“Venham mais cinco”

 “Venham mais cinco”

(Direitos reservados)

Álbum acaba de ser reeditado pela Mais 5

O álbum editado pela Orfeu, no Natal de 1973, foi apreendido pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE).

“Venham mais Cinco” foi o último álbum de José Afonso antes da Revolução de 25 de Abril de 1974. Gravado em Paris, contou com a produção de José Mário Branco (1942-2019). A Censura (no Estado Novo) proibiu-o e a PIDE procedeu à sua imediata apreensão. “Venham mais Cinco”, que tinha sido editado no Natal de 1973, pela Orfeu de Arnaldo Trindade, acaba de ser reeditado em CD e em vinil pela editora Mais 5 (*), a qual também o disponibiliza nas plataformas digitais.  “Venham mais Cinco”, “A Formiga no Carreiro” e “Era um Redondo Vocábulo”, escritas por Zeca durante a sua prisão em Caxias, são algumas das canções que integram o álbum.

Aos 88 anos de idade, Arnaldo Trindade mantém uma intensa actividade cultural. (Direitos reservados)

A reedição de “Venham mais Cinco”, que saúdo, traz-me à memória a Orfeu. A editora portuense e o seu criador, Arnaldo Trindade, tiveram um papel fundamental na edição daquilo que melhor se fez na música popular. A Orfeu foi também a primeira editora discográfica do mundo a gravar discos de poesia dita pelos seus autores. Miguel Torga, José Régio, Sophia de Mello Breyner Andresen, Ferreira de Castro, Aquilino Ribeiro, Alberto Serpa, Egito Gonçalves e Papiniano Carlos, José Rodrigues Migueis, Daniel Filipe, Agustina Bessa-Luís e José Régio foram alguns deles.

Arnaldo Trindade, o senhor Orfeu guardava as palavras dos autores em discos. Com belas capas. Muitas foram desenhadas por artistas como José Santa-Bárbara, José Brandão, José Luís Tinoco e Isolino Vaz. Ou com a arte de fotógrafos como Eduardo Gageiro, Patrick Ullmann e Fernando Aroso.

A partir do seu Porto natal, Arnaldo Trindade construiu uma das mais importantes marcas discográficas do país durante a década de 1960 e seguintes. Além de José Afonso, a Orfeu editou cantautores como Fausto, Carlos  Mendes, José Mário Branco, Samuel, Sérgio Godinho, José Jorge Letria, os quais enriqueceram um catálogo que tinha os populares conjuntos António Mafra e Maria Albertina, bem como José Cid, Armando Gama, Quim Barreiros e o minhoto Rancho de Santa Marta de Portuzelo, que o poeta Pedro Homem de Melo deu a conhecer ao país. Os roqueiros Titãs e Pop Five também gravaram com a etiqueta Orfeu.

Arnaldo Trindade é um bom burguês do Porto. A 21 de Setembro, completa 88 anos de idade, mas isso não o impede de ter uma intensa actividade cultural, nem de dedicar-se à escrita de poesia. “Commedia dell’Arte”, “Jogos de Xadrez e da Vida” e, mais recentemente, “Nuvem sem Água não Chora” são os títulos das obras publicadas por este cidadão de corpo inteiro a quem o país tanto deve e a quem tarda a prestar a homenagem devida.


(*) A família de José Afonso decidiu, em parceria com a editora Lusitanian Music (cujo nome foi entretanto alterado para Mais 5), avançar com a edição dos 11 álbuns de José Afonso originalmente editados entre 1968 e 1981. Assim, a obra imortal de Zeca continuará viva entre os mais jovens.

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Soares Novais

Porto (1954). Autor, editor, jornalista. Tem prosa espalhada por jornais, livros e revistas. Assinou e deu voz a crónicas de rádio. Foi dirigente do Sindicato dos Jornalistas (SJ) e da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto (AJHLP). Publicou o romance “Português Suave” e o livro de crónicas “O Terceiro Anel Já Não Chora Por Chalana”. É um dos autores portugueses com obra publicada na colecção “Livro na Rua”, que é editada pela Editora Thesaurus, de Brasília. Tem textos publicados no "Resistir.info" e em diversos sítios electrónicos da América Latina e do País Basco. É autor da coluna semanal “Sinais de Fogo” no blogue “A Viagem dos Argonautas”. Assina a crónica “Farpas e Cafunés”, na revista digital brasileira “Nós Fora dos Eixos”.

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