Viagens pelas terras de Espanha (II)

 Viagens pelas terras de Espanha (II)

(queroviajarmais.com)

España, se ha dicho muchas veces, está por conocer para los españoles.  Hay aquí  no pocos que, sin conocer el resto de España, sin haber viajado por ella, sin haber visitado rincones, llenos de historia, de leyenda, de poesía y de paz, de Castilla, Aragón, Extremadura ó Andalucía, se han ido á viajar por Francia, Italia ó Alemania

(mariaberini.es)

“A Espanha, já foi dito muitas vezes, ainda não é conhecida pelos Espanhóis.   São  muitos os que, sem conhecer o resto de Espanha, sem tê-lo percorrido, sem ter visitado recantos cheios de história, lenda, poesia e paz em Castela, Aragão, Extremadura ou Andaluzia, eles viajaram pela França, Itália ou Alemanha.

Braga (mariaberini.es)
(mariaberini.es)

“E fui para Braga, para a Braga antiga, para a Bracara Augusta dos Romanos . A Braga, que foi corte dos reis suevos durante mais de século e meio, por volta de VI . E lá fui eu, atravessando terras daquela província mimosa do Minho”

“Agora tenho de vos falar do Bom Jesus do Monte, que é a razão de ser de Braga para os turistas.”

“Desci do Bom Jesus a pé, pela escadaria monumental, ladeada por templos.  É preciso concordar que esta monumental descida – e subida – do Bom Jesus do Monte de Braga é, além de extremamente agradável e muito frondosa, também instrutiva.”

(Miguel de Unamuno1)

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Burgos

Prosseguimos numa visita à cidade de Burgos e à sua magnífica catedral consagrada à Virgem Maria.

A construção desta igreja começou em 1221, seguindo os padrões góticos franceses, mas também segue a tradição germânica, especialmente nas agulhas de pedra perfuradas e na ornamentação geométrica. O desenho da fachada principal está relacionado com o clássico gótico francês das grandes catedrais, em particular, Paris e Reims.

No interior, aconselho uma visita particular ao Papamoscas (ou Flycatcher), figura mecânica/autómata que, a todas as horas, abre a boca ao mesmo tempo que mexe o braço direito para accionar o badalo de um sino. É uma figura popular e vulgarizada, que contraria o espírito severo e religioso do monumento.

El Martinillo, à esquerda do Papamoscas, a menor altura e de menor tamanho, situa-se numa pequena varanda. Esse outro autómato chamado Martinillo ou Martinillos​ encarrega-se de assinalar os quartos de hora, em badaladas mais agudas e estridentes que as do Papa-moscas.

El Papamoscas (guiasturisticosburgos.com)

O Monasterio de Santa María la Real de las Huelgas é um mosteiro feminino, fundado pelo rei Afonso VIII de Castela e pela sua jovem esposa, a princesa de Inglaterra Leonor Plantageneta, filha de Leonor de Aquitânia e de Henrique II de Inglaterra, em 1187. Na Idade Média, foi o mais importante mosteiro feminino de Castela, albergando raparigas pertencentes à alta nobreza e da família real castelhana.

(patrimonionacional.es)

Possui uma biblioteca onde as freiras guardavam livros de diferentes e numerosos temas, alguns até proibidos pela Igreja Católica. Um famoso livro compilado e armazenado nesta biblioteca, durante vários séculos, é o Códice de Las Huelgas. Situado a ocidente da cidade de Burgos, num terreno antigamente ocupado por prados e que era conhecido como “Las Huelgas”, que era o nome dado a este lugar de cultivo não trabalhado e dedicado aos pastos e ao descanso dos animais.

Estátua de El Cid, em Burgos. E foto de Gérard Philipe, em 1954, no Teatro Nacional de Varsóvia, com o figurino de Cid. (Direitos reservados)

Burgos é ainda a cidade de El Cid, figura que inspirou as nossas brincadeiras de crianças, com de capas, espadas, lanças e os simulacros de guerras entre cristãos e mouriscos. Rodrigo Díaz de Vivar (1043-1099),mais conhecido por El Cid (do mourisco sidi, “senhor”)e de Campeador (Campeão), foi um nobre guerreiro castelhano que viveu no século XI, época em que a Hispânia estava dividida entre reinos rivais de cristãos e de mouros (muçulmanos).

