O ciclo e as escolas artísticas no TNSJ e no TMP

Representação pelos alunos de Teatro da ESAP. (Créditos fotográficos: Hilário Barrias, aluno da licenciatura em Fotografia da ESAP)
Começo por me referir a um ciclo de representações iniciado há mais de uma década do qual fazemos parte, desde o início, eu – em representação da Escola Superior Artística do Porto (ESAP) – e a sua licenciatura em Teatro, quando era professor dessa instituição. Esse evento teve o generoso acolhimento do director artístico do Teatro Nacional São João (TNSJ), nessa época, o encenador Nuno Carinhas, e do director de Produção, Salvador Santos.

Assim, a partir de então, todos os anos, o TNSJ tem sido o palco dos projectos e das provas finais dos alunos de várias escolas de Arte do Porto: “[…] um programa que cria pontes entre a formação académica e a proje[c]ção de um futuro profissional. Os espe[c]táculos levantados pelos alunos finalistas dos cursos de Teatro da ESMAE e da ACE envolvem todas as valências teatrais (interpretação, cenografia, figurinos, luz, som, dire[c]ção de cena e produção).”
Seguindo uma nota informativa do TNSJ, lemos ainda: “As apresentações públicas dos finalistas das licenciaturas em Artes Dramáticas / Formação de A[c]tores da Universidade Lusófona do Porto e em Teatro da ESAP são oportunidades de imersão num contexto profissional e de confronto com representantes do tecido artístico, favorecendo a futura integração dos alunos. Na primeira mostra pública das competências acumuladas ao longo de três anos, os finalistas de Dança e de Teatro do Balleteatro apresentam as suas Provas de Aptidão Profissional. Resultantes de proje[c]tos artísticos próprios, estas provas são o remate de uma pesquisa criativa e de uma exploração de novas soluções cénicas e performativas.”

Dos espectáculos a que pude assistir no Teatro Carlos Alberto (TeCA), destaco “The Amazing Show of Isaac Flores”, um trabalho escrito e encenado por Marta Freitas Almendra, com interpretação dos alunos finalistas da licenciatura em Artes Dramáticas da Universidade Lusófona do Porto. Esse texto parece responder à pergunta: “Será o palco um espelho da nossa sede por desgraça?”
Jaime Soares1 foi o responsável pela encenação deste ano da representação dos alunos da ESAP, com base nos textos de Raúl Brandão, de Javier Tomeo, de Harold Pinter e da sua própria autoria.

Jaime Soares – que é o director artístico da NAPALM-ctdac (Companhia de Teatro Dança em Conjunto ou Alternadamente) – pretende, pois, dar respostas às perguntas enunciadas como ponto de partida para este trabalho: “Fazer o quê, dizer o quê? Fazer como? Em teatro, nem sempre há respostas para as perguntas que os artistas colocam a si próprios. O que há são tentativas. Saltos para o vazio, na esperança de não partir os dentes no chão… experimentar e contaminar, provocar, encontrar propósito(s), explorar zonas onde o belo e o grotesco se confundem, onde o corpo, o som, a imagem e a palavra se cruzam sem hierarquia.”
E, finalmente, as PAP (Provas de Aptidão Profissional) dos alunos do 3.º ano dos cursos de Dança e de Teatro, numa produção do Balleteatro do Porto.
Seria longo descrever os trabalhos de mais de cinquenta alunos finalistas, mas todos eles cumpriram com rigor os desafios artísticos, teóricos e técnicos que estas provas implicam. Não sendo este um espaço de crítica teatral, quero salientar que as escolas artísticas do Porto demonstraram, mais uma vez, a sua maturidade na criação e formação nas áreas performativas, motivo que deve ser orgulho da cidade e do País.
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Gaza
O escritor e jornalista Luís Osório, sempre tão agudo nos seus textos para o Jornal de Notícias (JN), coloca-nos a pergunta: “Como podem os Judeus fazer o que lhes fizeram?” E o articulista desenvolve, na edição de 29 de Julho de 2025 do JN: “[…] O que agride mais em Gaza é a circunstância deste genocídio ser feito por filhos, netos e bisnetos de quem sofreu na pele a tentativa de genocídio nazi. O que choca é compararmos as imagens dos judeus famintos em 1945 com as crianças esfomeadas na Palestina, e percebermos que são a mesma face de uma alma humana em putrefação. E como pode tanta gente que frequenta as igrejas, que reza a Deus, que fala de moral e de ética, que se indigna com Hitler e as mortandades ficar em silêncio com o que se está a passar? Como é possível dormirem descansados e continuarem a comer a torradinha enquanto leem o jornal? Israel conseguiu rebentar com o capital que tinha. Tornaram impossível a empatia de que eram credores pelo macabro sofrimento que viveram às mãos dos monstros nazis.”

Supostamente, do outro lado da barricada, o jornalista João Miguel Tavares, ao escrever no jornal Público, referindo-se à postura da direcção artística do Teatro Nacional D. Maria II, parece mofar da atitude (expressa num comunicado) que exigia, na última terça-feira de Julho (29/07/25), um cessar-fogo “imediato e permanente” na Faixa de Gaza, sublinhando a necessidade de “responsabilização internacional pelos crimes cometidos”, bem como “a libertação de todos os reféns e o reconhecimento do Estado Palestiniano”.
Para o jornalista João Miguel Tavares – enquanto autor da crónica intitulada “Teatro D. Maria II exige o fim do conflito israelo-palestiniano” –, o teatro e as atitudes condenatórias devem ser inúteis. Mas eu pergunto onde estão as grandes instituições do País (por exemplo, as universidades, as bibliotecas, os centros de investigação, as fundações, etc.) e quais as posições sobre Gaza?

A propósito, cito a jornalista Helena Bento (edição de 15 de Julho de 2024, do Expresso), que assinou o artigo intitulado “Universidades portuguesas afastam corte de relações conjunto com instituições israelitas”.
A referida peça jornalística começa por afirmar que o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portugueses “descarta a possibilidade de ser ado[p]tada uma posição semelhante à de Espanha, onde todas as universidades se comprometeram a rever ou a suspender as parcerias com universidades e centros de investigação israelitas”. O mesmo responsável garante que “a paz e o direito internacional serão sempre defendidos” e “os a[c]tos de terrorismo e discursos de ódio condenados”.
E termino, parafraseando o pastor luterano Martin Niemöller2, testemunha da Alemanha nazista: “[…] Foi então que eles vieram me buscar, e já não havia mais ninguém para me defender.”
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Notas:

1 – Encenador, actor e formador com mais de 15 anos de experiência profissional, Jaime Soares é membro fundador da NAPALM (em 2008), onde exerce, desde então, as funções de director artístico.
2 – Martin Niemöller (1892-1984), conhecido pastor protestante que se opôs ao regime nazista, embora, na década de 1920 e no início da de 1930, ele tenha simpatizado com muitas das ideias nazistas e apoiado movimentos políticos radicais de extrema-direita.
Ele passou os últimos sete anos do regime nazi preso em campos de concentração. O seu pensamento foi inspiração para o poema “E não sobrou ninguém”, de Bertolt Brecht (1889-1956).
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14/08/2025