O ciclo e as escolas artísticas no TNSJ e no TMP 

 O ciclo e as escolas artísticas no TNSJ e no TMP 

Representação pelos alunos de Teatro da ESAP. (Créditos fotográficos: Hilário Barrias, aluno da licenciatura em Fotografia da ESAP)

Começo por me referir a um ciclo de representações iniciado há mais de uma década do qual fazemos parte, desde o início, eu – em representação da Escola Superior Artística do Porto (ESAP) – e a sua licenciatura em Teatro, quando era professor dessa instituição. Esse evento teve o generoso acolhimento do director artístico do Teatro Nacional São João (TNSJ), nessa época, o encenador Nuno Carinhas, e do director de Produção, Salvador Santos.  

(Créditos fotográficos: Pedro Figueiredo – e-cultura.pt)

Assim, a partir de então, todos os anos, o TNSJ tem sido o palco dos projectos e das provas finais dos alunos de várias escolas de Arte do Porto: “[…]  um programa que cria pontes entre a formação académica e a proje[c]ção de um futuro profissional. Os espe[c]táculos levantados pelos alunos finalistas dos cursos de Teatro da ESMAE e da ACE envolvem todas as valências teatrais (interpretação, cenografia, figurinos, luz, som, dire[c]ção de cena e produção).”

Seguindo uma nota informativa do TNSJ, lemos ainda: “As apresentações públicas dos finalistas das licenciaturas em Artes Dramáticas / Formação de A[c]tores da Universidade Lusófona do Porto e em Teatro da ESAP são oportunidades de imersão num contexto profissional e de confronto com representantes do tecido artístico, favorecendo a futura integração dos alunos. Na primeira mostra pública das competências acumuladas ao longo de três anos, os finalistas de Dança e de Teatro do Balleteatro apresentam as suas Provas de Aptidão Profissional. Resultantes de proje[c]tos artísticos próprios, estas provas são o remate de uma pesquisa criativa e de uma exploração de novas soluções cénicas e performativas.”

(tnsj.pt)

Dos espectáculos a que pude assistir no Teatro Carlos Alberto (TeCA), destaco “The Amazing Show of Isaac Flores”, um trabalho escrito e encenado por Marta Freitas Almendra, com interpretação dos alunos finalistas da licenciatura em Artes Dramáticas da Universidade Lusófona do Porto. Esse texto parece responder à pergunta: “Será o palco um espelho da nossa sede por desgraça?”

Jaime Soares1 foi o responsável pela encenação deste ano da representação dos alunos da ESAP, com base nos  textos de Raúl Brandão, de Javier Tomeo, de Harold Pinter e da sua própria autoria.  

(napalm.pt)

Jaime Soares – que é o director artístico da NAPALM-ctdac (Companhia de Teatro Dança em Conjunto ou Alternadamente) – pretende, pois, dar respostas às perguntas enunciadas como ponto de partida para este trabalho: “Fazer o quê, dizer o quê? Fazer como? Em teatro, nem sempre há respostas para as perguntas que os artistas colocam a si próprios. O que há são tentativas. Saltos para o vazio, na esperança de não partir os dentes no chão… experimentar e contaminar, provocar, encontrar propósito(s), explorar zonas onde o belo e o grotesco se confundem, onde o corpo, o som, a imagem e a palavra se cruzam sem hierarquia.”  

E, finalmente, as PAP (Provas de Aptidão Profissional) dos alunos do 3.º ano dos cursos de Dança e de Teatro, numa produção do Balleteatro do Porto. 

Seria longo descrever os trabalhos de mais de cinquenta alunos finalistas, mas todos eles cumpriram com rigor os desafios artísticos, teóricos e técnicos que estas provas implicam. Não sendo este um espaço de crítica teatral, quero salientar que as escolas artísticas do Porto demonstraram, mais uma vez, a sua maturidade na criação e formação nas áreas performativas, motivo que deve ser orgulho da cidade e do País. 

