Luiz Inácio Lula da Silva é reeleito presidente do Brasil
Numa das disputas presidenciais mais acirradas que o Brasil já enfrentou, com 98,81% dos votos válidos apurados, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) anuncia vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (do Partido dos Trabalhadores – PT) às 19h58 do dia 30 de Outubro. A ganhar o segundo turno com 50,90% sobre o seu adversário, e actual presidente, Jair Messias Bolsonaro (do Partido Livre – PL) com 49,10% dos votos válidos. No primeiro dia de Janeiro de 2023, Lula da Silva assumirá, pela terceira vez, a presidência da República Federativa do Brasil, sendo a primeira pessoa a ser eleita três vezes como presidente no país.
Um país que tornou-se extremamente dividido, doído pelos casos de corrupção nos governos e pelas 688 mil vítimas de covid-19 durante a pandemia, viu-se impelido a votar. Os quatro anos do governo de Bolsonaro foram repletos de crise, de agressões verbais, de abuso de poder e de informações falseadas.
A virada dos votos ocorreu com aproximadamente 68% dos votos válidos apurados e 0,01 pontos percentuais, o candidato Lula da Silva saiu à frente do candidato e atual presidente Jair Bolsonaro. O término da apuração resultou em 1,8 pontos percentuais de diferença apertada, que equivale a um pouco mais de dois milhões de pessoas para um país de proporções continentais com mais de 200 milhões de habitantes.
Em muitas cidades no exterior, a votação ocorreu amistosa e organizada. Toronto amanheceu fria e sob uma forte neblina, a impedir a visibilidade.
Entretanto, gradativamente os brasileiros sairam para votar no centro de convenções Beanfield Centre. Entrevistada pelo sinalAberto, a família de Hedy Farouk e Daniele Galvão, acrescida dos filhos, foi votar à caráter com roupas vermelhas, bandeira do Partido dos Trabalhadores com fotografia de Luís Inácio Lula da Silva e chapéu de cangaceiro a representar o Nordeste brasileiro. Hedy e Daniele mudaram-se de Natal (capital do estado de Rio Grande do Norte, no Brasil) para a cidade de Toronto, há sete anos, em busca de mais esperança e de um futuro melhor para os filhos.
“Já se falava muito do impeachment de Dilma, em 2015, quando a gente veio. Então, a gente sabe que instabilidade política leva a instabilidade económica. De lá para cá, as coisas no Brasil saíram muito do prumo. O maior bem que um país pode ter é a democracia”, afirma Hedy Farouk. A família Farouk Galvão apresenta uma das muitas faces da diversidade identitária que constituem o Brasil.
O sinalAberto também conversou com uma brasileira vestida de verde e amarelo e com a bandeira do Brasil. Ieda Macedo mudou-se, pela segunda vez, para Toronto, há oito anos, de Petrolina, cidade no interior de Pernambuco. Apesar de não ter o seu título de eleição transferido para o Canadá, acompanhou a filha à votação, neste domingo (30 de Outubro), em suporte ao candidato do PL, Jair Bolsonaro.
As suas filhas mudaram-se para Toronto para completar os seus estudos universitários e Ieda foi ter com elas, a acreditar que, aqui, ambas teriam mais oportunidades. Hoje, Ieda trabalha com translado e como motorista da Uber, enquanto as suas filhas trabalham em engenharia civil e no âmbito paralegal (profissão com conhecimentos técnicos jurídicos, porém sem permissão para actuar como advogado).
“Eu sou conservadora, então eu votaria no Bolsonaro. O que ele defende é o que eu defendo. Deus acima de tudo, eu sou cristã. Amor à pátria, apesar de não estar no Brasil. Eu amo o Brasil! Se defende a família e a liberdade, então, são essas as causas que justificariam o meu voto por ele”, refere Ieda Macedo.
Com uma fuga de cérebros, acentuada a partir da entrada de Bolsonaro na Presidência, em 2018, no exterior, tanto no primeiro quanto no segundo turno destas eleições, Lula da Silva apresentou a maioria dos votos válidos com 51,28%. Entretanto, Bolsonaro apresentou maioria dos votos válidos apenas nas jurisdições do Japão, em Boston e em Miami, ambos no primeiro e no segundo turno.
