da Redacção:
1 – Jens Stoltenberg é o actual secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN / NATO).
2 – Seguindo a Wikipédia, lemos que o Destacamento de Operações Especiais “Azov”, conhecido como o Regimento Azov ou, mais comummente, pelo seu nome antigo de, até Setembro de 2014, Batalhão Azov, é uma unidade da Guarda Nacional da Ucrânia, sediada em Mariupol, na região costeira do Mar de Azov, de onde deriva seu nome.
3 – Ursula Gertrud von der Leyen é uma política alemã, actual presidente da Comissão Europeia, desde 2019.
4 – Recorrendo novamente à Wikipédia, é referido que o massacre de Bucha foi “o assassinato em massa” ocorrido, em Março de 2022, durante a batalha de Bucha, na invasão russa da Ucrânia.
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Nota do Director:
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06/04/2023