TGV tem luz verde (de curta-metragem) do Parlamento para avançar

 TGV tem luz verde (de curta-metragem) do Parlamento para avançar

(pt.euronews.com)

A Assembleia da República (AR) aprovou, a 9 de janeiro, o Projeto de Resolução n.º 967/XV, do Partido Socialista (PS), que recomenda ao governo que “tome todos os passos necessários ao lançamento do concurso para o primeiro troço da Linha de Alta-Velocidade (LAV) Porto-Lisboa, antes do final do prazo para as candidaturas ao CEF [Connecting Europe Facility] (30 de Janeiro)” e que “prossiga com o trabalho necessário ao lançamento dos concursos seguintes […], de forma a manter viável a conclusão deste projeto dentro dos prazos que foram anunciados”.

Deputado socialista Hugo Costa. (ps.pt)

O PS apontou os 30 anos de atraso na decisão das LAV, apelando ao avanço do concurso para a linha de comboio de alta velocidade (TGV, na sigla francesa de “train de grande vitesse”) entre o Porto e Lisboa. “São 30 anos de atraso, em relação a Espanha, para decidir a Alta Velocidade ou mais de 50 anos, para decidir o novo aeroporto de Lisboa. Continuamos sem avançar, fruto de uma cultura política, especialmente da nossa direita, onde decidir é um problema, certamente na esperança de que o mercado resolva tudo”, disse Hugo Costa, abrindo as hostilidades no debate solicitado pelo partido, sobre “Novas ligações ferroviárias”.

Todavia, o Partido Social Democrata (PSD) e o Chega responsabilizam o governo pela demora e pela indecisão. “Ao fim de oito anos de governo, o PS não quer falar do passado, não quer falar do presente, só quer falar do futuro, numa reencarnação do ‘agora é que vai ser’. 

Paulo Rios Oliveira, do PSD. (psd.pt)

O PS vem ao Parlamento pedir aos grupos parlamentares que ajudem a PS a instar o governo a governar”, afirmou Paulo Rios Oliveira, do PSD, referindo-se ao projeto que o partido votou favoravelmente, mas criticando o lançamento, à última hora, do concurso para o primeiro troço da LAV, entre Porto e Oiã (Aveiro), julgado essencial para o sucesso da candidatura a fundos europeus. “Não será isto a forma mais confessada de dizer que não trabalharam, foram incompetentes e não fizeram o trabalho de casa?”, questionou. “Votaremos a favor de Portugal e não do PS, porque não conhecemos e não acompanhamos as peças técnicas e do concurso”, disse.

Sobre os 30 anos de governo do PS, o deputado do Chega Filipe Melo mostrou uma capa do jornal Público, de 1999, sendo António Guterres primeiro-ministro (PM), com a notícia de que o TGV ligaria o Porto a Lisboa em 1h15, em 2015. “Seguiu-se José Sócrates, depois António Costa, com um intervalo pelo meio do PSD. Foram vários anos de governos socialistas. A responsabilidade é inteiramente do PS”, acusou. Porém, Hugo Costa atirou responsabilidades aos governos do PSD, dizendo que Guterres projetou o TGV, Durão Barroso enviou-o para o lixo e Sócrates reapresentou o projeto do TGV, que Passos Coelho enviou para o lixo.

Deputado comunista Bruno Dias. (pcp.pt)

Bruno Dias, do PCP, disparou aos dois partidos. “São cúmplices na destruição da ferrovia em Portugal”, disse, acrescentando não ser por falta de apoio da AR que esta e outras infraestruturas vão derrapando no tempo com a decisão sempre discutida na véspera das eleições e adiada, depois.

E Rui Rocha, da Iniciativa Liberal (IL), que também votou favoravelmente a resolução, vincou o atraso, face ao resto da Europa, e atirou aos dois maiores partidos. “É caso para dizer que, ao longo das últimas décadas, o PS arrastou os pés, também nesta matéria. Entre um PS, que arrasta os pés, e um PSD, que hesita, a IL avança para este projeto com confiança”, afirmou.

