A mediocridade nos poderes

 A mediocridade nos poderes

(madeira.rtp.pt)

Cada vez mais, fico chocado com quem em Portugal detém os poderes. Não falo, especialmente, de política (no sentido de gestão directa da coisa pública), embora nela se integre e de que maneira. Falo de direcções de instituições ou de organizações, da cultura à comunicação social, e desta ao mundo empresarial, dos sistemas centrais aos locais, da direita à esquerda, no desporto, nas colectividades, nos sindicatos, na escola pública e na privada… Em tudo.

(Imagem gerada por IA – firefly.adobe.com)

Uma vez a mediocridade instalada nos poderes, a própria organiza-se na única coisa em que ela é capaz (muitas vezes, nos postos intermédios e não no topo): o instinto de sobrevivência de si mesma. Quando alguém se destaca, mesmo que servindo os interesses da organização e sem querer aceder à direcção, forma-se um cerco para evitar que ponha as suas aptidões e saberes ao serviço da própria organização, não vá alguém dar conta de quão mau é quem dirige (ou quem executa o que quem dirige decide). Esta mediocridade é a principal responsável pela queda generalizada do conhecimento, do gosto e da vontade colectiva.

É uma praga que, em democracia, prolifera com ruído e que, em ditadura, abafa vozes. Mas, no essencial, o resultado não difere muito. Diferem os meios e a possibilidade de denunciar. Mas tudo cai em saco roto. Só poderemos sair (e não é certo que saiamos) deste impasse com outros medíocres (ainda que aparecendo como salvadores) e com a sua posterior derrocada, se se forjar na resistência a exigência e não igual mediocridade.

(Imagem gerada por IA – firefly.adobe.com)

Neste momento, resta esperar a queda desta, ver a ascensão da outra e começar a preparar uma resistência crítica (e não papagueante inútil). Defender o esterco que está é inútil. Pensar que o que vem a seguir não é esterco, é ingenuidade ou mera imbecilidade. Não é para hoje, nem para amanhã, o combate. É para depois de amanhã. Não será já para o meu tempo. Apenas alerto sobre o que me parece. Pelo meio, é preciso tentar que as máquinas da mediocridade sofram um rombo aqui ou ali. Mesmo que sem efeito muito visível, mesmo que criando só uma bolha: são ensaios (pouco aprimorados ainda, mas são) para o tal depois de amanhã.

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Nota do Director:

O jornal sinalAberto, embora assuma a responsabilidade de emitir opinião própria, de acordo com o respectivo Estatuto Editorial, ao pretender também assegurar a possibilidade de expressão e o confronto de diversas correntes de opinião, declina qualquer responsabilidade editorial pelo conteúdo dos seus artigos de autor.

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22/09/2025

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Jorge Castro Guedes

Com a actividade profissional essencialmente centrada no teatro, ao longo de mais de 50 anos – tendo dirigido mais de mil intérpretes em mais de cem encenações –, repartiu a sua intervenção, profissional e social, por outros mundos: da publicidade à escrita de artigos de opinião, curioso do Ser(-se) Humano com a capacidade de se espantar como em criança. Se, outrora, se deixou tentar pela miragem de indicar caminhos, na maturidade, que só se conquista em idade avançada, o seu desejo restringe-se a partilhar espírito, coração e palavras. Pessimista por cepticismo, cínico interior em relação às suas convicções, mesmo assim, esforça-se por acreditar que a Humanidade sobreviverá enquanto razão de encontro fraterno e bom. Mesmo que possa verificar que as distopias vencem as utopias, recusa-se a deixar que o matem por dentro e que o calem para fora; mesmo que dela só fique o imaginário. Os heróis que viu em menino, por mais longe que esteja desses ideais e ilusões que, noutras partes, se transformaram em pesadelos, impõem-lhe um dever ético, a que chama “serviços mínimos”. Nasceu no Porto em 1954, tem vivido espalhado pelo Mundo: umas vezes “residencialmente”, outras “em viagem”. Tem convicções arreigadas, mas não é dogmático. Porém, se tiver de escolher, no plano das ideias, recusa mais depressa os “pragma” de justificação para a amoralidade do egoísmo e da indiferença do que os “dogma” de bússola ética.

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