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Gaza

O escritor e jornalista Luís Osório, sempre tão agudo nos seus textos para o Jornal de Notícias (JN), coloca-nos a pergunta: “Como podem os Judeus fazer o que lhes fizeram?” E o articulista desenvolve, na edição de 29 de Julho de 2025 do JN: “[…] O que agride mais em Gaza é a circunstância deste genocídio ser feito por filhos, netos e bisnetos de quem sofreu na pele a tentativa de genocídio nazi. O que choca é compararmos as imagens dos judeus famintos em 1945 com as crianças esfomeadas na Palestina, e percebermos que são a mesma face de uma alma humana em putrefação. E como pode tanta gente que frequenta as igrejas, que reza a Deus, que fala de moral e de ética, que se indigna com Hitler e as mortandades ficar em silêncio com o que se está a passar? Como é possível dormirem descansados e continuarem a comer a torradinha enquanto leem o jornal? Israel conseguiu rebentar com o capital que tinha. Tornaram impossível a empatia de que eram credores pelo macabro sofrimento que viveram às mãos dos monstros nazis.”

Uma família sentada ao redor de uma tigela de feijão na sua tenda em Rafah, no Sul da Faixa de Gaza (em Julho de 2024). (Créditos fotográficos: Unicef/Abed Zagout)

Supostamente, do outro lado da barricada, o jornalista João Miguel Tavares, ao escrever no jornal Público, referindo-se à postura da direcção artística do Teatro Nacional D. Maria II, parece mofar da atitude (expressa num comunicado) que exigia, na última terça-feira de Julho (29/07/25), um cessar-fogo “imediato e permanente” na Faixa de Gaza, sublinhando a necessidade de “responsabilização internacional pelos crimes cometidos”, bem como “a libertação de todos os reféns e o reconhecimento do Estado Palestiniano”.

Para o jornalista João Miguel Tavares – enquanto autor da crónica intitulada “Teatro D. Maria II exige o fim do conflito israelo-palestiniano” –, o teatro e as atitudes condenatórias devem ser inúteis. Mas eu pergunto onde estão as grandes instituições do País (por exemplo, as universidades, as bibliotecas, os centros de investigação, as fundações, etc.) e quais as posições sobre Gaza?

(Créditos fotográficos: UNICEF/Ajjour)

A propósito, cito a jornalista Helena Bento (edição de 15 de Julho de 2024, do Expresso), que assinou o artigo intitulado “Universidades portuguesas afastam corte de relações conjunto com instituições israelitas”.

A referida peça jornalística começa por afirmar que o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portugueses “descarta a possibilidade de ser ado[p]tada uma posição semelhante à de Espanha, onde todas as universidades se comprometeram a rever ou a suspender as parcerias com universidades e centros de investigação israelitas”. O mesmo responsável garante que “a paz e o direito internacional serão sempre defendidos” e “os a[c]tos de terrorismo e discursos de ódio condenados”.   

E termino, parafraseando o pastor luterano Martin Niemöller2, testemunha da Alemanha nazista: “[…] Foi então que eles vieram me buscar, e já não havia mais ninguém para me defender.”

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Notas:

Jaime C. Soares (jpn.up.pt)

1 – Encenador, actor e formador com mais de 15 anos de experiência profissional, Jaime Soares é membro fundador da NAPALM (em 2008), onde exerce, desde então, as funções de director artístico.  

2 – Martin Niemöller (1892-1984), conhecido pastor protestante que se opôs ao regime nazista, embora, na década de 1920 e no início da de 1930, ele tenha simpatizado com muitas das ideias nazistas e apoiado movimentos políticos radicais de extrema-direita.

Ele passou os últimos sete anos do regime nazi preso em campos de concentração. O seu pensamento foi inspiração para o poema “E não sobrou ninguém”, de Bertolt Brecht (1889-1956).

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14/08/2025

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Roberto Merino

Roberto Merino Mercado nasceu no ano de 1952, em Concepción, província do Chile. Estudou Matemática na universidade local, mas tem-se dedicado ao teatro, desde a infância. Depois do Golpe Militar no Chile, exilou-se no estrangeiro. Inicialmente, na então República Federal Alemã (RFA) e, a partir de 1975, na cidade do Porto (Portugal). Dirigiu artisticamente o Teatro Experimental do Porto (TEP) até 1978, voltando em mais duas ocasiões a essa companhia profissional. Posteriormente, trabalhou nos Serviços Culturais da Câmara Municipal do Funchal e com o Grupo de Teatro Experimental do Funchal. Desde 1982, dirige o Curso Superior de Teatro da Escola Superior Artística do Porto. Colabora também como docente na Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, desde 1991. E foi professor da Balleteatro Escola Profissional durante três décadas. Como dramaturgo e encenador profissional, trabalhou no TEP, no Seiva Trupe, no Teatro Art´Imagem, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (UP) e na Faculdade de Direito da UP, entre outros palcos.

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