Climatologistas alertam para risco de inundações extremas mais frequentes
As inundações extremas, como as que devastaram a Europa Central nos últimos tempos, podem vir a acontecer com mais frequência, à medida que a temperatura da Terra aumenta, segundo os especialistas.
De acordo com o famoso climatologista austríaco Marc Olefs, da Geosphere Austria, diretor de investigação climática da Geosphere Austria, estes fenómenos extemos, que se esperava que ocorressem de 100 em 100 anos, podem, agora, ocorrer de 90 em 90 anos ou de 80 em 80.
O especialista em investigação climática afirmou que a indústria dos combustíveis fósseis é responsável pelo agravamento dos fenómenos meteorológicos extremos, incluindo as fortes chuvas registadas na Europa nas últimas semanas. “Estamos, atualmente, a aquecer a um ritmo – ou seja, a Terra como um todo – de cerca de 14 bombas atómicas de Hiroshima por segundo. Esta é a energia adicional que nós, enquanto seres humanos, estamos a adicionar ao sistema terrestre, com a qual a Terra está a aquecer. Isto significa que o ar também pode conter mais vapor de água e que as chuvas fortes também se tornarão mais extremas”, explicou Marc Olefs.
Num ano normal, a região de Saint Poelten, no Sul da Áustria, recebe até 430 litros de chuva, durante seis a nove meses. Mas, neste ano, esse volume caiu em poucos dias.
As inundações na Europa Central, provocadas pela tempestade Boris, destruíram várias habitações e infraestruturas públicas e fizeram mais de vinte vítimas mortais.
Estima-se que serão necessários mais de mil milhões de euros para reconstruir partes da Chéquia, da Polónia, da Roménia e da Áustria.
O climatologista referiu que toda a área acima da Europa Central, tanto os oceanos como as massas de terra, está dois a três graus acima dos valores dos tempos pré-industriais, devido à intervenção humana. “Consequentemente, não só as massas de ar quentes, húmidas e mediterrânicas, mas também as massas de ar frias e polares estão dois a três graus mais quentes e, portanto, podem absorver mais 7% de vapor de água por cada grau de aquecimento, quando estão saturadas. Isto significa que todo este conglomerado de massas de ar pode atualmente absorver mais 15 a 20% de vapor de água em comparação com a época pré-industrial”, considerou Marc Olefs.
Na Hungria, o rio Danúbio subiu para níveis recorde, tendo atingindo, pela primeira vez, os 8,5 metros junto a Budapeste. Já na Polónia, a zona mais afetada pela tempestade foi o Sudoeste do país, onde moradores e voluntários já começaram os trabalhos de limpeza e de análise dos danos.
Também na Catalunha, há registos de inundações e de cheias, e foram emitidos alertas para as cidades de Tarragona e de Salou. “Imagine um secador de cabelo ou um regador que se mantém no mesmo sítio durante demasiado tempo. O que é que acontece? Queima-se ou a água transborda”, acrescentou o climatologista, que diz que, para esta situação, só há uma solução: “Reduzir as emissões o mais rapidamente possível.”
A indústria dos combustíveis fósseis é responsável pelo agravamento dos fenómenos meteorológicos extremos, incluindo a precipitação intensa registada na Europa recentemente. “É absolutamente essencial alcançar a neutralidade climática até meados do século, o mais tardar, pois é a única forma de evitar uma maior intensificação destes fenómenos”, afirmou Olefs.
A presidente da Comissão Europeia prometeu 10 milhões de euros de ajuda aos países da Europa Central atingidos pelas inundações mortíferas. “Estes são tempos extraordinários, e tempos extraordinários exigem medidas extraordinárias”, considerou Ursula von der Leyen.
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Na noite de 28 para 29 de julho, cerca de 200 mil famílias ficaram sem eletricidade na Lituânia e na vizinha Letónia, devido aos ventos fortes e à chuva intensa que assolaram os países bálticos, durante a noite. Segundo as autoridades, uma mulher de 50 anos morreu em Vilnius, capital lituana, após a queda de uma árvore.
Os bombeiros e as equipas de salvamento de ambos os países receberam centenas de chamadas de emergência a reportar a queda de árvores, carros danificados e estradas e campos inundados.
Na Lituânia, as autoridades avisaram as pessoas para viajarem apenas em situações urgentes, pois a tempestade trouxe ventos fortes e níveis catastróficos de chuva para a maioria das regiões do país de 2,8 milhões de habitantes.
Alguns voos foram cancelados ou desviados para outros aeroportos da Lituânia, uma vez que os aviões não puderam aterrar em Vilnius ou na segunda cidade, Kaunas, devido à tempestade.
Segundo os meteorologistas lituanos, nos distritos de Šiauliai, Telšiai e Šilalė, registou-se uma precipitação equivalente a um mês de chuva, nos dias 28 e 29 de julho.
Os meteorologistas letónios diziam que os ventos fortes que se fizeram sentir na Letónia deveriam continuar a fazer subir o nível das águas ao longo da costa do Golfo de Riga.
As autoridades de Riga informaram que a Praça Dome, no centro da capital, foi temporariamente encerrada, devido ao perigo que representam para o público os danos causados pelo vento numa parte do telhado da catedral medieval.
Também a parte Sul da Estónia, o terceiro Estado báltico, foi atingida por fortes chuvas e ventos de tempestade.
Após dias de intenso calor, a Alemanha foi assolada, em meados de agosto, por fortes tempestades, com chuva forte e granizo a colocarem em alerta os serviços de emergência em várias zonas do país.
As condições meteorológicas extremas aconteceram logo após a Alemanha ter registado o dia mais quente do ano, o 13 de agosto, com temperaturas máximas a atingir os 36,5 graus, no Estado da Renânia-Palatinado.
