Como são lindas as crianças!

 Como são lindas as crianças!

(Créditos fotográficos: Michał Parzuchowski – Unsplash)

O trânsito é que manda. Não o trânsito motorizado, que também lá vai tendo os seus ditames, mas o trânsito do tempo, o trânsito das pessoas.

Será vaidade, de nós os humanos, ao nos afirmarmos os seres com o quociente de inteligência (QI) mais elevado, ou essa aptidão máxima está na posse de outrem?

Gosto muito do meu cão. É mais mexido do que muitos penedos do meu monte. Tenho alguns sobrinhos-netos. Cada um deles tem um perfil muito próprio. E todos me encantam. Um dia destes, um deles, num gesto carinhoso, deu uma palmadinha na cara de um dos seus irmãos, de apenas cinco anos. Mas, antes que o pequeno se zangasse, o mais velho disse: “Desculpa, lindo, foi a brincar!”

Assim, vindo do nada, o miúdo, de dedo em riste, disse: “Tu vais-me pagar por conta disto!”

Ficamos todos a olhar uns para os outros. Que frase brilhante, tão bem contextualizada!

(Imagem gerada por IA – canva.com)

O mês de Dezembro corria em direcção ao Natal; também ele gosta das festas bonitas. A meio deste mês, a minha sobrinha – tia dos miúdos – fez anos. Cantámos os parabéns em festa. Eu, que adoro os pequenos, porque são o quadro vivo do meu passado, abracei o Enzo, aquele que proferiu a frase que nos surpreendeu, e repeti-lhe, assim, aparentemente, um pouco fora do contexto: “Tu vais-me pagar por conta disto.”

“Ai, vais, vais!”, retrucou, com um riso de traquinas, expressando-se de modo a que todos ouvissem. E, tocando-me no braço, disse baixinho: “Não vais, não.”

A meiguice de mãos dadas com um traquinas, com uma inteligência acima da média. Como são lindas as crianças!

Naquele mesmo festejo de aniversário, a sogra da minha sobrinha, avó dos pequenos, queixou-se de dores nas costas. O outro meu sobrinho-neto, o do meio, com sete aninhos acabados de sair do forno, pegou na mão da outra sua avó, a minha irmã, e levou-a ao quarto dela, pedindo-lhe que lhe desse uma travesseira para a outra avó. De imediato, dirigindo-se-lhe, disse: “Avó, pega esta travesseira e põe-na entre a cadeira e as tuas costas, para te aliviar as dores.”

O miúdo levou beijos e aplausos, porque as boas acções merecem ser levadas com beijos e aplausos.

(Imagem gerada por IA – monica.im)

Como são lindas as crianças! De facto, nós, os adultos, temos tanto a aprender com elas! Muito mais quando nos deixamos corromper por nós mesmos! Tenhamos em conta as palavras do brasileiro Chico Xavier (do município de Pedro Leopoldo, no estado de Minas Gerais): “Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim.” “Fico triste quando alguém me ofende, mas, com certeza, eu ficaria mais triste se fosse eu o ofensor”, salientava Chico Xavier.

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09/01/2025 

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José Torres Gomes

José Torres Gomes é natural da localidade de Belinho, no concelho de Esposende. O facto de ser portador da doença degenerativa de Stargardt (ou seja, uma distrofia macular hereditária de início juvenil caracterizada por atrofia macular bilateral) tem-lhe agravado a acção da visão central, a ponto de não ler o que escreve pelo seu próprio punho. O contacto com a Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO) trouxe-lhe novas esperanças na realização do seu sonho. Concretizou uma formação para a aprendizagem dos "softwares" de leitura de textos digitais, particularmente o “JAWS” (um leitor de ecrã desenvolvido para utilizadores de computadores cuja perda de visão os impede de ver o conteúdo do ecrã ou de navegar com um rato), transitando para o “NVDA” ("non visual desktop access"). A partir de então, passou a escrever regularmente no computador. Assim, em 2010, editou o seu primeiro livro, intitulado “Os ossos também falam”. No ano seguinte, publicou a obra “Nunca mais te vi”. Em 2013, lançou o seu terceiro livro: “Gente sem governo”. Na sua quarta obra, em 2015, experimentou a poesia com “A inquietude do silêncio”, título que agora adapta para o seu espaço de escrita no jornal "sinalAberto". Já em 2018, começa a exercitar a sua escrita no domínio da literatura para a infância e publica “O elefante branco”, ilustrado por Geandra Lipa. Em 2020, edita, igualmente para os mais novos, o livro “Zé Trinca-Espinhas e as letras do lago”, com ilustrações de Alexandra de Moraes. O seu mais recente livro para a infância “O menino que queria ser árvore” (homónimo de uma obra do autor brasileiro Fabiano Tadeu Grazioli) foi ilustrado por Carla Sofia Cardoso. Entretanto, tem participado em várias antologias.

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