Justiça: o que não se lê no mapa (11)*

 Justiça: o que não se lê no mapa (11)*

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Impactos do novo mapa judiciário em Sines e em Monchique

“Atendendo ao pólo industrial em que Sines se tornou, faz todo o sentido que o Tribunal de Trabalho para aqui tenha voltado”, refere Ana Vilhena, enquanto presidente do Agrupamento de Delegações de Santiago do Cacém – Sines da Ordem dos Advogados, concordando com a reactivação dos tribunais que tinham sido fechados pela antiga ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz.

“Ao longo dos tempos, o tribunal de Monchique sofreu várias vicissitudes, tendo sido extinto, recuperado, criado em comarca e esta extinta. O fecho dos serviços gerou sempre grande descontentamento da população, atenta a interioridade do concelho, a considerável distância das cidades mais próximas e a deficiente rede de transportes públicos existente”, declara, por sua vez, Paulo Rosa, na qualidade de delegado da Ordem dos Advogados em Monchique, ao sinalAberto.

A propósito da reorganização do mapa judiciário, o advogado Paulo Rosa admite que “é difícil sondar as razões de medida tão irracional”. “Certamente, um misto de insensibilidade, de ignorância e de prepotência”, verifica.

No que respeita a Sines, no distrito de Setúbal e posteriormente sob alçada da circunscrição do Alentejo Litoral (comarca-piloto no contexto da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais ou Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto), os dados disponíveis indicam que este município tinha 13577 habitantes em 2001. Dez anos depois, regista-se um acréscimo populacional de 683 pessoas, equivalente a uma evolução demográfica de 5,03%.

O concelho de Sines está dividido em duas freguesias: Sines, a
norte, e Porto Covo, a sul. (alentejoturismo.pt)

Como assinala o jornal municipal Sineense, na edição de Outubro/Novembro de 2011, publicação dirigida pelo antão presidente da Câmara Municipal, Manuel Coelho Carvalho, os “dados preliminares dos Censos 2011 revelam que Sines foi o concelho do Alentejo cuja população mais cresceu na última década (5,03%)”. “De 13577 residentes em 2001, Sines passou para 14260 em 2011”, sendo 50,49% mulheres e 49,51% homens, como especifica esta publicação da responsabilidade da autarquia local. “Os restantes quatro concelhos do Alentejo Litoral registaram perdas de população (Odemira, -0,01%; Alcácer do Sal, -9,15%; Grândola, -0,32; Santiago do Cacém, -4,45%) e no Alentejo apenas houve evolução positiva, embora inferior a Sines, nos concelhos de Campo Maior, Évora, Vendas Novas e Viana do Alentejo”, acrescenta o Sineense (edição n.º 76).

Entretanto, no período de 2010 a 2019, observa-se um ligeiro aumento do índice de envelhecimento (de 112 para 151 idosos) e uma baixa no número de residentes, de 14225 para 13673. Todavia, em face dos recentes resultados preliminares dos Censos 2021, divulgados em 28 de Julho, verificamos que a variação da população residente neste município, entre 2011 (com 14238 indivíduos) e 2021 (quando são contabilizadas 14214 pessoas, tendo esse número sido corrigido para 14200 residentes), é praticamente imperceptível, com uma ligeira tendência de queda populacional de cerca -0,3% (ou seja, Sines perdeu 38 habitantes em dez anos).

No anterior mapa judiciário, a Comarca de Setúbal, com uma área de acção correspondente ao próprio distrito, era composta pelas comarcas de Alcácer do Sal, de Almada, do Barreiro, de Grândola, da Moita, do Montijo (incluindo o município de Alcochete), de Santiago do Cacém, do Seixal, de Sesimbra, de Setúbal (abarcando o concelho de Palmela) e de Sines.

Ao atendermos à organização e aos recursos humanos, verificamos – seguindo o Ensaio para a reorganização da estrutura judiciária, publicado em Janeiro de 2012, pela Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) – que o tribunal ou Juízo Misto do Trabalho e de Família e Menores (JMFM) da então comarca de Sines era parte integrante da comarca-piloto Alentejo Litoral, assim como as comarcas de Alcácer do Sal e de Grândola (ambas com os tribunais: Juízo de Média e Pequena Instância Cível, e Juízo de Instância Criminal), a par da comarca de Santiago do Cacém (com os tribunais: Juízo de Grande Instância Cível, Juízo de Média e Pequena Instância Cível, e também o Juízo de Instância Criminal).

O tribunal ou Juízo Misto do Trabalho e de Família e Menores (JMFM) era parte integrante da comarca-piloto Alentejo Litoral.

Nesse contexto e recorrendo a informação que se reporta a 16 de Junho de 2011, a comarca de Sines dispunha de um juiz no seu quadro legal, embora fossem dois os juízes que, ali, exerciam funções. Idêntica situação se observava, na referida data, relativamente aos magistrados do Ministério Público. Por outro lado, ao JMTFM de Sines tinha sido atribuído um quadro legal que comportava nove oficiais de justiça, mas eram 10 os profissionais que, efectivamente, desempenhavam funções nesse tribunal.

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Movimento processual e média das entradas

No que concerne ao movimento processual e à média das entradas, a DGAJ informa que, na comarca de Sines, a actividade do juízo misto totalizava 142 processos, sendo 40 os que diziam respeito ao foro do Trabalho e 102 os processos no domínio forense de Família e Menores. A DGAJ esclarece, em nota de rodapé, que os dados da comarca-piloto se reportavam “apenas ao ano de 2010” e que “foram calculados em função do peso relativo da população residente em 2011” nos municípios que integravam a respectiva área de jurisdição, com base na informação preliminar dos Censos 2011.

No seio da comarca-piloto Alentejo Litoral, a resposta judiciária na comarca de Sines era cumprida somente nas áreas de Família e Menores (FM) e do Trabalho. Por conseguinte, as causas de matéria Cível eram tratadas no Juízo de Grande Instância Cível (JGIC) de Alcácer do Sal e no Juízo de Pequena e Média Instância Cível (JMPIC) de Santiago do Cacém. Em matéria Penal, as resoluções eram tomadas no Juízo de Instância Criminal (JICrim) de Santiago do Cacém. Já as divergências a nível do Comércio eram apreciadas no JGIC e no JMPIC de Alcácer do Sal.

Ao projectar uma nova organização na instância central do Tribunal Judicial do Distrito de Setúbal (TJDS), o Ministério da Justiça (MJ) propunha que a 1.ª Secção Cível e a 1.ª Secção Criminal fossem sediadas na cidade de Almada, ambas com competência territorial para os municípios de Almada, do Barreiro, da Moita e do Seixal. Também nessa intenção organizativa, a 2.ª Secção Cível e a 2.ª Secção Criminal seriam localizadas em Setúbal, com uma área de competência territorial que englobaria os concelhos de Alcochete, de Alcácer do Sal, de Grândola, do Montijo, de Palmela, de Santiago do Cacém, de Sines, de Sesimbra e de Setúbal.

Sugerindo a extinção do Juízo Misto do Trabalho e de Família e Menores de Sines, o Ministério da Justiça apercebeu-se de que “o volume processual se revela[va] insuficiente para a criação de uma secção especializada para cada uma das matérias”.

Ao propor a extinção do Juízo Misto do Trabalho e de Família e Menores de Sines, integrado na Comarca do Alentejo Litoral, por “não ter respondido às necessidades da população”, sobretudo ao nível de FM, “devido às grandes distâncias que é necessário percorrer, nas deslocações ao tribunal[,] o que desmotiva a ida ao tribunal”, o MJ apercebeu-se ainda de que “o volume processual se revela insuficiente para a criação de uma secção especializada para cada uma das matérias”. Assim, a DGAJ recomendava “a extinção do mesmo e a integração da matéria relativa ao trabalho na Secção do Trabalho de Setúbal e a matéria da família e menores na secção de família e menores a criar em Santiago do Cacém”.

Nessa circunstância e no campo de acção da competência especializada, a DGAJ recomendava, a nível da instância central no TJDS, três secções de Trabalho. A 1.ª Secção do Trabalho, localizada na cidade de Almada, ficaria com uma área de competência territorial nos municípios de Almada, do Seixal e de Sesimbra. Por sua vez, a 2.ª Secção do Trabalho, com sede no Barreiro, abrangeria os concelhos de Alcochete, do Barreiro, da Moita e do Montijo. Já à 3.ª Secção do Trabalho, estabelecida em Setúbal, corresponde uma área de competência territorial que engloba os municípios de Alcácer do Sal, de Grândola, de Palmela, de Santiago do Cacém, de Sines e de Setúbal.

Relativamente à instância central da Secção de Família e Menores (FM), a DGAJ considerou, no contexto do TJDS, a existência de cinco unidades forenses fundamentais: a 1.ª Secção de Família e Menores, com sede em Almada, tem uma área de competência territorial para todo o concelho; a 2.ª Secção de FM, localizada na cidade do Barreiro, possui competência territorial nos municípios de Alcochete, do Barreiro, da Moita e do Montijo; a 3.ª Secção de FM, situada no Seixal, assume competência territorial no próprio concelho do Seixal e no de Sesimbra; a 4.ª Secção de FM, estabelecida em Setúbal, detém competência nos municípios de Setúbal e de Palmela; e a 5.ª Secção de Família e Menores, sediada em Santiago do Cacém, tem competência territorial nos concelhos de Alcácer do Sal, de Grândola, de Santiago do Cacém e de Sines.

Com carácter de instância central no alcance do TJDS, o Ministério da Justiça pensou em duas secções de Execução. À 1.ª Secção de Execução, com sede em Almada, foi-lhe atribuída competência territorial para os municípios de Almada e do Seixal. Por sua vez, à 2.ª Secção de Execução, localizada no Barreiro, demarcou-se-lhe competência para os concelhos de Alcácer do Sal, de Alcochete, do Barreiro, de Grândola, da Moita, do Montijo, de Palmela, de Santiago do Cacém, de Sesimbra, de Setúbal e de Sines.

No que respeita ao foro da Instrução Criminal (IC), a DGAJ decidiu avançar com duas secções no âmbito do TJDS. À 1.ª Secção de IC, com sede em Almada, cabe uma área de competência territorial que abarca os municípios de Alcochete, de Almada, do Barreiro, da Moita, do Montijo e do Seixal. Por outro lado, à 2.ª Secção de IC, instalada na cidade de Setúbal, foi garantida competência territorial que engloba os concelhos de Alcácer do Sal, de Grândola, de Palmela, de Santiago do Cacém, de Sesimbra, de Setúbal e de Sines. Todavia, a DGAJ anota que, por determinação legal, “pode ser estabelecido que a intervenção do Juiz da Secção de Instrução Criminal ocorra em diversos pontos da comarca”.

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Reorganização da Comarca de Setúbal

Analisando uma proposta global de reorganização para a Comarca de Setúbal (TJDS), com uma estrutura de gestão composta por um juiz presidente, por um procurador coordenador e por um administrador judiciário, a Direcção-Geral da Administração da Justiça designava, como instância local, o Tribunal de Santiago do Cacém como secção de competência genérica, tendo competência territorial para o próprio concelho e para o município de Sines. Nesse desígnio, com a reforma implementada a 1 de Setembro de 2014, ao abrigo da Lei da Organização do Sistema Judiciário (Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto), regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de Março, foi encerrado o Tribunal de Sines.

Com a reforma implementada a 1 de Setembro de 2014, ao abrigo da Lei da Organização do Sistema Judiciário, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de Março, foi encerrado o Tribunal de Sines.

Ao ter em conta os tribunais ou juízos a extinguir e os tribunais entretanto destinados a outras áreas de competências, a DGAJ, com base na plataforma electrónica www.viamechelin.com, calculou que a distância de 19 quilómetros, entre Sines e Santiago do Cacém (sobretudo, nos processos em matéria de Família e Menores), seria percorrida em 24 minutos. Por outro lado, as pessoas envolvidas em casos no foro do Trabalho demorariam 94 minutos a deslocar-se de Sines a Setúbal, num trajecto de 124 quilómetros (km).

Conforme o anexo do documento “Indicadores de A[c]tividade nos Arquivos dos Tribunais 2014”, publicado pela DGAJ, em Março de 2015, notamos que, na Comarca de Setúbal, ao ser encerrada a instância de Sines (o tribunal ou Juízo Misto do Trabalho e de Família e Menores), o seu arquivo, correspondente ao ano de 2014, apresentava uma extensão de 148 metros de prateleiras e uma extensão documental com 40 metros, o que corresponde a um saldo positivo de 108 metros. O mesmo documento não regista o total de processos eliminados e remetidos para o arquivo distrital, entre 2003 e 2014.

A DGAJ calculou que a distância de 19 quilómetros, entre Sines e Santiago do Cacém (nos processos em matéria de Família e Menores), seria percorrida em 24 minutos. Por outro lado, as pessoas envolvidas em casos no foro do Trabalho demorariam 94 minutos a deslocar-se de Sines a Setúbal, num percurso de 124 quilómetros

Como é referido na publicação municipal Sineense, na sua edição n.º 83 (Dezembro de 2012/Janeiro de 2013), a Câmara Municipal de Sines – ainda liderada por Manuel Carvalho (o qual já tinha presidido à edilidade em 1997, pela aliança entre o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista “Os Verdes” – PCP/PEV, sucedendo a Francisco Maria Pereira do Ó Pacheco; em 2001, pela Coligação Democrática Unitária–CDU; e em 2005, também pela CDU) – dirigiu-se, em comunicação formal, à ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), em Novembro de 2012, reivindicando a criação, na cidade de Sines, de uma secção de proximidade da, então, nova Comarca de Setúbal, com base no seu movimento processual.

“A reivindicação acontece no quadro da nova organização judiciária e da sua proposta de mapa, em que não está contemplado qualquer serviço de justiça em Sines”, mencionava a edilidade presidida por Manuel Coelho (no seu quarto mandato, tendo sido cabeça-de-lista de um Grupo de Cidadãos, na sequência das vitórias autárquicas locais comunistas, desde 1976 – no seio da Frente Eleitoral Povo Unido, da Aliança Povo Unido, do PCP/PEV e da CDU) recordando que “o novo mapa judiciário proposto pelo governo extingue as comarcas do Alentejo Litoral e [de] Setúbal e cria uma única comarca com sede em Setúbal”. Por conseguinte, no caso de Sines “será extinto o Juízo Misto de Trabalho, Família e Menores, inaugurado há apenas três anos”.

“O novo Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal ficará organizado em Instância Central, Instâncias Locais e Extensões Judiciais (ou Secções de Proximidade)”, antecipava-se no Sineense, acrescentando-se: “As Extensões Judiciais (ou Secções de Proximidade) serão criadas em locais onde haja, após a reorganização, uma procura expectável de pelo menos 200 processos por ano, ou 100 processos e não exista oferta de serviços de justiça a uma distância de menos de 30 km. [sic]”

O município de “Sines não é contemplado com nenhuma Secção de Proximidade, mas a Câmara Municipal considera que isso só pode acontecer porque os dados do movimento processual foram erradamente contabilizados”.

Como era também observado na mesma publicação, no mapa proposto pelo Governo (chefiado pelo social-democrata Pedro Passos Coelho), o município de “Sines não é contemplado com nenhuma Secção de Proximidade, mas a Câmara Municipal considera que isso só pode acontecer porque os dados do movimento processual foram erradamente contabilizados”. “No quadro do movimento processual que foi a base da decisão apenas se encontram registados os dados de Sines relativos a processos de trabalho e família / menores (40+102 processos), ou seja[,] os tratados no juízo misto de trabalho, família e menores sedeado em Sines, ficando em branco os campos relativos aos processos das restantes especialidades que os cidadãos sineenses submeteram nos outros tribunais”, argumenta a edilidade sineense.

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Câmara de Sines contesta decisão da DGAJ

Nessa circunstância, a Câmara Municipal manifesta “a convicção de que Sines tem certamente um movimento processual anual em todas as especialidades muito superior a 200 processos e que[,] por isso, seguindo os critérios enunciados pelo próprio Ministério da Justiça, deve ser criada no concelho uma Secção de Proximidade da Comarca de Setúbal”. Assim, previa-se que, nestas secções de proximidade, “os cidadãos possam ser informados sobre todos os processos em que estão envolvidos (incluindo aqueles que não são tratados no seu tribunal), entregar articulados e ser ouvidos por videoconferência”.

Como reparavam os responsáveis autárquicos, apenas “com a criação de uma secção com estas características, os munícipes de Sines não ficarão fortemente penalizados com a reforma judicial, considerando que a nova sede da Comarca se localiza a 120 km, sendo esse o único tribunal onde passarão a estar todas as especialidades” (sic).

O jornal quinzenário Correio Alentejo noticiava, a 7 de Fevereiro de 2014, que “Câmara de Sines repudia fecho do tribunal na cidade”. De facto, uma nota à imprensa do dia anterior (6 de Fevereiro) informava que a Câmara Municipal de Sines tinha aprovado, nessa quinta-feira, “por unanimidade, um voto de repúdio pela decisão tomada em Conselho de Ministros de encerrar o Tribunal de Sines no âmbito do novo mapa judiciário”.

Como então manifestava a autarquia – agora presidida por Nuno José Gonçalves Mascarenhas (que, nas eleições de 29 de Setembro de 2013, encabeçou a lista do Partido Socialista, a qual obteve maioria absoluta, ao conseguir 51,97% dos votos úteis) –, a ser concretizada esta decisão do Governo, “o Tribunal de Sines será encerrado cinco anos depois de ter sido inaugurado, deixando os munícipes sem acesso a qualquer serviço judiciário no seu concelho”. Na mesma nota de imprensa, a edilidade recordava que os juízos existentes no Tribunal de Sines – trabalho e família e menores – estavam ajustados ao perfil desta cidade como p[ó]lo económico e urbano da região e justificava-se a sua manutenção em a[c]tividade”.

A autarquia sineense sublinhava que o “acesso dos cidadãos à justiça é um valor basilar da democracia” e que tornar “mais caro, mais moroso e mais difícil aceder aos serviços judiciários é tornar Portugal um país com menos qualidade democrática”.

Na ocasião, a Câmara Municipal (de maioria socialista, com quatro vereadores em sete localmente atribuídos – refira-se que até às eleições autárquicas de 1989 eram possíveis cinco mandatos) declarava que também não tinha sido “atendida a reivindicação do município para que fosse criada em Sines uma secção de proximidade, que permitiria manter uma oferta de serviços judiciários, mitigando o prejuízo imposto à população local com o encerramento do tribunal”, argumentando: “Sines tem uma procura anual de processos que cumpre os critérios estabelecidos pelo Ministério da Justiça para a criação de secções de proximidade, pelo que também esta decisão é incompreensível”.

Esta autarquia do Alentejo Litoral, sob a liderança do socialista Nuno Mascarenhas, acrescentava ainda que, “ao contrário do que a Associação Nacional de Municípios Portugueses tinha solicitado, a apreciação do mapa judiciário em Conselho de Ministros aconteceu sem que se tenha realizado qualquer reunião entre a ministra da Justiça, o conselho dire[c]tivo da associação e os presidentes da Câmara dos municípios para cujos tribunais existia proposta de encerramento”. Nessa circunstância, a autarquia sineense sublinhava que o “acesso dos cidadãos à justiça é um valor basilar da democracia” e que tornar “mais caro, mais moroso e mais difícil aceder aos serviços judiciários é tornar Portugal um país com menos qualidade democrática”.

No período de antes da ordem de trabalhos da reunião extraordinária da Câmara Municipal de Sines, de 29 de Novembro de 2013, presidida por Nuno Mascarenhas, o vereador Hélder Guerreiro (da CDU) questionou o presidente da edilidade sobre a situação do tribunal local. Como regista a acta n.º 28, Nuno Mascarenhas respondeu que já tinha solicitado “informação sobre o tema, uma vez que as notícias indicam que o mesmo vai fechar, facto que é incompreensível e inconcebível para um tribunal com todas as condições”.  O líder camarário disse que aguardava mais informação que, posteriormente, seria transmitida ao executivo, mas que iria “recorrer a todos os meios possíveis para evitar o seu encerramento”.

Entretanto, no período de antes da ordem de trabalhos da reunião ordinária da Câmara Municipal de 6 de Fevereiro de 2014, o presidente do executivo deu conhecimento e solicitou a aprovação da tomada de posição do município referente à situação do Tribunal de Sines, nomeadamente acerca das decisões, então recentemente, tomadas pelo Ministério da Justiça sobre o fecho dos tribunais, sendo a mesma “aprovada por unanimidade”, como regista a acta n.º 3/2014.

