Produtividade mais longe da média da UE e os salários não sobem

 Produtividade mais longe da média da UE e os salários não sobem

(Pixabay)

O retrato português da última década (2011-2019) – o estado da educação, de emprego e de competências – é preocupante (e tem vindo a piorar) pela perda de rendimentos e pelo recuo nas médias europeias.

Segundo a Fundação José Neves (FJN), que pretende a inversão da tendência com qualificações, para levantar produtividade e rendimentos, Portugal é um dos países da União Europeia (UE) com rendimentos mais baixos e com perdas salariais reais em praticamente todos os níveis, exceto entre os que têm menos qualificações. E a produtividade média afasta-se crescentemente dos padrões europeus. Na década em referência, o salário médio dos portugueses aumentou só para os trabalhadores com o ensino básico, na ordem dos 5%, por força do aumento da remuneração mínima mensal garantida (RMMG), determinado por decreto-lei e pela negociação coletiva.

Há um supino ou elevado problema de produtividade. Sem ela, os salários não sobem com sustentabilidade. E, sem qualificações, não há produtividade. Por isso, urge a aposta generalizada na formação ao longo da vida, na reconversão profissional e na aquisição de competências.

Créditos: Gerd Altmann (Pixabay)

Carlos Oliveira, presidente da FJN, sustenta que “precisamos de apostas de educação diferentes para gerações diferentes” e de acelerar as qualificações, pois há vários retornos que se conseguem com a educação: melhor salário, vantagens sociais, bem-estar, etc.

É certo que, a nível das requalificações e das formações, nos últimos anos, o efeito é positivo, mas “os que têm menos competências não estão a aumentá-las”, o que é preocupante. Por isso, a FJN traça um conjunto de metas aspiracionais para 2040, que passam por incentivos à educação capazes de “garantir um futuro mais próspero para Portugal e para os portugueses”. São ambiciosos os seus objetivos: colocar o país no top 10 dos países da EU, com mais emprego em tecnologia e conhecimento; ter, pelo menos, 25% dos adultos a participar em educação e formação ao longo da vida; ter um máximo de 15% dos adultos (dos 25 aos 64 anos) com baixa escolaridade (atualmente, é de 40,5%) e, pelo menos. 60% dos jovens adultos com o ensino superior (correspondendo a 47,5%); e conseguir que 90% dos jovens recém-formados tenham emprego.

Créditos: sigre (Pixabay)

Depois, é preciso discutir o que há a fazer, que programas e modelos são mais apropriados. Com efeito, segundo a FJN, a educação em 2022 é praticamente igual à de 1950 (exagero só aceitável para quem não conhece a escola!), pois mudar não é trazer computadores à equação, mas “discutir profundamente modelos e competências que são fundamentais”. É, segundo Oliveira, necessária uma sólida formação de base, a que se adicionem grupos de competências, nomeadamente de soft skills, de comunicação, mais práticas, a par da aceleração da digitalização para o trabalho do futuro e da definição de metas exequíveis, que se foquem nas qualificações das pessoas e nas necessidades do mercado de trabalho, para um aproveitamento ótimo das qualificações. Isto implica motivar as pessoas, criar-lhes exigências e levar à Universidade quem nunca lá foi, de modo que tenhamos um ensino dual, mais cientifico-técnico e próximo do mundo de trabalho.

Como não há profissões para a vida, importa assegurar um conjunto de capacidades que permitam aceder a clusters de carreira, não bastando traçar diagnósticos, mas passando a dar pistas quanto a um rumo que possa melhorar as perspetivas dos portugueses e, também, contribuir para aumentar a riqueza e o crescimento do país. Para tanto, a própria FJN constituiu um programa de bolsas que visa melhorar e aumentar competências (e que já dá frutos), e trabalha articuladamente com as universidades do Minho e de Aveiro, permitindo ver mais além e encontrar, por exemplo, uma relação entre os retornos da educação e o bem-estar.

Como não há profissões para a vida, importa assegurar um conjunto de capacidades que permitam aceder a clusters de carreira, não bastando traçar diagnósticos

O presidente da FJN realça alguns dos parâmetros em que Portugal precisa de trabalhar, sendo um dos mais prementes os salários, diretamente proporcionais aos níveis de produtividade. Com efeito, desde 2011, a perda real de rendimentos ascendeu a 11% entre os trabalhadores com o ensino superior e foi de 3% para os que têm o ensino secundário, mas a piorar para os mais jovens, com -15% entre os licenciados, -12% entre os mestres e -22% entre os doutorados.

Créditos: José Martín Ramírez Carrasco (Unsplash)

Há cinco países da UE onde os trabalhadores menos qualificados ganham menos do que os muito qualificados em Portugal e, noutros 13, os trabalhadores que têm o ensino secundário são mais ricos do que os nossos licenciados. Todavia, um nível de qualificação média superior é sempre mais bem recompensado. Isto resulta da subida da RMMG (vulgo salário mínimo nacional) sem que os outros níveis hajam acompanhado a evolução, dadas as sucessivas crises e retratos conjunturais, reduzindo o fosso entre os mais bem pagos e os menos qualificados.

