China e Rússia assinam memorando para construção de novos gasodutos

(monitormercantil.com.br)
A Televisão Central da China informou que o presidente russo, Vladimir Putin, e o presidente chinês, Xi Jinping, estiveram reunidos, em Pequim, para “troca de pontos de vista aprofundada sobre questões internacionais e regionais de interesse comum”, e acordaram em reforçar a cooperação.
De acordo com informações oficiais, as duas partes assinaram mais de 20 documentos bilaterais sobre cooperação, nos domínios da energia, do aeroespacial, da inteligência artificial, da agricultura, da inspeção e quarentena, da saúde, da investigação científica, da educação e dos meios de comunicação social.

Segundo Xi Jinping, os dois países “atribuem grande importância à igualdade soberana, à ordem jurídica internacional e ao multilateralismo”, pelo que devem “continuar a reforçar a cooperação, no âmbito das plataformas multilaterais”, mas continuarão a “conduzir a cooperação, através de grandes projetos, e a promover uma integração mais profunda dos interesses” bilaterais.
A este respeito, Moscovo afirmou que o gasoduto Power of Siberia-2 é um “grandes projetos” a que o presidente chinês aludiu.
No âmbito das conversações, a Gazprom e a China National Petroleum Corporation (CNPC) assinaram um memorando sobre a construção do gasoduto Power of Siberia-2 e do gasoduto de trânsito Soyuz Vostok, através da Mongólia.
Os meios de comunicação social estatais russos publicaram declarações de Alexander Miller, presidente do conselho de administração da empresa russa Gazprom, a afirmar que o gás para a China seria mais barato do que para os consumidores na Europa e que o acordo terá uma duração de 30 anos.

empresa russa Gazprom. (pt.wikipedia.org)
Na ótica de Alexander Miller, “deve ser entendido que os projetos de construção do gasoduto Power of Siberia-2 e do gasoduto Soyuz Vostok” são ambos de particular de relevância, mas “o gasoduto de trânsito através da Mongólia e as correspondentes capacidades de transporte de gás na China serão, agora, o maior e o mais intensivo projeto de capital na indústria do gás no Mundo”. Neste sentido, serão, agora, “discutidas e esclarecidas” todas “as questões relacionadas com o financiamento da construção do gasoduto, bem como as condições comerciais de fornecimento”.
A Rússia e a China também concordaram em aumentar o fornecimento de gás, através das rotas existentes. Neste âmbito, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Guo Jiakun, afirmou que será introduzido um regime de isenção de vistos para os cidadãos russos, a partir de 15 de setembro: “De 15 de setembro de 2025 a 14 de setembro de 2026, haverá uma política experimental de isenção de vistos para os cidadãos russos”, precisou.

Jiakun. (en.wikipedia.org)
A China absteve-se de condenar a agressão militar russa na Ucrânia, com Kiev e os seus aliados a acusarem Pequim de apoiar a produção militar russa e de exportar tecnologia de dupla utilização.
É de assinalar que enquanto a União Europeia (UE) está a discutir a imposição de sanções secundárias contra os países cujas relações com o Kremlin estão a financiar a guerra, a declaração conjunta de Moscovo e Pequim não faz qualquer referência à guerra da Rússia na Ucrânia. Por isso, desiluda-se quem tenha estado à espera de que o encontro entre os dois estadistas iria suavizar, pela diplomacia, a relação entre Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky.
Dificilmente se acredita que o Kremlin deseje a paz, a não ser com pesadas desvantagens para a martirizada Ucrânia.
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O acordo em referência foi celebrado à margem da cimeira de segurança regional extraordinária que motivou a viagem do presidente russo à China, mais propriamente, à cidade portuária de Tianjin, no Norte da China, a 31 de agosto, num momento crucial das conversações sobre a guerra da Rússia na Ucrânia, mas demonstrando uma forte demonstração de unidade entre os líderes do Sul Global.

“Sul Global” é uma expressão geopolítica que abrange países em desenvolvimento e nações que compartilham um histórico de colonialismo, de neocolonialismo e de desigualdades, procurando maior autonomia e um mundo multipolar. Não é uma localização geográfica exata, mas uma identidade e perspetiva política e económica compartilhada, contraposta ao “Norte Global” (países desenvolvidos e ocidentais). Exemplos de grupos que representam o Sul Global incluem o BRICS e o G77+China.
A referida cimeira é a assembleia geral da Organização para Cooperação de Xangai (OCX), uma organização eurasiática de natureza política, económica e de segurança, fundada, em 2001, pela China, pelo Cazaquistão, pelo Quirguistão, pela Rússia, pela Bielorrússia, pelo Cazaquistão, pelo Tajiquistão e pelo Uzbequistão. Posteriormente, expandiu-se com a adesão da Índia e do Paquistão, em 2017, do Irão, em 2023, e da Bielorrússia em 2024. É a maior organização regional do Mundo, em termos de área geográfica e população.