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No Alentejo, seriam “extintos” três tribunais

Na sua edição online de 10 de Fevereiro de 2014, a Rádio Nova Antena (RNA, com sede em Montemor-o-Novo) dava conta de que o Governo tinha anunciado que iria “fechar 20 tribunais e converter 27 em secções de proximidade, de acordo com o diploma regulamentar da Reorganização Judiciária aprovado em Conselho de Ministros”. Conforme noticiava a RNA, no Alentejo, seriam “extintos” três tribunais – o de Castelo de Vide, o de Portel e o de Sines – enquanto cinco deixariam de “ser tribunais”, ao serem “convertidos em secções de proximidade”. Tais despromoções aconteceriam em Nisa, em Avis, em Arraiolos, em Alcácer do Sal e em Mértola.

Todavia, igualmente no Alentejo, ganhariam importância os tribunais de Portalegre, de Évora e de Beja, “havendo para os restantes um esvaziamento” das suas capacidades, “sendo de admitir uma redução do número de funcionários”.

A 23 de Fevereiro de 2014, o Correio da Manhã (CM) noticia que “Sines avança para providência contra fecho do tribunal”. Segundo este diário nacional, a Câmara de Sines “repudiou” o encerramento do tribunal e, então, anunciou a intenção de avançar com uma providência cautelar para impedir o fecho de “mais um serviço público” naquele concelho alentejano. Na ocasião, o presidente da edilidade, Nuno Mascarenhas, assumiu estar contra o que classificava de “retrocesso”, depois do investimento, em 2009, para a instalação do tribunal na cidade. “É uma decisão incompreensível. O número de processos é largamente superior ao que a ministra da Justiça exigia como limite mínimo para
encerrar o tribunal”, declarou o autarca sineense.

O presidente da Câmara Municipal de Sines, Nuno Mascarenhas, assumiu estar contra o que classificava de “retrocesso”, depois do investimento, em 2009, para a instalação do tribunal na cidade.

Na mesma altura, o presidente do Núcleo de Santiago do Cacém da Ordem dos Advogados (OA), Júlio Cardoso, observou que o fecho do tribunal de Sines “gera prejuízos” para a população, argumentando que neste juízo entraram, até ao final de 2013, cerca de cinco mil processos, tanto de família como de trabalho, o que, como conclui, “perfaz mais de mil processos por ano”.

Também em nota de imprensa, assinada pelo vereador Ricardo Cardoso, enviada a de 25 de Fevereiro de 2014, a vizinha autarquia de Odemira (no distrito de Beja) alertava, em antetítulo: “Justiça a mais de 100 km de Odemira”. Nesse comunicado, a Câmara Municipal deste município – que, tal como Sines, Alcácer do Sal, Grândola e Santiago do Cacém, integra o Alentejo Litoral – anunciava que iria “avançar com uma ação popular contra o novo mapa judiciário, reivindicando um modelo que salvaguarde o direito fundamental de acesso à Justiça em Odemira, manifestando-se contra o seu afastamento e a desqualificação do Tribunal de Odemira”.

A propósito, recuando no calendário, em 29 de Outubro de 2009 (três dias após a tomada de posse do XVIII Governo Constitucional, liderado por José Sócrates), o Bloco de Esquerda (BE) questionava o Ministério da Justiça (sob a responsabilidade do socialista Alberto Martins) relativamente ao funcionamento da então comarca-piloto do Alentejo Litoral (ao abrigo da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto): “Pretende o Governo tomar medidas desde já, no sentido de obviar os cidadãos das zonas mais afastadas a percorrer mais de 100 km para se deslocarem ao tribunal especializado?”

Já em 29 de Outubro de 2009, o Bloco de Esquerda questionava o Ministério da Justiça relativamente ao funcionamento da então comarca-piloto do Alentejo Litoral: “Pretende o Governo tomar medidas desde já, no sentido de obviar os cidadãos das zonas mais afastadas a percorrer mais de 100 km para se deslocarem ao tribunal especializado?”

Recordando que, a 14 de Abril desse ano, “entrou em funcionamento, no âmbito do novo mapa judiciário [no contexto da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, que antecedeu a Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) ou Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto], a comarca-piloto do Alentejo Litoral, um espaço que concentra um Juízo Misto do Trabalho, de Família e Menores”, o BE observava que seis meses após a sua inauguração, “os cidadãos apontam a distância a percorrer e a carência de transportes públicos para aceder ao tribunal especializado como um entrave ao acesso à Justiça, situação que assume especial importância para os cidadãos das zonas mais afastadas dos concelhos de Alcácer do Sal, Grândola e Odemira”.

Como informava o BE, no mesmo documento (assinado pelos deputados Fernando Rosas e Mariana Aiveca) dirigido ao presidente da Assembleia da República, sobre esta matéria, “veio a Delegação de Odemira da Ordem dos Advogados salientar que o modelo escolhido não teve em [consideração] o facto de Odemira ser o maior concelho do país e distar 90 km do Tribunal de Sines”. “As dificuldades de deslocação à nova unidade judiciária são ainda corroboradas por membros do Sindicato de Funcionários Judiciais, bem como por advogados”, notava o BE, adiantando: “Sobre o Tribunal de Sines é ainda de salientar a escassez de recursos humanos, nomeadamente no quadro de funcionários e juízes, manifestada pelos profissionais e cidadãos do Alentejo Litoral.”

Por conseguinte, atendendo ao exposto “e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda” dirigiu ainda uma segunda questão ao Governo, através do Ministério da Justiça: “Que medidas […] pretende o Governo adoptar no sentido de responder às dificuldades de acesso, por parte dos cidadãos e profissionais, ao Tribunal de Sines?”

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Tribunal em vias de imediato encerramento

Sendo 1 de Setembro de 2014 a data de início da reforma judiciária implementada ao abrigo da LOSJ (Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto) e regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de Março, o Tribunal de Sines estava em vias de imediato encerramento, a exemplo de outros no território nacional. No mesmo dia, o jornal Público (na sua edição online) destaca que o futuro dos tribunais fechados ainda é incerto. E regista que nenhuma das grandes obras previstas pelo mapa judiciário fica pronta este ano. No desenvolvimento da peça jornalística (assinada por Ana Henriques e Carlos Dias), ficamos a saber que a “adaptação do edifício, que pertencia à Rede Ferroviária Nacional, às funções de tribunal custou 1,1 milhões de euros”. Ao ser questionada sobre a utilização que o imóvel poderia ter a partir de então, a Câmara de Sines respondeu que ignorava.

Nuno Mascarenhas (© Sines Municipal, Março de 2014)

Passados quase 150 dias sobre a tomada de posse do novo executivo municipal sineense, o presidente da edilidade, Nuno Mascarenhas, ao assinar o editorial do boletim municipal (com um novo formato e um novo título: Sines Municipal), reforçava a vontade de “uma mudança de métodos de gestão do município”. A edição de Março de 2014 desse órgão de comunicação autárquico informava que a Câmara aprovou, no dia 6 de Fevereiro, “por unanimidade, um voto de repúdio pela decisão tomada em Conselho de Ministros de encerrar o Tribunal de Sines”, no âmbito do novo mapa judiciário, o que deixaria “os munícipes sem acesso a qualquer serviço judiciário no concelho”.

Ao considerar que os juízos então existentes no Tribunal de Sines (trabalho e família e menores) “estavam ajustados ao perfil desta cidade”, como pólo económico e urbano da região (assumida “capital marítima do Alentejo”, onde nasceu, em 1469, o navegador Vasco da Gama), a edilidade sineense denunciava, na primeira edição do Sines Municipal, que também “não foi atendida a reivindicação do município para que fosse criada em Sines uma secção de proximidade, que permitiria manter uma oferta de serviços judiciários, mitigando o prejuízo imposto à população local com o encerramento do tribunal”.

Em Março de 2014, Câmara Municipal de Sines afirmava que o previsto
encerramento do tribunal era uma decisão “incompreensível”.
(© Sines Municipal)

Alegando que o tribunal local tinha uma procura anual de processos que cumpria “os critérios estabelecidos pelo Ministério da Justiça para a criação de secções de proximidade”, a autarquia frisava que “também esta decisão é incompreensível”. Nesse contexto, a Câmara Municipal de Sines notava que, “ao contrário do que a Associação Nacional de Municípios Portugueses tinha solicitado, a apreciação do mapa judiciário em Conselho de Ministros aconteceu sem que se tenha realizado qualquer reunião entre a ministra da Justiça, o conselho diretivo da associação [ANMP] e os presidentes da Câmara dos municípios para cujos tribunais existia proposta de encerramento” (sic).

Por com seguinte, o Sines Municipal comunicava que a Câmara estava a estudar a possibilidade de uma providência cautelar ou acção popular. Entretanto, a União Local de Sindicatos e a Comissão de Utentes de Serviços Públicos de Sines já tinham realizado uma concentração, a 26 de Fevereiro desse ano, junto do Jardim das Descobertas, contra o encerramento do tribunal e da repartição de Finanças, tendo Nuno Mascarenhas igualmente participado nessa manifestação popular, na qual revelou que a edilidade estava a ponderar, com os juristas da autarquia, “interpor uma providência cautelar ou mesmo uma ação popular” contra o previsto fecho do tribunal.

A Câmara de Sines estava a estudar a possibilidade de uma providência cautelar ou acção popular, mas a União Local de Sindicatos e a Comissão de Utentes de Serviços Públicos de Sines já tinham realizado uma concentração, a 26 de Fevereiro de 2014, junto do Jardim das Descobertas

Nessa altura, o edil socialista reafirmava: “Tudo aquilo que for possível fazer por parte da autarquia estaremos na primeira linha de a[c]tuação.” Por sua vez, Sandra Garcia Silva, da comissão de utentes, manifestou, durante a concentração, que a participação da população é indispensável para a defesa dos serviços públicos em Sines e – como regista ainda o boletim municipal – a mesma a cidadã revelou que o próximo passo da comissão seria “a realização de um abaixo-assinado para entregar aos órgãos autárquicos locais, ao governo e aos grupos parlamentares”.

Grupo de munícipes de Sines participantes na concentração organizada pela União Local de Sindicatos e pela Comissão de Utentes, no dia 26 de Fevereiro de 2014, a qual envolveu cerca de duas centenas de pessoas. (© Sines Municipal)

Municípios do Alentejo Litoral contra mapa judicial

Na sua edição de Junho de 2014, o boletim municipal (de publicação trimestral) inseria o título “Municípios do Alentejo Litoral juntos contra mapa judiciário”. No desenvolvimento do texto informativo, o Sines Municipal recordava que o Conselho Intermunicipal da CIMAL (Comunidade Intermunicipal do Alentejo Litoral), que reúne os presidentes dos municípios de Alcácer do Sal, de Grândola, de Odemira, de Santiago do Cacém e de Sines, tinha apresentado, em Abril desse ano, “uma posição conjunta” sobre o garantido novo mapa judiciário.

Conforme regista o boletim municipal, ao assumirem tal posição, “os autarcas repudiam a reforma introduzida pela Lei n.º 49/2014, de 27 de março”, porque recusam “a continuada descapitalização do território e o abandono das populações e dos agentes económicos”. Essa posição conjunta foi enviada à ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, reiterando o pedido de audiência enviado em Novembro de 2013, não tendo sido obtida qualquer resposta por parte da tutela. Nesse sentido, os autarcas do Alentejo Litoral argumentavam que a, então, já determinada reforma judiciária “beneficia os infratores e contribui para a instalação do sentimento de impunidade, além de aumentar os custos para os cidadãos e empresas, o que representa um desincentivo ao recurso aos tribunais”.

Ao manifestarem o seu desagrado com essa decisão do Governo liderado por Passos Coelho, os presidentes das câmaras municipais desta sub-região, proclamaram que tais medidas “agrava[va]m não apenas o afastamento dos cidadãos de um serviço público essencial, mas de uma função de soberania do Estado, com prejuízo para a coesão social e territorial, penalizando a competitividade económica dos territórios, bem como a sua capacidade de atra[c]ção e fixação de investimentos e residentes e colocando em causa a própria Democracia”.

A Comunidade Intermunicipal do Alentejo Litoral agrega os municípios de Alcácer do Sal, de Grândola, de Odemira, de Santiago do Cacém e de Sines. (cimal.pt)

Nessa posição conjunta, a CIMAL referiu, igualmente, que a comunidade iria iniciar um procedimento judicial sob a forma de acção popular. Na mesma edição do boletim Sines Municipal é ainda sublinhado que o novo mapa judiciário afectava todos os concelhos do Alentejo Litoral, mas que, no caso de Sines, “o concelho fica[va] sem qualquer oferta judiciária local, encerrando o Tribunal de Trabalho [e de] Menores e Família”.

Antes da discussão dos pontos da ordem de trabalhos da reunião ordinária da Câmara Municipal realizada a 7 de Agosto de 2014, o vice-presidente do executivo (Fernando Miguel Ramos) informou “sobre a decisão do Tribunal em recusar a providência cautelar, interposta pela CIMAL, relativamente à decisão do Ministério da Justiça em fechar os tribunais no Litoral Alentejano”.

A 7 de Agosto de 2014, o vice-presidente da Câmara Municipal de Sines informou “sobre a decisão do Tribunal em recusar a providência cautelar, interposta pela CIMAL, relativamente à decisão do Ministério da Justiça em fechar os tribunais no Litoral Alentejano”.

Na ocasião, a vereadora Marisa Santos (do movimento independente Sines Interessa Mais – SIM) referiu que – como regista a acta n.º 18/2014 – tinha “informação de que o Tribunal de Família e Menores se iria manter em Sines, considerando que esta alteração, para além de acarretar dificuldades acrescidas para a família no acesso à justiça, constitui também um péssimo acto de gestão por parte do Estado, tendo em conta o investimento realizado para adequar o espaço às necessidades de funcionamento do Tribunal”.

A 8 de Agosto de 2014, em edição online, o canal de televisão CMTV (associado ao diário Correio da Manhã) informa que o Supremo Tribunal Administrativo rejeitou providências cautelares dos autarcas do Alentejo Litoral contra o novo mapa judiciário, em vigor a partir de 1 de Setembro.

Pouco tempo depois, a 25 de Agosto, na reunião ordinária pública da autarquia, o presidente da edilidade (Nuno Mascarenhas) informou o restante executivo que, “na sequência das alterações do mapa judiciário”, enviou uma carta à ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) relativamente à “posição da Câmara Municipal de Sines e embora não tendo obtido resposta por parte desta, teve conhecimento do despacho do Ministério da Justiça sobre a manutenção por tempo indeterminado do Tribunal de Sines”. Como assenta a acta n.º 19/2014, o autarca Nuno Mascarenhas esperava, no entanto, que a manutenção do tribunal em Sines fosse uma realidade, mas tal não aconteceria.

A 25 de Agosto de 2014, na reunião ordinária pública da autarquia, o presidente da edilidade informou o restante executivo que tinha enviado uma carta à ministra da Justiça relativamente à “posição da Câmara Municipal de Sines” sobre o anunciado fecho do tribunal e que não tinha obtido resposta por parte de Paula Teixeira da Cruz.

Na sua edição do dia seguinte (2 de Setembro), a ADN – Agência de Notícias (www.adn-agenciadenoticias.com), enquanto órgão de informação do distrito de Setúbal com periodicidade diária, salienta, em título, que o “Tribunal de Sines que custou 1,1 milhões vai mesmo fechar”. Ao dar conta de que o mapa judiciário “fechou tribunal com cinco anos”, a ADN relembrava que, no dia anterior, tinha entrado em vigor “o novo mapa judiciário, que implica grandes mudanças nos tribunais do Litoral Alentejano e na Península de Setúbal”. Conforme, explicava este órgão de comunicação, no Litoral Alentejano, os concelhos de Alcácer do Sal, de Grândola, de Santiago do Cacém e de Sines ficam sob a alçada da Comarca de Setúbal”.

Com efeito, a ADN referia que o Juízo Misto do Trabalho e da Família e Menores de Sines era extinto, passando as suas competências para Santiago do Cacém. Por seu lado, “o Tribunal de Alcácer do Sal é convertido numa secção de proximidade”, mas ainda ninguém sabia “bem o que fazer com o tribunal de Sines, construído há cinco anos por 1,1 milhões de euros”. O Tribunal de Sines tinha, assim, o “destino traçado”: “irá encerrar portas um destes dias”. “Se continua aberto, é a título provisório, enquanto as competências que detinha – apenas Trabalho e Família e Menores – não transitam para Santiago do Cacém e para Setúbal”, era então esclarecido, sabendo-se que “a adaptação do edifício, que pertencia à Rede Ferroviária Nacional, às funções de tribunal custou 1,1 milhões de euros”.

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“Um vazio de informação que se repete…”

Na ocasião, a Câmara de Sines – ao ser questionada sobre a utilização que o imóvel poderia ter futuramente – respondeu que ignorava, uma vez que não tinha recebido “qualquer informação sobre o assunto por parte do Ministério da Justiça”. “Um vazio de informação que se repete nas respostas de autarcas um pouco pelo país fora”, nota a ADN, adiantando que o Ministério da Justiça tencionava “instalar nos edifícios encerrados conservatórias e outros serviços do Instituto de Registos e Notariado”, que, na perspectiva da tutela, “fazem mais falta às populações no quotidiano do que os tribunais”.

Por consequência, os sineenses “com questões a resolver em tribunal deslocar-se-ão a Santiago do Cacém”, a 20 quilómetros de distância. Nos casos mais graves, com valores superiores a 50 mil euros em processos cíveis ou penas superiores a cinco anos no foro criminal, os munícipes de Sines teriam de se deslocar a Setúbal, a cerca de 160 quilómetros da sua cidade.

O socialista Nuno Mascarenhas sucede a Manuel
Carvalho na Câmara Municipal de Sines.
Sines Municipal, Junho de 2014)

O município de Sines – pela primeira vez gerido pelo Partido Socialista (o qual ganhou as eleições autárquicas de 2013, com 51,97% dos votos, tendo Nuno Mascarenhas sucedido aos quatros mandatos de Manuel Carvalho) – alega que, com a concretização desta decisão do Governo liderado por Passos Coelho, “o Tribunal de Sines será encerrado cinco anos depois de ter sido inaugurado, deixando os munícipes sem acesso a qualquer serviço judiciário no seu concelho”. Como já registámos no presente trabalho jornalístico, esta autarquia do Litoral Alentejano reiterava a ideia de que os “juízos existentes no Tribunal de Sines – trabalho e família e menores – estavam ajustados ao perfil desta cidade como pólo económico e urbano da região” e que, nessa conformidade, se justificava “a sua manutenção em actividade”.

Esta edilidade do Litoral Alentejano reiterava a ideia de que os “juízos existentes no Tribunal de Sines – trabalho e família e menores – estavam ajustados ao perfil desta cidade como pólo económico e urbano da região”.

A ADN–Agência de Notícias mencionava, igualmente, que o executivo camarário sineense não viu “atendida a reivindicação do município” para que fosse criada em Sines uma secção de proximidade, a qual “permitiria manter uma oferta de serviços judiciários, mitigando o prejuízo imposto à população local com o encerramento do tribunal”. Ainda segundo a ADN, a edilidade objectava: “Sines tem uma procura anual de processos que cumpre os critérios estabelecidos pelo Ministério da Justiça para a criação de secções de proximidade, pelo que também esta decisão é incompreensível.”

Na edição de Setembro de 2014 do boletim Sines Municipal, o edil socialista Nuno Mascarenhas observa que não pode terminar o respectivo editorial sem fazer referência ao novo mapa judiciário. No seu artigo de opinião, o presidente do executivo lembra que, depois de “várias diligências, empreendidas pela Câmara Municipal de Sines e pelas diversas organizações, nomeadamente junto da ministra da Justiça”, tinha sido publicado, no dia 21 de Agosto, em Diário da República, “o despacho n.º 10780/2014, que determina que Sines mantenha em funcionamento o seu tribunal com competência nas jurisdições de trabalho e família e menores”.

