Pinotes tribais

 Pinotes tribais

(Créditos fotográficos: Movephoto – record.pt)

O Sport Lisboa e Benfica e o Futebol Clube do Porto deram o pontapé de saída da época futebolística. Por serem campeões nacionais e vencedores da Taça de Portugal, respectivamente. Anteontem, no Estádio Municipal de Braga (a “Pedreira”), o Sporting Clube de Braga e o Futebol Clube de Famalicão jogaram a primeira partida da 1.ª Liga (Liga Portugal Bwin) 2023/2024. A bola já rola, pois! A bola e os pinotes tribais, que caracterizam o triste fado do futebol por estas paragens.

(Direitos reservados)

O treinador do FC Porto, Sérgio Conceição, foi expulso na Supertaça diante do Benfica, à passagem do minuto 90+7’, contestando uma falta assinalada sobre Di María. Conceição, que já tinha recebido ordem de expulsão por 24 vezes, não acatou logo a decisão do juiz da partida e o jogo esteve interrompido por quatro longos minutos. Depois, dizem os jornais de sábado, o técnico dos “dragões” mimou Luís Godinho com insinuações e palavrões, segundo aquilo que o árbitro escreveu no seu relatório.

(Créditos fotográficos: Miguel Pereira/Global Imagens)

Em Braga, também houve mosquitos por cordas. Perto do final do jogo, registaram-se incidentes entre adeptos. Resultado: um abandonou o estádio em maca e outro foi detido pela Polícia de Segurança Pública. Tais comportamentos confirmam aquilo que se sabe há muito: a tribo do futebol1, desde o mais destacado treinador ao mais ignorado adepto, tem comportamentos que fazem regressar a hábitos civilizacionais e culturais primitivos, os quais fariam corar de vergonha o homem das cavernas.

Alguns dirigentes de clubes e a Imprensa2, sobretudo a televisiva, concorrem para o estado calamitoso em que se encontra o futebol português. Os dirigentes, pelas picardias constantes entre eles; a Imprensa, pelo tempo de antena que dispensa a arruaceiros como aqueles que gritam que o adversário é “merda”. Tal qual fizeram os adeptos portistas no momento da partida do autocarro da sua equipa rumo a Aveiro.

Em 2016, o então técnico do Bayer Leverkusen foi suspenso e multado por se recusar a sair de campo, depois de ser expulso pelo árbitro Felix Zwayer. (espn.com.br)

Basta percorrer as redes sociais e os comentários dos leitores nos jornais para confirmar a insanidade colectiva da tribo. Um exemplo: aqueles que não hesitaram em ir ao baú e invocar a recusa de Roger Schmidt em abandonar o banco do Bayer Leverkusen, depois de ter recebido ordem de expulsão, num jogo da Bundesliga, no ano de 2016. Como se uma canalhice justificasse a outra. Não, não justifica. Tal “argumento” é uma completa estupidez.

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Notas:

1 – Desmond Morris publicou a obra “A tribo do Futebol”, em 1981. No livro, o antrópologo britânico defende que o comportamento dos adeptos desportivos tem raízes no nosso passado mais primitivo e corresponde a uma forma de competição entre tribos que, desde a Pré-História, faz parte do comportamento humano. E, de facto, quando os factores identitários tradicionais estão em crise, as pessoas agrupam-se através das suas preferências clubísticas, esquecendo toda e qualquer racionalidade, e seguindo o chefe da tribo em qualquer direcção, mesmo que para o abismo. Lamento, também, que a fúria da tribo não se manifeste contra a injustiça que condena cada vez mais pessoas à miséria.

2 – Embora, tradicionalmente, o termo “Imprensa” esteja associado à informação escrita, neste texto, assume a designação colectiva dos meios de comunicação social que exercem o Jornalismo.

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14/08/2023

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Soares Novais

Porto (1954). Jornalista. Tem prosa espalhada por jornais, livros e revistas. “Diário de Notícias”, “Portugal Hoje”, “Record”, “Tal & Qual” e “Jornal de Notícias” (JN) são algumas das publicações onde exerceu o seu ofício [Fonte: “Quem é Quem no Jornalismo”, obra editada pelo Clube de Jornalistas, em 1992]. Assinou e deu voz a crónicas de rádio. Foi delegado sindical e dirigente do Sindicato dos Jornalistas (SJ) [no biénio de 1996/97, sendo a Direcção do SJ presidida por Diana Andringa], da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto (AJHLP) e membro do Conselho de Redacção do JN, do qual foi editor-adjunto do “Gabinete de Reportagem” e do “Desporto”. É autor do romance “Português Suave – Cuidado com cão” [1.ª edição “Euroedições”, em 1990; 2.ª edição “Arca das Letras”, em 2004], do livro de crónicas “O Terceiro Anel Já Não Chora Por Chalana”, da peça de teatro “E Tudo o Espírito Santo Levou” e da obra para a infância “A Família da Gata Pintinhas”. É um dos autores portugueses com obra publicada pela Editora Thesaurus, de Brasília. Actualmente, integra a Redacção do jornal digital “sinalAberto”.

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