Depois do calor intenso, o território foi atingido chuvas fortes, tempestades e granizo em toda a Alemanha, sendo as regiões da Renânia do Norte-Vestefália, Baixa Saxónia, Baviera e Baden-Württemberg as mais afetadas. Os serviços de emergência foram chamados para várias ocorrências, nomeadamente em caves e em ruas inundadas. Na Baviera, os bombeiros foram mobilizados, depois de um comboio ter colidido com uma árvore que estava caída.
Também a Bélgica foi afetada, tendo sido emitido aviso meteorológico laranja para tempestades nas províncias de Limburgo e de Liège, enquanto o resto do país continua sob aviso amarelo.
O Instituto Meteorológico da Bélgica afirmou que o recorde de precipitação de agosto foi ultrapassado e que várias ruas foram encerradas em Bruxelas e na província de Antuérpia, devido a inundações.
Na tarde de 3 de setembro, uma tempestade repentina atingiu Roma, deixando a capital italiana em polvorosa e causando danos numa das maravilhas da Roma Antiga, o Arco de Constantino. A obra remonta a 315 d.C., construída no vale do Coliseu, na encosta do Monte Palatino, para celebrar a batalha vitoriosa de Constantino contra Maxêncio, na Ponte Milviana, em 28 de outubro de 312 d.C.
O monumento dedicado pelo Senado e pelo povo romano foi atingido por um raio que provocou a queda de alguns fragmentos: “Os nossos funcionários chegaram ao local imediatamente, após a queda do raio. Todos os fragmentos foram recuperados e colocados em segurança”, lia-se numa nota do Parque Arqueológico do Coliseu. Este último explicou que “a operação de recuperação efectuada pelos técnicos foi oportuna”. Dois dias antes da tempestade, tinham começado os trabalhos de restauro na fachada sul do Arco.
Devido ao aguaceiro, mais de uma centena de intervenções foram efetuadas pelas patrulhas da polícia local de Roma Capitale e numerosas foram também as intervenções dos bombeiros. Os maiores incómodos ocorreram no quadrante oriental da capital e no centro da cidade. Precisamente no 1.º Município, caíram cerca de 60 milímetros de chuva em menos de uma hora, de acordo com uma nota emitida pela Defesa Civil, o máximo equivalente a um mês inteiro de outono.
Entre os danos registados, conta-se o desmoronamento parcial de um andaime no interior do Circus Maximus, bem como inconvenientes para o metro: algumas paragens da linha A foram temporariamente encerradas entre a tarde do dia 3 e a manhã do dia 4, tendo sido reabertas a seguir. Inundações também no interior do hospital de Santo Spirito, no centro da capital. Várias linhas de autocarros foram desviadas para percursos alternativos.
Em meados de setembro, a tempestade Boris varreu a Europa Central e Oriental com chuvas que fizeram subir o nível dos rios e que provocaram inundações repentinas na Chéquia, na Polónia e na Áustria. Pelo menos, uma pessoa morreu na Polónia e outra na Áustria, enquanto quatro foram dadas como desaparecidas na Chéquia.
Na Morávia, no Leste da Chéquia, milhares de pessoas foram obrigadas a fugir, devido à tempestade que deixou a grande maioria das casas sem eletricidade. De acordo com as autoridades checas, inundações extremas como estas costumam ocorrer uma vez por século.
Na Polónia, o Sudoeste do país foi particularmente afetado, tendo sido 1600 pessoas retiradas da cidade de Klodzko. Os bombeiros polacos tiveram de recorrer ao exército para os apoiar nas operações de salvamento, dada a dimensão da tempestade. Com efeito, um dos camiões dos bombeiros ficou inundado pelas cheias.
O primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, apelou às pessoas que se recusaram a abandonar Klodzko para que o fizessem e disse que o Estado iria fornecer ajuda financeira às pessoas afetadas pelo clima extremo.
Já na Áustria, dezenas de municípios foram declarados “zonas de desastre” pelas autoridades, e os residentes tiveram de ser retirados. Além disto, foi emitido um alerta da defesa civil, depois de um bombeiro ter morrido, enquanto respondia às inundações.
Na madrugada de 22 de setembro, um edifício de dois andares desmoronou na província de Nápoles, no Sul de Itália, matando duas crianças.
As autoridades italianas recuperaram os corpos das duas crianças, um menino de seis anos e a irmã de quatro; e, mais tarde, o de uma das duas mulheres desaparecidas. De acordo com os bombeiros, o colapso terá sido causado por uma explosão de gás.
Um terceiro irmão das crianças que morreram, de dois anos, foi encontrado com vida, assim como o pai que foi hospitalizado em Nápoles e que se encontra em estado grave.
O presidente da câmara, Vincenzo Simonelli, esteve no local e disse aos jornalistas que o edifício parecia “amassado sobre si próprio” e que se tratava de “uma situação muito grave”.
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As ondas de calor, que levaram a temperaturas máximas de 36,5ºC a 41ºC em muitas partes da Europa, mataram animais, secaram culturas, ocasionaram incêndios rurais, prejudicaram a saúde de muitas pessoas e ceifaram algumas vidas. Porém, às ondas de calor seguiram-se tempestades com granizo e chuvas torrenciais, que aumentaram o caudal dos rios, destruíram culturas e arrastaram consigo a parte pulverizada do solo.
Podemos dizer, com ironia, que as alterações climáticas estão no seu melhor e que os grandes responsáveis por este “benefício” são os gananciosos do lucro e os decisores que preferem o voto popular ao serviço do bem comum.
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30/09/2024