No aludido editorial, Nuno Mascarenhas assegurava que, apesar de “a decisão governamental definir a solução como transitória, sem prazo estabelecido”, a Câmara de Sines continuaria “a realizar todos os esforços necessários” para que, no futuro, essa transitoriedade se viesse a converter “em solução definitiva”. Na referida edição do boletim municipal, o autarca sineense adiantava: “Desde que foi conhecida a proposta de novo mapa judiciário, a Câmara Municipal de Sines tem vindo a bater-se pela manutenção em funcionamento do tribunal de Sines, um dos tribunais mais modernos do distrito de Setúbal, inaugurado há apenas cinco anos. É com esta vontade que nos vamos continuar a bater. Mesmo neste contexto de grande dificuldade, não baixaremos os braços.”

Em 20 de Janeiro de 2015, foi solicitada informação, à então secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais), sobre o objecto da Petição n.º 453/XII/ 4.a – com 2050 assinaturas e intitulada “Em defesa dos serviços públicos em Sines (Tribunal, Serviço de Finanças e Centro de Saúde)” –, a qual se encontrava em apreciação na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (CACDLG), na Assembleia da República (AR). No mesmo ofício, o deputado social-democrata Fernando Negrão, na qualidade de presidente desta comissão parlamentar, dirigiu à ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) três questões relativamente ao Tribunal de Sines: “Qual a data em que foi criado o Tribunal de Sines? Quais os juízos de competência especializada existentes no Tribunal de Sines? Qual a média anual de processos tramitados naquele tribunal?”

Em 20 de Janeiro de 2015, foi solicitada informação, à então secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, sobre o objecto da petição com 2050 assinaturas e intitulada “Em defesa dos serviços públicos em Sines (Tribunal, Serviço de Finanças e Centro de Saúde)”.

No mesmo documento, o então presidente da CACDLG apresentou também seis questões ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do XIX Governo Constitucional. Na última dessas interrogações, Fernando Negrão – a fim de habilitar a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias a aprovar um relatório final sobre a petição em causa – queria saber quais os meios de transporte que é possível utilizar desde os diferentes agregados populacionais até ao local que foi ou será utilizado para acolher os contribuintes no cumprimento das suas obrigações patrimoniais e fiscais”.

Todavia, na sua edição online de 23 de Janeiro de 2015, o jornal Distrito exibe o título “Governo pretende encerrar o Tribunal de Sines”. Na mesma peça jornalística, é dito que a Comissão de Utentes revela, em comunicado, que durante a audição, realizada no dia anterior (quinta-feira), com a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, os deputados garantiram que o Governo pretende “encerrar o Tribunal de Sines”. Por conseguinte, como adianta o Distrito (órgão informativo da região de Setúbal), “as competências do Tribunal de Sines serão transferidas para o Tribunal de Santiago do Cacém, depois da conclusão das obras em curso”.

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Relatório final da petição

A 4 de Março de 2015, é dirigido (pela CACDLG) à então presidente da Assembleia da República (a social-democrata Assunção Esteves foi a primeira mulher a desempenhar este cargo, entre 21 de Junho de 2011 e 2015 e 23 de outubro de 2015) o Oficio n.o 239/XIJ/1.a – CACDLG/2015 dando conta do relatório final da Petição n.º 453/XII/ 4.a com o título, já mencionado, “Em defesa dos serviços públicos em Sines (Tribunal, Serviço de Finanças e Centro de Saúde)”.

Assim, na sequência do parecer, aprovado por unanimidade – com a ausência do PCP, do BE e do PEV –, na reunião da Comissão dessa quarta-feira (4 de Março), foi dado  conhecimento da referida petição e do respectivo relatório aos grupos parlamentares para a apresentação de eventual iniciativa legislativa, bem como à ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), através do primeiro-ministro (Pedro Passos Coelho), “para ponderar a apresentação de eventual medida legislativa”, no que respeita ao encerramento do Tribunal de Sines.

Como adiantava o Distrito (órgão informativo da região de Setúbal), “as competências do Tribunal de Sines serão transferidas para o Tribunal de Santiago do Cacém, depois da conclusão das obras em curso”. (sines.pt)

Em nota prévia do aludido relatório final, é reafirmada a solicitação de informação à ministra da Justiça sobre o objecto desta petição ao Governo, tendo sido colocadas questões relativamente ao Tribunal de Sines, tendo igualmente sido requeridos esclarecimentos ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sobre a Repartição de Finanças de Sines (através do aludido ofício, de 20 de Janeiro de 2015, dirigido à secretária de Estados dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade). Neste documento (relatório final), afirma-se que apenas foi recebida a resposta do Ministério da Justiça.

Sendo reafirmado que a “regulamentação da Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) foi operada pelo Governo, através do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de Marco”, é também recordado que decorreu deste diploma legal, que entrou em vigor no dia 1 de Setembro de 2014, “o encerramento de 20 tribunais (entre os quais o Tribunal de Sines – Juízo Misto do Trabalho e de Família e Menores) e a conversão de 27 tribunais em 27 secções de proximidade”, das quais nove têm um regime especial.

Com o Despacho n.º 10780/2014, de 21 de Agosto, “a ministra da Justiça determinou que fossem transitoriamente deslocalizadas as sedes das secções de alguns tribunais de comarca”

É, igualmente, recordado que, através do Despacho n.º 10780/2014, de 21 de Agosto, “a ministra da Justiça determinou que fossem transitoriamente deslocalizadas as sedes das secções de alguns tribunais .de comarca, sendo que no caso da Comarca de Setúbal foi determinado o seguinte: “g) No Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal:

  1. A secção de comércio da instância central com sede em Setúbal e, transitoriamente, deslocalizada para Alcácer do Sal;
  2. A 2.a secção do trabalho da instância central com sede em Santiago do Cacém e, transitoriamente, deslocalizada para Sines;
  3. A 2.a secção de família e menores da instância central com sede em Santiago do Cacém e, transitoriamente, deslocalizada para Sines.”

“Daí que, transitoriamente, a 2.a Secção do trabalho e a 2.a Secção de família e menores de Santiago do Cacém estejam deslocalizadas em Sines”, como se concluía, admitindo que a satisfação do pretendido pelos peticionários, no que ao Tribunal de Sines diz respeito, implicava alterações legislativas, pelo que se impunha que esta matéria fosse ponderada “pelas entidades que dispõem de poder de iniciativa legislativa”.

Francisca Eugénia Van Dunem, ministra da Justiça, entre 26 de Novembro de 2015 e 30 de Março de 2022, nos XXI e XXII governos, liderados por António Costa. (portugal.gov.pt)

Entretanto, já a 24 de Maio de 2016, o Observador informava, citando a agência Lusa, que os tribunais de Sines e de Castelo de Vide seriam reabertos, mas que o campus da Justiça poderia “mudar de local”. Nesse dia, a ministra da Justiça (Francisca Van Dunem, que sucedeu no cargo ao social-democrata Fernando Mimoso Negrão) esclareceu que o tribunal de Sines iria ser reaberto, “tendo em consideração a importância estratégica do porto de Sines”, embora o campus da Justiça pudesse vir a situar-se noutro local.

Francisca Van Dunem, que sucedeu a Fernando Negrão no Ministério da Justiça, esclareceu que o tribunal de Sines iria ser reaberto, “tendo em consideração a importância estratégica do porto de Sines”.

A 3 de Junho de 2016, a ADN-Agência de Notícias informava que a reactivação do tribunal de Sines agradava ao PS e que os deputados eleitos por Setúbal “enaltecem posição de ministra da Justiça”, aplaudindo as declarações prestadas, na Assembleia da República, por Francisca Van Dunem “sobre a reabertura do tribunal de Sines, no âmbito de um conjunto de alterações ao mapa judiciário”.

Como avançava a ADN, os deputados consideraram que essas novas medidas vinham corrigir “os erros cometidos pelo Governo anterior”. A mesma notícia recordava que, no mês antecedente (em Maio de 2016), a ministra da Justiça tinha anunciado que seriam reactivados 20 tribunais que “foram encerrados na última reforma do mapa judiciário”, a maioria dos quais – como considerava Francisca Van Dunem – instalada “no interior rural e envelhecido”.

Em comunicado, os deputados socialistas eleitos por Setúbal – Ana Catarina Mendonça Mendes (actual ministra adjunta e dos Assuntos Parlamentares), Eurídice Pereira, Paulo Trigo Pereira, Ivan Gonçalves, Sofia Araújo, André Pinotes Batista e Francisca Parreira – reafirmaram que “sempre se opuseram à extinção” do Tribunal de Sines, alegando que tinha “movimentação processual suficiente” e que, “tendo acolhido a criação da comarca-piloto do Alentejo Litoral, deveria manter-se ao serviço das pessoas e das populações que legitimamente se opuseram ao seu encerramento”.

Os subscritores do comunicado lembraram que, de acordo com a Revisão do Mapa Judiciário aprovada pelo governo liderado por Passos Coelho, “determinou”, a 1 de Setembro de 2015, “alterações profundas e erradas nos serviços de proximidade”, tendo os concelhos de Alcácer do Sal, de Grândola, de Santiago do Cacém e de Sines ficado sob a alçada da Comarca de Setúbal, “enquanto Odemira transitou para a Comarca de Beja”.

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Tribunais entre a extinção e a perda de competências

Como esclarece a ADN, na edição de 3 de Junho de 2016, o Juízo Misto do Trabalho e da Família e Menores de Sines foi extinto, passando as suas competências para Santiago do Cacém, e o Tribunal de Alcácer do Sal foi convertido numa secção de proximidade. Por sua vez, os tribunais de Grândola, de Odemira e de Santiago do Cacém perderam competências, “pois os processos cíveis e criminais de maior envergadura passaram a ser tratados nas sedes das comarcas”.

Nesse comunicado, os aludidos deputados socialistas observavam que o encerramento do Tribunal de Trabalho e Família de Sines “implicou a deslocação das pessoas a Santiago do Cacém” e que a extinção da comarca obrigaria muitos cidadãos a deslocarem-se a Setúbal, “para grande parte dos processos.

Após terem surgido dúvidas relacionadas com o facto de o Tribunal de Sines não aparecer na lista dos tribunais que iriam ser reactivados pelo Ministério da Justiça, no âmbito dos ajustamentos do mapa judiciário, a então ministra Francisca Van Dunem declarou, no Parlamento, que o tribunal sineense seria reaberto, “tendo em consideração a importância estratégica do porto de Sines e da atividade económica que lhe está associada”.

Na oportunidade, o presidente da Câmara Municipal (que seria reeleito em 1 de Outubro do ano seguinte e tomado posse do seu segundo mandato a 14 de Outubro) disse que a informação que tinha era a de que se previa a criação local de uma secção de proximidade. “Mas vamos bater-nos para que tenha todas as competências [que tinha]”, declarou o socialista Nuno Mascarenhas, então citado pela Agência de Notícias.

O autarca, apesar de se congratular com a decisão de o Governo reabrir o tribunal (como regista a ADN), lembrou que antes funcionava na cidade o Juízo Misto do Trabalho e da Família e Menores e que, tratando-se de uma “importante zona de atividades económicas” – a qual inclui “o porto de Sines –, “fazia aqui todo o sentido, por exemplo, o tribunal do Trabalho”.

O presidente da Câmara Municipal, Nuno Mascarenhas, apesar de se congratular com a decisão de o Governo reabrir o tribunal, lembrou que, tratando-se de uma “importante zona de atividades económicas” – a qual inclui “o porto de Sines –, “fazia aqui todo o sentido, por exemplo, o tribunal do Trabalho”.

O boletim do município de Sines (Sines Municipal, na sua edição n.º 10, de Junho de 2016) reiterava a notícia de Francisca Van Dunem tinha confirmado a reabertura do tribunal local, “no âmbito de um conjunto de alterações ao mapa judiciário [então] em vigor”.

A edilidade voltava, com efeito, a declarar que a “manutenção em funcionamento do tribunal de Sines foi uma reivindicação da Câmara Municipal de Sines durante o processo de elaboração do novo mapa judiciário” e que o presidente da Câmara, Nuno Mascarenhas, se congratulava pela decisão de reactivá-lo. “Esta decisão é o corrigir de um erro, uma vez que o Tribunal de Sines era um tribunal novo, com todas as condições para funcionar, além de que existia movimentação processual que justificava a sua manutenção”, salienta o autarca, aludindo à “relevância do pólo económico de Sines”, também assinalada pela ministra da Justiça. Para o socialista Nuno Mascarenhas esse “não era o único motivo, mas era motivo suficiente para que o tribunal nunca tivesse sido encerrado”.

Na mesma edição do boletim Sines Municipal admitia-se que ainda não era “certo em que modelo o tribunal” voltaria a funcionar, “havendo a indicação preliminar” de que seria uma secção de proximidade. “Se assim for, o presidente da Câmara considera que será ‘um primeiro passo’, esperando que no futuro volte a funcionar com todas as suas competências ao nível dos juízos de trabalho e família e menores”, avançava o Sines Municipal.

Nove meses depois, em Março de 2017, o dito boletim desta autarquia alentejana dava conta de que o Tribunal de Sines tinha sido reaberto com apoio da autarquia e que poderia reforçar valências.

“Depois de ter sido encerrado em 2014, pelo anterior governo, o Tribunal de Sines voltou a funcionar no início de 2017”, regista esta publicação trimestral autárquica, esclarecendo que a Câmara Municipal de Sines “colabora com a reabertura do tribunal através da cedência de uma trabalhadora do seu mapa de pessoal”, a qual, em conjunto com o oficial de justiça, “apoia o atendimento ao público e o funcionamento do juízo”. Refira-se que a reabertura do tribunal se fez com “um novo tipo de valência”: o juízo de proximidade. “Os juízos de proximidade prestam informações sobre processos, recebem documentos, operacionalizam diligências de audição e asseguram a realização de algumas audiências de julgamento para crimes menos graves”, clarifica o boletim, acrescentando que o presidente da Câmara Municipal, Nuno Mascarenhas, “defende que Sines volte a ter também um juízo dedicado especificamente ao trabalho, como teve nos primeiros anos de funcionamento”.

Visita da secretária de Estado adjunta e da Justiça, Helena Mesquita Ribeiro, ao tribunal de Sines, em 14 de Fevereiro de 2017.
Sines Municipal, Março de 2017)

“O juízo de proximidade foi o primeiro passo, mas o nosso obje[c]tivo é ter mais valências, seguramente o trabalho. O governo, tal como cumpriu a promessa de reabrir o tribunal em Sines, certamente que fará todos os esforços para que isso seja uma realidade no futuro”, afirmou o edil socialista Nuno Mascarenhas.

Segundo o boletim Sines Municipal (na edição de Março de 2017), a secretária de Estado adjunta e da Justiça, Helena Mesquita Ribeiro, no decorrer da visita que fez ao tribunal local, a 14 de Fevereiro, manifestou abertura por parte do Governo para “responder a esta reivindicação”. Na oportunidade, a governante afirmou que o “maior nível de litigiosidade neste concelho” se verifica “ao nível laboral”. “Tem todo o sentido que a experiência que já tinha sido iniciada pelo ministro Alberto Costa, que criou aqui um juízo misto laboral e de família, seja repensada. Vamos repensar a possibilidade de vir a instalar aqui no futuro um juízo do trabalho”, declarou Helena Mesquita Ribeiro.

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Possibilidade de “juízo dedicado às questões do trabalho”

Na manhã de 1 de Março de 2017, o Jornal Sudoeste noticiou que a secretária de Estado adjunta e da Justiça, Helena Mesquita Ribeiro, admitia “a possibilidade de a cidade de Sines voltar a ter um juízo dedicado às questões do trabalho”. Conforme explicava este quinzenário do Litoral Alentejano, a posição da governante foi expressa durante a sua, então, “recente visita às instalações do Tribunal de Sines”, que voltou a funcionar, no início desse ano, como juízo de proximidade.

Na ocasião, Helena Mesquita Ribeiro reconheceu que o “maior nível de litigiosidade neste concelho situa-se ao nível laboral”. Por isso, no seu entender, fazia “todo o sentido que a experiência que já tinha sido iniciada pelo ministro Alberto Costa, que criou [ali] um juízo misto laboral e de família”, fosse repensada. “Vamos repensar a possibilidade de vir a instalar aqui no futuro um juízo do trabalho”, sublinhou a secretária de Estado adjunta e da Justiça, depois de o presidente da Câmara de Sines ter defendido a instalação, no concelho, de “um juízo dedicado especificamente ao trabalho, como teve nos primeiros anos de funcionamento, antes de ser encerrado pelo anterior Governo, em 2014”.

O autarca socialista disse que o juízo de proximidade foi o “primeiro passo”, mas que o objectivo da edilidade e dos munícipes era “ter mais valências, seguramente o trabalho”. “O Governo, tal como cumpriu a promessa de reabrir o tribunal em Sines, certamente que fará todos os esforços para que isso seja uma realidade no futuro”, sustentava Nuno Mascarenhas, como também divulgou o Jornal Sudoeste.

Helena Mesquita Ribeiro reconheceu que o “maior nível de litigiosidade neste concelho situa-se ao nível laboral”.
(© Município de Sines – www.jornalsudoeste.com)

Entretanto, na última publicação municipal do primeiro ciclo de gestão do executivo liderado pelo socialista Nuno Mascarenhas, a edilidade recordou, no boletim Sines Municipal (edição de 15 de Agosto de 2017), 40 momentos que marcaram a acção da autarquia de 2014 a 2017. Assim, a reabertura do Tribunal de Sines, no início de 2017, constituiu um desses importantes momentos, “depois da luta da autarquia para que tal acontecesse e do seu apoio[,] em recursos humanos[,] ao reinício do funcionamento”.

Desde a sua reabertura (no início de 2017, por iniciativa de Francisca Van Dunem, a exemplo de “outros 19 tribunais pelo país”), o Tribunal de Sines só tinha tido um julgamento em seis meses

A 7 de Junho de 2017, o blogue Notícias de Sines (noticiasdesines.com) informava que, desde a sua reabertura (no início do ano, por iniciativa da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, a exemplo de “outros 19 tribunais pelo país”), o Tribunal de Sines só tinha tido um julgamento em seis meses e que, “com o aproximar das férias judiciais, esse número muito curto perante as expectativas criadas”, não iria “por certo aumentar antes do final do ano”.

“Nem mesmo um dos supostos motivos avançados para esta situação – suspensão disciplinar, pelo Conselho Superior da Magistratura, do juiz que aqui deveria deslocar-se a Sines é justificativo porque o trabalho atribuído ao juiz passou por outro seu colega da classe”, desenvolvia a notícia.

Como dava conta o Notícias de Sines, o presidente da Comarca de Setúbal, Manuel Sequeira, em declarações então recentes, “afirmou que já tinha sugerido que Sines deveria ter uma valência de Tribunal de Trabalho em vez de um balcão de atendimento”. O jornal sineense recordava ainda que o juiz Manuel Sequeira tinha também admitido que o tribunal de Sines “não possui condições de segurança nenhumas para julgar crimes como homicídio e por nunca ter tido antes esse tipo de competência”.

Segundo o Notícias de Sines, “outro factor apontado contra são os poucos recursos humanos, visto [naquela data] só existir um único funcionário judicial, [apoiado] por um funcionário camarário, sendo que este último não possui acesso à plataforma informática dos tribunais, o que na prática significa que tem um raio de acção muito curto, servindo apenas de ‘companhia’ e apoio administrativo[,] quando há necessidade de receber pessoas [ou] quando o funcionário sai em serviço”.

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Tribunal de Sines reabre com falta de recursos humanos

Lembramos, igualmente, que, três dias antes (a 4 de Janeiro de 2017), O Jornal Económico (JE) destacava, em título, “Insólito: Tribunal de Sines tem de fechar para funcionária ir ao WC”. O respectivo “lead” jornalístico transmitia que a falta de segurança e de recursos humanos estavam a dificultar o funcionamento do “novo” tribunal de Sines.

“O recém-reabilitado tribunal de Sines ainda agora abriu e já está a dar que falar”, verificava o JE, aludindo igualmente à “falta de recursos humanos e de segurança” que obrigavam “a única funcionária do tribunal a ter de fechar a porta de cada vez que quer ir à casa de banho, já que nos cinco andares que tutela não há um único polícia ou outro funcionário para revezar funções”.

“O recém-reabilitado tribunal de Sines ainda agora abriu e já está a dar que falar”, confirmava o JE, a 4 de Janeiro de 2017, aludindo igualmente à “falta de recursos humanos e de segurança”.