O Afeganistão e a Mongólia são Estados observadores e 14 outros países, na sua maioria do Sudeste Asiático e do Médio Oriente, são “parceiros de diálogo”.
Esta organização estabeleceu relações com Organização das Nações Unidas (ONU), onde tem o estatuto de observador na Assembleia Geral, com a União Europeia (UE), com a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), com a Comunidades dos Estados Independentes (CEI) e com a Organização para a Cooperação Islâmica (OCI).
A OCX tem as suas raízes na Shangai Five, um grupo formado, em 1996, entre a China, o Cazaquistão, o Quirguistão, a Rússia e o Tajiquistão para gerir fronteiras e resolver disputas territoriais. Em 2001, estes países, juntamente com o Uzbequistão, encontraram-se, em Xangai, para anunciar a criação de nova organização com uma cooperação política e económica mais profunda.
Atualmente, funciona como um espaço para a cooperação em diversas áreas, como a segurança, através do combate ao terrorismo, ao separatismo e ao extremismo, com a criação da Estrutura Antiterrorista Regional (RATS); a economia, promovendo a cooperação económica e o desenvolvimento entre os estados-membros; e o fomento do diálogo e da construção de entendimentos, para evitar tensões regionais.
O país anfitrião da cimeira anual é rotativo todos os anos.

Дмитрий Осипенко – Pixabay)
De acordo com os meios de comunicação social estatais chineses e russos, o presidente da Rússia, “chegou à China, no domingo [31 de agosto], com um tapete vermelho estendido, para uma cimeira regional extraordinária”.
Estava previsto – e aconteceu – que o presidente russo, Vladimir Putin, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, e o presidente iraniano, Masoud Pezeshkian, se reuniriam durante a cimeira, o que, segundo os analistas, representa um desafio às abordagens unilaterais e impositivas e, frequentemente, incoerentes dos Estados Unidos da América (EUA), em relação ao comércio e aos conflitos regionais.
Entre as questões relevantes, está o alinhamento das posições de Moscovo e de Pequim sobre a guerra na Ucrânia, num contexto de esforços persistentes, ainda que atrabiliários, dos EUA para pôr fim aos combates.
Apesar de a China afirmar que é um mediador neutro no conflito, as duas nações tornaram-se mais próximas, desde o início da invasão em 2022. E, no início do mês de agosto, o presidente ucraniano rejeitou a possibilidade de a China atuar como garantia de segurança, no caso de um futuro acordo de paz Rússia-Ucrânia para acabar com a invasão de Moscovo.
Antes da sua partida para Tianjin, Vladimir Putin elogiou, a 30 de agosto, as relações entre Moscovo e Pequim, enfatizando que atingiram um “nível elevado sem precedentes”, com especial realce nos aspetos estratégicos e económicos da parceria.

Vladimir Putin deverá permanecer na China, o mais importante país aliado da Rússia, durante quatro dias, numa visita invulgarmente longa para o líder russo.
De acordo com os meios de comunicação social chineses, a cimeira da OCX, de dois dias, que Pequim designa como a “maior de sempre”, será utilizada para “traçar o plano para a próxima década de desenvolvimento do bloco” euroasiático. Com efeito, poderá esclarecer melhor as questões relacionadas com as atividades e com as intenções do grupo.
A cimeira anual, que é, neste ano, organizada pela China, realizou-se poucos dias antes de uma grande parada militar, em Pequim, para assinalar o 80.º aniversário da rendição do Japão, no final da Segunda Guerra Mundial.
Esta parada militar contou com a presença de Vladimir Putin, de quem Xi Jinping é o maior aliado, e com a rara presença de Kim Jong-un, presidente da Coreia do Norte.
O único líder da UE que esteve presente foi o primeiro-ministro eslovaco Robert Fico, ao qual se juntou Aleksandar Vučić, presidente da Sérvia, um dos países candidatos à adesão ao bloco.
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O presidente chinês recebeu os líderes de cerca de 20 países na cimeira de segurança da Organização de Cooperação de Xangai. Apesar de tal não constar na declaração conjunta de Moscovo e de Pequim, sobre a cooperação bilateral entre os dois países e, em concreto, sobre a construção dos gasodutos transiberianos e transmongólicos, a relação entre Pequim e Moscovo tinha de ser o tema central da cimeira desta cimeira extraordinária da OCX.