(google.pt/books/editions)

Como nos informa a Wikipédia, a sua vida e feitos tornaram-se em lenda, sobretudo, devido a uma canção de gesta (a Canción de Mio Cid, de 1207), transcrita no século XIV pelo copista Pedro Abád, cujo manuscrito se encontra na Biblioteca Nacional da Espanha, um referencial para os cavaleiros da Idade Média. A imagem que emerge desse manuscrito é a do cavaleiro medieval idealizado: forte, valente, leal, justo e piedoso. Mas há outras fontes que lhe pintam um retrato bem menos favorável.

Lembro-me do liceu e da leitura deste poema épico (canción de gesta), em especial o episódio das Arcas de Areia, no qual o herói castelhano engana os judeus Raquel e Vidas que, movidos pela ganância de ganhos futuros, lhe entregam seiscentos marcos em troca de guardar um baú com grandes riquezas, mas que, na realidade, apenas está cheio de areia.

(en.wikipedia.org)

O meu professor de literatura colocava aqui, neste episódio, as origens da literatura picaresca espanhola, com obras que mais tarde serão, entre outras, El Lazarillo de Tormes, El Libro de Buen Amor, El Conde Lucanor e essa obra magnífica que é La Celestina, também conhecida como Comedia de Calisto y Melibea e, depois, Tragicomedia de Calisto y Melibea, atribuída quase na sua totalidade ao bacharel Fernando de Rojas.

El Cid está enterrado na catedral de Burgos junto da sua esposa Ximena. Sobre esta figura, a mais célebre peça de teatro é a de Pierre de Corneille, Le Cid (de 1636)2, e um filme, realizado em Espanha, no ano de 1961, com Charlton Heston e Sophia Loren, nos papéis principais.

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León

Na visita à cidade de León, é também obrigatória a sua catedral.

Catedral de Santa Maria de Regla de Leão é dedicada à devoção de Nossa Senhora. Foi o primeiro edifício histórico e religioso bem classificado como monumento nacional de Espanha, pela Real Ordem de 28 de Agosto de 1844 – ou seja, há 179 anos.

(spain.info)

A sua construção, iniciada em 1205, é uma das grandes obras da arquitectura gótica europeia, de influência francesa. Conhecida como Pulchra Leonina, que significa “bela leonesa”, encontra-se no Caminho de Santiago. O edifício leva ao extremo a “desmaterialização” da arte gótica, isto é, a redução das paredes à sua mínima expressão para serem substituídas por cerca de 1.800 metros quadrados de vitrais coloridos, os quais constituem um dos maiores conjuntos de vitrais medievais do Mundo.

Há um dístico latino que, referindo-se às quatro mais antigas catedrais espanholas, reza assim: Sancta ovetensis, pulchra leonina, / Dives toletana, fortis salmantina.

Interior da Catedral de Leão. (barbararosillo.com)

Retomando a narrativa de Miguel de Unamuno, lemos: “Santa la de Oviedo, por sus muchas reliquias; bella la de León, rica la de Toledo, fuerte la de Salamanca, la vieja, la románica, no la nueva, la que en el siglo XVI se empezó. Y he traducido pulchra por bella, como pude traducir elegante o bonita. Y lo es más, sin duda, que no hermosa. Porque esta elegantísima y bella catedral gótica leonesa no tiene ni lo pintoresco y variado de la de Burgos […] Es de una suprema sencillez y, por lo tanto, de una suprema elegancia. Podría decirse que en ella se ha resuelto el problema arquitectónico, a la vez de ingeniería y de arte […].”

Panteão dos Reis de San Isidoro de León. (barbararosillo.com)

E ainda uma visita àquela que é considerada a “Capela Sistina do Românico”, na Basílica de Santo Isidoro (ou Colegiada Real de San Isidoro de León), considerando a extraordinária beleza e conservação das suas pinturas. A Basílica de Santo Isidoro, chamada informalmente de Santo Isidoro de Leão, é um dos conjuntos arquitectónicos de estilo românico mais destacados da Espanha, construído durante os séculos XI e XII. Originariamente, era um mosteiro dedicado a São João Baptista, ainda que se suponha que, anteriormente, assentava no seu solo um templo romano. Com a morte de São Isidoro, bispo de Sevilha, e com a trasladação dos seus restos mortais para a cidade de Leão, foi alterado o nome do templo.

