Memórias: Botequim (1)
O Botequim de Natália Correia. (expresso.pt – amesadocafeeuropasenteipensei.blogs.sapo.pt)
Marcara um encontro com o Fernando Dacosta no Botequim, bar-casa da Natália Correia. Quando a porta se abriu, verifiquei que as mesas estavam todas unidas num qualquer jantar particular. Recuei. Helena Roseta, com um ar de Juliette Greco, disse-me: “Entra amigo, entra!” Entrei.

Era um jantar de solidariedade com Timor-Leste (em 1991, talvez). Sentei-me à mesa. Um timorense, da União Democrática Timorense (UDT), ia discursar. Sentia-se intimidado com a presença de deputados, jornalistas, escritores e “mesmo” um ministro. O homem referiu-o, meio sufocado por uma gravata que lhe apertava no colarinho. Natália quis pô-lo à vontade: “Se soubesse o que vai pelo bidé de cada um!” Os circunstantes já a conheciam e não levaram a mal.

Lembro-me de ter trocado um olhar cúmplice e malicioso com Adriano Moreira, de olhos muito argutos e simultaneamente irónicos pela circunstância e algo condoídos com o “discursante”. Este ficara vermelho como um pimentão e parecia que o colarinho ainda o apertava mais, como se os olhos fossem saltar fora. Gaguejava entorpecido.
Valeu Helena Roseta que disse umas palavras de introdução, enquanto ele desapertou o colarinho e tomou fôlego para falar. Natália permanecia impassível, como tendo dito o mais natural do Mundo. Era assim o Botequim, espaço libertário (não libertino), onde Natália Correia, única, um dia apresentara Snu Abecassis a Sá Carneiro. Entretanto, naquela noite, lá chegou o Dacosta e continuou uma noite mais de “loucas” tiradas de Natália. Voltarei a elas, nessa e em outras noites.
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17/11/2025