Para Carlos Oliveira, é bom ter subido a RMMG e tem de subir mais. Daí que, se a empresa não consegue pagar um salário digno, pode não ter condições para existir. Não dar boas condições aos trabalhadores também induz a emigração e, se isso se torna sistémico em vez de conjuntural, o país perde talento. Ora, urge trabalhar a produtividade da economia, mas a produtividade tem relação direta com as qualificações.

O estudo da FJN revela que, apesar de o salário médio em 2019 ficar abaixo do de 2011 na maioria dos níveis de escolaridade, são notórios os ganhos salariais mais qualificados face aos menos qualificados: a licenciatura traduz-se num ganho salarial de 50% face ao ensino secundário. E, com mestrado, a diferença sobe aos 59%. Os prémios salariais também se verificam nos jovens adultos (dos 25 aos 34 anos), sendo os mestrados que originam retorno salarial superior, com ganhos de 43% face ao ensino secundário e de 15% face às licenciaturas, os quais melhoram as perspetivas de se manter empregado (16%) e em melhor posição. E a possibilidade de estar entre os 40% da população com maior rendimento aumenta em 50% para os licenciados.

Melhores qualificações garantem melhor emprego e melhor salário, mas também há associação positiva entre salários e produtividade. Só um aumento sustentado da produtividade dará margem a aumentos de salário e de rendimento. E a produtividade em Portugal tem perdido terreno face à média europeia. Em 2019, era o 6.º país com menor produtividade – apenas acima da Roménia, da Polónia, da Letónia, da Grécia e da Bulgária – e, desde 2000, ela nunca ultrapassou os 70% da média europeia, a não ser em 2013, tendo chegado à pandemia nos 66%.

Também o rendimento é dos mais baixos e os jovens sofrem mais. Em 2019, o nosso rendimento anual, em paridade com o poder de compra, era de 13.727 euros, o 7.º mais baixo da UE, não chegando aos 11 mil euros por ano os que se ficaram pelo ensino básico (10.º mais baixo nos 27 da UE). E, com o ensino superior, o rendimento médio não ultrapassava os 19.755€ (o 8.º mais baixo na UE).

Créditos: Mathieu Stern (Unsplash)

Inverte-se a tendência e melhoram-se as perspetivas dos portugueses partindo de conclusões, como: empresas com uma força de trabalho mais qualificada são mais produtivas; é preciso ajustar qualificações e profissões, pois a aposta da empresa na formação dos trabalhadores aumenta a produtividade em 5% (mas só 16% delas o faz); e os jovens estão cada vez mais qualificados, mas tal só se reflete na produtividade quando eles têm peso superior a 40% no total de trabalhadores.

Depois, surge o problema das qualificações dos gestores, em que quase não há investimento, com o país a apresentar a maior percentagem de empregadores que não terminou o ensino secundário. Em 2021, eram 47,5% dos empregadores, quase o triplo da média europeia (16,4%).

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Também a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), para quem a inflação portuguesa em 2022 não é das mais altas, diz que a subida dos salários é das mais fracas e muitos trabalhadores perderão poder de compra. A perda de poder de compra das remunerações médias por trabalhador, em Portugal, rondará os 3,5% em 2022, na que é a maior redução desde o tempo da troika e do programa de austeridade (de 2011 a 2013) e uma das maiores do grupo de 33 países OCDE, o clube dos países mais avançados da economia global.

(Pixabay)

A redução do poder de compra de quem trabalha em Portugal, quando a taxa de inflação é relativamente alta (cerca de 6,3% é a previsão para 2022), principalmente à luz do histórico dos últimos anos, mas não é das mais acentuadas do grupo dos países ricos, onde a média ronda os 8%.

Ora, a quebra no poder de compra dos salários médios per capita acontece, porque a subida da compensação média por trabalhador (por conta de outrem) é só de 2,9%, o sexto registo mais fraco do grupo das três dezenas de economias da OCDE. Tudo considerado, o trabalhador médio português enfrenta um ano mais apertado do ponto de vista do poder de compra; e porque, sendo um país endividado, a fatura dos juros pesará nos orçamentos familiares.

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Este estado da Nação resulta, basicamente, da não aposta generalizada na qualificação das pessoas (algumas empresas preferem os menos qualificados para lhes pagarem menos), nomeadamente trabalhadores e gestores, na falta de organização do trabalho, na conforme subsidiodependência, na esperança de que o Estado resolva todos os problemas, mormente dos que pretendem que haja menos Estado, e na insistência nos baixos salários e na falta de condições de trabalho digno.

04/07/2022

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Louro Carvalho

É natural de Pendilhe, no concelho de Vila Nova de Paiva, e vive em Santa Maria da Feira. Estudou no Seminário de Resende, no Seminário Maior de Lamego e na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi pároco, durante mais de 21 anos, em várias freguesias do concelho de Sernancelhe e foi professor de Português em diversas escolas, tendo terminado a carreira docente na Escola Secundária de Santa Maria da Feira.

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