As tecnologias digitais não substituem os professores

 As tecnologias digitais não substituem os professores

(pixabay.com)

Há muita diversidade de opiniões sobre este tema. Há quem afirme que as tecnologias, mais tarde ou mais cedo, substituirão os docentes. Esse foi, por exemplo, um dos sonhos da série televisiva de grande sucesso “Silicon Valley”. Mas há também muitos que consideram que tais tecnologias não substituem os professores, nem nunca os poderão substituir. Este é, entre outros, o caso de Mozart Neves Ramos, um dos grandes educadores do Brasil na actualidade, autor de obras fundamentais como “Educação Sustentável” (de 2006), “Educação Brasileira: Uma Agenda Inadiável”(de 2015) e “Sem Educação não Há Futuro” (de 2019).

(imdb.com)

Os que consideram que, mais tarde ou mais cedo, as tecnologias digitais podem vir a substituir os docentes, pensarão certamente no extraordinário potencial das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). Numa fase inicial, são levados a pensar que estas devem ter um uso adequado, explorando todas as suas vantagens. E, neste quadro, os docentes reduzem o seu papel servindo, apenas, de guia aos alunos e alunas, no labirinto de conhecimentos em permanente expansão, que vão encontrar nas suas largas trajectórias de vida.

Em circunstâncias destas, alguns previram, há muito, que os docentes estavam condenados a desaparecer, pois, pura e simplesmente, não fariam falta. Para tais pensadores, a máquina substituiria  facilmente o docente. E, convictos da sua verdade, propalaram aos quatro ventos que as máquinas até fariam uma maior divulgação de conhecimentos, tornando-os mais acessíveis a todos. Como não podia deixar de ser, viram, então, uma fácil resolução para a falta de professores, um problema actual e universal.

Imagem gerada por IA. (Créditos de imagem: Alexandra_Koch – Pixabay)

Quanto a nós, estas previsões não são assim tão convincentes, porque o magistério efectivo, feito por homens e por mulheres, ainda hoje, continua a ser uma prioridade em todos os países. Os docentes continuam, pois, hoje, a ser actores fundamentais. O professor e a professora têm de continuar a ser o guia  dos discentes, desde a infância até à idade adulta.

Num dos países com melhores resultados escolares, como a Finlândia, os bons resultados são devidos a muitos factores. Há, porém, um que é central e que não pode ser esquecido: os professores da Finlândia são altamente qualificados, com excelente formação profissional. Neste país, a um professor ou professora, com um emprego a tempo integral, exige-se um diploma de mestrado. Além de que a selecção profissional é um processo altamente rigoroso e só, de facto, os melhores são escolhidos para a docência, tendo de provar a sua competência inerente aos conteúdos científicos a ensinar e em relação aos conhecimentos psicopedagógicos.

(europeanway.com.br)

Pensando no panorama educativo que, neste momento, temos em Portugal, resta-nos concluir que tudo parece ter piorado. Temos falta de docentes nas escolas. O próprio Ministério da Educação, Ciência e Inovação o assume, embora se baralhe nos números! Mas temos, sobretudo, falta de docentes com formação científica e formação psicopedagógica.

Este aspecto foi, há muito, descurado em Portugal. Houve um tempo em que se fez boa formação de professores, quer a nível científico quer a nível psicopedagógico, e em moldes aceitáveis. Hoje, não parece ser o caso. Cremos que está na hora de a tutela ministerial repensar, equilibradamente, o ensino dos conteúdos científicos e, principalmente, a parte psicopedagógica. Todos conhecemos o velho adágio de que, para ensinar Latim ao João, não basta conhecer o Latim. Temos de conhecer o Latim e o João.

Actualmente, temos de formar professores que sejam verdadeiros facilitadores da aprendizagem, usando metodologias activas diversificadas. Pois, todos sabemos que a pedagogia magistercentrista é uma tortura para os nossos alunos e alunas. E todos conhecemos desabafos de discentes que, constantemente, se queixam da pedagogia exclusivamente expositiva dos seus docentes! Sabemos também que quem pratica unicamente a pedagogia expositiva está, apenas, a contribuir para a domesticação dos jovens que tem na sala de aulas.