“À margem do anúncio da reabilitação de tribunais, a ministra [Francisca Van Dunem] terá dito que as instalações reabilitadas seriam sujeitas a ‘pequenas obras’, tendo em conta que a maior parte das instalações estaria disponível e em boas condições de utilização”, lê-se na mesma edição do JE. Porém, “apenas dois dias depois da abertura do ‘novo’ tribunal de Sines já se fazem notar múltiplos problemas”. “Desde logo a falta de sinalização do espaço, que se julgaria ao abandono não fossem ‘a porta encostada, os canteiros semiabandonados à porta e o lixo que ali se começou a amontoar’ a assinalar o contrário”, adianta o JE, citando o jornal Público.

O próprio juiz que preside à Comarca de Setúbal, a qual insere a secção de proximidade de Sines, critica a inadequação do edifício: “[…] é um prédio de apartamentos [de habitação] adaptado”. Como nota o JE, este magistrado não via “grandes proveitos na reactivação do tribunal”.

Recorrendo ainda ao diário Público, a notícia divulgada pelo JE mencionava que, naquela data, os processos judiciais permaneciam no tribunal de Santiago do Cacém e que, de momento, em Sines, “apenas” era “possível entregar peças processuais, ser ouvido em diligências judiciais por videoconferência ou tratar de assuntos simples[,] como o certificado de registo criminal”.

Reiterando o juiz Manuel Sequeira, o JE reparava que, neste estabelecimento judicial, faltavam “ainda condições de segurança para a realização de julgamentos de crimes”, por falta de policiamento e de funcionários, embora o Ministério da Justiça tenha “prometido mais um funcionário para assegurar o normal funcionamento das instalações”.

A 1 de Dezembro de 2017, o Notícias de Sines recorda que o jornal Público (na sua edição de4 de Janeiro de 2017) aponta debilidades no, então, recém-aberto tribunal local, através de um artigo da jornalista Ana Henriques, que revela: “[…] tanta desolação ninguém diria”.

Com base no dito trabalho jornalístico do Público, o jornal em formato digital deste concelho do Litoral Alentejano transcreve: “Depois de muitos anos de reivindicações Sines conseguiu, em 2009, ter um tribunal. É verdade que funcionava – como hoje, de resto – num prédio de habitação e que só resolvia questões de família e menores ou laborais, mas sempre evitava muitas deslocações a Santiago do Cacém, a 17 quilómetros, ou a Setúbal, que fica ainda mais longe.”

Secção de proximidade de Sines funciona num prédio de habitação. (Créditos fotográficos: Enric Vives Rubio / Público)

Ao seguir na reprodução da peça desenvolvida pela jornalista Ana Henriques, o Notícias de Sines adianta que “há pessoas que nem dinheiro têm para comer quanto mais para os transportes”.

Mais à frente, o jornal digital alentejano serve-se novamente da peça do Público (de 4 de Janeiro de 2017): “A maioria dos fregueses só quer tratar do certificado do registo criminal, para apresentar no emprego. Mas também vai ser possível entregar aqui peças processuais e até ser ouvido em diligências judiciais por videoconferência. Por ora, estão vazios os gabinetes dos magistrados que hão-de vir ao tribunal de quando em quando para realizar julgamentos de processos-crime, que os litígios familiares e laborais inscritos numa placa que se mantém à entrada do prédio, junto a um mastro sem bandeira, já não serão dirimidos aqui. Foram despachados para Santiago do Cacém em 2014, quando o tribunal de Sines e outros 19 fecharam, e por lá continuarão.”

Na edição de 22 de Julho de 2019, a publicação trimestral da autarquia informa que o Tribunal de Sines “voltou a ter em funcionamento um juízo de competência especializada em assuntos de trabalho, integrado na Comarca de Setúbal”, o qual se encontra “em funcionamento no edifício do Tribunal de Sines, na Alameda da Paz, juntamente com o Juízo de Proximidade”.

A localização do Tribunal do Trabalho e do Juízo de Proximidade, nesta cidade alentejana, vem no seguimento de “um compromisso assumido pelo governo no âmbito da reforma judiciária, contribuindo para a universalidade do acesso de todos à justiça”.

Como esclarece o Sines Municipal, a localização do Tribunal do Trabalho e do Juízo de Proximidade, nesta cidade alentejana, vem no seguimento de “um compromisso assumido pelo governo no âmbito da reforma judiciária, contribuindo para a universalidade do acesso de todos à justiça”. Segundo este boletim editado pela Câmara Municipal de Sines, o presidente da edilidade destaca a relevância da abertura do tribunal do trabalho em Sines. “A abertura em Sines do tribunal do trabalho corresponde ao reconhecimento, por parte do governo, de que esta área da justiça tem especial relevância neste concelho, onde a elevada procura de recursos humanos torna mais exigente a resposta que o Estado deve prover em matéria de salvaguarda dos direitos e contencioso laboral”, comenta o socialista Nuno Mascarenhas.

“Congratulamo-nos com a concretização desta decisão e estamos certos que quer o governo quer a Comarca de Setúbal tudo farão para que, subsequentemente, a resposta judiciária em Sines seja valorizada”, conclui este autarca alentejano, que se mostrou sempre indisponível para uma entrevista ou para um simples depoimento no contexto desta investigação jornalística.

Na sequência de uma conversa telefónica, na manhã de 22 de Abril de 2021, com Dora Salvador (do Gabinete de Apoio à Presidência e Vereação – GAP) e com Rui Matos Pereira (coordenador da Unidade de Gestão e Comunicação Estratégica), o jornal sinalAberto solicitou, por mensagem electrónica, a disponibilidade de Nuno Mascarenhas, na qualidade de presidente do executivo municipal, para, num primeiro momento, nos responder a um conjunto de questões no âmbito desta reportagem especial, incluída no dossiê “Justiça: o que não se lê no mapa”, acerca dos impactos do novo mapa judiciário e do encerramento temporário do tribunal de Sines (a exemplo dos outros municípios que viram fechar, entre 1 de Setembro de 2014 e 1 de Janeiro de 2017, os seus antigos tribunais).

Ao mostrar-se indisponível para responder ao sinalAberto, o presidente da Câmara Municipal de Sines, o socialista Nuno Mascarenhas, não assinalou as marcas ficaram de tal ensaio de reorganização judiciária na comunidade local.

Entre outras questões, procurámos saber, junto da edilidade sineense, que marcas ficaram de tal ensaio de reorganização judiciária nas comunidades locais, assim como a que ideais de justiça social aspiram as populações idosas, sem transporte próprio e com dificuldades económicas. Por outro lado, a propósito da tão propalada equidade, falando em critérios de justiça, o jornal sinalAberto quis saber se o presidente da Câmara de Sines observava no seu município, que não é interior, repercussões negativas com o fecho do tribunal local e se a justiça então praticada neste concelho do Alentejo Litoral correspondia às necessidades de cidadania e dos agentes económicos. Ou se faltavam mecanismos que permitiam à sociedade (no contexto das comunidades locais e regionais) identificar o papel primordial do poder judicial e judiciário, reforçando a sua confiança, ao invés de um modelo de funcionalização das magistraturas.

Não obstante os inúmeros telefonemas para o GAP e de duas deslocações presenciais à Câmara Municipal de Sines, em que falámos com Dora Salvador, nunca houve abertura por parte de Nuno Mascarenhas nem da vereação para nos receber. A campanha para as eleições autárquicas, que decorreram a 26 de Setembro de 2021, serviu de desculpa. Apesar da agitação política desse período, o sinalAberto voltou a reencaminhar a mensagem de 22 de Abril, com um questionário sobre o mapa judiciário e os eventuais impactos da sua aplicação no município de Sines. Mais uma vez, não obtivemos resposta.

Todavia, a 29 de Junho de 2021, Nuno Mascarenhas afirma, no editorial da publicação Sines Municipal, que “é um concelho que se pode orgulhar de si mesmo”, podendo “confiar no seu futuro”. Faltavam menos de três meses para o acto eleitoral que o iria catapultar para o seu terceiro mandato na presidência do executivo camarário. Assim, era necessário mostrar obra feita e sublinhar que “Sines, como a generalidade do Alentejo Litoral, é um território muito atrativo”. Nesta linha de pensamento, o edil mostra-se convicto de que o seu município “desperta muito interesse junto de investidores estrangeiros”, sobretudo pelas “suas condições industriais e portuárias, mas também pela sua qualidade de vida”.

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Tribunal de Trabalho regressou a Sines, mas o de Família ficou em Santiago do Cacém

Ana Vilhena, natural de Santiago do Cacém, é licenciada em Direito pela Universidade de Coimbra e já foi membro da Comissão Nacional de Avaliação da Ordem dos Advogados (OA). Em 30 de Outubro de 2021, quando acedeu falar com o sinalAberto, tinha 61 anos de idade e presidia ao Agrupamento de Delegações de Santiago do Cacém – Sines da OA.

“À data do seu encerramento, do Tribunal de Sines faziam parte o Tribunal
de Trabalho e o Tribunal de Família, que estavam a funcionar sem atrasos
nos processos”, garante a advogada Ana Vilhena.

A respeito do encerramento, em 2014, de uma vintena de tribunais, no contexto do novo mapa judiciário, a advogada Ana Vilhena pensa que essa decisão do Ministério da Justiça “apenas afastou mais ainda a população mais carenciada do recurso à justiça”.

“À data do seu encerramento, do Tribunal de Sines faziam parte o Tribunal de Trabalho e o Tribunal de Família, que estavam a funcionar sem atrasos nos processos”, afirma a causídica responsável pelo contencioso da Delegação de Sines do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal (CESP), do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Hotelaria, Restauração e Turismo e Similares do Sul, bem como da Associação dos Directores de Segurança de Portugal (ADSP). “Falamos de Sines que é uma cidade do Litoral Alentejano com um grande volume de processos laborais, devido à enorme quantidade de pequenas, médias e grandes empresas que aqui têm as suas instalações”, salienta a jurista Ana Vilhena, a qual, durante 20 anos, também integrou a Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia de Sines.

“Sines é uma cidade do Litoral Alentejano com um grande volume de processos laborais, devido à enorme quantidade de pequenas, médias e grandes empresas que aqui têm as suas instalações”, assinala a causídica Ana Vilhena.

Considerando o período em que o Tribunal de Sines esteve encerrado (de Setembro de 2014 a Janeiro de 2017), a exemplo de vários tribunais no país, a advogada Ana Vilhena observa que “os juízos criminais continuaram a funcionar em Santiago do Cacém, como até essa data, não afectando nem o aumento nem a diminuição da criminalidade na cidade de Sines”. “Relembro que Sines se encontra a 18 quilómetros [km] de Santiago do Cacém”, particulariza a delegada da OA, embora esteja convicta de que o fecho dos tribunais contrariou as políticas de proximidade e de coesão territorial. “Talvez por isso é que o Tribunal de Trabalho voltou novamente para Sines, sendo que o Tribunal de Família permanece, neste momento, em Santiago do Cacém”, interpreta a causídica. “Atendendo ao pólo industrial em que Sines se tornou, faz todo o sentido que o Tribunal de Trabalho para aqui tenha voltado”, abona Ana Vilhena, concordando com a reactivação dos tribunais que tinham sido fechados pela DGAJ.

A advogada Ana Vilhena desconhece quais foram “os valores que o
Estado poupou com o encerramento de alguns tribunais”.

Actualmente [em Outubro de 2021], pertencemos à Comarca de Setúbal, onde nos temos de deslocar com bastante assiduidade. A distância entre Sines e Setúbal é de cerca de 127 km. A deslocação dos arguidos, dos advogados, das testemunhas e das forças de segurança para um julgamento em Setúbal implica um grande afastamento da justiça, que frequentemente leva o cidadão a pensar duas vezes se recorre ao tribunal para alcançar a sua pretensão”, clarifica a delegada local da OA.

Em 1 de Setembro de 2014, a então ministra Paula Teixeira da Cruz afirmava: “A reforma da justiça e o novo mapa judiciário vão poupar muito dinheiro e recursos ao País.” Considerando que, com a reforma judiciária, o sistema judicial, em particular, teve de identificar áreas para reduzir custos, a advogada Ana Vilhena desconhece quais foram “os valores que o Estado poupou com o encerramento de alguns tribunais”. “Agora, o que sei é que o cidadão normal terá uma despesa muito maior se quiser recorrer à justiça”, assegura a jurista, discordando totalmente “que a justiça privilegie a perspectiva economicista”.

“A deslocação dos arguidos, dos advogados, das testemunhas e das forças de segurança para um julgamento em Setúbal implica um grande afastamento da justiça, que frequentemente leva o cidadão a pensar duas vezes se recorre ao tribunal para alcançar a sua pretensão”, argumenta a jurista Ana Vilhena.

Para a nossa entrevistada, a finalidade fundamental da reorganização do mapa judiciário “foi concentrar um maior número de tribunais nas grandes cidades, extinguindo alguns das pequenas cidades, reduzindo gastos, mas levando, cada vez mais, ao isolamento dos cidadãos que aí residem”.

Na perspectiva de Ana Vilhena, foi precipitado o avanço do novo mapa judiciário em 1 de Setembro de 2014, “pois alguns casos chegaram a ser revistos, como sucedeu com o Tribunal de Trabalho, que voltou para Sines”. Para a advogada – que, durante alguns anos, leccionou várias disciplinas do 5.º ano ao 10.º ano de escolaridade, em Sines e em Grândola, além de ter sido directora do jornal quinzenário “Sudoeste” –, no município, “não se verificou um aumento de desertificação, mesmo quando o Tribunal de Trabalho deixou de estar em Sines, porque é uma cidade com muitas empresas, daí que existam muitos trabalhadores”.

Sem questionar uma suposta melhoria resultante da reorganização
judiciária, que pretenderia diminuir a morosidade dos processos, a
advogada Ana Vilhena diz que também “ainda há muito a fazer” para
garantir o acesso de todos os cidadãos aos tribunais e à justiça.

A jurista pensa que a tutela ministerial que forçou a aplicação do, então, novo mapa judiciário “não fazia ideia” do que era preciso para organizar adequadamente esta reforma. “Muitas vezes, não se tem a noção das distâncias”, declara ao sinalAberto, ciente de que a realidade é outra “quando se está no terreno”.

Com as alterações, em 2017, ao mapa judiciário anteriormente decidido pela antiga ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), os sineenses e os que trabalham no concelho viram com agrado o regresso do Tribunal de Trabalho à cidade, sob a designação de Juízo do Trabalho (secção de competência especializada). Todavia, a delegada da OA observa que “ainda há muito para fazer, para termos uma justiça mais célere e mais próxima do cidadão”. Sem questionar uma suposta melhoria resultante dessa reorganização judiciária, que pretenderia diminuir a morosidade dos processos, a advogada diz que também “ainda há muito a fazer” para garantir o acesso de todos os cidadãos aos tribunais e à justiça.

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A comarca de Monchique tinha “valores inferiores” no movimento processual e na população que servia

Mais a sul, no distrito de Faro e na que seria a circunscrição do Barlavento Algarvio – no âmbito da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais ou Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, se, em Maio de 2010, o segundo Governo de José Sócrates (XVIII Governo Constitucional) não tivesse suspendido o alargamento desse mapa judiciário –, o município de Monchique acompanha o decréscimo populacional dos concelhos até agora mencionados.

Mapa do concelho de Monchique.
(© Jorge Bastos – www.flickr.com)

Em 2001, foram assinalados 6974 residentes e, em 2011, menos 937 indivíduos (porém, os resultados definitivos do INE indicam 6045 habitantes), o que implica uma redução de 13,44%. Segundo dados da Pordata, entre 2010 e 2019, também se averigua uma acentuada diminuição da população residente, de 6124 para 5130 pessoas.

Considerando os resultados preliminares do XVI Recenseamento Geral da População e VI Recenseamento Geral da Habitação (Censos 2021), é observável uma variação negativa de 9,6% na população residente em Monchique, entre 2011 e 2021. Com efeito, este município algarvio, atendendo aos dados provisórios, indicava a perda de 580 indivíduos.

É observável uma variação negativa de 9,6% na população residente em Monchique, entre 2011 e 2021.

Porém, já utilizando os resultados definitivos dos Censos 2021, os dois concelhos algarvios que perderam mais população, em termos percentuais, foram Alcoutim, contabilizando 2523 habitantes (menos 394 do que em 2011; o que corresponde a -13,5%), e Monchique, que agora conta com 5462 habitantes (menos 583 pessoas do que em 2011; ou seja, confirma-se a referida variação negativa de -9,6%). O terceiro município algarvio que sofreu uma maior variação demográfica negativa, em termos percentuais, foi Castro Marim, com -4,5%.

A Comarca de Faro, ajustada ao distrito administrativo, alcançava as comarcas de Albufeira, de Faro (incluindo o município de S. Brás de Alportel), de Lagos (abrangendo os municípios de Aljezur e de Vila do Bispo), de Loulé, de Monchique, de Olhão, de Portimão (que também englobava o município de Lagoa), de Silves, de Tavira, de Vila Real de Santo António (compreendendo ainda os municípios de Alcoutim e de Castro Marim).

A comarca de Monchique estava agregada à comarca de Silves, ao abrigo da Portaria n.º 412-D/99, de 7 de Junho. A propósito da organização e dos recursos humanos, o Ministério da Justiça informa que os tribunais de competência genérica de Monchique e de Silves, em conjunto, tinham um quadro legal com dois juízes, não obstante serem três os juízes que então exerciam funções. Ambos os tribunais dispunham de um quadro legal conjunto de dois magistrados do Ministério Público, os quais se encontravam em exercício de funções.

No que se refere aos oficiais de justiça, igualmente com informação reportada a 16 de Junho de 2011, a comarca de Monchique tinha quatro profissionais no seu quadro legal, todos em exercício de funções. Por sua vez, a comarca de Silves dispunha de 18 oficiais de justiça no respectivo quadro legal, estando 17 desses profissionais a exercer funções.

Se procuramos saber do movimento processual e da média das entradas na comarca de Monchique, entre 2008 e 2010, a DGAJ informa que, por ordem decrescente, há registo de 37 execuções, de 32 processos de média instância criminal, de 29 processos de pequena instância criminal, de 10 processos de pequena instância cível, de nove processos de média instância cível e de seis processos de grande instância cível. Há ainda a considerar dois processos de grande instância criminal e um outro de instrução criminal, não tendo havido processos no domínio do Comércio.

À data da publicação do Ensaio para a reorganização da estrutura judiciária (que deu origem ao documento Linhas Estratégicas para a Reforma da Organização Judiciária, de 15 de Junho de 2012), a resposta forense no município de Monchique, especificamente nas áreas Cível, Penal e do Comércio, era conferida no tribunal da comarca local, enquanto os casos dos foros da FM e do Trabalho eram resolvidos, respectivamente, no Tribunal de FM de Portimão e no Tribunal do Trabalho de Portimão, também competente para decidir sobre os conflitos laborais procedentes do concelho de Monchique.

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Distribuição de competências no quadro da instância central

Em Janeiro de 2012, no quadro da instância central do Tribunal Judicial do Distrito de Faro (TJDF), a DGAJ propunha, com sede na própria capital do distrito, a 1.ª Secção Cível e a 1.ª Secção Criminal. Por sua vez, na cidade de Portimão, ficariam a 2.ª Secção Cível e a 2.ª Secção Criminal, cada uma delas com competência territorial para os municípios de Albufeira, de Aljezur, de Lagoa, de Lagos, de Monchique, de Portimão, de Silves e de Vila do Bispo.

No que diz respeito às secções de competência especializada, o Ministério da Justiça recomendava, no alcance do TJDF, a presença em Faro da 1.ª Secção do Trabalho. Já a 2.ª Secção do Trabalho seria estabelecida em Portimão, com uma área de competência territorial que, além de abranger o município de Monchique, também iria servir os concelhos de Albufeira, de Aljezur, de Lagoa, de Lagos, de Portimão, de Silves e de Vila do Bispo.

No foro da Família e Menores (FM), a 1.ª Secção de FM seria sediada em Faro e 2.ª Secção de FM na cidade de Portimão, com uma área de competência territorial idêntica à da 2.ª Secção do Trabalho, dando assim resposta aos residentes em Monchique.

No foro da Família e Menores (FM), a 2.ª Secção de FM seria sediada na cidade de Portimão, com uma área de competência territorial idêntica à da 2.ª Secção do Trabalho, dando assim resposta aos residentes em Monchique.

