Levantar os olhos

 Levantar os olhos

Possessed Photography (Unsplash)

Já não existe opção. Sem tecnologias da informação e sem Internet o nosso mundo já não funciona. No princípio, tudo foi muito lento, avançando-se com pequeníssimos passos cheios de hesitação e de incerteza. Um computador aqui, uma pequena rede ali, uma nova solução para armazenar dados acolá. Em pouco tempo, no entanto, tudo explodiu, passando-se de ambientes laboratoriais muito restritos para países, continentes, o mundo inteiro. Mais uma vez, a raça humana demonstrou a sua superioridade, a sua capacidade para moldar o seu ambiente e para decidir o seu destino. Com as novas ferramentas, passámos a ditar a nossa própria evolução, escolhendo o caminho que percorremos. Às vezes, porém, as coisas não correm como planeado, tal como já nos demonstrou a História vezes sem conta. Será que nunca vamos aprender?

É claro que não podemos dispensar a grande quantidade de ferramentas tecnológicas que estão na base do enorme conhecimento científico que detemos e de inúmeros avanços essenciais a uma vida melhor. Tudo isso é certo. Ninguém pode contestar o contributo que as tecnologias da informação e comunicação têm dado para praticamente todas as áreas da nossa sociedade. Mas a questão é que, pelo menos até agora, esse contributo se registou sempre em situações nas quais somos nós, humanos, a controlar a tecnologia e não o contrário. Infelizmente, algo parece estar a mudar e, tal como aconteceu inicialmente, também agora se começa com pequenos passos, muito bem intencionados.

Um desses pequenos passos consiste na chamada Internet das Coisas (Internet of Things, IoT). Com a IoT, os sistemas computacionais podem monitorizar e controlar fenómenos físicos e sistemas reais. Nestes sistemas, incluem-se também as pessoas, caracterizadas por vários parâmetros biométricos. Podemos, agora, monitorizar as pessoas, a sua localização, os seus comportamentos, os seus hábitos, a sua condição física. As vantagens são inúmeras, o potencial é enorme, mas as ameaças também. Outro pequeno passo tem a ver com os sistemas inteligentes. É agora possível que os sistemas computacionais “percebam” o ambiente que os rodeia, que “raciocinem” e que analisem todo o tipo de dados, tomando decisões. Igualmente neste caso, as aplicações são incontáveis, as vantagens são inúmeras e o limite é apenas imposto pela imaginação (das pessoas ou das máquinas). Combinando as duas tecnologias – IoT e inteligência artificial –, os sistemas computacionais podem agora entender-nos, aconselhar-nos e, além disso, decidir que informação nos devem apresentar e o que é bom para nós. Se informação é poder, então, se não controlamos a informação que nos chega, deixamos de ter poder e, sobretudo, liberdade.

É curioso que, muitos de nós, ficamos maravilhados com tudo isto e que vemos apenas as suas vantagens, desde que não nos vedem a possibilidade de passar horas sem fim a olhar para um telemóvel, alienados com um mundo virtual, enquanto as máquinas tomam conta do mundo real. Claro que a solução para isto é muito simples: levantar os olhos dos ecrãs, olhar para o mundo que nos rodeia e não deixarmos de pensar pelas nossas próprias cabeças.

04/01/2022

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Fernando Boavida Fernandes

Professor catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, sendo docente do Departamento de Engenharia Informática. Possui uma experiência de 40 anos no ensino, na investigação e em engenharia, nas áreas de Informática, Redes e Protocolos de Comunicação, Planeamento e Projeto de Redes, Redes Móveis e Redes de Sensores. É membro da Ordem dos Engenheiros. É coautor dos livros “Engenharia de Redes Informáticas”, “Administração de Redes Informáticas”, “TCP/IP – Teoria e prática”, “Redes de Sensores sem Fios” e “Introdução à Criptografia”, publicados pela FCA. É autor dos livros “Gestão de tempo e organização do trabalho” e “Expor ideias”, publicados pela editora PACTOR.

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