Ir no conto do vigário

 Ir no conto do vigário

Pormenor da pintura “Pipe smoking priest”, de Eduard von Grützner.

Quase todas as expressões populares têm implícita uma história que, sendo verídica ou apenas ficção, contém aspectos engraçados ou curiosos. É o caso do conto do vigário.

A história é contada como se se tivesse passado, efectivamente, no Brasil, em Ouro Preto. Consta que, no século XVIII, a imagem de uma Nossa Senhora foi oferecida à cidade para ser posta na igreja, só que, na antiga urbe de Vila Rica (actual Ouro Preto), existiam duas paróquias: a de Pilar e a da Conceição, e cada uma delas queria a referida imagem para a sua igreja.

Gerou-se uma controvérsia sobre qual das igrejas ficaria com a imagem. Para solucionar o diferendo, o vigário da igreja do Pilar sugeriu o seguinte: amarrar a imagem a um burro e deixá-lo solto na fronteira entre as duas paróquias. Atendendo à paróquia para que o burro se dirigisse, a igreja respectiva ficava com a imagem. Ambos os padres concordaram e fez-se o proposto.

O burro foi solto e, de imediato, dirigiu-se para a igreja do Pilar. Tudo parecia certo e honesto, no entanto, na proposta havia algum sofisma ou aparência de verdade, porque o burro pertencia ao vigário da igreja de Pilar. Assim sendo, o burro não fez mais do que se dirigir para casa.

(medium.com)

Por esta razão, a expressão “ir no conto do vigário” é sinónimo de “deixar-se enganar” ou de “ir na conversa”. Já “conto do vigário” significa “falcatrua”, “malandragem”. Semanticamente, “conto do vigário” é a golpada ou o delito cometido por alguém que se faz passar por outro, ludibriando a vítima que está de boa-fé, mas é gananciosa.

Em Portugal, também tem havido muitos vigaristas que tentam levar as pessoas a “ir no conto do vigário”. No século XIX, terá ocorrido algo semelhante, quando alguns malandros chegavam às cidades onde eram desconhecidos e se apresentavam como emissários do vigário. Esses indivíduos diziam que tinham uma grande quantia de dinheiro numa mala que estava bem pesada e que precisariam de guardá-la para continuarem a sua viagem. Por isso, propunham que lhes dessem alguma quantia em dinheiro, como garantia, para poderem viajar tranquilos.

(espacovital.com.br)

Uma actuação muito em voga, no século passado, era a da cautela premiada. O vigarista chegava-se ao pé de alguém com o perfil que achava adequado e dizia-lhe que tinha na mão uma cautela premiada com valor avultado. Como a cena se passava, normalmente, perto uma estação de comboios ou de camionagem, o vigarista alegava que necessitava de tomar aquele meio de transporte e que não tinha hipóteses de levantar o prémio. Por conseguinte, apesar do valor da cautela ser elevado, ele vendia-a por uma pequena fracção do seu real valor.

Por vezes, a ganância de um lucro fácil leva o alvo do vigarista a ir no conto do vigário. Mas os esquemas de contos do vigário são muitos e variados. Ainda hoje, ouve-se relatos na televisão de pessoas, geralmente idosas e em lugares remotos de Portugal, que foram na conversa de vigaristas.

12/01/2023

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Vítor Duque Cunha

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