“Manuela Rey Is In Da House”: Festival de Teatro de Viana do Castelo 2023
Assisti ao Festival de Teatro de Viana do Castelo, no dia 11 de novembro (sexta-feira), ao espectáculo dedicado a Manuela Lopes Rey1, actriz galega que se tornou uma estrela dos palcos em Portugal, no século XIX, enquanto primeira mulher integrante do elenco residente do Teatro Nacional D. Maria II2.
Dois motivos me levaram a deslocar-me ao belo teatro vianense que passo a comentar.
O primeiro teve a ver com o meu total desconhecimento sobre esta actriz, que se tornaria uma das figuras emblemáticas dos palcos lisboetas. Tendo nascido na Galiza, emigrou muito jovem, para conquistar, como tantos outros galegos, um lugar em Portugal.
“Manuela Rey Is In Da House” é o título da peça do Centro Dramático Galego, numa coprodução com as companhias do Teatro do Noroeste – Centro Dramático de Viana (companhia residente no Teatro Municipal Sá de Miranda), do Teatro Nacional São João (TNSJ) e do Teatro Nacional D. Maria II (de Lisboa). Como podemos ler na respectiva folha de sala, “pretende trazer à luz ‘a figura’ de uma artista, cuja vida permanece envolta em mistério, mas que marcou a história do teatro nacional e a sua ligação à Galiza (Espanha).
“Do pouco que se sabe, Manuela morreu com 23 anos e está sepultada no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa”, adianta a mesma folha informativa. “É uma miúda do século XIX, que chegou a ser uma grande personalidade do teatro português da altura. Primeira atriz do elenco residente do Teatro Nacional D. Maria II, que escrevia e de que fizeram uma biografia um pouco depois da sua morte. E que, de repente, foi apagada da história”, descreve Fran Núñez, encenador de “Manuela Rey Is In Da House”, que subiu ao palco, no Teatro Municipal Sá de Miranda, em Viana do Castelo. Trata-se de um espectáculo que, dado o percurso conhecido da “atriz galega nascida em Mondoñedo, e que acabou por trabalhar e triunfar em Lisboa”, Fran Nuñez considera que “era necessário e um dever do teatro público”, concretizar.
Se procuramos informação, na Internet, sobre esta figura, ela é escassa. E a que está referida na Wikipédia, é uma tradução literal de uma publicação pela mesma enciclopédia livre, em Galego, da qual retirei os dados mais significativos sobre Manuela Rey, como as datas do nascimento e da sua morte, a par do seu percurso artístico, que menciono nas notas finais.
O outro motivo e não menos importante – “last but not least” (como dizem os Ingleses) – foi para ver uma jovem actriz que conheço desde a sua infância. Refiro-me a Teresa Vieira, filha dos meus amigos (uma verdadeira família em Portugal) Manuel Vieira e Ana Maria Vieira, que conheço há mais de quarenta anos. Teresa Vieira tem-se destacado, ultimamente, no cinema, a nível da produção e da administração de guarda-roupa, em séries e em filmes. No próximo ano, ocorrerá a estreia de um filme no qual é também protagonista: “Revolução (sem) sangue”, do realizador Rui Pedro Sousa. É um filme que visa “mostrar aos espectadores como foi a revolução na perspectiva do povo, contando a história verídica de cinco pessoas que morreram a 25 de Abril de 1974.”
Ana Teresa Vieira é licenciada em Teatro, pela Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo (ESMAE), e colaborou como actriz no Teatro Experimental do Porto (TEP), na Seiva Trupe – Teatro Vivo, onde contracenou com o seu pai, Manuel Vieira, na recente produção dessa companhia portuense de “O Crime de Aldeia Velha”, de Bernardo Santareno. Trabalhou comigo, em várias encenações, como ajudante de encenação e na direcção de actores dos exercícios finais dos meus alunos do Curso de Teatro da Escola Superior Artística do Porto (ESAP), todos eles apresentados no Mosteiro de São Bento da Vitória e no Teatro Carlos Alberto, bem como nas salas do TNSJ.
Voltando ao espectáculo “Manuela Rey Is In Da House”, esclareço que esta não é, nem pretende ser, uma crítica teatral. É, sim, um belo documento de uma pesquisa “arqueológica” teatral sobre esta actriz. Em cena, todos as actores e actrizes partilham as suas memórias iniciais no teatro. Teresa Vieira também o faz, quando narra as suas experiências no teatro amador e quando recorda como interpretou, ainda criança, a Rainha Dona Maria II, num espectáculo encenado para o TEP, com direcção do saudoso amigo Norberto Barroca.
Curiosamente, quando nos referimos ao Teatro Nacional D. Maria II, pensamos sempre, ou quase sempre, nos nomes de Amélia Rey Colaço e das companhias que exploraram as suas instalações. Porém, nada sabíamos (falo por mim) desta Manuela Rey, galega insigne, tal como a sua compatriota Maria Casares, também actriz, mas de melhor fortuna na vida.
Aos coprodutores criadores deste espectáculo e a Teresa Vieira, endereço os meus sinceros agradecimentos pela memória documental desta mulher, a quem chamam, na representação, “Mulher-Lírio”.
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Notas:
1 – María Manuela Ramona Rey González, também conhecida como Manuela Lopes Rey (Mondoñedo, 1842 – Lisboa, 1866), foi uma actriz de teatro galego-portuguesa. Escreveu algumas obras como a comédia “A actriz” e o provérbio “Por este deixarás pai e mãe”. Manuela Lopes Rey integrou uma companhia teatral itinerante, que percorreu localidades como Leão, Palência, Bragança, Valença, Ponte de Lima, Viana do Castelo, Régua e Porto. Pela sua “presença e beleza” em palco, a actriz, que também era escritora, ficou conhecida como “mulher lírio”. “Frágil e delicada, mas igualmente poderosa e brilhante”, segundo os anotações para este artigo da Wikipédia, traduzido do Galego, intitulado “Manuela Rey”.
2 – O Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, foi inaugurado a 13 de Abril de 1846, durante as comemorações do 27.º aniversário de D. Maria II.
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30/11/2023