Oceanos ganham força e reforçam o seu papel na luta climática, na COP30
(Créditos fotográficos: Kammeran Gonzalez-Keola – pexels.com)
A 18 de novembro, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) apresentou, pela primeira vez, a nível internacional, o trabalho feito com o desenvolvimento da Conta dos Serviços dos Ecossistemas Marinhos (ou Conta Satélite do Mar), relativo ao espaço marítimo nacional, realizado no último ano, que contou com a participação de várias instituições e de investigadores nacionais, em estreita articulação com o Instituto Nacional de Estatística (INE), em torno do grande objetivo “Reconhecer e Valorizar o Capital Natural do Mar Português”.

O evento ocorreu no Pavilhão do Oceano, de que o IPMA é coorganizador, instalado no espaço da Cimeira das Nações Unidas sobre o Clima (COP30), a decorrer em Belém do Pará, no Brasil. O evento contou com a presença do secretário de Estado das Pescas e do Mar, Salvador Malheiro, que abriu a sessão, em que participaram Conceição Santos coordenadora do Núcleo de Planeamento e Apoio ao Conselho Diretivo do IPMA (NPACD/IPMA), que apresentou o estudo, Giovanna Valverde Conselheira Especial para as alterações Climáticas do Governo da Costa Rica, Marine Lecert da Ocean & Climate Platform e Victoria Paz diretora financeira da Iniciativa Mangrove Breakthrough. A sessão foi moderada por Kiliparti Ramakrishna responsável das relações exteriores do Woods Hole Institute.

Woods Hole Institute. (woodwellclimate.org)
As contas dos ecossistemas marinhos, segundo o IPMA, são um conjunto de novos módulos de contas económicas do ambiente inserido no sistema económico europeu, no final de 2024, para prestar informações coerentes sobre a extensão, o estado e os fluxos de serviços dos ecossistemas para o sistema socioeconómico. Até ao final de 2026, Portugal deve reportar estas novas contas ao Gabinete de Estatísticas da União Europeia (UE) (Eurostat) para toda a extensão do território nacional, incluindo o seu espaço marítimo. Nos termos da Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 121/2024, de 2 de setembro – que atualiza o enquadramento da Conta Satélite do Mar, um instrumento estatístico para avaliar a relevância da economia do mar para Portugal –, cabe ao IPMA apoiar o INE, na definição de uma metodologia para a inclusão dos ecossistemas marinhos nas Contas Nacionais.

As contas dos ecossistemas, impulsionadas pela UE, são um sistema para medir o estado, a extensão e os serviços dos ecossistemas (terrestres e marinhos), de forma a integrar o capital natural na tomada de decisões económicas. A UE está a implementar estas contas como parte do seu compromisso com o Pacto Ecológico Europeu e com a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030, utilizando-as para apoiar a monitorização dos objetivos ambientais e as estratégias de desenvolvimento sustentável. Os estados-membros têm a obrigação de reportar dados ao Eurostat, utilizando as contas para melhor gerir recursos, para identificar valor económico e ambiental e para orientar políticas futuras.

Efetivamente, a UE estabeleceu um quadro jurídico obrigatório para a contabilidade dos ecossistemas, através de alteração ao Regulamento (UE) n.º 691/2011, sobre as contas económicas e ambientais europeias (CEEA) – um novo enquadramento estabelecido pelo do Regulamento (UE) 2024/3024, em vigor desde dezembro de 2024, que torna as contas dos ecossistemas um pilar central da contabilidade ambiental e económica na UE.
Nos termos dos regulamentos, os países da UE reportam três tipos de contas dos ecossistemas: a conta de extensão dos ecossistemas, que diz respeito à dimensão dos ecossistemas numa determinada área considerada, abrangendo os ecossistemas terrestres e marinhos nacionais; a conta de estado dos ecossistemas, que informa sobre a qualidade de um ecossistema e é medida através de parâmetros abióticos, bióticos e paisagísticos, por tipo de ecossistema; e a conta dos serviços de ecossistema, que se refere aos benefícios que os ecossistemas proporcionam às atividades económicas e a outras atividades humanas.
É, comummente propalado que “Portugal é Mar”, visto que é uma das maiores nações marítimas do Mundo, com aproximadamente 97% do seu território situado no oceano, sendo a sua área marinha mais de 40 vezes superior à terrestre, estendendo-se por profundidades médias superiores a 3500 metros. E o Espaço Marítimo Nacional cobre cerca de quatro milhões de quilómetros quadrados, aproximadamente a área terrestre da UE, estendendo-se além da Crista Média Atlântica e conferindo a Portugal grande centralidade na bacia do Atlântico Norte.