O governo avançará com o concurso público internacional para o primeiro troço da LAV entre Porto e Oiã (Aveiro), orçado em 1.950 milhões de euros, pois considera o concurso essencial para Portugal garantir 729 milhões de euros em fundos europeus do Mecanismo Interligar a Europa (MIE), para a primeira fase do projeto, que tem o custo global de 3.550 milhões de euros e inclui a ligação entre Oiã e Soure. O concurso da LAV Porto-Lisboa prevê três parcerias público-privadas (PPP) para diferentes troços da linha. O contrato de concessão durará 30 anos, cinco para a construção e 25 para a gestão operacional.

 Pedro Nuno Santos, actual secretário-geral do PS e ex-ministro das
Infraestruturas e da Habitação. (portugal.gov.pt)

O debate foi invadido por uma questão lateral, visando a direita o secretário-geral e deputado do PS, que esteve na bancada. “O PS não quer nem pode falar de saúde, de educação, de justiça, de pobreza, de serviços públicos. O PS quer, ao menos, falar de Pedro Nuno Santos. O problema do ex-ministro e futuro deputado é que ele tem um passado que o persegue. Onde ele toca estraga”, afirmou Rios Oliveira, apontando, como exemplos a crise na habitação, o despacho para o novo aeroporto, revogado pelo PM, e a sua demissão, na sequência da indemnização a Alexandra Reis, ex-administradora executiva da TAP. “Não serviu para ministro, mas querem que sirva para primeiro-ministro”, atirou. E o Chega lembrou o pedido de desculpas “embaraçado” do ex-ministro, no despacho do novo aeroporto.

Coube a José Carlos Barbosa fazer a defesa do secretário-geral do PS: “Aquilo que sabemos hoje é que, se há ministro que, no pós-25 de abril, apostou na ferrovia foi Pedro Nuno Santos.”

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O PM demissionário assinalou o dia histórico da aprovação do lançamento do projeto de alta velocidade ferroviária, anunciou a proximidade do concurso e saudou a maturidade democrática do processo. “Hoje é um dia histórico, para a mobilidade e para o transporte público”, disse, em Vila Nova de Gaia (distrito do Porto), referindo-se à votação favorável, pela AR, de projetos de resolução do PS que recomendam ao governo o avanço do projeto de alta velocidade ferroviária. 

Primeiro-ministro António Costa assistiu à assinatura da consignação da empreitada da Linha Rubi do Metro do Porto. (metrodoporto.pt)

Falando nas Caves Ferreira, onde assistiu à assinatura da consignação da empreitada da Linha Rubi do Metro do Porto ao consórcio FCC, ACA e Contratas y Ventas, por 379,5 milhões de euros, vincou: “É um momento que deve ser aplaudido, porque revela enorme maturidade democrática, e que é particularmente importante, para um país onde as obras públicas são obsessivamente discutidas e obsessivamente adiadas.” Para o PM, num momento de grande agitação política, a AR ser capaz de uma esmagadora maioria votar a favor e dizer que “abram lá o concurso”, é muito importante e “deve encher, todos os democratas, com muito orgulho”.

A abertura do concurso, até 18 de janeiro, garante o acesso a 729 milhões de euros que estão, segundo Costa, reservados, em Bruxelas, exclusivamente para a obra, “poupando-nos a ter de concorrer, nos anos seguintes, com todos os outros países”, sendo o investimento “estrutural para a descarbonização da mobilidade, para encurtar as distâncias entre as duas áreas metropolitanas, para substituir muitas das viagens que hoje se fazem de avião ou por automóvel”.