No âmbito das acções executivas, a DGAJ determinava que a 1.ª Secção de Execuções ficaria em Loulé e que a 2.ª Secção de Execuções teria a sua sede em Silves, com competência territorial para os concelhos de Albufeira, de Aljezur, de Lagoa, de Lagos, de Monchique, de Portimão, de Silves e de Vila do Bispo. Por sua vez, a 1.ª Secção de Instrução Criminal teria a sua sede em Faro, enquanto a 2.ª Secção de Instrução Criminal, localizada em Portimão, assumiria competência territorial nos mesmos municípios que a 2.ª Secção de Execuções. A este respeito, a DGAJ anota que, por determinação legal, “pode ser estabelecido que a intervenção do Juiz da Secção de Instrução Criminal ocorra em diversos pontos da comarca”. Quanto à Secção de Comércio, o MJ entendeu que “a localização geográfica e a existência de instalações adequadas justificam” a sua sede em Olhão, tendo competência territorial em todo o distrito de Faro.

Embora, no distrito de Faro, existam comarcas com um volume processual muito
reduzido, a população distrital teve um aumento de 13,98% nesses últimos 10 anos (de acordo com os dados censitários de 2011, então preliminares). Porém, nos municípios de Alcoutim, de Monchique e de Vila do Bispo verificou-se uma redução populacional. Assim, com a análise de vários factores, como o movimento processual, a evolução demográfica e a inexistência de instalações adequadas, a DGAJ justificava a extinção de um tribunal no distrito de Faro.

Atendendo a que a comarca de Monchique apresentava “valores inferiores, quer de movimento processual, quer de população, relativamente à comarca de Silves” e que a respectiva evolução demográfica, na mesma década, evidenciava uma diminuição de 13,44% da população, enquanto no concelho de Silves essa redução era de 9,63%, o Ministério da Justiça propunha, em Janeiro de 2012, a extinção do tribunal de Monchique, cujas instalações, tidas como “adequadas ao respectivo funcionamento”, pertencem à câmara municipal local. Comparativamente, o edifício do tribunal de Silves, propriedade do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça, IP (IGFPJ, IP, actual IGFEJ, IP – Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP), também mostrava condições adequadas ao seu funcionamento. Uma nota complementar da DGAJ prende-se com os “bons acessos rodoviários entre os dois municípios”.

O Ministério da Justiça propunha, em Janeiro de 2012, a extinção do tribunal de Monchique, cujas instalações, tidas como “adequadas ao respectivo funcionamento”, pertencem à câmara municipal local.

A 24 de Fevereiro de 2012, o Jornal do Algarve alertava – com o título “Monchique em risco de ficar sem tribunal” – para a eventualidade de o Tribunal de Monchique vir a “ser o único a fechar as portas na região algarvia”, em consequência da “nova proposta do Governo sobre a reorganização do mapa judiciário”. Como noticiava o mesmo órgão de comunicação, a autarquia liderada pelo social-democrata Rui André (então no seu primeiro mandato) estava “contra a proposta do Governo PSD/CDS”, argumentando que o encerramento do tribunal iria “agravar ainda mais o isolamento da população e a desertificação do concelho”.

“Caso se confirme o fechar de portas do Tribunal Judicial de Monchique, a população terá de se deslocar até Silves, cerca de vinte quilómetros por estradas sinuosas”, aludia o Jornal do Algarve, reconhecendo que o problema seria agravado “para quem se desloca em transportes públicos, uma vez que não existem autocarros directos entre as duas localidades”.

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“Decisão ditada por questões meramente economicistas”

Aproximadamente nove meses depois, a 14 de Novembro de 2012, o jornal Barlavento avançava com o título “Comunistas contra encerramento do Tribunal de Monchique”, aludindo que essa deliberação do Ministério da Justiça decorria no âmbito do processo de reorganização do mapa judiciário e que, assim, o Governo pretendia encerrar aquela instância local. “Esta é uma decisão ditada por questões meramente economicistas, inserida numa política de ataque às funções do Estado”, denunciava este semanário regional do Algarve.

“A poupança que o Ministério da Justiça irá ter com o encerramento do Tribunal de Monchique não é significativa, já que o edifício onde se encontra o tribunal é propriedade da autarquia e esta já se disponibilizou para suportar grande parte das despesas com a manutenção do tribunal”, desenvolvia a mesma peça jornalística, admitindo-se que qualquer poupança que viesse a ser feita seria “sempre muito inferior aos custos económicos, sociais e humanos que representa a desertificação do interior algarvio”.

“A poupança que o Ministério da Justiça irá ter com o encerramento do Tribunal de Monchique não é significativa, já que o edifício onde se encontra o tribunal é propriedade da autarquia e esta já se disponibilizou para suportar grande parte das despesas com a manutenção do tribunal.”

Conforme adiantava o Barlavento, na sua edição de 14 de Novembro, a “decisão do Governo PSD/CDS de encerrar o Tribunal de Monchique é mais um contributo da política de direita para a desertificação do interior algarvio, com elevados custos económicos, sociais e humanos”, como classificavam os comunistas em comunicado. Ou seja, o Partido Comunista Português rejeitava “a política do Governo de encerramento de tribunais, no Algarve e no país”, a qual – citava este semanário algarvio – “agrava os problemas da interioridade e da desertificação, além de pôr em causa o acesso ao direito e aos tribunais, consagrado na Constituição da República Portuguesa”.

“A decisão do Governo PSD/CDS de encerrar o Tribunal de Monchique é mais um contributo da política de direita para a desertificação do interior algarvio, com elevados custos económicos, sociais e humanos.”

Passado um ano sobre a nova reforma judicial, o advogado Paulo Rocha (na qualidade de articulista da revista Julgar) escreve que na zona mais a sul do País “sempre houve tribunais de competência especializada longe de outros centros densamente povoados”. No caso do Algarve, “apenas duas cidades (Faro e Portimão) tinham competências especializadas, pelo que não se estranhou, agora, com a introdução do novo mapa[,] a necessidade de deslocações mais longas”, anota o causídico.

No que concerne à “anunciada busca da especialização”, Paulo Rocha escreve que se verificou “com muita acuidade, no caso concreto de Faro, embora comum a quase todas as novas comarcas, algo de insólito no que diz respeito à movimentação/colocação dos vários Juízes”.

Nessa circunstância, o articulista confirma que alguns juízes que exerciam, há muitos anos, “num tribunal com determinada competência material” foram colocados noutros “cuja matéria não dominavam”. Facto que, na sua perspectiva – quer no caso de Faro quer em quase todo o território nacional –, se deveu “não só à precipitação da entrada em vigor do diploma legal, por parte do órgão executivo”, mas também, em grande parte, aos próprios juízes que, “optando por um critério de conforto geográfico, acabaram por escolher o desconforto da falta de experiência em certos domínios de jurisdição”.

Segundo o advogado Paulo Rocha, “uma das situações mais dignas de nota é o caso da secção de comércio de Olhão”, que concentra toda a pendência do Algarve, “o que é claramente inadequado e inviável”, mantendo “os […] recursos humanos, quer quanto à quantidade quer quanto à qualidade”, ao que “acresce o défice de condições” no espaço do edifício.

Recorrendo ao anexo do documento Indicadores de A[c]tividade nos Arquivos dos Tribunais 2014, publicado pela Direcção-Geral da Administração da Justiça, em Março de 2015, constata-se que, ao ser encerrada a instância de Monchique, o respectivo arquivo, relativo ao ano de 2014, foi transferido para o Arquivo Central da Comarca de Faro (sediado no Edifício Estamo – que é uma empresa pública que gere património imobiliário do Estado), tendo uma extensão de 145 metros de prateleiras e uma extensão documental (ou seja, os fundos documentais do antigo Tribunal da Comarca de Monchique) com 108 metros, o que equivale a um saldo positivo de 37 metros. O mesmo relatório informa que o total de processos eliminados e remetidos para o arquivo distrital, entre 2003 e 2014, foi de 4.965 processos.

Em 5 de Novembro de 2013, o social-democrata Rui André, enquanto líder autárquico, apresentou uma proposta de moção relativa à reorganização judiciária nacional, envolvendo o Tribunal de Monchique.

No período de antes da ordem do dia da reunião ordinária da Câmara Municipal de Monchique realizada em 5 de Novembro de 2013, presidida pelo social-democrata Rui Miguel da Silva André, o líder autárquico apresentou uma proposta de moção relativa à reorganização judiciária nacional, envolvendo o Tribunal de Monchique, sugerindo que, depois de debatida, fosse subscrita pelos membros do plenário. E, como regista a Acta XXII/2013, o plenário deliberou, por unanimidade, a admissão da referida proposta.

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“Estabelecer uma reforma profunda no sistema judicial”

Na oportunidade, o mesmo autarca algarvio contextualizou a proposta fazendo uma resenha das acções até então desenvolvidas. “A Reorganização Judiciária Nacional é um dos objectivos do Ministério da Justiça que, como todos nós sabemos, é determinante para que o Estado e os procedimentos inerentes a este se[c]tor sejam mais ágeis e que os mesmos proporcionem uma melhor e mais célere justiça, cumprindo o designado na Constituição da República Portuguesa sobre o acesso à justiça por todos os cidadãos em igualdade de circunstâncias”, afirma-se no aludido documento.

“A Reorganização Judiciária Nacional é um dos objectivos do
Ministério da Justiça que, como todos nós sabemos, é
determinante para que o Estado e os procedimentos inerentes a
este se[c]tor sejam mais ágeis e que os mesmos proporcionem
uma melhor e mais célere justiça.”

“A sustentação técnica desta pretensão surge agora em forma de proposta de Lei para a Reorganização deste se[c]tor de responsabilidade daquele Ministério”, contextualiza-se, esclarecendo que a “reda[c]ção proposta para a Lei de Organização do Sistema Judiciário e para o Regime de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciários vem estabelecer uma reforma profunda no sistema judicial e na forma como são entendidos os tribunais[,] não só apenas os profissionais da área como também pelas pessoas em geral”.

Como é, entretanto, esclarecido: “No caso específico de Monchique[,] esta reforma vem conduzir ao desaparecimento do Tribunal de Comarca de Monchique e de centenas de outros, aglomerando todos em Comarcas Distritais, conforme é de conhecimento geral” (sic). “Contudo” – como é também observado –, “enquanto em alguns locais continuam a existir secções de Comarca e em outras secções de proximidade, na referida proposta de Lei, entregue aos […] Deputados na Assembleia da República, no caso de Monchique[,] não está prevista nenhuma das situações atrás descritas, percebendo-se que a referida proposta de Lei termina com o serviço da área Judicial no território do Concelho de Monchique” (sic).

“No caso específico de Monchique[,] esta reforma vem conduzir ao desaparecimento do Tribunal de Comarca de Monchique e de centenas de outros, aglomerando todos em Comarcas Distritais, conforme é de conhecimento geral.”

Prosseguindo a explanação das acções concretizadas, são mencionadas “diversas reuniões tidas com o Ministério da Justiça” (MJ), quer com a ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) quer com os serviços do MJ, a par de outras entidades, como a Ordem dos Advogados, a ANMP e vários grupos parlamentares na Assembleia da República, em que a edilidade de Monchique – como sublinha – “sempre pugnou pela continuidade do serviço de proximidade ao cidadão, através da constituição de Secção da Comarca de Foro ou de Secção de Proximidade” (sic).

Como regista a Acta XXII/2013, a edilidade manifesta: “Se[,] por um lado[,] recebemos o apoio à nossa causa da maioria das entidades supramencionadas, parece que apenas no Ministério da Justiça tais ‘démarches’ parecem não ter tido aceitação para inclusão, apesar de ter sido sempre apontado como uma possibilidade, dado que os custos inerentes ao seu funcionamento são bastante reduzidos.”

O executivo camarário de Monchique informava que tinham sido solicitados, pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, “contributos para uma tomada de posição conjunta”, numa reunião que decorreria a 7 de Novembro, em Coimbra.

Depois de terem sido contactados alguns deputados eleitos pela região algarvia e após ter tomado conhecimento da “proposta de Lei”, a autarquia local expressava: “[…] sabemos que existem contributos que poderão passar a ser propostas de inclusão na Lei da Secção de Proximidade para Monchique.” E adiantava: “Aguardaremos para saber se essas propostas serão entregues e aceites pelo Parlamento e[,] assim, alterar a referida Proposta de Lei. Por outro lado, a ANMP, conforme fez desde o início desta Reforma, tem dado um apoio muito consistente a esta ‘luta’ dos Municípios pela manutenção da Justiça de proximidade, nomeadamente em territórios onde a mobilidade das pessoas é mais difícil[,] como é o caso de Monchique.”

“Pelo que percebemos da proposta de Lei, o concelho de Monchique poderá perfeitamente acolher uma Secção de Proximidade integrada da Instância Local dos Tribunais judiciais de primeira instância”

Na oportunidade, o executivo camarário informava que tinham sido solicitados, pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, “contributos para uma tomada de posição conjunta”, numa reunião que decorreria dois dias depois (a 7 de Novembro), em Coimbra.

O plenário municipal sublinhou que mantinha “a
sua proposta de disponibilizar o […] edifício do
Tribunal de Monchique para albergar esta Secção
de Proximidade, manifestando total abertura para
qualquer outro tipo de apoios”.

Por conseguinte, a Câmara Municipal de Monchique, no âmbito dessa reunião ordinária, deliberou: “Pelo que percebemos da proposta de Lei, o concelho de Monchique poderá perfeitamente acolher uma Secção de Proximidade integrada da Instância Local dos Tribunais judiciais de primeira instância. Essa secção de Proximidade teria as funções a que o diploma em discussão introduz. […]”

Ao reconhecer que seria importante não apenas “referir a atribuição a estas unidades da titularidade do exercício da função jurisdicional”, mas também que nelas podem ser praticados actos jurisdicionais e realizadas audiências, videoconferências, entre outras atribuições, o plenário municipal sublinhou que mantinha “a sua proposta de disponibilizar o […] edifício do Tribunal de Monchique para albergar esta Secção de Proximidade, manifestando total abertura para qualquer outro tipo de apoios.” Note-se que o edifício do tribunal se situa na Rua Prior Francisco Jorge de Melo e faz parte do Sítio de Interesse Comunitário de Monchique, no âmbito do Plano Sectorial da Rede Natura 2000. Este imóvel foi inaugurado em 1995, após a realização de trabalhos de remodelação e de adaptação.

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Proposta de um tribunal arbitral nas questões agrícolas e florestais

Na mesma ocasião, foi frisado que, sem “prejuízo do que antes se disse” também “se gostaria de ver equacionada” a proposta avançada por aquele plenário municipal de um “Tribunal Arbitral, com especial incidência nas questões agrícolas e florestais, com jurisdição em todo o território da comarca de Faro”, a qual “igualmente funcionaria no edifício do […] Tribunal de Monchique com os meios ali disponíveis e que são assegurados pelo próprio Município”.

Nesse contexto, a autarquia liderada pelo social-democrata Rui Miguel da Silva André destacava a pretensão do município de Monchique para que fosse “mantido neste concelho as soluções referidas”, ou seja, “a Secção de Proximidade integrada da Instância Local dos Tribunais judiciais de primeira Instância e o tribunal arbitral – ou qualquer delas, alternativa e conjugadamente” (sic). Com efeito, o plenário municipal apelou, nessa moção, “para a ponderação destes fa[c]tores, sem esquecer os motivos a que o diploma” se propunha, tendo em vista “a melhor administração da justiça ao serviço das populações”, de forma a “acautelar os interesses das populações dos meios rurais e interiores, não afastando os poucos meios ainda disponíveis[,] repondo, assim, alguma equidade”.

A autarquia liderada por Rui André destacava a pretensão do município
de Monchique para que fosse “mantido neste concelho as soluções
referidas”, ou seja, “a Secção de Proximidade integrada da Instância Local
dos Tribunais judiciais de primeira Instância e o tribunal arbitral – ou
qualquer delas, alternativa e conjugadamente”.

A acta da reunião ordinária seguinte da Câmara Municipal de Monchique, realizada em 19 de Novembro de 2013, refere que, a 7 de Novembro – como estava agendada –, tinha decorrido, em Coimbra, “uma Reunião na ANMP tendo em vista o parecer desta entidade para com a proposta do Governo para a reorganização judiciária”.

Como também regista a Acta II/2014 da reunião ordinária da Câmara Municipal de Monchique realizada em 28 de Janeiro de 2014, no período antes da ordem do dia, o presidente da edilidade, Rui André, prestou informações sobre o anteprojecto de decreto-lei relativamente ao regime de organização e funcionamento dos tribunais judiciais, dando conhecimento do ofício enviado ao gabinete da ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), o qual ficou apenso à acta.

Por sua vez, na reunião ordinária seguinte (de 11 de Fevereiro de 2014) da autarquia de Monchique, presidida pelo social-democrata Rui André, o edil prestou informações sobre correspondência e documentação de interesse para a reunião, particularmente documentação contendo cópia do ofício enviado ao, então, primeiro-ministro (Pedro Passos Coelho), em 6 de Fevereiro de 2014, manifestando a posição da Câmara de Monchique relativamente “à prevista aprovação em Conselho de Ministros, nesta mesma data, da Reforma Judiciária do país e, bem assim, cópia do ofício enviado à ministra da Justiça, dando conhecimento do ofício ao primeiro-ministro”.

O então autarca social-democrata Rui André disse que iria “interpor uma providência cautelar para tentar impedir o encerramento do tribunal, previsto no novo mapa judiciário”.

Ao final da tarde de 6 de Fevereiro, a Lusa informava que o autarca de Monchique tinha anunciado providência cautelar contra o fecho do tribunal monchiquense. Em declarações à agência noticiosa, Rui André disse que iria “interpor uma providência cautelar para tentar impedir o encerramento do tribunal local, previsto no novo mapa judiciário, e aprovado [nesse mesmo dia] no Conselho de Ministros”.

O edil social-democrata algarvio manifestou que “apenas” tinha uma dúvida, que era a de saber se a providência cautelar seria “apresentada individualmente ou em conjunto, com os restantes 19 municípios que também viram os seus tribunais serem incluídos na lista de estabelecimentos a encerrar”.

O então presidente da Câmara Municipal de Monchique acusou ainda a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, e o seu gabinete de terem tido uma posição “inaceitável” ao tomarem uma decisão final quando ele próprio “aguardava por uma reunião individual”, depois de, segundo Rui André, a governante “se ter recusado a receber o conjunto” dos autarcas dos 47 municípios que poderiam ver os seus tribunais serem encerrados com o novo mapa judiciário.

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Ministra recusou reunião com o conjunto dos municípios

Na ocasião, o edil confirmou o que havia sido discutido em sessão da Câmara Municipal (como foi assinalado na Acta IV/2014): “Tivemos uma reunião na Associação Nacional de Municípios (ANMP), e os 47 decidimos pedir uma reunião com ela [a ministra da Justiça]. E ela disse que com o conjunto, com todos, não se reunia e iria reunir-se com um de cada vez.”

O ex-presidente da Câmara Municipal de Monchique, Rui
André. (facebook.com)

Naquela altura, o autarca Rui André estava a aguardar por essa reunião e pela comunicação da data do encontro por parte do gabinete de Paula Teixeira da Cruz, quando soube pela comunicação social que o novo mapa judiciário iria ser analisado e aprovado em Conselho de Ministros. “Até porque, além de termos dados novos, tínhamos também a proposta de, na eventualidade de ter mesmo que encerrar, que ficasse uma secção de proximidade. E era essa a nossa esperança”, manifestou o autarca algarvio à Lusa, anunciando uma providência cautelar contra o fecho do tribunal local, conforme ficou acordado, no quadro da ANMP, pelos municípios envolvidos por essas decisões do Ministério da Justiça, tendo sido consideradas “algumas medidas de luta” e “entre essas medidas estava uma providência cautelar”. “E por causa disso informei, numa nota de imprensa, que vou pôr uma providência cautelar para suspender esta decisão”, adiantou o edil social-democrata Rui André à Lusa, salientando que faltava somente saber se iriam “ser apresentadas em conjunto”, por todos os municípios abrangidos ou “individualmente”.