Enquanto nação marítima, Portugal assumiu um conjunto de compromissos nacionais e internacionais, relativos à monitorização, à proteção, ao restauro dos ecossistemas marinhos e à exploração sustentável dos seus recursos, nomeadamente, a nível nacional, na implementação da Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030 e da Conta Satélite do Mar, em que Portugal foi pioneiro na UE; a nível europeu, na Diretiva-Quadro Estratégia Marinha, na Rede Natura 2000, e na Lei do Restauro da Natureza; e, a nível global, na Agenda 2030 das Nações Unidas através do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 (ODS do Oceano), o novo Quadro (Marco) Global da Biodiversidade de Kunming-Montreal.

O desenvolvimento das contas dos ecossistemas marinhos é também fundamental para apoiar a tomada de decisão na gestão efetiva e eficiente dos recursos naturais e no planeamento estratégico, relativamente às atividades a desenvolver no Espaço Marítimo Nacional, dando, ao mesmo tempo, mais visibilidade à riqueza, à diversidade e à importância dos ecossistemas marinhos, no espaço marítimo nacional, e melhor compreensão e maior reconhecimento do seu valor como capital natural. De modo particular, o processo assume relevância estratégica no contexto da designação de Áreas Marinhas Protegidas (AMP), em zonas oceânicas.

Estas áreas e o conjunto dos ecossistemas fornecem um conjunto de serviços fundamentais, desde a regulação do clima até ao suporte à biodiversidade e à atividade económica sustentável. Se tais serviços são comprometidos ou degradados, o prejuízo – ambiental, social e económico – supera largamente qualquer ganho de curto prazo. Neste contexto, este trabalho enquadra-se no Projeto Áreas Marinhas Protegidas Oceânicas, financiado pelo Fundo Azul, promovido pelo IPMA e pela Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM).
Este trabalho conta com a participação de vasta equipa de investigadores do IPMA, coordenada por um grupo que atua em estreita articulação com o INE. Diversas entidades relevantes – como a Direção-Geral de Política do Mar (DGPM), a DGRM, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), a Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental (EMEPC), entre outras –, bem como as autoridades regionais competentes das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, têm colaborado, ativamente, no seu desenvolvimento. A iniciativa conta ainda com o valioso contributo de vários investigadores do meio académico, assegurando uma abordagem técnica e científica robusta.

Portugal mostra, mais uma vez, liderança no desenvolvimento das Contas do Oceano, ao apresentar os resultados para o carbono absorvido pela sua zona marítima, em toneladas e em valor económico. Os dados preliminares evidenciam que o dióxido de carbono (CO2) absorvido, anualmente, pela zona económica exclusiva (ZEE) é de três vezes e meio a meta estabelecida por Portugal para 2045, considerando, essencialmente, florestas e uso do solo.
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Simultaneamente, a 18 de novembro (anteontem), a COP30 deu o primeiro passo para reconhecer o papel do oceano na ação climática, com a criação de uma taskforce que pretende acelerar a inclusão do carbono azul nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) dos países. E Portugal apoia a iniciativa e já prepara mecanismos para medir e para certificar a absorção de CO2, nos seus ecossistemas marinhos.

