Por um novo Brasil Colônia: voltamos, Portugal!
Começou despretensiosamente. E é claro que muitos já estranhavam desde então.
— Monarquia não é uma coisa meio antiga?
Mas alguém disse que ainda se usava em algum canto da Europa e a bem da verdade é que ninguém levava aquela ideia muito a sério. E a coisa foi indo aos poucos. De modo que o hábito ia tornando normal o estranho, já que vinha diluído em pequenas doses.
O primeiro problema foi o rei. Já há muito não se tinha. E restaurar a monarquia sem o rei pareceu a todos uma completa tolice. Bom, havia sim, seus descendentes, mas não inspiravam muita admiração. Os que sobravam da família real tinham como ofício, em sua maior parte, apenas o desemprego. Uns mais esforçados até vendiam broches com o brasão do Império. Mas, é claro, não tinham a pompa requerida.
— E se a gente voltasse com os reis antigos? Alguém propôs.
Obviamente não se podia ressuscitar Dom Pedro. A ideia era como que ir ficando com monarcas simbólicos enquanto ninguém aparecia com uma ideia melhor.
Assim foi feito. Em pouco tempo, os adeptos da nova monarquia passaram a prestar homenagens aos reis, príncipes e princesas. Coroas de flores se espalhavam pelas estátuas de toda a antiga família real. Músicas, celebrações. Louvavam os monarcas de bronze como se vivos estivessem.
As festividades se repetiam a cada semana. Em honra da solenidade, na presença da realeza de metal, os súditos passaram a se trajar como a ocasião requeria. Vestidos vitorianos, anáguas, chapéus, lenços, capas e bengalas. Mesmo desafiados pelo calor intenso, a corte, como forma de distinção, ia assumindo as novas vestimentas também no dia a dia.
Óbvio, agora o movimento já causava grande estranhamento, que só aumentou com a circulação das charretes. Os carros se viam obrigados a disputar as vias com os veículos movidos a cavalos. Isso quando não se deparavam com liteiras, às quais os monarquistas aderiram em substituição ao Uber.
Nesse ponto, a história já não tinha mais tanta graça e os que se riam dos cortesãos começaram a ficar revoltados quando certos médicos, adeptos ao movimento, passaram a receitar orações, sanguessugas e emplastros. Tudo tem limite.
Já era tarde. A guarda imperial, de baionetas em punho, repreendia os revoltosos. A situação já bem podia virar uma guerra civil. Mas, no fundo, no fundo, os opositores acreditavam que aquilo não tinha como ir para a frente. De modo que a guerra não se fez por certa falta de ânimo.
Se tornando maioria, os cortesãos já perdiam muitos pudores. Não tardou quererem voltar com a escravidão. A proposta, no entanto, causou grande comoção entre os próprios monarquistas. Não porque lhes parecesse em algum sentido estranha. A questão era de fundo econômico. Os assalariados, mesmo ganhando bem pouco, eram obrigados a se abrigar, se locomover e se alimentar a suas próprias custas. Saíam, na ponta do lápis, mais baratos que os escravos, de modo que a troca do sistema podia acabar um tanto desvantajosa aos que procuravam mão de obra.
Embaralhados nas contas, desistiram da ideia em prol de uma mais glamurosa. Os monarquistas resolveram se oferecer para serem recolonizados por Portugal. A iniciativa, obviamente, esbarrava em toda a sorte de aspectos políticos e legais. O governo lusitano sequer se deu ao trabalho de responder ao ofício vindo do Brasil, que reivindicava a desindependência.
Mas os cortesãos já tratavam Portugal por capital, mesmo que à revelia. E se foram aos montes para Lisboa. Para agradar aos da metrópole, passaram a falar ao modo que escrevia Camões. Ninguém os entendia e talvez nem eles entendessem a si mesmos. Mas parecia, a essa altura, que o mais recomendável fosse evitar mesmo qualquer entendimento do que falavam.
E assim, as estátuas dos antigos monarcas portugueses foram se enchendo também de flores e homenagens. Agora, a corte causava estranhamento em todo o mundo. E os monarquistas brasileiros, orgulhosos, estampavam as capas da imprensa mundial. Eram a elite do atraso!
Não tardou empolgarem outros pelo globo. Nos Estados Unidos, as vestimentas estranhas começavam a serem flagradas na rua de forma ainda um tanto dispersa.
— Mas monarquia não é uma coisa meio antiga? Alguém perguntou.
— Parece que ainda se usa em algum lugar da Europa…