Rabindranath Tagore (Calcutá, 1861-1941)

Rabindranath Tagore (revistaprosaversoearte.com)

Aproveitei os dias de férias de Natal para reler livros esquecidos. Nesta vez, uma breve peça de teatro escrita pelo poeta e dramaturgo bengali Tagore, intitulada “O Carteiro do Rei”, seguida por uma colectânea de breves relatos sob o título “A Lua Nova”.
Na peça, o protagonista, um rapaz chamado Amal que, por se encontrar doente e por ordem do seu médico aiurvédico (antiga medicina indiana dos Vedas), não pode sair da sua casa nem do seu quarto. Assim, só pode olhar através da sua janela as pessoas que, de vez em quando, passam em frente, com as quais estabelece breves e belos diálogos. Nesses diálogos, destacam-se os que são estabelecidos entre Doioala, vendedor ambulante de queijinhos artesanais, e Sudha, a rapariga que vende flores, envolvendo também os rapazes que jogam diante da sua janela, com os seus brinquedos.

A todos eles, Amal promete seguir, na sua vida futura. Amal tem a ilusão de receber uma carta do rei, a qual espera que, entretanto, lhe chegue, pois, em frente da sua janela encontra-se a sede dos correios. O jovem está extremamente doente e, por fim, de forma simbólica ou metafórica, anuncia-se a chegada da carta do rei, antes de a vida de Amal expirar. E também quando Sudha, a rapariga das flores, chega para dizer que não o esqueceu.
À partida, sabemos que o jovem Amal está condenado. Os diálogos são breves momentos de vida ou quadros, quase paisagens, que descrevem a vida quotidiana da aldeia e das suas gentes.
Neste breve diálogo que se segue, entre Amal e o fabricante de queijos, apercebemo-nos de que forma o jovem Amal imagina o mundo exterior:

Tagore foi um autor que muito influenciou escritores chilenos na sua época. No seu livro “20 Poemas de Amor y una Canción Desesperada”, Pablo Neruda, no “Poema 16”, faz uma paráfrase de um poema de Tagore. Foi acusado de plágio. E, por estranho que pareça, participaram neste processo, em nada dignificante, três outros grandes poetas chilenos: Volodia Teitelboim, Paulo de Rocka e Vicente Huidobro. Todos eles poetas ilustres.

No mundo – ou mundinho, melhor dito – da literatura, são muitos os casos de grandes rivalidades entre autores, todos eles de grande dimensão.
Não sei de nenhuma entre os três grandes trágicos gregos, mas já li num documento que Sófocles se levantou durante uma representação, em sinal de luto, quando soube da morte de Eurípedes (406 a.C.), o qual se encontrava exilado na Macedónia.
De facto, desde a época de Shakespeare (ou de Christopher Marlowe) até aos nossos dias, a História da Literatura está repleta de rivalidades literárias. Essas disputas, muitas vezes, ultrapassaram as páginas dos livros e tornaram-se pessoais, alimentando uma rivalidade que chegava a durar anos, até mesmo décadas.
Alguns casos notáveis são a rivalidade entre Ernest Hemingway e James Joyce, a qual começou quando Hemingway criticou publicamente o estilo de Joyce, chamando-o de “mau escritor”. Joyce não gostou das críticas e respondeu com uma série de comentários mordazes sobre Hemingway.
Em Espanha, foram célebres as rivalidades entre Francisco de Quevedo e Luis de Gôngora, em pleno Século de Ouro Espanhol.

Também Miguel de Cervantes teve um rival à altura: o dramaturgo Lope de Vega.
Jean-Paul Sartre e Albert Camus conheceram-se durante a Resistência, em Paris, e tornaram-se amigos íntimos. Ambos cultivaram o existencialismo na filosofia e na literatura, apesar de Sartre apenas valorizar Camus como escritor. Recorde-se que, nos anos 50, eram as duas figuras intelectuais mais importantes do seu tempo.
Também sabemos de uma bofetada, em 1976, entre os escritores sul-americanos Mario Vargas Llosa e Gabriel García Márquez.
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Notas:
1 – Tagore participou no movimento nacionalista indiano e era amigo pessoal de Mahatma Gandhi que o chamou “Sentinela da Índia”. Lemos na Wikipédia que, como escritor, tornou-se famoso na Índia, logo nos primeiros anos da sua carreira literária, alcançando notoriedade no Ocidente com a publicação dos seus textos traduzidos para Inglês, muitos deles pelo próprio autor. Tagore ganhou a admiração de escritores como William Butler Yeats, que assinou a apresentação do seu livro “Gitanjali”, na sua edição britânica. Em 1913, torna-se o primeiro escritor asiático a ser agraciado com o Prémio Nobel da Literatura.


2 – Na versão inglesa, o título da obra é “The Post Office”. A versão francesa foi traduzida por André Gide e intitula-se “Amal et la Lettre du Roi”. Juan Ramón e Cecília Meireles decidiram, também, intitulá-la “O Carteiro do Rei” (“El Cartero del Rey”).
3 – Em 1986, a Escola de Formação Artística “Seiva Trupe” do Porto, sob a direcção de Fernando R. Umaña, realizou a encenação desta obra.
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30/01/2025