O PM demissionário, António Costa, assinalou o dia histórico da
aprovação do lançamento do projeto de alta velocidade ferroviária.
(metrodoporto.pt)

Numa posição escrita enviada à Lusa, assinada pelo vice-presidente do PSD Miguel Pinto Luz, este partido anunciou o voto favorável ao concurso da LAV Porto-Lisboa, porque “nunca será um entrave” ao desenvolvimento, mas remete responsabilidades da solução para o PS e sustenta que “o país já perdeu demasiado tempo e esta seria a segunda candidatura falhada por incompetência e impreparação do governo português, liderado pelo PS”. “O voto é a favor de Portugal. Quanto ao resto, cada partido que assuma as suas responsabilidades e que não enganem mais os Portugueses. Porque o governo não tem, nem merece, crédito neste assunto”, criticou.

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Em causa está o lançamento do concurso para o troço Porto-Oiã (Oliveira do Bairro, distrito de Aveiro) da LAV Porto-Lisboa, que ligará as duas cidades numa hora e 15 minutos, com paragens em Gaia, em Aveiro, em Coimbra e em Leiria.

O custo estimado da sua primeira fase é de 3.550 milhões de euros, montante 20% mais alto do que os 2.950 milhões apontados na apresentação pública do projeto, em setembro de 2022.

(infraestruturasdeportugal.pt)

Os cálculos apontam para o custo de 1.950 milhões, para o troço entre o Porto e Oiã (Aveiro), cujo concurso público o governo quer lançar até 18 de janeiro. Em setembro, o orçamento era de 1.650 milhões, mudança para a qual concorre a elevada inflação sentida nos materiais de construção. O custo do troço entre Oiã e Soure subiu de 1.300 para 1.600 milhões de euros. E o orçamento total sobe para 3.550 milhões. Um quinto poderá ser pago com fundos europeus do MIE, se o Executivo avançar com a candidatura até 30 de janeiro. Dos 729 milhões de euros a que Portugal concorre, 480 milhões destinam-se ao primeiro troço e 249 milhões ao segundo. O projeto será ainda financiado por empréstimos junto do sistema financeiro, da parte do vencedor da concessão, do financiamento de 625 milhões já negociado com o Banco Europeu de Investimento (BEI) e de pagamentos antecipados pelo Estado.

O comentador da SIC Luís Marques Mendes. (sicnoticias.pt)

Em comentário na SIC, Luís Marques Mendes acusou, a 7 de janeiro, o governo de falta de transparência, em relação ao TGV, questionando se o projeto envolve uma PPP, se esta inclui só a construção ou também a exploração da linha, se esta será do Estado ou dos privados e qual o investimento. Porém, a apresentação do projeto, em 2022, já referia o modelo de concessão para a conceção, construção, manutenção e financiamento da linha. As três PPP terão um período de concessão de 30 anos, cinco para a construção e 25 para a gestão da linha. E pode avançar uma quarta PPP, para a última fase, mas o modelo ainda não está definido. 

Findo o contrato de concessão, a linha reverterá para o Estado. A concessionária garantirá a operacionalidade da linha e será remunerada em função da disponibilidade do serviço. A exploração será aberta a todos os operadores, ficando a gestão da circulação e alocação da capacidade na esfera do Estado, pela Infraestruturas de Portugal (IP). Fora das PPP ficam projetos complementares e a sinalização e telecomunicações, que serão atribuídos em empreitadas.

A separação em várias PPP permite criar contratos de dimensão razoável e ajustada à capacidade do mercado, garantindo a capacidade e a atratividade do setor privado e assegurando a forte competitividade, aspeto de fulcral importância na criação de valor para o Estado. E permite gerir o esforço financeiro do Estado e maximizar os benefícios para os utilizadores do sistema, de modo a antecipar os benefícios da LAV, iniciando a utilização dos troços, à medida que sejam concluídos. A conclusão da 1.ª fase encurtará a viagem entre Lisboa e Porto de 2h49 para 1h59.

