Sonetos…
Um grupo de investigadores da Universidade de Coimbra (UC) avança com a hipótese de o poeta Luís de Camões ter nascido a 23 de Janeiro de 1524, precisamente um ano antes de um eclipse solar visível em Portugal. Esta tese, relacionada com o soneto de Camões “O dia em que eu nasci, morra e pereça”, baseia-se no estudo da Astronomia e da ocorrência de eclipses e foi discutida publicamente no dia 23, num debate promovido pela Biblioteca Geral (BGUC) e pela Imprensa da Universidade de Coimbra (IUC), segundo divulgou o Diário de Notícias (edição de 12.01.2024).
A notícia que encabeça este breve artigo motiva-me a escrever sobre os sonetos camonianos, a exemplo do poema que, agora, reproduzimos:
Seduz-me a forma do soneto, pela sua métrica e ordenamento em quatro estrofes, dois quartetos e dois tercetos… Parece tão fácil escrever um soneto, mas não é. E, no entanto, são muitos os autores que se aventuraram nesta forma lírica e muitos são os belos sonetos que nos legaram.
Pela História da Literatura, aprendemos que o soneto teria nascido no começo do século XIII, possivelmente na Sicília, onde era cantado na corte de Frederico II de Hohenstaufen da mesma forma que as tradicionais baladas provençais.
A invenção do soneto é atribuída inicialmente a Giacomo da Lentini, conhecido como Jacopo (il) Notaro, poeta siciliano e imperial, tendo surgido como uma espécie de canção ou de letra escrita para música, possuindo uma oitava e dois tercetos, para melodias diferentes.
Mas foi Francesco Petrarca (1304-1374), poeta italiano, que aperfeiçoou a estrutura poética iniciada na Sicília, difundindo-a por toda a Europa nas suas viagens. A sua obra engloba 317 sonetos contidos no “Il Canzoniere”, colectânea de poesia que exerceu influência sobre toda a literatura ocidental. Os melhores poemas desse livro são dedicados a Laura de Novaes. Petrarca popularizou os esquemas de rimas abba abba cdc dcd e abba abba cde cde.
O poeta português Sá de Miranda (1481-1558), depois de uma viagem que fez a Itália, entre os anos de 1521 e de 1526, regressou a Portugal com uma nova estética poética, introduzindo pela primeira vez o soneto. Luís Vaz de Camões adoptou esta estética, compondo diversos sonetos com o amor como tema principal e imortalizando o soneto, como nos informa a Wikipédia.
Poderia fazer, aqui, uma breve antologia sobre o assunto, na qual não deixaria de recordar “Os Sonetos da Morte” (Los Sonetos de la Muerte), de Gabriela Mistral, transcrevendo, brevemente, a primeira estrofe:
Traduzindo:
E do grande poeta peruano Cesar Vallejo, “Soneto Ausente”:
Na versão traduzida:
E Sophia de Mello Breyner Andresen dedica à paixão de Orpheu um soneto de perda e de ausência:
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Pablo Neruda, na sua obra poética, inclui um livro de cem sonetos nos quais rompe a métrica em versos livres:
Lendo-se, em tradução livre:
Vasco Graça Moura, a quem devemos belíssimas traduções de Dante e de Shakespeare, também não pode ser esquecido.
Como observou Vasco Graça Moura e anotou a Bertrand Editora na sua página electrónica: “[…] nos Sonetos [de Shakespeare], o tempo trai a beleza e as pompas, a velhice trai a juventude, o amigo trai o amigo, o homem trai a mulher, a mulher trai o homem, a tristeza e o desânimo traem a alegria, a decadência trai a pujança, a escassez trai a abundância, os sentimentos são traídos…”
Acabarei, ainda, por citar o autor Vasco Graça Moura que, no seu “Soneto do Soneto”, nos descreve a anatomia do poema, não podendo deixar de o comparar com o “Soneto a Violante”, do grande autor espanhol, poeta e dramaturgo Félix Lope de Vega, chamado “El Fénix de los Ingenios”:
E na bela versão de José Bento:
Notas:
1 – Consultando a Wikipédia, somos informados de que Gabriela Mistral é o pseudónimo escolhido por Lucila de María del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga, que foi uma poetisa, educadora, diplomata e feminista chilena, premiada com o Nobel da Literatura, em 1945. Os temas centrais nos seus poemas são o amor, o amor de mãe, memórias pessoais dolorosas, mágoa e recuperação.
2 – Sobre César Abraham Vallejo Mendoza a Wikipédia regista que “foi um poeta de tendência vanguardista, unanimemente considerado pela crítica especializada como um dos maiores poetas hispano-americanos do século XX e o maior poeta peruano, tendo sido também contista, romancista, dramaturgo e ensaísta”.
3 – Como menciona a livraria on-line Wook, Vasco Graça Moura é “personagem polifacetada da vida cultural portuguesa” (Foz do Douro, 3 de Janeiro de 1942 – Lisboa, 27 de Abril 2014). Adiantando, na breve nota biográfica do autor: “Poeta, romancista, ensaísta, tradutor, foi secretário de Estado de dois Governos provisórios. Autor de uma vastíssima obra poética, ensaística e ficcional, e um nobilíssimo tradutor e divulgador das literaturas clássicas. Prémio Pessoa (1995), o Prémio de Poesia do Pen Club (1997), o Grande Prémio de Poesia da APE (1997) e o Grande Prémio de Romance e Novela APE/IPLB (2004). Foi galardoado em 2007 com o Prémio Vergílio Ferreira e com o prémio de poesia Max Jacob Étranger.”
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29/01/2024