Mbappé, Thuram, Pepe & Le Pen
1 – “Estamos num momento crucial na história do nosso país. A situação é inédita, por isso, dirijo-me ao povo francês e à geração mais jovem, que pode fazer a diferença. Apelo aos jovens para que votem, vemos que os extremistas estão à porta do poder, temos a oportunidade de escolher o futuro do nosso país.” O grito de alerta é de Mbappé, o parisiense, filho de pai camaronês e de mãe argelina, que defende os valores da “tolerância, diversidade e respeito”.
O apelo do capitão da selecção francesa atiçou o ódio da extrema-direita francesa. Marine Le Pen saltou para a arena e uivou na CNN France: “Os Franceses estão cansados de receber lições de moral e instruções sobre como votar.” Laurent Jacobelli, porta-voz da União Nacional, também criticou o capitão da seleção francesa, aconselhando-o a “ficar no seu lugar”. “Não vou entrar em campo para dar conselhos de treinador, acho que cada um deve ficar no seu lugar”, afirmou, em entrevista à TF1. O figurão não gosta de futebolistas que se recusam a usar a cabeça só para jogar à bola…
Kylian Mbappé não foi o único elemento da selecção francesa a não ficar indiferente à ameaça extremista. O avançado Marcus Thuram também o fez. “Ficámos todos um pouco chocados no balneário. Esta é a triste realidade da nossa sociedade, hoje, e isso é muito grave. Há mensagens transmitidas todos os dias na televisão para ajudar esta festa [a extrema-direita] a passar.
Como disse o Ousmane [Dembélé], devemos dizer a todos para irem votar. Como cidadãos, sejam vocês ou eu, devemos lutar diariamente para que isto não volte a acontecer e que o RN não passe”, expressou em conferência de imprensa.
Antes, Dembélé e Olivier Giroud já se tinham pronunciado sobre a situação, mas Thuram foi mais incisivo: “Devemos também dizer como chegámos aqui e [falar da] gravidade da situação. Na seleção francesa, não tenho dúvidas de que todos partilham a minha visão sobre as coisas. Estamos num país livre e todos deveriam fazer o que acham certo. Eu chego aqui e digo certas coisas. Outras pessoas podem não dizer isso, mas, repito, não tenho dúvidas de que todos pensam como eu”, acrescentou o jogador do Inter de Milão, filho do antigo campeão mundial e europeu Lilian Thuram.
Aurélien Tchouaméni também juntou a sua voz às de Thuram e de Mbappé. O médio do Real Madrid pediu a “todos” para irem votar, garantido que “todos têm o direito a dar a sua opinião”. “Recebemos uma mensagem forte de Mbappé, mas também de Thuram. Partilho as suas opiniões. Odeio extremos e partilho uma mensagem de união que acredito ser o que melhor representa França”, manifestou.
Colocada perante as denúncias dos craques, a Federação Francesa de Futebol pediu para se evitar “qualquer forma de pressão e uso político da selecção”, exigindo “neutralidade” aos jogadores, embora reconheça o direito à “liberdade de expressão” de cada um, pois, é a melhor forma de agradar a Gregos e a Troianos…
2 – Pepe jogou o seu último “Europeu”. E fê-lo de forma soberba, como sempre. Apesar da sua condição de jogador mais velho do torneio, com 41 anos. Pepe é um profissional de excelência, recheado de carácter. Um ser humano notável como prova a forma como mimou António Silva, quando o puto cometeu dois erros fatais no jogo frente à Georgia (em que Portugal perdeu: 2-0).
A vida de Pepe é um longo combate, que ele ganhou. Graças a muito suor e à sua luta constante para alcançar os objectivos a que se propôs, a partir do momento em que deixou a sua terra natal – Maceió, na costa leste do Brasil – e rumou ao Club Sport Marítimo, o seu primeiro clube em Portugal. Na Madeira e na cidade do Porto, Pepe “fez-se homem” e ganhou estatuto. Como futebolista e como cidadão de um país que lhe deu tudo, como reconhece, e ao qual agradeceu, envergando o equipamento da selecção portuguesa. Mesmo que tenha jogado no colossal Real Madrid e no clube turco Besiktas.
Ao que sei, Képler Laveran de Lima Ferreira (ou seja, o Pepe) nunca fez declarações públicas sobre política. Não se lhe conhece tal posicionamento em Portugal, na Espanha ou na Turquia. Tão-pouco no país onde nasceu. Por isso, foi com espanto que vi uma foto, no sítio electrónico do jornal Record, com três adeptos “tugas” que exibem um cartaz com uma forte mensagem política, como podemos verificar na fotogaleria da mesma edição.
É o “boneco” número dez de um conjunto de 23 fotografias. E o mínimo que posso dizer é que Pepe não merecia tão nefasta companhia.
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08/07/2024