Na mesma ocasião, Jorge Botelho – o ex-presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve (actualmente, António Pina é o novo presidente da AMAL, estrutura que reúne todos os municípios algarvios) – manifestou, ao ser contactado pela Lusa, que a “extinção de serviços administrativos na região não é bem-vinda” e que estava a fazer “perder claramente a capacidade de responder às pessoas”, que teriam de “se deslocar cada vez mais longe” para aceder a esses serviços. “E quando falamos da Justiça estamos a falar de uma questão de soberania”, prosseguiu Jorge Botelho, acentuando que “é de lamentar que este Governo [liderado por Pedro Passos Coelho, sendo o centrista Paulo Portas vice-primeiro-ministro] esteja a proceder ao encerramento de tribunais, que vão dificultar ainda mais o acesso à justiça”, por “critérios economicistas”.

A Câmara Municipal de Monchique e outros órgãos autárquicos deste concelho algarvio já tinham deliberado diversas tomadas de posição sobre o encerramento do tribunal local e manifestado o seu “descontentamento”.

Também na tarde de 6 de Fevereiro, o portal Algarve Primeiro informava, em título, que a Câmara de Monchique avançava com providência cautelar para travar fecho do tribunal.  Através de um comunicado, a autarquia monchiquense disse que teve, então, “conhecimento, via comunicação social”, de que estaria agendada para essa quinta-feira a aprovação, em Conselho de Ministros, da “Reforma Judiciária do País, coordenada pelo Ministério da Justiça”. Como recordava o aludido comunicado, a Câmara Municipal de Monchique e outros órgãos autárquicos deste concelho algarvio já tinham deliberado, nos últimos dois anos, “diversas tomadas de posição sobre o assunto, manifestando o seu descontentamento”.

O mesmo comunicado da autarquia monchiquense adiantava que esse processo tinha “tido um envolvimento próximo da ANMP (Associação Nacional de Municípios Portugueses)” e que a ANMP havia proposto, à ministra da Justiça, “a realização de uma reunião com os Municípios Portugueses visados, pelo que ficou decidido realizar reuniões com cada um desses Municípios abrangidos, de uma forma ou de outra[,] com alterações no seu Mapa Judiciário” (sic).

Segundo o portal Algarve Primeiro (com sede em Olhão), ficou decidido que cada município iria solicitar uma reunião com a ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) e, também, pedir aos tribunais locais todo o movimento processual de 2012 e de 2013, para se esclarecer sobre os números apresentados pelos tribunais como sendo de movimento processual. A esse respeito, a Câmara Municipal de Monchique reiterava “ter cumprido com o decidido”, tendo, por diversas vezes, “solicitado audiência, com caráter de urgência”, à ministra da Justiça, bem como requerido ao Tribunal de Monchique o movimento processual dos anos de 2012 e de 2013.

Enquanto aguardava pelo agendamento de uma audiência, o presidente da autarquia, Rui André, entendia que não podia “fazer mais do que repudiar a atitude por parte do Ministério da Justiça”, declarando que nessa quinta-feira (6 de Fevereiro) tinha “enviado para o Gabinete do Primeiro Ministro, com conhecimento à Ministra da Justiça, uma carta contento o repúdio pela atitude com que a Câmara Municipal de Monchique e outras foram tratadas em todo este processo, manifestando a sua indignação” (sic).

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Câmara de Monchique avança com providência cautelar

Como adiantava o portal Algarve Primeiro, com base nas declarações do autarca de Monchique, e uma vez que parecia que estava encerrado o campo das negociações, a edilidade iria partir para outro tipo de acções que serviriam “para manter a luta de um serviço que, a deixar de existir, representa[va] um entrave para aqueles que continuam a lutar pela dignidade e manutenção de serviços juntos dos que mais necessitam”. Nessa intenção, a Câmara Municipal de Monchique decidira apresentar uma providência cautelar, “tentando travar este processo”.

A Câmara Municipal de Monchique reiterava “ter cumprido com o decidido”, tendo, por diversas vezes, “solicitado audiência, com caráter de urgência”, à ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), bem como requerido ao Tribunal de Monchique o movimento processual dos anos de 2012 e de 2013.

Igualmente no início da tarde dessa quinta-feira (6 de Fevereiro de 2014), o jornal Sul Informação destacava, em título, que a Câmara de Monchique iria apresentar providência cautelar contra o encerramento do tribunal nesta vila algarvia, como foi decidido em Conselho de Ministros, com a aprovação do novo mapa judiciário. Conforme escrevia Elisabete Rodrigues (directora deste jornal regional, com sede em Faro), previa-se, em resultado da determinação do Governo (chefiado por Passos Coelho), “o fecho de 20 tribunais em todo o país, e a passagem de outros 27 em Secções de Proximidade, nove das quais com um regime especial que permite realizar julgamentos”.

No Algarve, o único tribunal afectado pela reorganização judiciária era o de Monchique, como verificava Elisabete Rodrigues, adiantando que este tribunal não constava “sequer” da lista dos que passariam a funcionar apenas como secção de proximidade, um novo tipo de serviço que, segundo a ex-bastonária do Ordem dos Advogados (OA), mais não é que “um balcão com um funcionário para receber papéis”.

No Algarve, o único tribunal afectado pela reorganização judiciária era o de
Monchique, como verificava Elisabete Rodrigues, adiantando que este tribunal
não constava “sequer” da lista dos que passariam a funcionar apenas como
secção de proximidade.

A autarquia monchiquense denunciava, em comunicado também recebido pelo Sul Informação, que o processo se encontrava “ferido de legitimidade”, “na forma e na matéria de análise dos números do movimento processual, assim como do respeito pelos cidadãos e dos seus direitos mais fundamentais como o acesso à justiça”. O edil Rui André exteriorizou o seu desagrado com “a atitude” do Ministério da Justiça, para si “inqualificável”, dando conta do envio, para o gabinete do então primeiro-ministro, com conhecimento à ministra da Justiça, de “uma carta contendo o repúdio pela atitude com que a Câmara Municipal de Monchique e outras foram tratadas em todo este processo, manifestando a sua indignação pelo obstáculo ao exercício do contraditório e na legítima defesa das populações que representa”.

Em declarações à rádio Antena1, a bastonária da OA (Elina Fraga, que exerceu este cargo no triénio de 2014 a 2016) admitiu que a reorganização judiciária significava, na prática, “o fecho de 47 tribunais”. No seu entender, as denominadas secções de proximidade mais não seriam do que “um local com um funcionário para receber papéis” (como já mencionámos). Para a ex-representante nacional dos advogados, também citada pelo jornal Sul Informação, essa decisão do Governo correspondeu a algo ainda mais ineficaz quando se sabe que, com o novo Código do Processo Civil, a maioria das tramitações é feita por via electrónica. Na opinião de Elina Fraga, as secções de proximidade equivalem a “atirar areia para os olhos dos cidadãos” e para pouco mais servirão que para “satisfazer alguns interesses políticos das autarquias locais”, podendo, assim, dizer que o seu tribunal não fechou de todo.

A Câmara Municipal de Monchique repudiou a atitude da tutela da Justiça, “em todo este processo, manifestando a sua indignação pelo obstáculo ao exercício do contraditório e na legítima defesa das populações que representa”.

Perante a nova situação, a então bastonária – que integrou o Grupo de Trabalho, criado pelo Ministério da Justiça, de Revisão do Mapa Judiciário, em 2009 – salientava que a decisão política de Paula Teixeira da Cruz iria “obrigar centenas de milhar de cidadãos a deslocar-se” para ter acesso à Justiça, mas que o cidadão carenciado não iria “ter de todo acesso”. Consequentemente, com o fecho dos tribunais em concelhos do interior e periféricos, Elina Fraga notava que a mensagem que se estava a passar “é de que não vale a pena investir naquele concelho”.

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Governo decide fechar 20 tribunais em todo o país

Na sua edição digital de 6 de Fevereiro de 2014, o Jornal do Algarve noticiava que foi pela comunicação social que a população e os autarcas de Monchique ficaram a saber, nessa quinta-feira, que “o Governo decidiu fechar definitivamente vinte tribunais em todo o país, incluindo o de Monchique”. “Isto apesar de, há pelo menos dois anos, os habitantes e a autarquia virem demonstrando o seu descontentamento face a essa possibilidade, que agora se confirma”, acrescentava este semanário, com sede em Vila Real de Santo António, dando conta de que o presidente da autarquia monchiquense, Rui André (do PSD), “reagiu de imediato e avançou com uma providência cautelar para tentar travar o encerramento do tribunal”.

A reacção do edil deste município algarvio – que acusou a ministra da Justiça e o seu gabinete de terem tido uma posição “inaceitável” – foi também divulgada pela SIC Notícias, citando a agência Lusa: “O presidente da Câmara de Monchique, Rui André, disse hoje que irá interpor uma providência cautelar para tentar impedir o encerramento do tribunal local, previsto no novo mapa judiciário, e aprovado hoje no Conselho de Ministros.” A mesma notícia é divulgada, também a 6 de Fevereiro, pela revista Visão (na sua publicação online), recorrendo ao título “Mapa judiciário: Autarca de Monchique anuncia providência cautelar contra fecho de tribunal”.

O edil de Monchique, Rui André, acusou a ministra da Justiça e o seu gabinete de terem tido uma posição “inaceitável”.

A 11 de Fevereiro, o Correio da Manhã publicava que a bastonária da OA, Elina Fraga, tinha questionado, no dia anterior, “os requisitos do Ministério da Justiça para encerrar tribunais no âmbito do novo mapa judiciário”. Isso porque a representante nacional dos advogados considerava que, segundo os cálculos da Ordem, havia apenas dois tribunais (Fronteira e Monchique) com menos de 250 processos pendentes: “Não contabilizaram inquéritos criminais, as acções de valor superior a 50 mil euros, nem os processos com penas acima de cinco anos.” 

Só dois tribunais em Portugal – Monchique e Fronteira – apresentavam menos de 250 processos pendentes, requisito definido pelo Ministério da Justiça para o seu encerramento

Também a 11 de Fevereiro, o jornal desportivo A Bola salientava: “Bastonária teme reforma judiciária”. Elina Fraga, que “esteve reunida com a ministra Paula Teixeira da Cruz”, pela primeira vez enquanto bastonária, “partilhou preocupações” e garantiu, à saída dessa reunião com a ministra da Justiça, que só dois tribunais em Portugal – Monchique e Fronteira – apresentavam menos de 250 processos pendentes, requisito definido pelo Ministério da Justiça para o seu encerramento. Na ocasião, como recordava o jornal A Bola, “Elina Fraga confessou-se apreensiva com a implementação desta medida, temendo um ‘retrocesso’ pela reorganização judiciária em curso”.  

A edição do mesmo dia do Público reiterava as declarações da bastonária da OA de que só havia “dois tribunais em condições de encerrar”, de acordo com os critérios definidos pela própria tutela para o fecho. Depois de ter reunido com a ministra Paula Teixeira da Cruz, Elina Fraga esclareceu que a existência de menos de 250 processos anuais por tribunal foi o principal critério usado para decidir o encerramento. Como então disse a bastonária ao jornal Público – e a tutela acabaria por confirmar –, a contabilidade do Ministério da Justiça não incluiu os inquéritos criminais nem as acções de valor superior a 50 mil euros.

Como noticiava o diário nacional, também “não foram tidas em conta as acções que irão caber aos tribunais especializados, como as relativas ao direito da família ou do trabalho”. “É intelectualmente desonesto”, criticava a representante dos advogados, segundo a qual, se a tutela seguisse esse critério à risca não poderia fechar mais de dois tribunais, um em Fronteira e outro em Monchique.  

Conforme referia o Público, a tutela admitiu não ter contabilizado para efeitos de decisão sobre o encerramento os processos que, depois de a reforma ser aplicada, passam a ser da competência das secções especializadas, “como, por exemplo, família e menores ou as instâncias centrais criminais e cíveis, que julgam os processos com crimes mais graves e valores mais elevados”.

Todavia, numa nota enviada à comunicação social, o Ministério da Justiça argumentava: “Caso fossem contabilizados para artificialmente aumentar os números, estariam a ser contados processos em tribunais onde eles não vão estar após a reorganização.” “Sabendo-se que esses processos passam a ser julgados em secções especializadas, não pode pretender-se que continuem a ser contabilizados nos tribunais de origem, o que seria absolutamente contraditório”, acrescenta a mesma nota, citada pelo mesmo jornal, sustentando que, desse modo, os tribunais com fecho anunciado “não têm mais de 250 processos pendentes por ano, quer na média do triénio-base de 2008-2010, quer no triénio de actualização de 2010-2012”.

Ordem dos Advogados envia documento para a ministra analisar

Elina Fraga observou, então, que a Ordem dos Advogados iria enviar um documento sobre esta matéria à ministra Paula Teixeira da Cruz, dizendo que a governante “mostrou abertura para [o] analisar”, no qual se procurava demonstrar que outro dos critérios divulgados pela tutela para o encerramento, como o de “haver condições rodoviárias ou transporte colectivo para as populações poderem aceder ao tribunal mais próximo que continue aberto[,] também não foi, afinal, tido em conta em todos os casos”.  

Outro dos critérios divulgados pela DGAJ para o encerramento dos tribunais, como o de “haver condições rodoviárias ou transporte colectivo para as populações poderem aceder ao tribunal mais próximo que continue aberto, também não foi, afinal, tido em conta em todos os casos”.  

Entretanto, a 17 de Fevereiro, o canal televisivo CMTV reparava: “O Estado gastou mais de um milhão de euros na remodelação do Tribunal de Monchique, e que agora quer fechar.” A CMTV noticiava, nessa tarde, que o encerramento do Tribunal de Monchique estava “a gerar a revolta neste concelho da serra algarvia”, com seis mil residentes, “a maior parte idosos”.

A autarquia prometeu “não baixar os braços na luta contra o encerramento do tribunal”. Assim, decidiu avançar com uma providência cautelar, reiterava o mesmo canal televisivo. Em declarações à CMTV, o então presidente da autarquia afirmou que os custos para o Estado eram “insignificantes”. O social-democrata Rui André lembrou, ainda, que o edifício onde funciona o tribunal tinha sido “totalmente remodelado há poucos anos”.

Em declarações à CMTV, o presidente da autarquia (Rui André) afirmou
que os custos para o Estado eram “insignificantes”.

Por sua vez, o jornal Correio da Manhã (CM), também a 17 de Fevereiro, realçava que, no município de Monchique, o “tribunal foi remodelado e agora vai fechar”. Nessa edição, o CM repetia a informação de que o Estado gastou mais de um milhão de euros nas obras de remodelação – então, “há cerca de 10 anos” – e que o orçamento anual do tribunal rondava os 10 mil euros, sendo o edifício cedido pela autarquia monchiquense.

“Estamos indignados”, manifestava o social-democrata Rui André, na qualidade de presidente da Câmara Municipal de Monchique, sobre o anunciado fecho do tribunal local. “A autarquia já suporta algumas despesas e está disposta a reavaliar a necessidade de apoiar ainda mais”, garantia o autarca, acrescentando que não havia “redução de custos para o Estado com o fecho” do tribunal. Conforme publicava o CM, o edil algarvio Rui André sublinhava que a população monchiquense é idosa, pelo que a deslocação até Portimão implicava “despesas para as pessoas e muitos transtornos”.  

Na mesma altura, o advogado Paulo Rosa – que entrevistámos no desenvolvimento deste trabalho jornalístico – garantiu que as instalações “são ótimas” e que os processos corriam “mais rápido do que em tribunais vizinhos”. Esse causídico algarvio elucidou também que a maioria dos processos era de “natureza criminal”, pelo que a Guarda Nacional Republicana teria de ir a Portimão quase todos os dias, deixando o concelho de Monchique “desprovido de segurança”.

O advogado Paulo Rosa afirmou que a maioria dos processos era de “natureza criminal”, pelo que a Guarda Nacional Republicana teria de ir a Portimão quase todos os dias, deixando o concelho de Monchique “desprovido de segurança”.

A 19 de Fevereiro, o Público noticiava que a bastonária dos advogados “congratulou-se nesta quarta-feira, em Coimbra, com a tomada de posição de algumas autarquias, que avançaram, ou anunciaram que pretendem avançar, com providências cautelares para travar medidas do novo mapa judiciário” (sic).

A bastonária, que falou à margem de uma reunião com o Conselho Distrital de Coimbra da OA, salientou que, além do fecho de 20 tribunais e da conversão de 27 em secções de proximidade, era necessário “sensibilizar” os autarcas de que os restantes tribunais abertos poderiam “fechar”. Para Elina Fraga, “a tónica” estava “demasiado centrada” nesses 47 tribunais, sendo que os autarcas “que viram que o seu tribunal se mantinha não fizeram uma reflexão de que o seu tribunal [iria] deixar de tramitar processos” e que “a instância local acabar[ia] por encerrar”.

A bastonária da OA (Elina Fraga) defendeu que a justiça pública é “um alicerce
de um Estado de direito e apresenta garantias de imparcialidade que os demais
centros de justiça não dão”.

Como regista, igualmente, o jornal Público, na perspectiva da bastonária da OA, estava “em curso a negação do direito de aceder à justiça pública”, alegando que iria “proliferar a justiça privada”. Por isso, a representante dos advogados defendeu que a justiça pública é “um alicerce de um Estado de direito e apresenta garantias de imparcialidade que os demais centros de justiça não dão”.

Na opinião de Elina Fraga, o novo mapa judiciário merecia “total repúdio” por parte dos advogados, aludindo que esta reforma “obriga a deslocações por parte das pessoas”, numa altura em que estavam “esmagadas pelos impostos ou por situações de desemprego”. Como informava o Público, na mesma edição, os autarcas de Monchique, do Bombarral, de Lamego, de Murça, de Mondim de Basto e de Portel já tinham anunciado “a intenção de avançar com uma providência cautelar”, enquanto os presidentes das 13 câmaras municipais do Médio Tejo tinham aprovado, por unanimidade, “a instauração de uma acção popular contra o novo mapa judiciário”.

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Autarca de Monchique participa em reunião na sede da ANMP

A 25 de Fevereiro, na reunião ordinária da edilidade de Monchique, o presidente do executivo camarário deu conhecimento de reuniões em que participou e dos eventos e informações relevantes. Assim, Rui André comunicou que, no dia 13 de Fevereiro, em Coimbra, no contexto da ANMP, participou na reunião dos presidentes das câmaras dos concelhos onde era previsto o encerramento de tribunais.

A este propósito, como regista a Acta IV/2014, o presidente da Câmara Municipal de Monchique disse que a ministra da Justiça, “que se comprometeu com estes autarcas, embora pretendesse reunir individualmente e não cole[c]tivamente não só não agendou qualquer reunião como, sem aviso prévio, enviou a proposta da Reforma Judiciária para o Conselho de Ministros a qual aguarda agora a promulgação do Presidente da República”. “Esta atitude da governante demonstra que ela não pretende dialogar com o poder local, o que é reprovável”, prosseguiu, na oportunidade, Rui André, admitindo que, perante “isso, os autarcas já concluíram que a via de negociações que pretendiam seguir não se compatibiliza com gente com tais métodos de trabalho”, pelo que iriam “iniciar outros métodos de luta a envolver: um pedido de fiscalização preventiva, no âmbito da ANMP; fazer o uso possível da divulgação junto dos meios de comunicação social para realçar e manter a[c]tual o tema junto da opinião pública; pedidos de providências cautelares e audiências com o Procurador-Geral da República, com o Provedor de Justiça e com o Presidente da República” (sic) – assunto sobre o qual incidiu o ponto 2.3 da ordem do dia daquela reunião ordinária da Câmara Municipal de Monchique.

O presidente da edilidade apresentou e contextualizou a Proposta n.º 11/2014, acrescentando que “a providência cautelar só seria interposta”, se e/ou quando o Presidente da República promulgasse a resolução do Conselho de Ministros que determinava o encerramento dos tribunais.

A vereadora socialista Maria da Graça Cerro Batalim da Mota comentou que, no ano transacto, quando Rui André se deslocou a Lisboa para falar com a ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) e foi recebido pelo seu chefe de gabinete, “tivera oportunidade de manifestar o que reputou de falta de consideração e de respeito da governante para com o poder local, tendo daí, logo, presumido que não era sua intenção qualquer diálogo com os autarcas”.

Segundo a Acta IV/2014, o presidente da Câmara comentou que, para além dessa “reunião em que foi recebido pelo então chefe de gabinete da ministra da Justiça, investido todavia em competências próximas das de um ministro, visto ser o coordenador geral do processo, chegou a reunir com a própria, reunião essa de que extraiu alguma esperança de, ao menos, se encontrar uma solução alternativa para Monchique” (sic).