Para garantir a luz verde da Comissão Europeia aos 729 milhões em fundos, o governo tem de lançar, previamente, o concurso público internacional, o que ocorrerá até 18 de janeiro. E o lançamento carece de resolução do Conselho de Ministros a aprovar a despesa. Será a segunda vez que Portugal se candidata a estes fundos europeus para o TGV. Da primeira, o projeto não teve luz verde da Comissão Europeia por atraso, em termos de maturidade.

(Créditos fotográficos: Erich Westendarp – Pixabay)

O governo de gestão quis o apoio do PSD para o lançamento do concurso. Porém, o partido demarca-se do projeto, acompanhando a necessidade de reforçar a LAV Lisboa-Porto, em solução técnica, jurídica e de financiamento da exclusiva responsabilidade do PS, o que não pressupõe adesão às peças do concurso nem às soluções técnicas ou de financiamento das PPP.

O projeto da LAV que revolucionará a mobilidade nacional, lançado quando Pedro Nuno Santos era ministro das Infraestruturas, prevê três fases. A primeira inclui dois troços, Porto-Aveiro (Oiã) e Aveiro-Soure; a segunda liga Soure ao Carregado; e a última, o Carregado a Lisboa. O calendário aponta que o troço Porto-Aveiro entre em funcionamento em 2030. O projeto inclui a modernização ou construção de estações ferroviárias em Campanhã, Vila Nova de Gaia, Aveiro, Coimbra, Leiria e Oriente.

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A decisão da Comissão Europeia sobre o MIE, a que o governo submeterá um troço do TGV, será conhecida em julho, com as propostas a terem de ser apresentadas até 30 de janeiro.

A Comissão convidou para a apresentação de propostas, a 26 de setembro, com prazo até 30 de janeiro, e previu decisão para julho. “Os projetos de infraestruturas financiados no âmbito do presente convite melhorarão a segurança e a interoperabilidade da rede de transportes da UE”, argumentava Bruxelas, acrescentando que as candidaturas podiam ser apresentadas por “um ou mais Estados-membros” ou por “organizações internacionais ou organismos públicos ou privados estabelecidos num Estado-membro da UE”, com o acordo do país em causa e em áreas como a ferrovia ou a resiliência das infraestruturas.

(Créditos fotográficos: Yan Agrit – Unsplash)

O PM disse que nem os países ricos aceitariam perder 750 milhões de euros, mas frisou que as obras públicas devem ter consenso de dois terços da AR e que o Plano Nacional de Investimentos, que definiu os investimentos mais relevantes, incluindo a construção de uma LAV entre Lisboa, Porto, Braga e Vigo, foi aprovado por “quase três quartos” dos deputados.

Entretanto, o governo já deu passos para avançar com o TGV, nomeadamente o congelamento de terrenos para facilitar os primeiros troços, garantindo que “naquele corredor não se podem fazer operações urbanizáveis, sem parecer prévio da IP, para não tornar mais cara a execução da obra”, como vincou Frederico Francisco, secretário de Estado das Infraestruturas.

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Será a partir de agora que Portugal terá ligação de TGV com o resto da Europa.

Porém, 30 anos, nos tempos de hoje, são muito tempo. Para quando a ligação a Madrid, pelo Centro e pelo Sul do nosso país? É que estamos a falar da ligação Porto-Lisboa e Porto-Vigo. Madrid continuará longínqua e o país continuará a ser a ilha ferroviária da Europa Ocidental, sobretudo se mantivermos a bitola ibérica. Somos a Inglaterra incorporada no continente europeu.

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11/01/2024

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Louro Carvalho

É natural de Pendilhe, no concelho de Vila Nova de Paiva, e vive em Santa Maria da Feira. Estudou no Seminário de Resende, no Seminário Maior de Lamego e na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi pároco, durante mais de 21 anos, em várias freguesias do concelho de Sernancelhe e foi professor de Português em diversas escolas, tendo terminado a carreira docente na Escola Secundária de Santa Maria da Feira.

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