O nosso “pequenino quarto”

 O nosso “pequenino quarto”

(portocidadaniaportuguesa.com.br)

Quando eu tinha os meus 15 ou 16 anos, no meu extravagante quarto com paredes castanhas e o tecto castanho muito escuro (foram tolerantes os meus pais) e com os candeeiros (um de tecto e outro na mesa-de-cabeceira) redondos e cor-de-laranja, subia, sem ninguém saber, para cima do guarda-fatos (os pés direitos das casas eram mais altos e o guarda-fatos não o era muito), onde ficava um tempo (nunca terei passado os 20 minutos seguidos lá em cima) a pensar.

Vista de Glasgow a partir do Queen’s Park, na zona sul da cidade. (pt.wikipedia.org)
(Direitos reservados)

Olhar de outra perspectiva, inusitada, para o meu próprio quarto, ajudava-me a ver a minha própria vida e sonhos e projectos com outros olhos. Hoje, ao lembrar-me disto, percebi que é exactamente por isso que adoro viajar. Para olhar para o “quarto Portugal” de um outro ângulo. “Lá fora” já não vou há uns três anos e faz-me falta. Tenho de ver como o vou conseguir fazer. (Desta vez, o objectivo próximo é a Escócia.) É muito importante: perceber que uma simples mudança de paisagens, de hábitos e de língua, tanto nos ajudam a recentrar-nos no nosso pequenino quarto, que é todo o nosso mundo.

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02/10/2025

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Jorge Castro Guedes

Com a actividade profissional essencialmente centrada no teatro, ao longo de mais de 50 anos – tendo dirigido mais de mil intérpretes em mais de cem encenações –, repartiu a sua intervenção, profissional e social, por outros mundos: da publicidade à escrita de artigos de opinião, curioso do Ser(-se) Humano com a capacidade de se espantar como em criança. Se, outrora, se deixou tentar pela miragem de indicar caminhos, na maturidade, que só se conquista em idade avançada, o seu desejo restringe-se a partilhar espírito, coração e palavras. Pessimista por cepticismo, cínico interior em relação às suas convicções, mesmo assim, esforça-se por acreditar que a Humanidade sobreviverá enquanto razão de encontro fraterno e bom. Mesmo que possa verificar que as distopias vencem as utopias, recusa-se a deixar que o matem por dentro e que o calem para fora; mesmo que dela só fique o imaginário. Os heróis que viu em menino, por mais longe que esteja desses ideais e ilusões que, noutras partes, se transformaram em pesadelos, impõem-lhe um dever ético, a que chama “serviços mínimos”. Nasceu no Porto em 1954, tem vivido espalhado pelo Mundo: umas vezes “residencialmente”, outras “em viagem”. Tem convicções arreigadas, mas não é dogmático. Porém, se tiver de escolher, no plano das ideias, recusa mais depressa os “pragma” de justificação para a amoralidade do egoísmo e da indiferença do que os “dogma” de bússola ética.

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