Palestina: uma dor pulsante

 Palestina: uma dor pulsante

(Créditos fotográficos: Mohammed Abed – sicnoticias.pt)

Todos os dias, vejo os horrores de Israel contra o povo palestino. Milhares de mortos. Crianças feridas vagando, velhos perdidos na angústia, famílias revirando escombros, buscando comida. Centenas de pessoas andando pelos caminhos, sendo caçadas como num filme de Hollywood. Os “Jogos Vorazes” impiedosos dos sionistas, assassinos confessos. Uma dor que pulsa como um vidro cravado no peito. Impossível dormir. Impossível seguir vivendo como se nada… Na impotência, vamos gritando para ver se os malditos governantes do Mundo acabam com essa dor dilacerante que atravessa o corpo e a alma dos Palestinos. Mas, nada acontece.

Parentes e colegas de dois jornalistas palestinianos, Hasouna Slim e Sari Mansoor, mortos num ataque israelita, lamentam-nos durante o seu funeral em Deir al-Balah, no sul da Faixa de Gaza, em 19 de Novembro de 2023. (Créditos fotográficos: Bashar Taleb Agência France-Presse – ledevoir.com)

No meio de todo esse horror, com mais de 30 mil mortos e cidades despedaçadas, também morrem os jornalistas. Nesses tempos “tiktokers”, de dancinhas e musiquinhas, onde o jornalismo agoniza, jornalistas tentam passar ao Mundo a verdade do genocídio. Mas, estar com a identificação de “Imprensa” (“Press”) no meio do inferno promovido por Israel não vale de nada. Como não valem nada as resoluções da Organização das Nações Unidas ou coisas assim. Nenhuma regra vale para Israel. Nesses seis meses de massacre, o grupo Repórteres Sem Fronteiras já contabilizou 103 profissionais assassinados. Neste número, 91 são homens e 12 são mulheres. Vinte e dois morreram enquanto estavam com o microfone ou a câmara na mão, reportando. Assassinatos frios e calculados. Bastou estar reportando o genocídio no lado palestino e já vira alvo. Os únicos jornalistas respeitados e protegidos são os que atuam do lado das forças de Israel, contando mentiras ao Mundo.

A verdade não tem vez no território sob bombas. A verdade morre junto. A verdade é despedaçada junto com os corpos dos profissionais que insistem em reportar a realidade desde dentro de Gaza. Ali, são alvos, como qualquer um palestino. Porque o jornalismo que escancara a verdade tem de ser destruído. Basta a gente ver a agonia de Julian Assange, o primeiro a desvelar os horrores da guerra no Iraque. Preso, torturado, jurado de morte. Porque decidiu mostrar a barbárie. Os homens e as mulheres que se arriscam, hoje, nas ruas de Gaza para mostrar a realidade são filhos dessa proposta tão bem defendida por Assange: revelar as entranhas dos monstros. Expor as suas vísceras.

O chefe do escritório da Al Jazeera em Gaza, o filho de Wael Al-Dahdouh, Hamza Wael Al-Dahdouh, e Mustafa Thuraya, que também eram jornalistas, foram mortos num bombardeamento israelita contra o seu carro, na cidade de Rafah, em Gaza, no dia 7 de Janeiro de 2024. (Créditos fotográficos: Stringer/ Agência Anadolu – monitordooriente.com)

É facto que o jornalismo desapareceu dos meios comercias. Mas, pessoas há que ainda insistem, na via de outros espaços, sem a palavra “Imprensa” escrita nas costas, reportando a vida e a morte. E por mais que as bombas atravessem os corpos, outros tomarão as câmaras e os microfones e seguirão narrando. E é por causa deles que o jornalismo ainda vive em Gaza, mesmo sob os escombros do genocídio. Na Palestina, as vozes não se calam, por mais que os assassinos insistam.

O poeta palestiniano Mahmoud Darwish em Paris,
no ano de 2002. (Créditos fotográficos: Eamonn
McCabe/the Guardian – theguardian.com)

Como jornalista, me envergonha um pouco, que nem o sindicato da categoria nem a respectiva federação realizem uma campanha sistemática de repasse de informação sobre Gaza. E que tampouco pranteiem esses colegas que tombaram sob as bombas israelenses: 103 jornalistas. Cá, na minha insignificância, eu velo os seus corpos e dignifico a sua coragem, diariamente, repetindo com o imorrível Mahmoud Darwish:

Viverá. Palestina Livre.

.

02/05/2024

Siga-nos:
fb-share-icon

Elaine Tavares

Jornalista e educadora popular. Editora da «Revista Pobres e Nojentas», com Miriam Santini de Abreu. Integra o coletivo editorial da «Revista Brasileira de Estudos Latino-Americanos». Coordenadora de Comunicação no Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Federal de Santa Catarina (no Brasil).

Outros artigos

Share
Instagram