50 anos depois: o tempo que estamos a viver
Estamos a viver um tempo altamente preocupante, não só a nível internacional, como cá dentro deste “torrão” de iliteracia de quase tudo, mercê de um sistema educativo que deu e dá diplomas, mas não deu nem dá esse tudo que tanta falta nos faz.
“O poder do feiticeiro reside na ignorância dos seus irmãos tribais”, ouvimos repetidas vezes. Quer isto dizer que quanto mais inculto for o povo, mais facilmente é dominado e, até, desprezado pelo poder. Sempre foi assim. Está escrito e reescrito na História.
E sempre assim será num país caído nas lutas entre aparelhos partidários, em que emergem políticos incompetentes e oportunistas, de que a nossa sociedade está cheia, onde, de há muito, impera a corrupção, o vírus do futebol profissional e a promiscuidade entre a política, o poder económico e a justiça.
Na data de comemorarmos os 50 anos de liberdade, é com um sentimento de profunda decepção que me dou conta deste grande número de anos desaproveitados. É por demais evidente que não soubemos aproveitar a liberdade que nos foi oferecida, para erradicarmos muitos dos nossos atavismos civilizacionais e culturais.
Comemoramos 50 anos de liberdade, apenas de expressão, de reunião, de criação de partidos, de associações e de coisas assim. Mas são muitos os nossos concidadãos, sem esquecer os milhares de emigrantes, privados da liberdade de dar aos filhos uma refeição e uma habitação condignas, bem como do acesso à justiça, em pé de igualdade com aqueles que nós sabemos.
É evidente que a Revolução, de que estamos a festejar o quinquagésimo aniversário, nos abriu portas e janelas à democracia, à segurança social, aos cuidados de saúde, à ciência, ao ensino e à cultura. Portas e janelas que se têm vindo a fechar sob o olhar de uma classe política mais interessada nas lutas partidárias, nos compadrios e nas vantagens do poder. Uma classe política que não facultou aos cidadãos cultura civilizacional, nem científica nem humanística, porque entendeu que havia outras prioridades.
Este abandono permitiu que uma significativa parcela dos portugueses – a quem a escola não deu capacidade para “distinguir o trigo do joio”, marcada pela iliteracia de quase tudo, alienada pelo futebol e pelos programas televisivos de entretenimento que nos impõem e nos entram pela casa dentro a toda a hora – desse ouvidos a uma extrema-direita (até há pouco tempo, escondida e diluída nos partidos de direita e de centro-direita), agora, com importante voz no Parlamento. Porém, usando da plena liberdade que a democracia nos oferece, tenta declaradamente destruí-la, fazendo uso de um populismo inteligentemente pensado, que diz aquilo que uma grande parcela da população, desiludida e empobrecida física e intelectualmente, quer ouvir.
Entramos na nova legislatura e no novo governo com várias crises por resolver, entre as quais destaco, por conhecer melhor, a da Educação, que, desde há muito, por falta de visão política, atravessa uma situação sem solução à vista. Estamos a viver um tempo de inverdades ao mais alto nível e de incertezas, à beira (estou em crer) de uma nova crise política. Um tempo de miséria e, até, de fome para um número cada vez maior de famílias, de desprezível abandono dos idosos, de corrupção descarada e impune e de aumento do número e da riqueza dos ricos. A chamada classe média está a afundar-se, o desemprego está a ressurgir e é mais um incentivo crescente à igualmente dramática emigração de uma juventude qualificada.
É este o panorama nacional quando celebramos os 50 anos daquela esperançosa madrugada. É verdade que há muito para festejar, mas também é verdade que temos consciência de que é preciso que saiamos à rua, unidos e em força, num Portugal de Norte a Sul, como naquela manhã que agora se comemora.
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Nota da Redacção:
O presente artigo reitera e complementa, considerando a devida actualização, o que António Galopim de Carvalho afirma no seu artigo “Uma reflexão sobre o tempo que estamos a viver”, publicado na edição de 07/12/2023 do sinalAberto.
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Nota do Director:
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25/04/2024