Lenda do bolo-rei

(prendasnatal.pt)
Desta vez, não vamos falar de uma expressão popular, mas de uma lenda portuguesa: a lenda do bolo-rei.
Conta a lenda que, num país distante, viviam três homens sábios que analisavam e estudavam as estrelas e o céu. Esses sábios eram Gaspar, Melchior e Baltazar, tidos como os três Reis Magos, os quais, ao observarem o céu, viram uma nova estrela, muito mais brilhante que as restantes, movendo-se no firmamento. Eles interpretaram-na como um aviso de que o filho de Deus tinha nascido. Assim, resolveram segui-la até Belém, para adorar o Menino Jesus. E levaram consigo três presentes: incenso, ouro e mirra, para presentearem o Messias. Todavia, à entrada da gruta, depararam-se com um problema. Qual deles teria o privilégio de ser primeiro a oferecer um presente ao recém-nascido?
Um habitante da região ouviu a discussão entre os Reis Magos e propôs uma solução. A sua mulher faria um bolo e, na massa, colocava uma fava. O bolo seria repartido pelos três reis e àquele que lhe calhasse a fava teria o tão desejado privilégio.
Todos concordaram e o bolo foi feito, mas a mulher que o confecionou não se limitou a fazer um simples bolo. Representou nele os presentes que os Reis Magos tinham para oferecer ao Menino Jesus.


portuguesa, Manuel de Arriaga. (historiaschistoria.blogspot.com)
Assim, fez um bolo com a côdea dourada, em alusão ao ouro que Belchior trazia para oferecer; inseriu frutas cristalizadas, como referência à mirra que o rei Baltazar trazia; e polvilhou o bolo com açúcar, para simbolizar o presente de incenso do rei Gaspar.
A lenda é omissa sobre a quem calhou a fava, mas a tradição do chamado bolo-rei perdura até hoje.

Curiosamente, em Portugal, com a implantação da República, em 1910, os novos governantes, que não queriam nada com a monarquia, passaram a chamar ao bolo-rei, bolo-presidente e até bolo-Arriaga, em homenagem ao primeiro Presidente eleito da República Portuguesa, Manuel de Arriaga.
Em 7 de Janeiro de 1911, o Diário de Notícias não fazia as coisas por menos: “O bolo-rei tende a decair ou desaparecer – Terá de ser substituído?” Porém, o novo nome republicano não pegou e o povo continuou a chamá-lo de bolo-rei, associando-o tradicionalmente à época natalícia.

Sendo-lhe atribuídas origens diversas, diz-se que a ideia de um bolo misturado com fruta cristalizada terá surgido na corte do rei Luís XIV, em França. A receita foi, entretanto, adaptada pelos Portugueses e adquiriu a forma de coroa. Supostamente, a introdução da fava remonta ao tempo dos Romanos, que tinham o costume de, durante as suas festividades, elegerem o “rei da festa”, colocando uma fava num bolo.

Quanto à introdução de um brinde – que já não se pratica por ser considerada perigosa, principalmente para as crianças –, o decreto-lei n.º 158/99 proibiu “a comercialização de géneros alimentícios que contenham brindes misturados”, dando uma excepção ao bolo-rei “por razões de reconhecida tradição cultural”. Contudo, posteriormente, o diploma foi revisto. Curiosamente, a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) alega que a lei não impede a comercialização do tradicional bolo-rei com brinde, embora proíba a venda de géneros alimentícios com mistura directa de brinde. Concluindo, “não é proibido”, mas também não é permitido como era antes.
24/11/2022