Refira-se que António Manuel Costa Moura, natural do Porto, com mais de duas décadas de carreira diplomática, que tinha sido nomeado, em Janeiro de 2012, director-geral da Política de Justiça, passou a ser o novo chefe de gabinete da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, a partir de 11 de Fevereiro de 2013, substituindo João Miguel Barros, que “pediu a demissão por considerar ter-se esgotado nas funções de chefe de gabinete”, como escreveu Anabela Natário, no jornal Expresso (edição online de 8 de Fevereiro de 2023).

Retomando a acta da reunião ordinária da Câmara Municipal de Monchique realizada no dia 11 de Fevereiro de 2014, lemos que, a partir de então, “não mais foi possível reunir com a Ministra, apesar de, no âmbito da ANMP, se ter agendado a reunião a que [o autarca social-democrata Rui André] já aludira, para além de numerosa correspondência trocada”.

Ao consultarmos a Acta XI/2016, resultante da reunião ordinária da
edilidade de Monchique efectuada em 7 de Junho de 2016, lemos
que a reunião com a ministra da Justiça (Francisca Van Dunem) teve
como objectivo “reivindicar o regresso do serviço de proximidade ao
concelho, pois constitui uma necessidade da população[,] que
nunca desistiu de ter de novo o tribunal”.

Como reproduz a Acta IV/2014, o “assunto mereceu ainda uma troca de impressões coloquial entre os presentes”. Por conseguinte, terminadas as intervenções, o presidente do executivo camarário pôs à votação a Proposta n.º 11/2014, de 20 de Fevereiro, visando a anuência de previdência cautelar, em face do encerramento do tribunal de Monchique, a qual foi aprovada por unanimidade.

Já no período de intervenção do público, usaram da palavra três cidadãos, tendo Paulo Alexandre Duarte Rosa, na qualidade de membro da Assembleia Municipal de Monchique, informado que “os dados estatísticos, que acabara de compilar, de processos entrados no tribunal de Monchique em 2013, eram idênticos aos do ano anterior: cerca de 250, os do foro penal e, superiores a uma centena, os do foro cível” (sic). Segundo o mesmo cidadão, estes números eram os mesmos que a ministra da Justiça “interpretou, segundo a perspe[c]tiva que bem lhe conveio, de forma dolosa, não só para Monchique como para o interior do país”.

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Rui André no Ministério da Justiça para debater reactivação do tribunal

Na reunião ordinária da Câmara Municipal realizada a 17 de Maio de 2016, no período antes da ordem do dia, entre outras matérias de expediente geral, foi mencionado que o presidente da autarquia monchiquense iria reunir no dia seguinte com a ministra da Justiça – Francisca Van Dunem, a qual sucedeu ao social-democrata Fernando Negrão, integrando o XXI Governo Constitucional (de 26 de Novembro de 2015 a 26 de Outubro de 2019) – para debater o assunto relacionado com a reactivação do tribunal de Monchique.

Ao consultarmos a Acta XI/2016, resultante da reunião ordinária da edilidade de Monchique efectuada em 7 de Junho de 2016, lemos que a reunião com a ministra da Justiça teve como objectivo “reivindicar o regresso do serviço de proximidade ao concelho, pois constitui uma necessidade da população[,] que nunca desistiu de ter de novo o tribunal”. Foi também registado na acta que, depois da argumentação do município de Monchique “já conhecida”, a ministra Francisca Van Dunem “assumiu o compromisso” de que Monchique voltaria “a ter o tribunal aberto” no ano seguinte (ou seja, em 2017).

Passados mais de cinco meses, o presidente da autarquia monchiquense introduziu e contextualizou o protocolo de colaboração entre o município e a DGAJ relativamente à reabertura do tribunal local, após o que inquiriu os membros da edilidade, não tendo nenhum dos vereadores presentes (os sociais-democratas Luís Filipe de Carvalho Grade e Arminda de Lurdes Andrez, e os socialistas Maria da Graça Batalim da Mota e José Gonçalo Nobre Duarte da Silva) na reunião ordinária da Câmara Municipal, realizada a 22 de Novembro de 2016, pretendido intervir. Assim, foi deliberada a aprovação da proposta (n.º 98/2016) por unanimidade.

Competindo à autarquia (de acordo com o estipulado na alínea o) do n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro – regime jurídico das autarquias locais) “deliberar sobre as formas de apoio a entidades e organismos legalmente existentes, nomeadamente com vista à execução de obras ou à realização de eventos de interesse para o município, bem como à informação e defesa dos direitos dos cidadãos”, regista a Acta XII/2016 desta edilidade algarvia que foi “assumido, claramente, pelos órgãos do município de Monchique, a oposição ao Encerramento do Tribunal de Monchique, ocorrido em 2015” (sic). Por conseguinte, assim que o XXI Governo Constitucional (de 2015 a 2019, presido por António Costa) “tomou posse, a Câmara Municipal solicitou audiência à senhora Ministra para abordar a questão da reabertura das instalações do Tribunal em Monchique, tendo tido nesse dia a notícia [de] que iriam ser reabertas as instalações do Tribunal em Monchique” (sic).

A Câmara Municipal de Monchique assumiu as obras “recuperação
do edifício e de colocação de equipamentos, como a sala de
audiências e os gabinetes”.

Após essa decisão, “mantendo-se o Município de Monchique como parceiro privilegiado em toda esta iniciativa, nomeadamente na cedência de instalações e promoção de obras de beneficiação [então em curso] no edifício que a Câmara optou por não ser cedido nem colocar serviços nele, sem ser as instalações da Justiça no Concelho de Monchique” – conforme menciona a Acta XII/2016, referente à reunião do executivo municipal de 22 de Novembro – e considerando as “diversas reuniões de trabalho com os serviços do Ministério da Justiça[,] tendo em vista o processo de reabertura destas instalações” (que se previa no início de 2017), bem como o envio, em 3 de Novembro, por parte do director-geral da DGAJ de uma proposta de protocolo a celebrar entre as instituições, o presidente da edilidade (Rui André) sugeriu que fosse deliberada a aprovação do dito protocolo de colaboração com a Direcção-Geral da Administração da Justiça. O que sucedeu, tendo essa importante decisão sido aprovada em minuta, no final da sessão.

Tribunal de Monchique iria voltar a abrir, em Janeiro de 2017. A garantia tinha sido dada pela secretária de Estado adjunta e da Justiça

A 15 de Novembro de 2016, o título de um artigo assinado pela directora do jornal Sul Informação, realçava que “Tribunal de Monchique já está em obras para reabrir em Janeiro”.

Como escreveu Elisabete Rodrigues, o Tribunal de Monchique, cujo fecho foi determinado em 2014, pelo Governo de Passos Coelho, iria voltar a abrir em Janeiro de 2017. A garantia tinha sido dada pela secretária de Estado adjunta e da Justiça, em recente visita ao Algarve. Na ocasião da sua deslocação à vila de Monchique, a governante Helena Mesquita Ribeiro declarou ao Sul Informação que, da parte do Ministério da Justiça, estava tudo pronto para a reactivação do Tribunal de Monchique no início de Janeiro. A secretária de Estado adjunta e da Justiça alertou, porém, que a reabertura deste e de outros tribunais que, nessa altura, estavam fechados há dois anos, no âmbito do novo mapa judiciário promovido pelo anterior Governo (liderado por Passos Coelho), estava dependente da aprovação, pela Assembleia da República, de um diploma, pelo que – como acautelava Helena Mesquita Ribeiro – ainda poderia “haver alguma derrapagem no prazo”.

O Tribunal de Monchique, cujo fecho foi determinado em 2014, pelo
Governo de Passos Coelho, iria voltar a abrir em Janeiro de 2017. A
garantia tinha sido dada pela secretária de Estado adjunta e da
Justiça, Helena Mesquita Ribeiro, que se deslocou ao Algarve. Na
foto, vemos a governante a trocar impressões com o autarca Rui
André. (© Sul Informação)

Anota o Sul Informação que a governante fez questão de salientar o “excelente contributo por parte da Câmara de Monchique” para a reactivação do tribunal. “E, de facto, as obras no edifício municipal que há anos acolhe o Tribunal de Monchique vão de vento em popa, como revelou o presidente da Câmara Rui André”, prossegue Elisabete Rodrigues, esclarecendo que estavam a decorrer obras de “recuperação do edifício e de colocação de equipamentos, como a sala de audiências e os gabinetes”. Isso porque, como regista o jornal algarvio, apesar de o “edifício, propriedade da autarquia, até ser relativamente novo, quando a anterior ministra da Justiça [Paula Teixeira da Cruz] deu ordem de fecho, também ordenou que todo o equipamento do tribunal fosse de imediato retirado”. “Como a Câmara Municipal se recusou a fazer esse serviço, por não concordar com o fecho do Tribunal, enviaram para cá a tropa e eles arrancaram tudo, mobílias, chão, portas, tudo! Algumas mobílias estavam aparafusadas ao chão e nem se deram ao trabalho de as desaparafusar, foi tudo arrancado, levando o chão atrás”, como lamentou o autarca Rui André, em declarações ao Sul Informação.

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Autarquia “não estava a contar com esta despesa”

“Isto ficou numa situação tal, que fomos obrigados a fazer uma intervenção mais profunda”, comentou Rui André, reconhecendo que a autarquia monchiquense “não estava a contar com esta despesa”. “Acabei por concordar, porque o que nós pretendemos é que o Tribunal reabra o quanto antes”, justificou, nessa altura, o edil social-democrata. Em tom crítico, o presidente do executivo, afirmou que para reabrir o Tribunal, a Câmara, que já cedia o edifício ao Estado, gratuitamente, ainda teve de “arcar com as obras de reparação, de reequipamento da sala de audiências e gabinetes e ainda pinturas”, o que envolveria uma despesa de 50 mil euros nestas obras, que incluíram também trabalhos de pintura na Conservatória, situada no mesmo edifício.

“Vamos deslocar para o edifício um dos nossos funcionários, que ficará
instalado no piso de cima, que já não será usado pelo Tribunal”, elucidou o
então presidente da Câmara Municipal de Monchique, Rui André.

“Mas o investimento da autarquia não se fica por aqui” – adiantava o Sul Informação –, já que a Câmara Municipal de Monchique também acordou “ceder um funcionário administrativo, que possa dar apoio na secretaria do Tribunal, sempre que o funcionário judicial esteja a acompanhar um julgamento ou diligência”. “Vamos deslocar para o edifício um dos nossos funcionários, que ficará instalado no piso de cima, que já não será usado pelo Tribunal”, elucidou Rui André, sustentando que, nos dias em que não for necessário, esse funcionário continuaria “a fazer o seu trabalho normal para a Câmara, já que será, no fundo, uma pessoa mais polivalente”.

“Para nós, ainda que não conheçamos bem os pormenores das valências que voltarão a existir em Monchique, a reabertura do Tribunal é muito importante. É o regresso ao nosso concelho de um serviço do Estado. É uma questão simbólica, mas também de proximidade, para as pessoas não terem de deslocar-se para fora do concelho para obter um simples registo criminal”, prosseguiu o autarca monchiquense, relembrando que, mesmo depois de o tribunal ter sido fechado, a edilidade “nunca” baixou os braços.

“E, desde a primeira hora, sempre pus a possibilidade de isto ser uma situação reversível, pelo que nunca usámos o edifício para outro fim”, assegurou o social-democrata Rui André, no seu depoimento ao Sul Informação, concluindo: “Nós não estávamos à espera de ter de investir tanto dinheiro na reabertura, mas agora não posso regatear esforços. Predispus-me a ajudar em tudo, eliminando qualquer problema e fazendo parte da solução”.

“Isto ficou numa situação tal, que fomos obrigados a fazer
uma intervenção mais profunda”, comentou presidente do
executivo Rui André, reconhecendo que a autarquia
monchiquense “não estava a contar com esta despesa”.
(© Sul Informação)

Entretanto, na reunião ordinária em 20 de Dezembro de 2016, a Câmara Municipal tomou conhecimento da assinatura do aludido protocolo DGAJ, o qual “corporiza a colaboração” do município com o Ministério da Justiça, com vista à reabertura do tribunal de Monchique, então, previsto para 4 de Janeiro de 2017.

Assim aconteceu. Na primeira quarta-feira de 2017, o jornal Sul Informação destacava a notícia “Tribunal de Monchique reabre hoje, mas com serviços reduzidos”, lembrando que esta instância local, cujo fecho tinha sido determinado em 2014, pelo Governo de Passos Coelho, voltava “a abrir formalmente”, a 4 de Janeiro, com o senão de não repor “todos os serviços que tinha antes”.  Relativamente ao período anterior ao seu encerramento, este estabelecimento judicial, ao operar no sistema de proximidade, passava, entretanto, a proporcionar, principalmente, a recepção de documentos, bem como a prestar informações, ouvir testemunhas por videoconferência e, igualmente, efectuar algumas diligências, podendo eventualmente ser usado para julgamentos em determinados casos.

Como escreveu Elisabete Rodrigues (directora deste jornal algarvio), “Monchique é mesmo um dos nove entre os 20 tribunais que reabrem em todo o país e para cujo funcionamento as autarquias tiveram de ceder funcionários municipais”. Contudo, o Ministério da Justiça já tinha esclarecido que “nenhum funcionário das autarquias pode aceder aos processos judiciais, garantindo-se assim o necessário sigilo”.

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Reabertura dos tribunais fechados pelo anterior Governo

Nessa quarta-feira, reabriram em todo o país os tribunais que tinham sido encerrados pelo Governo anterior. “Na realidade, a maioria deles já começou a funcionar na segunda-feira, 2 de Janeiro, sendo hoje o dia oficial de reabertura em pleno, devido às férias judiciais”, observou Elisabete Rodrigues, anotando que a reactivação dos tribunais visava, segundo a ministra da Justiça Francisca Van Dunem, “combater a desertificação do interior e facilitar o acesso das populações à justiça”.

A aludida peça jornalística do Sul Informação recordava que, no decreto-lei (DL n.o 86/2016) que regulamenta a Lei da Organização do Sistema Judiciário, publicado a 27 de Dezembro, o Governo justificava a decisão: “Tornou-se assim premente a necessidade de satisfação da exigência de reaproximação dos cidadãos aos órgãos de jurisdição e de supressão ou, ao menos, de minimização do risco do não-acesso à justiça motivado por um distanciamento desrazoável entre quem procura justiça e quem a administra.”

Cerca de quatro meses depois, o Jornal de Monchique (na sua edição de 11 de Maio de 2017) dava conta da visita, na manhã do dia anterior, da secretária de Estado adjunta e da Justiça ao tribunal local, “na sequência de uma série de visitas” que a governante tinha realizado a tribunais que foram reactivados pelo XXI Governo Constitucional, liderado por António Costa.

Helena Mesquita Ribeiro reconheceu que o Governo e o Ministério da Justiça reagiram às críticas com “sentido de responsabilidade”.
(© Jornal de Monchique)

Como referia o mensário monchiquense, durante a cerimónia que decorreu na sala de audiências, a secretária de Estado – Helena Mesquita Ribeiro (que, anteriormente, exerceu como juíza dos tribunais administrativos e fiscais) – assumiu que o Governo se sentia “orgulhoso por reabrir estes tribunais”. No mesmo artigo, assinado por João Ricardo Costa, é dito que o facto de a instância judicial de Monchique, que tinha sido reaberta em Janeiro de 2017, apresentar “pouco movimento processual” não espantou a governante, a qual admitiu que, futuramente, poderia “vir a existir um reajuste” que viesse “dar um maior contributo”.

Em declarações “exclusivas” ao Jornal de Monchique, Helena Mesquita Ribeiro reconheceu que o Governo e o Ministério da Justiça reagiram às críticas com “sentido de responsabilidade”, salientando: “Já as tínhamos perce[p]cionadas. Sabíamos exa[c]tamente com o que contávamos.” Nesse sentido, a secretária de Estado adjunta e da Justiça reforçou a ideia de que o Governo pretendia, de facto, que “em todos os municípios onde exista um tribunal” que “passasse a funcionar, embora com valências reduzidas”.

A reactivação dos tribunais visava, segundo a ministra da Justiça Francisca Van Dunem, “combater a desertificação do interior e facilitar o acesso das populações à justiça”.

Por sua vez, o líder autárquico, Rui André, declarou que a abertura do tribunal local foi um acto justo, em que existiram cedências de ambas as partes. “O município garantiu recursos humanos, nomeadamente, um funcionário permanente e a intervenção necessária no edifício para a abertura”, elucidou o edil social-democrata monchiquense.

A 16 de Maio de 2017, no contexto da reunião ordinária da Câmara Municipal, o presidente do executivo informou da ida da secretária de Estado adjunta e da Justiça ao tribunal de Monchique, em 10 de Maio. Como inscreve a Acta X/2017, “a responsável governamental, acompanhada de comitiva, visitou as instalações do tribunal de Monchique, na sequência da reabertura decretada pelo Governo”. Na ocasião, a governante referiu que o tribunal de Monchique “era o último que lhe faltava visitar, dos reabertos”.

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Rui André indisponível para prestar declarações

No desenvolvimento da nossa reportagem, nunca conseguimos a anuência do presidente da Câmara Municipal de Monchique para uma entrevista presencial nem para responder a um conjunto de questões, semelhantes às que enviámos aos demais presidentes de câmara dos municípios abrangidos pelo mapa judiciário avançado por Paula Teixeira da Cruz.

A primeira tentativa de contacto ocorreu na manhã de 21 de Abril de 2021, por mensagem electrónica dirigida ao autarca social-democrata Rui André, na sequência de um telefonema atendido pela funcionária Zélia Carrilho (dada a ausência ou a indisponibilidade de outros responsáveis autárquicos), para sabermos dos impactos locais do “novo” mapa judiciário e do encerramento temporário do tribunal local. Não obstante as múltiplas diligências nesse sentido, o edil (que poderia delegar num seu representante) nunca se mostrou com vontade de prestar quaisquer declarações ao sinalAberto. A resposta da jovem telefonista – que conhecemos quando nos deslocámos a Monchique, em 26 de Agosto de 2021 – era, quase sempre, a de que o presidente da Câmara estava ausente, mas que lhe tinha transmitido a informação dos nossos diversos telefonemas.

Não obstante as múltiplas diligências nesse sentido, o edil (que poderia delegar num seu representante) nunca se mostrou com vontade de prestar quaisquer declarações ao sinalAberto.

Na altura, embora impedido de se recandidatar à Câmara Municipal de Monchique nas próximas eleições autárquicas (a 26 de Setembro) – atendendo à decisão do Tribunal Constitucional que, a 5 de Setembro de 2013, considerou “territorial a limitação de mandatos” – Rui André quis aproveitar a “luz verde” dada às candidaturas noutro local dos autarcas que completaram três mandatos consecutivos. Esclareça-se que, nestas eleições autárquicas, 50 presidentes de câmara eleitos em 2017 estavam impedidos de se candidatarem, por força da lei da limitação de mandatos. Assim, o cessante edil de Monchique concorreu à Câmara Municipal de Portimão, no âmbito da coligação “Um Novo Portimão”, liderada pelo PSD, que obteve 17,54% dos votos e elegeu dois vereadores. Neste concelho algarvio, a socialista Isilda Gomes foi reeleita presidente para o seu terceiro e último mandato consecutivo.

Em Monchique, o recente acto eleitoral autárquico (de 2021) foi vencido pela candidatura do PS, com 49,61% dos votos úteis, tendo Paulo Alves conquistado a presidência da edilidade. Os socialistas já não dominavam a Câmara Municipal desde 2009 – quando, a 11 de Outubro, o social-democrata Rui André virou a página política do concelho (com 46,73% dos votos). Nas duas seguintes eleições autárquicas (a 29 de Setembro de 2013 e a 1 de Outubro de 2017), os sociais-democratas reconquistaram a autarquia monchiquense, respectivamente, com 47,42% e 43,5% das votações.

O antecessor de Rui André na presidência da edilidade de Monchique foi o socialista Carlos Tuta que ganhou a câmara local a José Furtado, o qual tinha vencido as duas primeiras eleições para os órgãos do poder local (em 1976, pelo Partido Popular Democrático – PPD, actual Partido Social Democrata, com 40,85% dos votos; e em 1979, pela Aliança Democrática – AD, com 58,74% da votação).

