Saudades de um labirinto – Eduardo Lourenço (1923-2020)
Dizer que ele foi o maior ensaísta português do século XX é, mesmo assim, ficar aquém da relevância que o pensamento de Eduardo Lourenço teve para Portugal. Ninguém como ele pensou tão criticamente sobre a nossa condição como povo e como nação, — curiosamente viria a falecer no dia em que se assinala a restauração desse país, onde, como ele várias vezes afirmou e escreveu, “poucos povos serão como o nosso tão intimamente quixotescos”. Eduardo Lourenço faleceu esta manhã aos 97 anos. Era desde 2016 um dos 19 conselheiros de estado e para amanhã, 2 dezembro, o governo decretou dia de luto nacional.
Natural de S. Pedro do Rio Seco, distrito da Guarda, estudou em Coimbra e depressa se fez ao caminho, porque ”mais importante que o destino é a viagem”. Alemanha, Brasil e França fizeram parte desse seu percurso, até se fixar, em 1965, em Vence. As mensagens de pesar e de elogio pela sua obra e figura de pensador independente e íntegro sucedem-se a um ritmo ao mesmo tempo esperado e impressionante.
Das mais de quatro dezenas de obras que escreveu e das centenas de textos que dispersamente existem pela imprensa, em forma de reflexões, notas de leitura ou textos de conferências, é impossível não mencionar Heterodoxia I e II; O fascismo nunca existiu; Labirinto da saudade; Do colonialismo ao nosso impensado; A esquerda na encruzilhada ou fora da história?; A Europa desencantada — para uma mitologia europeia.
Como o grande intelectual portuguê do século XX, Eduardo Lourenço foi um homem do seu tempo, no sentido em que, ao contrário de muitos outros, sempre entendeu o papel e dimensão dos media num tempo histórico em que já era impossível viver fora deles e sem eles. Em todo o caso, jamais se submeteu à disciplina e regras mediáticas do fast-thinking, ou seja, não substituiu nunca o seu pensamento reflexivo, denso, por vezes, à velocidade da ideia simplista de que alguma comunicação mediática se alimenta e tanto gosta.
Por isso, entendemos que melhor do que falar no Homem e na obra é ouvi-lo a pensar sobre nós, como nesta entrevista gravada em Paris, em 2017, nas instalações da Fundação Calouste Gulbenkian, no âmbito de um projeto de história oral: