Mulheres exemplares 

 Mulheres exemplares 

A cineasta Alice Guy-Blaché. (Direitos reservados)

A historiadora Lucy Worsley investigou e revela-nos a história de uma suposta
bruxa cujo caso deu origem ao assassinato de milhares de mulheres. (rtp.pt)

A RTP2 repete, numa segunda emissão, um programa que eu já tinha visto e que aborda o tema da bruxaria e o papel das mulheres. Nesta produção da BBC Studios, a historiadora Lucy Worsley investiga, em quatro capítulos dramáticos da História britânica e numa perspectiva contemporânea, os julgamentos das bruxas do século XVI, a peste negra, a loucura do rei George III e os príncipes da torre. 

(pt.wikipedia.org)

No primeiro episódio de “A Caça às Bruxas”, Lucy Worsley aborda, entre outras coisas, como se iniciou, em 1590, este processo que está ligado à Escócia e no qual se destacou o facto de o próprio rei – James VI (Jaime VI da Escócia e I de Inglaterra) – se ter envolvido. O rei tinha ampliado ou alastrado o medo de que as bruxas planeassem matá-lo, depois de ter sofrido tempestades no mar enquanto regressava da Dinamarca.   

(archive.org)

Em 1487, foi lançado o livro “Malleus Meleficarum” (“O Martelo das Bruxas”), pelos inquisidores dominicanos Heinrich Kraemer e James Sprenger. Com 28 edições, esse volumoso manual define as práticas consideradas demoníacas. 

Como regista a Wikipédia, a de obra de Kraemer é “um catálogo de sadismo e perversão”, onde se “conclui que as feiticeiras são geralmente mulheres, em razão da sua suposta credulidade e baixa inteligência”. “Já os homens, considerados mais fortes e inteligentes, estariam mais aptos a abominar a feitiçaria”, lemos ainda na Wikipédia.

Morte na fogueira de três “bruxas” em Baden, na Suíça (em 1585), por
Johann Jakob Wick. (pt.wikipedia.org)

O rei Jaime VI criou, subsequentemente, comissões reais para caçar bruxas no seu reino, recomendando a tortura ao lidar com suspeitas. E, em 1597, escreveu um livro sobre a ameaça do que as bruxas, então, representariam para a sociedade. Nesse “manual de caça”, intitulado “Daemonologie”, o rei James VI (Jaime I, da Inglaterra) nota que “a experiência diária” prova como elas (as bruxas) resistem em confessar sem tortura. Um número aproximado de vítimas é impossível de obter, porque muitos registos foram perdidos ou destruídos. As estimativas atuais do número de pessoas que foram executadas por bruxaria variam de cerca de 35 mil a 50 mil. 

Foto oficial de George Walker Bush, presidente dos Estados Unidos da
América (EUA), de 2001 a 2009. (pt.wikipedia.org)

Entre as torturas aplicadas às mulheres, já nessa época, se destaca a tortura do sono, que consiste, ao que sabemos, em privar as pessoas do sono, mediante uma luz intensa, mantendo-as de pé, sempre acordadas!

Note-se que a “cartilha” supostamente defendida pelo presidente norte-americano G. Bush II (George W. Bush, filho do também presidente George Herbert Walker Bush) excluiu do conceito de “tortura” métodos como o waterboarding (imersão da cabeça da pessoa interrogada em água, com simulação de afogamento) e que, nas palavras de um congressista norte-americano, admitiam a licitude de todos os métodos de interrogatório, parando apenas à beira da mutilação do prisioneiro. 

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A história nunca contada de Alice Guy-Blaché

Também na RTP2, destaco o documentário “Be Natural: A História Nunca Contada de Alice Guy-Blaché” sobre a cineasta nascida em Saint-Mandé, na França, e que foi uma verdadeira pioneira ao entrar no mundo do cinema, logo no seu início. 

Acerca da sua vida e obra, a página electrónica da RTP regista que Alice Guy-Blaché começou “a carreira como secretária de Léon Gaumont” e que, “aos 23 anos de idade, inspirou-se para fazer o seu próprio filme chamado ‘La Fée aux Choux’ (A Fada do Repolho), um dos primeiros filmes de ficção”.

A mesma nota refere que, após “a carreira cinematográfica na Gaumont, seguiu para os EUA onde fundou e dirigiu o seu próprio estúdio em Fort Lee, Nova Jersey. 
Ao longo da sua carreira, Alice Guy-Blaché escreveu, produziu ou realizou mil filmes, incluindo 150 com som sincronizado durante a era “muda”. “O seu trabalho inclui comédias, faroestes e dramas, bem como filmes com temas inovadores, como o abuso infantil, a imigração, a paternidade planeada ou o empoderamento feminino”, acrescenta-se no texto de enquadramento, prosseguindo: “Alice Guy-Blaché conquistou um lugar na [H]istória ao fazer o primeiro filme conhecido com um elenco totalmente negro.” 

(rtp.pt)

Na nota informativa avançada pela RTP2, lemos que o “documentário de Pamela Green revela a verdadeira história de Alice Guy-Blaché, destacando não apenas as suas contribuições pioneiras para o nascimento do cinema, mas também a sua aclamação como força criativa e empreendedora nos primeiros anos da produção cinematográfica, e o ápice da fama e do sucesso que alcançou antes de ser excluída da indústria que ela própria ajudou a criar”.

Alice Guy, co-fundadora da Solax Company.
(pt.wikipedia.org)

“Através de testemunhos de protagonistas do mundo do cinema, imagens raras de entrevistas a Alice Guy-Blaché”, o documentário, agora apresentado pela RTP2, “reescreve” a História do Cinema, “revelando pela primeira vez toda a extensão da vida e obra de Alice Guy-Blaché”.

Entre as curiosidades que o documentário salienta, sublinha o facto de, nas diferentes publicações sobre a História do Cinema, o nome desta mulher notável não figurar ou não ser referido. Em particular, na obra de Georges Sadoul1, que tenho e que considerava como a mais completa, na altura da sua primeira edição.  

“Be Natural”, retira o título de uma orientação que a realizadora da Solax Company dava aos seus actores: “Sejam naturais!” Este não é o primeiro documentário sobre Guy-Blaché, antes deste documentário foi realizado um filme de Susan Koch e um outro – “Le Jardin Oublié: La vie et L’oeuvre d’Alice Guy-Blaché” – com produção canadiana, datada de 1996 e dirigida por Marquise Lepage, que contou com a participação da nora da cineasta, Roberta Blaché, e da neta, Adrienne. 

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A resistente Aurora Rodrigues

(sicnoticias.pt)

Sobre uma forma de “tortura medieval” aplicada, no século XX, em Portugal, chamo a vossa atenção para o trabalho jornalístico intitulado “A mulher que mais horas de tortura sofreu às mãos da PIDE”. Sob este título, os jornalistas Carolina Reis, Manuel Ferreira e Margarida Martins da SIC, contaram, nas vésperas do cinquentenário do 25 de Abril, a história de Aurora Rodrigues marcada por um dramático recorde. Hoje, é uma procuradora jubilada e conta que nunca perdeu a força. 

(sicnoticias.pt)
Aurora Rodrigues e Susaninha, duas amigas no Funchal.
(Créditos fotográficos: António Rodrigues)

Conheci esta corajosa mulher no Funchal, nos anos de 1978 a 1982. Privámos como amigos de outros amigos e camaradas. Curiosamente, talvez pelo respeito do seu passado, nunca abordámos o tema da tortura nem do cárcere. Afortunadamente, não houve tempo para isso. Notável, inteligente, pequena e de riso alegre, a Aurorinha (como lhe chamávamos, entre os seus amigos) é uma das minhas belas recordações madeirenses. Aprendi a conhecê-la e a valorizá-la muito, passado algum tempo e na distância. 

“Era maio de 1973. Aurora tinha 21 anos. Foram, pelo menos, 20 dias, 480 horas de tortura”, anotam os jornalistas Carolina Reis, Manuel Ferreira e Margarida Martins da SIC, dando voz a Aurora Rodrigues: “Sobretudo, era a tortura do sono. Impedir de dormir, consecutivamente, dia e noite. O tempo todo. Tinha só um banco sem costas, nunca tive uma cadeira.”

Mas Aurora Rodrigues, garante aos jornalistas, “tinha força”: “Não quebrava. Eles não iriam fazer de mim aquilo que queriam.”

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Uma actriz torturada 

Conhecida do grande público pelo seu papel no clássico “The Shining” (em 1980), Shelley Duvall morreu no recente dia 11 de Julho, aos 75 anos, durante o sono, devido a complicações relacionadas com a diabetes, segundo informou o seu companheiro à revista especializada em entretenimento The Hollywood Reporter

Morreu, a 11 de Julho (quinta-feira), a atriz Shelley Duvall, celebrizada no
cinema pelo icónico papel no filme “The Shining”, realizado por Stanley
Kubrick, numa adaptação de um livro de Stephen King.
(cnnportugal.iol.pt)

Conta-se que foi literalmente torturada nesse filme pelo cineasta e realizador Stanley Kubrick, com repetição de cenas em mais de uma centena de vezes. O genial realizador não teve para ela a genialidade da amabilidade nem do trato ou da cortesia. Desta actriz lembro-me, sobretudo, nas participações nos filmes do grande realizador norte-americano Robert Altman e num dos seus papéis como Olívia Palito (ela era magrinha, mas alta e de aparência desajeitada) no filme “Popeye”, de Robert Altman, no ano de 1980, junto de Robin Williams. 

Shelley Duval como Olívia Palito. (Créditos fotográficos: Direitos Reservados – jn.pt)

Uma jovem exemplar 

Raquel tem 18 anos e vende pastilhas elásticas na rua para pagar os
estudos: “Ajudem-me a realizar o sonho.” (sic.pt)

Raquel Barros sonha tirar o Curso de Marketing, em Aveiro. Os pais não têm possibilidades financeiras para a ajudar.

Não queria estudar, mas mudou de ideias. Agora vende pastilhas para pagar a universidade”, lemos na página electrónica da NiTfm.

Coragem, Raquel! Se me cruzar contigo, compro uma pastilha.

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Nota:

1 – “Historia del Cine Mundial, desde los orígenes”, de Georges Sadoul – edición de Siglo XXI. Consultar na InternetHistoria del cine mundial: desde los orígenes – Georges Sadoul – Google Livros 

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08/08/2024

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Roberto Merino

Roberto Merino Mercado nasceu no ano de 1952, em Concepción, província do Chile. Estudou Matemática na universidade local, mas tem-se dedicado ao teatro, desde a infância. Depois do Golpe Militar no Chile, exilou-se no estrangeiro. Inicialmente, na então República Federal Alemã (RFA) e, a partir de 1975, na cidade do Porto (Portugal). Dirigiu artisticamente o Teatro Experimental do Porto (TEP) até 1978, voltando em mais duas ocasiões a essa companhia profissional. Posteriormente, trabalhou nos Serviços Culturais da Câmara Municipal do Funchal e com o Grupo de Teatro Experimental do Funchal. Desde 1982, dirige o Curso Superior de Teatro da Escola Superior Artística do Porto. Colabora também como docente na Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, desde 1991. E foi professor da Balleteatro Escola Profissional durante três décadas. Como dramaturgo e encenador profissional, trabalhou no TEP, no Seiva Trupe, no Teatro Art´Imagem, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (UP) e na Faculdade de Direito da UP, entre outros palcos.

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