Memórias: Botequim (3)
Tertúlia com Natália Correia. (tezturas.pt)

demonstram que ela é uma necessidade ética ou criadora.
Quando não mo demonstram, não aceito.” (tezturas.pt)
Uma outra memória do Botequim, directamente relacionada comigo, começa antes. Eu era autor e apresentador de um programa sobre teatro na RTP2 (Dramazine). Uma das rubricas era um “abecedário” de entrevistas que o meu grande amigo e não menos grande actor António Cruz fazia. Quando foi a vez do N, eu escolhera Natália Correia como dramaturga.
A produtora viera dizer-me que não conseguia convencer Natália porque ela exigia que a televisão fosse a sua casa. Não podia, de todo, ser porque todos os entrevistados eram enquadrados pelo mesmo cenário. Lá fui ao Botequim e tentei explicar-lhe isso mesmo. Natália resistiu: “Ó meu amigo! Eu gosto muito de si, mas não posso ceder. A televisão anda sempre atrás dos políticos! Tem de vir ter com os poetas e os intelectuais. Somos mais queridos do que imaginam.”
Como eu nada me atrevia a contrapor, apenas repetindo as razões da deslocação dela aos estúdios, Natália já estava ausente das minhas argumentações e prosseguiu: “Eu não posso sair à rua, que o povo vem todo atrás de mim: Natália, candidata-te… Candidata-te, Natália!”

Estávamos próximo das eleições presidenciais em que Mário Soares seria eleito para um segundo mandato. Ela olhou-me bem e concluiu, com um tom conspirativo: “Eu até tive de telefonar ao Mário para o tranquilizar. Que ele podia recandidatar-se, porque eu não me candidataria.”
Lá tive eu de arranjar outra personalidade para a entrevista. E a nossa relação não ficou beliscada. Claro, Natália! Que bom ter o povo atrás dos poetas e dos intelectuais, sem termos permanecido no país em que “[…] Dão-nos um barco e um chapéu / Para tirarmos o retrato / Dão-nos bilhetes para o céu / Levado à cena num teatro” […]!
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24/11/2025