Mestre Anjos Teixeira
Regresso à Madeira depois de quase 45 anos desde a minha permanência na ilha durante cerca de cinco anos (de 1978 a 1982). Nesses quase cinco anos seguidos, estive à frente dos destinos do Grupo Experimental de Teatro do Funchal (então, GETF; hoje, ATEF – Associação Teatro Experimental do Funchal). Naquela época, o grupo iniciava os seus passos numa caminhada cultural (actualmente, já vai na quinta década) e na construção de uma colectividade profissional, uma das raras com longo percurso e continuidade na ilha da Madeira. Ou seja, é um caso a destacar, pois, nada disto temos no arquipélago dos Açores, território também rico em tradições culturais.
Regressar e reencontrar velhos amigos é uma felicidade. Pena é a falta daqueles que partiram. Entre eles, os amigos Fernando Nascimento (antigo director artístico do Teatro Municipal do Funchal), Virgílio Pereira (que foi presidente da Câmara Municipal do Funchal), Artur Andrade (músico-etnógrafo, ao qual se deve, juntamente com António Aragão, também saudoso amigo, uma recolha musical digna de ser destacada na linha iniciada, noutras terras, por Michel Giacometti – o corso que um dia se apaixonou por Portugal). Faltam-me ainda os jornalistas Tolentino Nóbrega (que trabalhou no Diário de Notícias-Madeira e no Público) e António Jorge Andrade, bem como o escultor Maurício Fernandes, o pintor Danilo Gouveia, a poeta Maria Aurora e aquele que agora destaco, pela sua singularidade e discrição: o mestre Pedro Anjos Teixeira.
Conheci o mestre Anjos Teixeira graças à minha amizade com Artur Andrade. Nessa altura, Anjos Teixeira integrava a Orquestra Sinfónica da Madeira. Era, entre muitas outras actividades a que se dedicava, violinista. E escrevia, como também faço, apontamentos críticos de teatro e de música no DN Madeira. A ele devo críticas teatrais muito generosas e instrutivas sobre as minhas encenações para o Teatro Experimental do Funchal (TEF), uma simpatia e bondade que voltei, apenas, a encontrar em outro crítico teatral, Manuel João Gomes (do jornal Público), um ser de infinita amizade pelo teatro e pela literatura!
O nosso encontro esteve cheio de momentos felizes e agradáveis. Era um conversador cheio de experiências e de recordações, que sempre partilhou com todos nós. Foi um escultor de obras singulares. Na Madeira, destaco, pela sua proximidade, o seu alto-relevo que está no hall do Teatro Municipal Baltazar Dias, retratando o autor-dramaturgo madeirense contemporâneo de Gil Vicente. Saliento ainda os trabalhos escultóricos “Florista Madeirense”, “Bordadeira” e o “Monumento ao Trabalhador Madeirense”.
Entre outras obras espalhadas pelo país do mestre Anjos Teixeira, refiro ainda o monumento “Os Perseguidos”, em Almada, obra que espelha o seu ideário de homem progressista e de opositor ao regime que imperou em Portugal continental e também na Madeira, durante quase meio século.
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Algumas notas biográficas:
Com base num texto informativo do Museu Anjos Teixeira, em Sintra, ficamos a saber que Pedro Augusto dos Anjos Teixeira nasceu em Paris, no dia 11 de Maio de 1908 e que faleceu em Sintra, a 20 de Março de 1997. Era filho de Artur Gaspar dos Anjos Teixeira, também escultor, e de Ester de Oliveira Franco. O facto de ter nascido na capital francesa deve-se à circunstância de o seu pai aí se encontrar “a residir, após ter ganho uma bolsa de estudos de escultura, como prémio atribuído pelo legado Valmor”.
Com o início da I Grande Guerra, o seu pai decidiu regressar, com toda a família, a Portugal. Fixando residência em Lisboa, mudou-se, mais tarde, para Mem-Martins, no concelho de Sintra. Pedro Augusto tinha seis anos de idade quando conheceu a vila de Sintra. Viveu toda a sua infância e adolescência nesta região saloia, ainda “eminentemente rural”, onde pôde desfrutar do contacto com a Natureza e com os trabalhos do campo. Esta vivência permitiu-lhe criar uma afeição especial pelos animais e pelo seu modus vivendi, que mais tarde transpôs para dois dos seus livros “História dos Grilos – Amigos da Minha Infância” e “Memórias de um Grão de Trigo”. A observação e a vivência destas realidades, durante a sua adolescência, marcaram-no de tal forma que todo este realismo veio, posteriormente, influenciar o seu trabalho, nas suas peças de temática humana e animal.
Refira-se ainda que, a convite de várias entidades, o mestre Anjos Teixeira produziu neste arquipélago grande parte da sua obra escultórica, a qual enobrece as principais praças e artérias urbanas. Nesse contexto, salientamos as estátuas do Dr. Jaime Moniz (no Funchal, em 1961), de Tristão Vaz Teixeira (no Machico, em 1971), o Busto de D. Filipa de Lencastre (na cidade do Funchal, datado de 1973), a Florista Madeirense (no Funchal, de 1980) e o Monumento às Bordadeiras (igualmente no Funchal e datado de 1986), entre muitas outras peças escultóricas. A obra de mestre Pedro Anjos Teixeira não é visível apenas nas grandes praças do Funchal. Neste período, executou inúmeros trabalhos que se encontram espalhados em diversas colecções particulares.
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23/05/2024