A poucos minutos de vitória, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi congratulado por representantes de Estado de diversos países, como António Costa, Joe Biden, Emmanuel Macron, Pedro Sánchez, Justin Trudeau e Alberto Fernández, na circunstância da sua eleição presidencial democrática:
Como primeiro pronunciamento, realizado ao lado dos seus apoiadores, como Marina Silva (da Rede Brasil Atual, que foi criada em 2009, resultando da parceria entre alguns sindicatos de trabalhadores), Simone Tebet (do MDB – Movimento Democrático Brasileiro) e o seu vice-presidente Geraldo Alkmin (do PSB – Partido Socialista Brasileiro), Lula da Silva realizou um discurso moderado, com a intenção de fazer aliados e de acabar com as adversidades que causaram uma cisão no país.
O seu pronunciamento apresentou as intenções para os quatro anos de governo. Bastante diferente dos seus discursos expontâneos de antigamente, Lula da Silva leu um discurso ponderado, focalizado em acabar com a pobreza e em trazer dignidade humana à população brasileira. Ao assumir compromisso com a democracia e com a constituição brasileira, o presidente eleito buscou falas que direcionassem a diversidade de partidos apoiadores para a sua candidatura, assim como a extrema conservadora presente no país.
“É preciso ir além, fortalecer as políticas de combate à violência contra as mulheres e garantir que elas ganhem o mesmo salário que os homens, no exercício da mesma função. Enfrentar sem trégua o racismo, o preconceito e a discriminação, para que brancos, negros e indígenas tenham os mesmos direitos e as mesmas oportunidades. Só assim seremos capazes de construir um país de todos, um Brasil igualitário, cuja prioridade sejam as pessoas que mais precisam. Um Brasil com paz, democracia e oportunidade”, salientou Lula da Silva, no seu discurso.
O presidente eleito reforçou que irá combater as diversas desigualdades presentes, neste momento, no Brasil fragmentado pela insatisfação para unir a população brasileira. Assumindo que não governaria para um único grupo, mas para os 215 milhões de brasileiros, inclusive aqueles que votaram pela primeira vez no candidato Lula da Silva e, consequentemente, no PT.
“Não existem dois brasis. Somos um único país, um único povo e uma única nação. A ninguém interessa viver num país dividido e em constante estado de guerra. […] É hora de baixar as armas que jamais deveriam ter sido empunhadas. Arma mata e nós escolhemos a vida”, expressa o vencedor das eleições brasileiras.
Consciente do enorme desafio que irá defrontar nos próximos quatro anos de governo, o agora eleito presidente reforça que buscará retornar a harmonia republicana entre os três poderes, as relações diplomáticas e a população. Em referência ao uso dos símbolos nacionais para incitar a discórdia e para trabalhar pautas direcionadas às questões do actual presidente, Lula da Silva afirma: “Este verde e amarelo e esta bandeira não pertencem a ninguém, a não ser ao povo brasileiro.”
Lula da Silva assume como compromisso de urgência acabar com a fome no país. Durante o governo de Bolsonaro, a disparidade entre classes acentuou-se ainda mais, a aumentar o número de miseráveis. Sem dinheiro para comprar qualquer tipo de carne, o brasileiro retornou ao consumo de ovo como principal proteína. Chegando ao ponto de catar restos de carnes fornecidos aos supermercados e que seriam descartados. No entanto, refira-se que o Brasil destaca-se entre os cinco maiores produtores de alimentos, juntamente com a China, com os Estados Unidos, a Rússia e a Índia. E entre os três principais produtores de carnes, em geral.
Em Setembro de 2022, o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) apresentou -0,29% de IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) relativo ao mês. Entretanto, o IPCA acumulado dos últimos 12 meses encontra-se em 7,17%. O poder de compra do consumidor no país reduziu consideravelmente nos últimos quatro anos. Durante o discurso, Lula da Silva também reitera que as decisões políticas serão tomadas por meio de um amplo debate e não à calada da noite, em referência ao actual presidente.
Tanto no exterior quanto no Brasil, milhares comemoram a reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva e festejam a vitória do candidato. Apenas, no primeiro dia de Novembro, o actual presidente Jair Messias Bolsonaro pronunciou-se pela primeira vez, após as eleições ocorridas no domingo, a 30 de Outubro. Em nenhum momento do seu breve discurso reconheceu a perda para Luis Inácio Lula da Silva, nas eleições presidenciais.
Jair Bolsonaro enfatizou uma suposta liberdade de expressão em referência aos protestos dos caminhoneiros em diversas rodovias pelo território brasileiro, a causar confusão em 25 estados, incluindo o Distrito Federal. Os manifestantes dizem ser contrários à vitória de Lula da Silva. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) acionou a Advocacia-Geral da União (AGU) para tomar ação contra os protestos.
03/11/2022