O socialista Carlos Tuta venceu as eleições autárquicas de 12 de Dezembro de 1982 (com 44,7% dos votos) e nos restantes seis mandatos alcançou, sempre, maioria absoluta: 67% (em 1985, conseguindo quatro lugares dos cinco atribuídos à edilidade), 51,2% (em 1989), 51,8% (em 1993), 61% (em 1997, tendo o PS a possibilidade de ocupar quatro dos cinco lugares), 54,9% (em 2001) e 51,6% dos votos (nas eleições autárquicas de 9 de Outubro de 2005).

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“Que venha cá o juiz sempre que seja preciso”

José Manuel Sequeira, então com 53 anos, natural da vila de Monchique.

Na manhã de 26 de Agosto de 2021, falámos o com o cidadão José Manuel Sequeira, então com 53 anos, natural da vila de Monchique, onde reside. O tema da breve conversa foi, obviamente, o do encerramento do tribunal local e da sua reactivação em juízo de proximidade, o qual, segundo o Ministério da Justiça, tem competência jurisdicional para realizar – já não de forma opcional, mas obrigatória – alguns julgamentos no município onde os factos que os justificam foram praticados.

Quisemos saber da percepção deste monchiquense relativamente às alterações na organização do sistema judiciário, sempre passível de ajustamentos, e do que pensa do fecho e da posterior reabertura do tribunal da sua terra. “Era uma comarca concelhia e fazia processos de toda a espécie, assim como julgamentos. Tudo isso! Mas fechou em 2014 e as pessoas revoltaram-se. Até o senhor presidente da câmara, Rui André, se manifestou. Apareceu no rodapé da SIC. Nessa altura, ele dizia que não queríamos ficar sem tribunal”, relembra José Manuel Sequeira.

“As pessoas, quando têm algum problema, procuram resolver as questões
ali. Mas só algumas! Não é a cem por cento, mas a vinte, vamos admitir…”,
diz este trabalhador algarvio, a respeito do Juízo de Proximidade de
Monchique. 

Na sua entoação tipicamente algarvia, este cidadão monchiquense confirma: “O tribunal abriu, mais ou menos, em 2017. Abriu, mas, para julgamentos, temos de ir a Portimão, que fica a 24 quilómetros daqui.”

“Não sei se, a esta hora, já está ali alguém…”, repara José Manuel Sequeira, apontando para a Rua Prior Francisco Jorge Melo, onde se encontra o edifício do Juízo de Proximidade. “Normalmente, está um funcionário, que sempre faz qualquer coisa… As pessoas, quando têm algum problema, procuram resolver as questões ali. Mas só algumas! Não é a cem por cento, mas a vinte, vamos admitir… Se calhar, a cinquenta não será!

É uma coisinha leve…”, prossegue, informando que – sobretudo, no tempo em que o tribunal local esteve com as portas fechadas – as pessoas tiveram de se deslocar a Portimão, o que implica despesas suplementares. “É claro! Vão na camioneta de carreira ou de táxi, se não têm carro”, confirma este monchiquense, exemplificando com os casos de inibição de condução em que os infractores ou arguidos são condenados a entregar a carta de condução e que – no prazo de 10 dias, contados a partir do trânsito da sentença –, poderão dirigir-se à secretaria do tribunal (ou do juízo de proximidade).

“A gente vai ali e pode entregar a carta de condução”, insiste José Manuel Sequeira, contudo, habitualmente, os cidadãos dirigem-se a uma secção de contraordenações do comando distrital da PSP ou a um gabinete de atendimento ao cidadão do comando distrital ou destacamento de trânsito da GNR da sua área de residência. “Quanto a julgamentos ou a outra coisa qualquer, acho que não tem havido nada. Porém, quando o tribunal esteve fechado, foi ainda mais incómodo. Ia toda a gente para Portimão. Antes, diziam que o tribunal iria passar para Aljezur, mas não foi assim…”, comenta este trabalhador do Algar – Centro de Triagem do Barlavento, que faz a recolha selectiva de papel e de cartão, de embalagens de vidro e de plástico, bem como de embalagens de metais ferrosos e não ferrosos, entre outros resíduos.

“Nunca é justo fechar um tribunal, de maneira nenhuma! Sendo pouco o que resolve, sempre é melhor que exista, porque faz falta. E quem diz o tribunal diz todos os outros serviços”, considera o monchiquense José Manuel Sequeira.
Acerca dos impactos do fecho temporário do tribunal no comércio da vila,
o monchiquense José Manuel Sequeira responde: “Não teve influência,
porque isto está morto! Mas não foi justo. Tudo o que acaba aqui, onde há
pouca população, é pior para Monchique.”

Acerca dos impactos do fecho temporário do tribunal no comércio da vila, o monchiquense José Manuel Sequeira responde: “Não teve influência, porque isto está morto! Mas não foi justo. Tudo o que acaba aqui, onde há pouca população, é pior para Monchique. Agora, continua a existir um estabelecimento da Justiça, mas, verdadeiramente, não existe um tribunal. Nunca é justo fechar um tribunal, de maneira nenhuma! Sendo pouco o que resolve, sempre é melhor que exista, porque faz falta. E quem diz o tribunal diz todos os outros serviços.”

Como homem prático, acrescenta: “Se a gente tem um pêro [este algarvio alude a uma variedade de maçã, mas nem todas as maçãs são pêros] e o corta ao meio, dá para duas pessoas. Se forem quatro pessoas, esse pêro terá de ser cortado em quatro partes. O pêro tem de dar para todos. Aqui, é o contrário. Como os habitantes são poucos, não digo que o tribunal esteja aberto todos os dias com um funcionário à espera, mas que venha cá o juiz sempre que seja preciso.”

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Paulo Rosa: “Um tribunal num concelho transmite uma sensação de segurança”

Paulo Rosa, delegado da Ordem dos Advogados em Monchique e autor do livro de poesia “O Perfume da Esteva”.

A 4 de Novembro de 2011, depois de várias conversas telefónicas sobre a justiça que não se lê nos mapas, o jornal sinalAberto entrevistou o advogado Paulo Alexandre Duarte Rosa, que, como ele costuma dizer, se deslocou de Monchique a Portimão para aí nascer, no ano de 1958. Licenciado em Direito e pós-graduado em Estudos Europeus pela Faculdade de Direito de Lisboa, Paulo Rosa obteve também um “master” em Interculturalismo e Ambiente pela Università Ca’ Foscari, em Veneza. Profissionalmente, é advogado e professor do ensino secundário.

O advogado Paulo Rosa foi eleito deputado
municipal na Assembleia Municipal, como
independente (pelas listas do PSD), e também
vereador na Câmara Municipal monchiquense.
(cm-monchique.pt)

Na sua vida multifacetada e interventiva, em diversas frentes, foi o primeiro presidente – cargo que exerceu durante vários mandatos – da associação ambientalista “A Nossa Terra”, da qual viria a ser presidente da Assembleia Geral. Alguns críticos não compreendem que tenha acumulado funções aparentemente contraditórias, ao ser também presidente da Assembleia Geral do Clube de Caça e Pesca de Monchique. Na política local, Paulo Rosa foi eleito deputado municipal na Assembleia Municipal, como independente (pelas listas do PSD), assim como assumiu o cargo de vereador na Câmara Municipal monchiquense, enquanto independente (pelas listas do PSD), no mandato de 1993 a 1997. Todavia, é na qualidade de delegado da Ordem dos Advogados em Monchique que presta declarações ao sinalAberto.

Sendo também, há um quarto de século, presidente da direcção da Rádio Fóia e director do Jornal de Monchique, Paulo Rosa conhece visceralmente a realidade algarvia, sobretudo a do município de Monchique. Por isso, apercebe-se das múltiplas variações sociais, económicas e culturais deste concelho algarvio, nomeadamente as que resultaram no contexto do então “novo” mapa judiciário, incluindo o encerramento temporário do tribunal.

“Ao longo dos tempos, o tribunal de Monchique sofreu várias vicissitudes, tendo sido extinto, recuperado, criado em comarca e esta extinta. O fecho dos serviços gerou sempre grande descontentamento da população, atenta a interioridade do concelho, a considerável distância das cidades mais próximas e a deficiente rede de transportes públicos existente”, declara o delegado da OA em Monchique ao sinalAberto.

O Governo, em 1995, construiu um novo edifício no local do velho
tribunal, cedido gratuitamente pelo município de Monchique, que era o
seu proprietário, num investimento de mais de um milhão de euros”.

“Ao longo dos últimos trinta anos, atentas as notícias que, de vez em quando, vinham a lume, sobre a eventual extinção da comarca, os vários governos afirmaram que tal não estava previsto. Dando ainda mais fé a estas promessas, o Governo, em 1995, construiu um novo edifício no local do velho tribunal, cedido gratuitamente pelo município de Monchique, que era o seu proprietário, num investimento de mais de um milhão de euros”, prossegue o advogado Paulo Rosa, comentando: “Confiou-se que a Administração Central cumpriria o acordado, o que não aconteceu. Ficou mais pobre o concelho, desvalorizou o património edificado da vila, por diminuição do movimento de pessoas, aumentaram as dificuldades de acesso à justiça para uma população maioritariamente idosa e perdeu-se uma fatia importante de dignidade, associada à existência da representação do poder judicial.”

“Ficou mais pobre o concelho, desvalorizou o património edificado da vila,
por diminuição do movimento de pessoas, aumentaram as dificuldades de
acesso à justiça para uma população maioritariamente idosa”, constata o
advogado Paulo Rosa.

Tendo em conta o período em que o tribunal local esteve encerrado, o causídico Paulo Rosa julga que “não se pode afirmar que aumentou a criminalidade, ou que, se aumentou, tenha sido por esse motivo”. “No entanto, a mera existência de um tribunal num concelho transmite uma sensação de segurança às pessoas e inibe comportamentos disruptivos e anti-sociais”, observa o advogado monchiquense, alegando não dispor de “dados seguros sobre as alterações do volume processual” e que “não gostaria de apresentar dados com a falácia com que o Ministério da Justiça, na altura da extinção da comarca, o fazia, considerando na estatística apenas os processos que chegavam ao fim com julgamento”.

“Ora, sabemos que uma grande parte dos processos, e não só de natureza penal, termina por acordo ou desistência, ou, no caso estritamente penal, pode passar até pela suspensão provisória dos processos, o que acontece muito na pequena criminalidade, a mais vulgar em concelhos como Monchique”, esclarece o jurista, que, entre outros cargos, também preside à direcção da Associação de Produtores de Medronho do Barlavento Algarvio e ao Conselho Disciplinar da Federação de Caçadores do Algarve.

“Numa próxima reforma – e haverá sempre mais reformas –, o desejável seria que os serviços de justiça fossem melhor distribuídos pela geografia do país, de modo a firmar a autoridade do Estado e a ajudar a ocupação efectiva do território”, considera o advogado monchiquense Paulo Rosa.

A seu ver, o encerramento do tribunal de Monchique, a exemplo do que sucedeu noutros municípios, contrariou as políticas de proximidade e de coesão territorial. “Sem qualquer dúvida, a realização de políticas socialmente justas e equilibradas passa pela descentralização dos serviços, da sua migração do centro para a periferia e não o que acontece normalmente, que é o contrário”, argumenta Paulo Rosa.

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“O desejável seria que os serviços de justiça fossem melhor distribuídos”

“Numa próxima reforma – e haverá sempre mais reformas –, o desejável seria que os serviços de justiça fossem melhor distribuídos pela geografia do país, de modo a firmar a autoridade do Estado e a ajudar a ocupação efectiva do território”, manifesta o advogado monchiquense. Pois, na sua opinião, “o funcionamento de um tribunal, com o movimento social que gera, contribui notoriamente para isso”. Daí que, na sua perspectiva, “uma forma de compensar estes territórios onde apenas foram criados juízos de proximidade seria, pelo menos, a implantação de um juízo de competência especializada, embora a competência genérica, como existia fosse o sistema mais justo, mais equilibrado e que melhor servia as populações”.

A respeito da tão propagada inoperância ou da inadequação das políticas de proximidade, o delegado da AO em Monchique diz que “o que acontece é que os sucessivos governos têm uma tendência centralizadora, até para melhor contentarem os boys partidários, sempre sequiosos de cargos de chefia, mas perto dos centros de decisão”. “Inclusivamente os quadros de pessoal da função pública, estão muito deficitários, não conseguindo prestar devidamente os serviços para os quais existem”, repara o causídico, ilustrando: “Veja-se, por exemplo, as conservatórias de registo predial, comercial, civil e de automóveis que estão em colapso total, um pouco por todo o país, por falta de funcionários e de chefias. A Conservatória de Monchique tem um quadro de cinco funcionários, mas só tem dois no activo. No entanto, meia hora antes de abrir, costuma ter cerca de vinte pessoas à porta para serem atendidas; pessoas de fora do concelho, porque nos outros concelhos vizinhos a situação ainda é mais grave.”

Na perspectiva do advogado Paulo Rosa, “uma forma de compensar estes territórios onde apenas foram criados juízos de proximidade seria, pelo menos, a implantação de um juízo de competência especializada, embora a competência genérica, como existia fosse o sistema mais justo, mais equilibrado e que melhor servia as populações”.

Questionado sobre uma hipotética poupança ou diminuição de custos com a aplicação do novo mapa judiciário e o consequente encerramento de tribunais, Paulo Rosa recorda que, “no ponto 7.3 do Memorando de Entendimento com a denominada Troika, o Governo português comprometeu-se a reduzir o número de comarcas judiciais para o número de 39”. “Ora, nem só não havia nenhum estudo consistente de que esta diminuição iria poupar custos ao Estado e muito menos ao país, o Governo de então [XIX Governo Constitucional, liderado por Pedro Passos Coelho, entre 2011 e 2015], mais papista que o Papa, e por boleia pedida à Assembleia da República, via Lei n.o 62/2013, de 26 de Agosto, reduziu as comarcas para 23, e não para 39”, critica o delegado da OA em Monchique, adiantando: “Não podemos nunca dizer que se poupa, quando o país fica a gastar mais e, apenas, o Estado, por uma visão orçamental enviesada aparenta gastar menos”.

No dito processo de reorganização do mapa judiciário, “não houve diálogo com o poder local nem com os organismos ligados à justiça, como os órgãos locais e regionais da Ordem dos Advogados”, afirma Paulo Rosa.

A propósito da reorganização do mapa judiciário, o advogado Paulo Rosa admite que “é difícil sondar as razões de medida tão irracional”. “Certamente, um misto de insensibilidade, de ignorância e de prepotência”, verifica, reconhecendo que foi precipitado o avanço do “novo” mapa judiciário em Setembro de 2014. “Foi uma asneira. Não foi suportado num estudo multidisciplinar e foram invocados factos que não correspondiam à realidade para justificar a concentração dos serviços judiciais, como a pendência processual e a falta de instalações adequadas. Monchique, por exemplo tinha – e tem –, um edifício novo e apetrechado”, censura o causídico de Monchique, o qual assegura que “também não houve diálogo com o poder local nem com os organismos ligados à justiça, como os órgãos locais e regionais da Ordem dos Advogados”.

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Por uma justiça mais próxima dos cidadãos

A justiça mais próxima dos cidadãos deveria ser uma realidade sempre presente, bem como um conjunto de serviços públicos indispensáveis à regular vivência em comunidade. Todavia, como constata Paulo Rosa, “o fecho de serviços num concelho do interior como Monchique, na medida em que obriga as pessoas a deslocarem-se aos concelhos vizinhos (ou distantes), para resolverem os seus problemas, diminui o aviamento do comércio e inibe o investimento, e estimula a desertificação – o que se tem verificado –, diminuindo a população residente, a cada censo ou recenseamento demográfico realizado”.

Perante a decisão de se avançar com o “novo” mapa judiciário, em 2014, Paulo Rosa subscreve a ideia de que a tutela, durante o mandato ministerial de Paula Teixeira da Cruz, não sabia o que era preciso para a dita reforma da Justiça. “Não fazia a mínima ideia do que é o país e do que é viver na província. É o grande problema dos nossos políticos, educados por uma cultura citadina, em que está tudo ao alcance de um gesto que carrega num botão e em que as inteligências individuais se submetem babosamente à opinião dos chefes, igualmente betinhos da city”, ironiza o jurista algarvio. “Temos um país real em quase todo o território e um país virtual em Lisboa”, comenta o delegado da OA em Monchique.

“O fecho de serviços num concelho do interior como Monchique, na medida em que obriga as pessoas a deslocarem-se aos concelhos vizinhos (ou distantes), para resolverem os seus problemas, diminui o aviamento do comércio e inibe o investimento, e estimula a desertificação”, conclui o advogado Paulo Rosa.

Ao atender a algumas reformulações no mapa judiciário, em 2017, já sob a liderança de Francisca Van Dunem, o nosso entrevistado confirma que essas alterações “diminuíram os danos, mas já se tinha começado a instalar uma cultura de centralização e de comodismo nos próprios magistrados – que não gostam de se deslocar para fora do seu local normal de trabalho – e a movimentação dos funcionários já tinha sedimentado rotinas”.

Perguntamos a Paulo Rosa se a redefinição do mapa judiciário atingiu os objectivos então apontados pelo Governo de Passos Coelho, mas o causídico monchiquense desconhece “quais eram os objectivos do Ministério da Justiça e do Governo, nem se foram cumpridos”.

“Na altura, em 2014, fui redactor e primeiro subscritor de uma petição pública dirigida ao Governo a pedir a criação de um juízo de proximidade em Monchique, para esbater os danos. O documento, profusamente assinado foi entregue na residência oficial do primeiro-ministro. Ainda estamos à espera da resposta”, recorda Paulo Rosa.

Por fim, perguntámos a este jurista algarvio se acredita na eventual melhoria dessa reorganização judiciária, visando acabar com a morosidade dos processos e garantir o acesso à justiça por parte de todos os cidadãos. “A justiça é uma miragem, uma estrelinha que se vê ao longe e que nunca se alcançará. Mas é, a par da segurança, mas superiormente a ela, o principal valor social que um Estado pode promover. A aproximação mais e mais dessa estrelinha é um encargo do Estado. Porém, o que se está, neste momento, a constatar, a par do mau funcionamento do sistema de Apoio Judiciário, é uma cada vez maior dificuldade dos cidadãos no acesso à justiça, que, cada vez é mais cara, está mais distante (apesar da medida correcta da criação dos juízos de proximidade) e colhe menos confiança junto dos cidadãos”, lamenta o delegado da OA em Monchique.

“A justiça é uma miragem, uma estrelinha que se vê ao longe e que nunca se alcançará. Mas é, a par da segurança, mas superiormente a ela, o principal valor social que um Estado pode promover”, salienta o jurista Paulo Rosa.

Ao concluir a entrevista, Paulo Rosa recordou ao jornal sinalAberto algumas ocorrências ou circunstâncias que, a seu ver, merecem mais atenção no quadro da Justiça: “o caso do concurso para Procurador Europeu” (referindo-se à polémica sobre a escolha do procurador José Guerra para Procurador Europeu, cujo processo se arrastou desde o final de 2018, tendo havido concurso antes de haver lei e regras para isso); “o controlo do Ministério Público pelo poder político, diminuindo-lhe a autonomia, e na organização hierárquica”; “a tentativa de retirar poderes e de controlar a Ordem dos Advogados” (o que, na sua óptica, também sucede com outras ordens profissionais); “a promiscuidade entre as magistraturas e o poder político”; “a sensação pública de que os políticos e os poderosos se safam sempre”; e ainda “os maus exemplos que os governantes, ao mais alto nível, dão do desrespeito pelas próprias leis que fazem, transmitindo a ideia de que a Lei não é igual para todos”.

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09/02/2023

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A SEGUIR:

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João Paulo Dias: “Temos uma tradição municipalista e um Estado centralista”

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(*) Nas próximas semanas, no jornal sinalAberto, continuaremos a desenvolver o dossiê com o título genérico “Justiça: o que não se lê no mapa”, no âmbito das Bolsas de Investigação Jornalística 2020, atribuídas pela Fundação Calouste Gulbenkian.

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Vitalino José Santos

Jornalista, cronista e editor. Licenciado em Ciências Sociais (variante de Antropologia) e mestre em Jornalismo e Comunicação. Oestino (de Torres Vedras) que vive em Coimbra.

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