Desta matéria nos dá conta a jornalista Carla Tomás, em artigo intitulado “Oceanos ganham força na COP30 com nova taskforce apoiada por Portugal, mas reforço do seu papel na luta climática só deve acontecer em 2026”, publicado no Expresso online, precisamente, a 18 de novembro.
Refere a jornalista que foi criado, na COP30, um grupo de trabalho destinado a reforçar o papel do oceano e a contabilização do carbono azul na mitigação das emissões de gases com efeito de estufa (GEE). Organizado pelo Brasil e pela França, numa reunião ministerial de alto nível sobre os oceanos, o grupo pretende desenvolver um mecanismo que acelere a integração, nos planos climáticos nacionais, de soluções baseadas no oceano. E “Portugal está entre os países que defendem esta abordagem”.

Ambiente e Energia. (eppgroup.eu)
No fim da reunião ministerial que criou a taskforce, Maria da Graça Carvalho, ministra portuguesa do Ambiente e Energia, considerou que “a função desta plataforma é preparar os países para incluírem o carbono azul e outras dimensões oceânicas nas suas NDC”, aumentando, “à medida que mais países o fizerem, a pressão política para que o oceano entre, oficialmente, na agenda”.
Estas medidas incluem a possibilidade de ter em conta o CO2 absorvido pelo oceano ou a criação de áreas marinhas protegidas. Porém, segundo a ministra portuguesa, “ainda não existe um capítulo formal dedicado ao oceano como aliado na mitigação das alterações climáticas e não deverá existir na declaração final desta cimeira do clima”.
Refere Carla Tomás que “o tema começou a ganhar destaque, desde a COP de Glasgow, em 2021”, e que “muitos esperavam que o Brasil o introduzisse como ponto de agenda na atual COP de Belém, mas isso não deverá acontecer”. “Agora a expectativa recai sobre a Austrália”, anota Graça Carvalho, torcendo para que a COP31 aconteça naquele país, devendo ser tomada, até ao final desta semana, a decisão sobre se a COP31, em 2026, acontecerá na Austrália ou na Turquia.

Além de Portugal, integram este esforço países europeus, como a França, a Bélgica e o Reino Unido, bem como o Brasil, a Austrália, o Canadá, o Chile, as Fiji, a Indonésia, o Quénia, Madagáscar, o México, Palau, as Seychelles e Singapura. E cresce o grupo de países que quer garantir que o oceano entra, de forma estruturada, na agenda climática.
A adesão de Portugal foi concertada entre o Ministério do Ambiente e o da Agricultura e Mar e com o governo. Porém, a ministra do Ambiente e Energia lembrou que a efetiva integração das metas oceânicas “dependerá também de decisões da União Europeia, dado que os compromissos climáticos são apresentados em bloco”. Mas, “surpreendentemente”, nas palavras da governante, “este é um dos dossiês mais complicados de decidir no Parlamento Europeu”, visto que “há países que não têm mar e que, embora não sejam contra, têm outras prioridades”.

(portugal.gov.pt)
Não obstante, Graça Carvalho acredita que a perceção está a mudar, pois há crescente consciência de que “toda a Europa depende do oceano”, como recurso e como estabilizador climático. Para a governante, Portugal não duvida de que, dada a nossa vasta dimensão marítima, seria muito benéfico poder contabilizar, nas NDC, “a absorção de CO2 no mar”.
Reconhecendo que “o processo é complexo”, Graça Carvalho recordou que o país lançou, recentemente, o mercado voluntário de carbono aplicado à floresta e que está a ser desenvolvida a metodologia para o chamado “carbono azul” do oceano. Admitindo que “é ainda mais difícil de certificar o carbono do que o carbono florestal, por exigir dados robustos, monitorização contínua e provas científicas da absorção de CO2 nos nossos ecossistemas marinhos”, a ministra garantiu que Portugal está a preparar esse mercado voluntário, “para estar pronto quando as regras internacionais avançarem”.
A Fundação Oceano Azul congratulou-se com a decisão de o governo se juntar a esta iniciativa, sustentando que o compromisso mostra que estamos em condições de avançar com todas as ações preparatórias necessárias para avaliar o contributo que iniciativas como as AMP podem oferecer”. Para Tiago Pitta e Cunha, CEO da Fundação Oceano Azul, “estes instrumentos são essenciais para dar forma aos objetivos do Blue NDC Challenge, reforçando a proteção da biodiversidade marinha” e “as AMP constituem um contributo tangível para o cumprimento dos nossos compromissos climáticos”.