Numa altura em que os ataques russos continuam a chover sobre a Ucrânia e em que aumentam os apelos europeus a novas sanções contra o Kremlin, o presidente russo, Vladimir Putin, participou no evento, a par do anfitrião, Xi Jinping.
A reunião incluiu, como é óbvio, representantes dos 10 países europeus e asiáticos membros da OCX, um organismo que se apresenta como uma alternativa à ordem mundial liderada pelos EUA.
A cimeira surgiu num momento difícil para alguns destes países, com o presidente dos EUA, Donald Trump, a impor, recentemente, tarifas de 50% à Índia, em grande parte, devido à decisão de Nova Deli de continuar a comprar petróleo russo.
E, além das tensões comerciais mundiais causadas pela política externa da administração da Casa Branca, há também preocupações sobre a potencial escalada da guerra no Leste da Europa, mais de três anos após a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Após o recente bombardeamento russo no centro de Kiev, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Guo Jiakun, sublinhou a importância do diálogo. “O diálogo e a negociação são a única solução viável para a crise ucraniana. Apelamos a todas as partes envolvidas para que respeitem o campo de batalha e não o transponham”, afirmou, em Pequim, a 29 de agosto.

Jiakun, em numa conferência de imprensa em Pequim, a 6 de
janeiro de 2025. (Créditos fotográficos: Ministério das Relações
Exteriores da China – news.cgtn.com)
Não obstante, afirmando que a guerra da Rússia na Ucrânia tem de terminar por meios diplomáticos, a China continua a conceder a Moscovo um apoio económico e político vital.
De acordo com a UE, a China é o maior fornecedor de bens de dupla utilização e de artigos sensíveis que sustentam a base industrial militar da Rússia e que se encontram no campo de batalha. “Sem o apoio da China a Moscovo, a Rússia não poderia continuar a sua guerra de agressão contra a Ucrânia com a mesma força”, afirmou o Serviço Diplomático Europeu (SEAE).
Hosuk Lee-Makiyama, diretor do Centro Europeu para a Economia Política Internacional (ECIPE), disse à Euronews que a mensagem de Pequim sobre a guerra foi muito direta.

Economia Política Internacional. (europeforum.fi)
“A China tem sido muito clara, tanto a nível oficial como não oficial, quando diz que quer ver o conflito terminar, mas também não quer ver a Rússia isolada. E, se falarmos com os Ucranianos, eles dir-nos-ão que não têm preocupações com a China”.
Outro aspeto fundamental da cimeira é o restabelecimento das relações entre a China e a Índia, na sequência das tarifas impostas por Washington a Nova Deli. E Hosuk Lee-Makiyama afirmou que, embora “a resolução da guerra não seja uma prioridade tão elevada para os chineses e [para] os indianos como é para os europeus”, uma perigosa escalada militar na Europa de Leste poderia, aos olhos de Deli e de Pequim, agravar as tensões comerciais globais.
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Quem teve lugar de destaque, na cimeira a OCX, foi António Guterres, secretário-geral da ONU, que foi recebido, pelo líder do país anfitrião, na cidade portuária de Tianjin, palco da cimeira, e que fez uma crítica velada aos EUA, no meio dos desafios que a ONU enfrenta.
“O papel da China na defesa do multilateralismo é fundamental”, afirmou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, ao Presidente chinês, Xi Jinping, à margem da importante cimeira sobre segurança, a 30 de agosto.
O chefe da ONU descreveu o estado do multilateralismo como estando sob fogo. “Assistimos a novas formas de política que, por vezes, são difíceis de compreender, que, por vezes, parecem mais um espetáculo do que esforços diplomáticos sérios, e em que os negócios e a política parecem por vezes também misturados”, afirmou António Guterres.

Em resposta, Xi Jinping afirmou que a China será sempre um “parceiro fiável” da ONU. “A China está disposta a aprofundar a cooperação com as Nações Unidas, a apoiar o seu papel central nos assuntos internacionais e a assumir conjuntamente as suas responsabilidades na manutenção da paz mundial e na promoção do desenvolvimento e da prosperidade”, afirmou o líder chinês.
Porque a cimeira da OCX se realiza num contexto de alteração da ordem geopolítica, pela primeira vez desde 2018, o primeiro-ministro indiano esteve na China, para participar na cimeira e no âmbito de uma aproximação a Pequim que começou no final de 2024, mas que foi acelerada pelas tarifas de 50% aplicadas por Donald Trump, aos produtos indianos. Nova Deli procura, agora, estabelecer laços mais estreitos com Pequim e com outros atores da Eurásia.
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O dito Ocidente e a UE não conseguem isolar a Rússia, nem lhe enfraquecer a economia. A Rússia tem muitos aliados declarados, sabe explorar a diversidade de contactos, mobilizou mecanismos de controlo, tem simpatias, criou dependências e ainda não se desfez o mito de que o gigante transcontinental é perigoso para o Mundo. Tem-se, ao invés, esquecido que os EUA são altamente perigosos, no policiamento do Mundo, na criação de dependências e na substituição de governos.
Por isso, há que reforçar a soberania interna dos diversos países, fazer funcionar a diplomacia e robustecer as alianças entre os diversos blocos de países.
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08/09/2025