Todos sabemos que a pedagogia magistercentrista é uma tortura para os nossos alunos e alunas. (passapalavra.info)

Assim, é urgente formar professores que eduquem para a diversidade e que sejam capazes de ser inclusivos. Temos de formar professores que ajudem os alunos e as alunas a desenvolverem competências relacionais e que aprendam a respeitar o meio ambiente. Temos de formar professores que sejam capazes de promover ambientes de respeito e de segurança na sala de aulas, que estimulem a autonomia, além de saberem usar estratégias e recursos didácticos diversificados. É, igualmente, fundamental que os professores saibam trabalhar em equipa com os seus colegas e que colaborem na construção de verdadeiras comunidades educativas, integrando os alunos, os colegas docentes, os funcionários, os pais e outros encarregados de educação.

Hoje, ninguém parece ter dúvidas de que o segredo do sucesso escolar está, em primeiro lugar, na qualidade da relação pedagógica que se estabelece na sala de aulas. Parece ser legítimo, pois, perguntar: Será que uma máquina conseguirá ter a mesma qualidade na relação pedagógica que os docentes estabelecem? Será um robot capaz de promover ambientes seguros e respeitosos da mesma forma que os professores e professoras?

(Créditos de imagem: Getty Images – epocanegocios.globo.com)

Dito isto, que fique claro que os docente não estão proibidos de usar as TIC na sala de aulas. Bem pelo contrário! Podem usá-las, desde que o façam com critério e equilíbrio. Usar as novas TIC, em situação de sala de aula, deve ser, aliás, uma competência que todos os docentes devem adquirir, para não correrem o risco de serem ultrapassados pelos seus alunos seduzidos, cada vez mais, por esses novos desafios.

Outro esforço que a tutela ministerial terá de fazer, agora, é estimular os docentes a possuírem um espírito de formação contínua. E, como é claro, tem de procurar, com urgência, oferecer aos docentes condições de trabalho mais atraentes, mais motivadoras, incluindo salários dignos e uma perspectiva de carreira. Observamos que estes aspectos têm andado um pouco esquecidos.

Não é, afinal, por tudo isto que os docentes portugueses continuam a lutar?

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Nota da Redação:

Este texto de José Vieira Lourenço é uma versão mais alargada de um artigo de opinião com igual título e que já foi publicado no Jornal Mirante, de Miranda do Corvo, em Dezembro de 2024.

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05/12/2024

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José Vieira Lourenço

José Vieira Lourenço é da colheita de Agosto de 1952. Estudou Teologia e fez a licenciatura e o mestrado em Filosofia Contemporânea, na Universidade de Coimbra. Professor aposentado do Ensino Secundário, ensinou Português, Filosofia, Psicologia, Sociologia, Teatro e Oficina de Expressão Dramática. Foi, igualmente, professor do Ensino Superior, na Universidade Católica de Leiria e no Instituto Superior Miguel Torga, em Coimbra. Foi ainda coordenador do Centro da Área Educativa de Coimbra (1998-2002) e só então conheceu verdadeiramente a classe docente. Descobriu bem cedo a sua paixão pela poesia, pela literatura, pela música e pelo Teatro. Foi Menino Jesus aos quatro meses no presépio vivo da sua freguesia. Hoje, como voluntário, dirige o Grupo de Teatro O Rebuliço da Associação Cavalo Azul e também o Grupo de Teatro de Assafarge. Canta no Coro D. Pedro de Cristo, em Coimbra. Apaixonado pela Natureza, gosta de passear a pé pelos trilhos da Abrunheira, na companhia do seu cão. Dedicado às causas da cidadania, é dirigente do Movimento Cidadãos por Coimbra, que insiste em fazer propostas para criar uma cidade diferente. Casado, tem duas filhas e uma neta, a quem gosta de contar histórias.

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