Segundo um relatório divulgado no dia 18 de novembro (anteontem), nove em cada dez países incluem medidas conexas com os oceanos nos seus planos nacionais para o clima, e o impulso para a ação climática baseada nos oceanos está mais forte do que nunca.
Também a 18 de novembro se soube que Portugal subiu três posições no Índice de Desempenho das Alterações Climáticas, como refere Carla Tomás, passando de 15.º para 12.º lugar, entre os 20 melhores classificados numa lista de 63 países responsáveis por 90% das emissões globais.
Conhecido pela sigla inglesa CCPI – de Climate Change Performance Index – , o relatório indica que a subida poderá equivaler ao 9.º lugar, se descontarmos os três primeiros lugares, que estão desocupados por nenhum país estar totalmente alinhado com o Acordo de Paris de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 ºC (graus centígrados).

Graça Carvalho, que se congratulou com a subida, admitiu um problema no setor dos transportes, que “não é falta de financiamento”, pois há verbas significativas para o metro, para a ferrovia e para navios, mas é “a execução, porque os atrasos se devem a litigância nos concursos públicos, a falhas de entrega de fornecedores e a processos morosos. Por exemplo, o concurso das novas carruagens da CP, dois anos parado por disputa judicial, provocou “perdas superiores a 100 milhões de euros”, lembrou a governante.
Acerca de quando Portugal acaba os apoios ou subsídios aos combustíveis fósseis, a ministra afirmou que o governo “está a terminar, gradualmente, o desconto no ISP [imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos], ajustando-o conforme o preço do petróleo para evitar impactos súbitos” e que o objetivo “é eliminar, progressivamente, estes apoios”. Mas não há datas.

reuniu com o Presidente Lula da Silva, “num momento de
diálogo construtivo para impulsionar um acordo que permita
avançar rapidamente nas negociações da 𝐂𝐎𝐏𝟑𝟎”.
(instagram.com/ambiente_pt)
Quanto à discussão sobre a transição gradual dos combustíveis fósseis, disse existir consenso crescente e que Portugal está disponível para apoiar um “roadmap”, desde que integrado formalmente nas negociações da COP, preferencialmente, sob liderança da presidência brasileira. Isto, apesar de haver incoerências entre o discurso público do presidente Lula da Silva e a condução do processo, considerando o recém-aprovado projeto de prospeção de petróleo ao largo da Amazónia. No dizer de Graça Carvalho, para Portugal, “a saída dos fósseis não apresenta grande dificuldade, dado que o país não produz combustíveis fósseis, está a reduzir o uso do gás e aposta fortemente na eletrificação e nas renováveis (71% da energia em 2023)”. O principal obstáculo ao cumprimento das metas climáticas até 2030 é o setor dos transportes, pelos atrasos estruturais na execução de projetos.
Porém, há muito a fazer. Se Portugal avançasse com ações eficazes nos setores mais poluentes, segundo dados associação ambientalista Zero, “poderia poupar 16 mil milhões de euros, até 2030, e evitar mais de 1300 mortes prematuras, por ano”.
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Enfim, a aposta é zelo pelo oceano, redução de emissões de carbono e redução drástica dos combustíveis fósseis.
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20/11/2025