Geologia do vinho

 Geologia do vinho

(Créditos fotográficos: Nick Karvounis – Unsplash)

O vinho não tem Geologia, mas, entre outros aspectos não menos importantes (como as castas, o clima, a topografia e outros que desconheço), tem uma relação muito estreita com a ciência que estuda as rochas, em especial no que diz respeito à sua natureza (granitos, basaltos, xistos, calcários e outras).

Sempre que a capa superficial das rochas expostas aos agentes externos definidores do clima, nomeadamente, a humidade e a temperatura, atinge um certo grau de apodrecimento (alteração ou meteorização) susceptível de permitir a ocupação vegetal e com ela todo um cortejo de seres vivos e de matéria orgânica, passa a ser considerada como solo. O solo é, pois, uma dada espessura (de escassos centímetros a vários metros) de material solto, móvel, na interface da rocha sã (rocha-mãe) com o meio exterior de que fazem parte o ar, os vegetais e alguns animais (minhocas, insectos e outros). Em linguagem corrente, “solo” é sinónimo de “terra”. Fala-se de terra arável, de cavar a terra, de estrumar a terra, etc.

Dos solos mais incipientes e pobres, ditos esqueléticos, aos mais evoluídos e ricos de matéria orgânica, todos existem porque há rochas aflorantes à superfície da Terra e porque há a sua meteorização menos ou mais acentuada.

Vários tipos de solos. (florestas.pt)

Há, pois, uma relação muito estreita entre o vinho e as rochas através do solo. Solo que depende do clima. Clima que, por seu turno, varia com a latitude, com a altitude, com a interioridade e, ainda e muito, com a orientação face à incidência da radiação solar, no caso das vertentes, como as do Alto Douro. Não obstante a pequena dimensão do País, há variações sensíveis no clima de norte a sul. Por exemplo, ao clima atlântico e húmido, no Minho, o berço do tradicional vinho verde, opõe-se a relativa secura do Alentejo oriental, que produz os conhecidos vinhos da Granja (em Amareleja).

Em Portugal, em termos muito gerais e no que toca à diversidade litológica, podemos distinguir, especialmente, os granitos, os xistos, os calcários, os mármores, os basaltos, os terrenos arenosos e aluviões. E, em função desta geologia, temos no nosso país:

 Fonte: Adaptado de Atlas Digital do Ambiente, 2002. (solosfilipe.yolasite.com)
  • solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração de rochas consolidadas como granitos e xistos;
  • solos arenosos consolidados ou não;
  • solos pouco evoluídos derivados de calcários diversos;
  • solos evoluídos derivados de rochas-mãe calcárias (terra rossa), de cores avermelhadas ou amareladas, de que temos bons exemplos em associação com os mármores de Vila Viçosa – Estremoz – Borba;
  • solos evoluídos, muito argilosos como são, entre outros, os barros pretos de Beja, derivados de gabros e dioritos, tradicionalmente conhecidos como campos de trigo;
  • solos de aluvião, no geral, areno-argilosos e ricos de matéria orgânica.

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Exemplos de vinhos relacionados com as características dos solos:

(turiventos-turismoeventos.blogs.sapo.pt)
  • Vinhos da Bairrada – em solos areno-argilosos.
  • Vinhos de Borba – em solos evoluídos derivados de rochas-mãe calcárias (terra rossa), de cores avermelhadas.
  • Vinhos de Bucelas – em solos derivados de margas e de calcários.
  • Vinhos de Carcavelos – em solo esquelético sobre calcário.
  • Vinhos do Cartaxo – em solos aluviais.
  • Vinhos de Colares – em solos de areia.
  • Vinhos do Dão – em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração do granito.
  • Vinhos de Estremoz – em solos evoluídos derivados de rochas-mãe calcárias (terra rossa), de cores avermelhadas
  • Vinhos de Évora – em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração do granito.
  • Vinhos da Graciosa (Açores) – em solos sobre basalto.
  • Vinhos de Lagoa – em solos areno-calcários.
  • Vinhos da Madeira – em solos sobre basalto.
  • Vinhos do Pico (Açores) – em solos sobre basalto.
  • Vinhos de Portalegre – em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração do granito.
  • Vinhos do Porto – em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração de xistos, nas vertentes do Alto Douro.
(Créditos fotográficos: John Cameron – Unsplash)
  • Vinhos do Redondo – em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração do granito.
  • Vinhos de Reguengos – em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração do granito.
  • Moscatel de Setúbal – em solo de areia.
  • Vinhos do Vale do Sado – em solos aluviais.
  • Vinhos da Vidigueira – maioritariamente, em solos não evoluídos ou esqueléticos, praticamente reduzidos à capa de alteração de xistos.
  • Vinhos Verdes – em solos medianamente evoluídos sobre rochas graníticas.

04/03/2024

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A. M. Galopim Carvalho

Professor universitário jubilado. É doutorado em Sedimentologia, pela Universidade de Paris; em Geologia, pela Universidade de Lisboa; e “honoris causa”, pela Universidade de Évora. Escritor e divulgador de Ciência.

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