A criatividade em Castelo Branco
Participei no I Encontro Internacional de Cidades Criativas e Desenvolvimento Sustentável realizado, entre 12 e 15 de abril, em Castelo Branco, no âmbito da candidatura à UNESCO, como Cidade do Artesanato e das Artes Populares (UNESCO Creative Cities Network). O que me permitiu assistir a algumas intervenções de relevo na apresentação de trabalhos preciosos na organização de redes comunitárias, em que a criatividade é um polo de desenvolvimento social e económico.
A presença do escritor e jornalista Francisco Duarte Mangas numa “residência literária”, no concelho do Fundão, ocupou-me os dias em que decorreu o encontro, ainda assim, assisti interessada e quero destacar aqui a intervenção de François Lajuzan, conselheiro cultural e diretor geral da Cultura de Toulouse.
A sua intervenção foi clara e precisa nos exemplos que apresentou para o desenvolvimento (em rede) de ideias e de produções criativas que nascem com e nas comunidades, atingindo os projetos uma dimensão impensável para uma comunidade de trezentas pessoas.
Segundo nos afirmou, graças à criatividade e ao envolvimento comunitário, além de múltiplas parcerias que envolve, desde os poderes públicos à comunidade local, conseguem juntar num só festival cerca de treze mil pessoas.
Outros exemplos: a arte pública que marca o território, com uma vigilância e ação colaborativa da aldeia; e uma biblioteca itinerante (bastante original) entre comunidades.
Estes dois últimos exemplos são facilmente reproduzidos na Beira Baixa (aliás, já se tentou o dos murais nas freguesias de Juncal e Freixial do Campo, mas que julgo inativo) e não necessitam de grandes meios ou de investimentos, apenas a capacidade de aglutinar o trabalho já desenvolvido por associações e movimentos cívicos; e juntar as pessoas certas que dinamizem, no terreno, o nascimento de um projeto em pequena escala, que vai crescendo naturalmente ao longos dos anos.
Gosto de participar em iniciativas em que Castelo Branco é vista como cidade de acolhimento de experiências e de propostas que nos liguem a dinâmicas que fomentam parcerias em todos os sectores: no económico, no social e, especialmente, no cultural.
A cidade de Castelo Branco tem vários equipamentos culturais que lhe permitem encontros de nível nacional e internacional. Equipamentos com potencialidades na sua utilização, mas também na criação de emprego altamente qualificado nas áreas em que a criatividade é um elemento central. Mas ainda falta organização e profissionalismo para transformar a Cultura, em Castelo Branco, num bem estimável de riqueza para todo o concelho.
Na minha opinião, falta à cidade de Castelo Branco saber gerir com competências as variantes positivas do território, bem como descentralizar por todo o concelho ideias criativas, aliando-as às riquezas naturais e ancestrais do território, de modo a apresentar um mosaico diferenciado e com competências bem determinadas, especialmente no turismo (e não apenas o bordado, que não passa nem passará de uma possível âncora).
Este parece um discurso estafado, mas se persiste e faz sentido é porque ainda não foi testada com convicção ou com veemência a aposta real na Cultura, como um vetor essencial no desenvolvimento que se pretende.
Se se incluir o ensino superior do concelho, do distrito e da região Centro (a cooperação com a Universidade da Beira Interior ou com a Universidade de Coimbra é tão escassa e residual porquê?), aproveitando a investigação de professores e de alunos, aplicando-a e distribuindo valências comerciais e serviços por todo o concelho, será uma aposta ousada e com futuro garantido.
É um desafio que requer ação e não, apenas, boas intenções no papel nem belos discursos de campanha eleitoral e de “tomada de posse” (só esta expressão é todo um ensaio sociológico do concelho). E as perguntas surgem de forma insidiosa: porque é que o exercício do poder no concelho de Castelo Branco é tão imperial e fechado? Porque é que não atinge o mínimo dos mínimos que é a cooperação franca com os seus agentes mais produtivos? Qual a razão porque não consegue dialogar com os agentes económicos, da Cultura e do associativismo local, especialmente os espalhados pelas suas freguesias? Porque, nas escassas vezes que o faz, é sem objetivos nem projetos integradores de valorização do território do concelho? Falta de cultura democrática?
Qualquer comunidade é geradora de energias específicas e elas, sim, são renováveis e com os alicerces no desenvolvimento do território. Com inúmeras dificuldades no diálogo, claro que sim!
Afinal, temos pouca ou nenhuma experiência coletiva na defesa do bem comum.
As agruras de um abandono centenário e de uma Beira Interior entregue à sua sorte deram-nos determinadas características individuais de resiliência; mas também de pouca confiança no “outro”, na dimensão que o filósofo Jacques Derrida lhe dá quando se trata de acolhimento do outro com as suas diferenças e riquezas particulares.
Se conseguirmos trabalhar, cada qual nas suas competências e vocações, com objetivos determinados e aplicados no desenvolvimento local, utilizando a criatividade e aproveitando o que já foi construído, acredito que o futuro do país também dependerá de nós.
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08/05/2023