Casa Botines (pt.wikipedia.org)

Finalmente, visita a Casa Botines, também conhecida na cidade como a Casa do Dragão, foi construída de 1892 a 1893. É, sem dúvida, uma interessante oportunidade para ver e conhecer, sobretudo interiormente, uma obra do arquitecto barcelonês Antoni Gaudí. No final do século XIX, o jovem arquitecto, que nunca tinha saído de Barcelona, atravessou a península para construir um armazém de tecidos em León. Hoje, está convertido num espaço museológico para exposições temporárias.

A Casa Botines, situada no epicentro da cidade, é um dos lugares mais visitados de León. Actualmente, e por ocasião da celebração do Ano Sorolla, que comemora o centenário da morte do pintor valenciano Joaquín Sorolla (1863-1923), o Museu Casa Botines Gaudí e a Fundação FUNDOS organizam a exposição “Sorolla e a paisagem de seu tempo”. Todavia, Sorolla merece um capítulo à parte!

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Valladolid

A luminosidade e riqueza das catedrais visitadas contrasta com a quase austeridade da Catedral de Valladolid, conhecida como La Inconclusa. Construída no século XVI, com o projecto de Juan de Herrera, a Catedral de Nossa Senhora da Assunção de Valladolid, chamada “A Inacabada”, atendendo a que a sua construção nunca foi, de facto, finalizada. Mais severo e sombrio é este monumento ao qual o terramoto de Lisboa (em 1755), acabou por roubar uma torre que acabaria por desabar no ano de 1841.

Gravura de Fournier que ilustra a fachada da catedral antes da queda da torre, e desenho de Isidoro Domínguez Díez, apresentando o estado da torre após a derrocada ou desabamento. (Direitos reservados)

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Notas:

(mariaberini.es)

1 – “Por terras de Portugal e Espanha” Esta obra inclui uma série de artigos escritos por Miguel de Unamuno, nos quais expressa as suas impressões sobre diferentes pontos da geografia espanhola e portuguesa, fruto das suas viagens pela Península Ibérica, na primeira década do século XX (entre 1906 e 1909), bem como suas ideias sobre o que é viajar, entre outros aspectos.

Miguel de Unamuno (1864-1936) foi um ensaísta, romancista, dramaturgo, poeta e filósofo espanhol. Foi também deputado, de 1931 a 1933, pela região de Salamanca. É o principal representante espanhol do existencialismo cristão.

Estátua de Miguel de Unamuno, em Salamanca. (Direitos reservados)

2 – Gérard Philipe, o famoso actor francês, será o intérprete ideal desta personagem (El Cid), sob a direcção de Jean Vilar, na segunda edição do Festival de Avignon, em 1948, vai vestir as roupagens de Rodrigues em 199 representações.

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28/08/2023

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Roberto Merino

Roberto Merino Mercado nasceu no ano de 1952, em Concepción, província do Chile. Estudou Matemática na universidade local, mas tem-se dedicado ao teatro, desde a infância. Depois do Golpe Militar no Chile, exilou-se no estrangeiro. Inicialmente, na então República Federal Alemã (RFA) e, a partir de 1975, na cidade do Porto (Portugal). Dirigiu artisticamente o Teatro Experimental do Porto (TEP) até 1978, voltando em mais duas ocasiões a essa companhia profissional. Posteriormente, trabalhou nos Serviços Culturais da Câmara Municipal do Funchal e com o Grupo de Teatro Experimental do Funchal. Desde 1982, dirige o Curso Superior de Teatro da Escola Superior Artística do Porto. Colabora também como docente na Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, desde 1991. E foi professor da Balleteatro Escola Profissional durante três décadas. Como dramaturgo e encenador profissional, trabalhou no TEP, no Seiva Trupe, no Teatro Art´Imagem, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (UP) e na Faculdade de Direito da UP, entre outros palcos.

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