Serviço Nacional de Saúde e privados

 Serviço Nacional de Saúde e privados

(Créditos fotográficos: Jafar Ahmed – Unsplash)

Tem sido assunto de primeira ordem política e recorrente na própria campanha eleitoral, que agora findou, se o Serviço Nacional de Saúde (SNS) deve ou não ser complementado pelos privados. Por mim, se for na perspectiva de complementaridade e não de desvio de verbas nem de enfraquecimento de recursos do SNS, sinceramente, não vejo problema. Só que importa, antes de tudo, como garantia, que os privados mudem, desde já, algumas das suas práticas. E vou dar só dois exemplos.

Um conhecido meu, em Lisboa, há sete anos já, habitualíssimo utilizador de um hospital privado, numa situação de extrema urgência, tendo recorrido a esse mesmo hospital, onde, inclusive, o director clínico era seu amigo, ficou à espera de que a mulher depositasse uma caução de 20 mil euros para ser assistido.

(Créditos fotográficos: National Cancer Institute – Unsplash)

Esta disposição devia ser absolutamente proibida e razão bastante para cessação do alvará médico do hospital em causa. Atendia-o primeiro em emergência e, admito, caso ele não tivesse meios de garantir os custos, reencaminhava-o para um hospital público. Agora, “20 mil euros ou morres”, é chocante! É mais um serviço de complementaridade com uma agência funerária!

A outra situação passa-se mesmo comigo. Tendo sido feita requisição médica para a realização de um estudo respiratório do sono, para despiste das causas (uma vez que sou doente cardíaco), os hospitais privados “com acordo com o SNS” não fazem o exame comparticipado! Sou de entendimento que essa devia ser uma condição sine qua non para a obtenção de alvará: garantir que todos os serviços que o hospital presta têm cobertura para serem realizados com comparticipação através do SNS.

Estes “cartões de visita” da medicina privada são, para mim, o primeiro ponto a determinar para que lhes seja atribuído um carácter de complementaridade da medicina pública no âmbito do SNS. Sem esse passo, não me merece nenhuma credibilidade a ideia de complementaridade. É mais de concupiscência financeira.

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19/05/2025

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Jorge Castro Guedes

Com a actividade profissional essencialmente centrada no teatro, ao longo de mais de 50 anos – tendo dirigido mais de mil intérpretes em mais de cem encenações –, repartiu a sua intervenção, profissional e social, por outros mundos: da publicidade à escrita de artigos de opinião, curioso do Ser(-se) Humano com a capacidade de se espantar como em criança. Se, outrora, se deixou tentar pela miragem de indicar caminhos, na maturidade, que só se conquista em idade avançada, o seu desejo restringe-se a partilhar espírito, coração e palavras. Pessimista por cepticismo, cínico interior em relação às suas convicções, mesmo assim, esforça-se por acreditar que a Humanidade sobreviverá enquanto razão de encontro fraterno e bom. Mesmo que possa verificar que as distopias vencem as utopias, recusa-se a deixar que o matem por dentro e que o calem para fora; mesmo que dela só fique o imaginário. Os heróis que viu em menino, por mais longe que esteja desses ideais e ilusões que, noutras partes, se transformaram em pesadelos, impõem-lhe um dever ético, a que chama “serviços mínimos”. Nasceu no Porto em 1954, tem vivido espalhado pelo Mundo: umas vezes “residencialmente”, outras “em viagem”. Tem convicções arreigadas, mas não é dogmático. Porém, se tiver de escolher, no plano das ideias, recusa mais depressa os “pragma” de justificação para a amoralidade do egoísmo e da indiferença do que os “dogma” de bússola ética.

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