“Milagre económico” é o que diz Krugman da economia portuguesa
“Portugal é uma espécie de milagre económico” e é “misterioso” o modo como chegou a este milagre, disse, em entrevista ao Jornal de Negócios (publicada anteontem, 21 de novembro), Paul Krugman, economista norte-americano que venceu o Prémio Nobel em 2008 e que esteve em Lisboa, por ocasião dos 20 anos daquele jornal, para falar da economia portuguesa e da europeia.
Portugal tem-se mantido forte, a nível económico, nestes últimos anos, estando melhor do que a maioria dos países europeus, mas isso não significa que os problemas tenham acabado ou que o país esteja livre de riscos. Ainda assim, o economista afirmou que “Portugal é uma espécie de milagre económico”.
O professor em Princeton, que já lecionou em Yale e em Stranford, considera que a economia portuguesa podia ser um caso de estudo, visto que ninguém percebeu como é que se saiu tão bem nos anos da crise da dívida.
Contudo, referindo-se aos riscos das taxas de juro elevadas, avisou que “Portugal não está livre” do problema, mas que “pode ser algo que consiga ultrapassar”, pois tem estado a crescer bem economicamente. Sublinhou, a título de exemplo, que nem os Estados Unidos da América (EUA) estão completamente livres de risco, mas sustentou que, havendo um forte crescimento económico, haverá uma maior possibilidade de suportar os juros altos da dívida. Já a Itália encontra-se com um risco maior, pois, ao contrário de Portugal (de momento), “não há nenhuma razão especial para pensar que o crescimento potencial de Itália tenha aumentado muito”.
Assim, tendo em conta o desempenho português nos últimos anos, face ao devir económico europeu e mundial, Paul Krugman sublinha o sucesso de Portugal.
Após a crise da dívida, “a Espanha acabou por alcançar a recuperação económica, mas fê-lo passando por anos de desemprego elevado, desvalorização interna e queda dos custos”, explicou. Já Portugal “teve uma recuperação sem isso”.
“Tive longas conversas com o meu amigo Oliver Blanchard, o antigo economista-chefe do Fundo Monetário Internacional [FMI] e ele diz: Não percebo como é que Portugal se saiu tão bem. Como é que eles fizeram isso?”, contou ao jornal. A sua explicação passa por vários fatores, nomeadamente as “atrações de Portugal”, onde se incluem o turismo e as exportações, que têm crescido, mas frisou que, no geral, “é um pouco misterioso” o modo como tudo aconteceu.
Nessa altura, o FMI tendia a “colocar Portugal e a Espanha no mesmo cesto”. Com efeito, ambos os países “tinham tido entradas maciças de capital, tinham ficado seriamente sobrevalorizados em termos de custos laborais, tinham níveis de dívida elevados e enfrentavam um período prolongado de austeridade”. Porém, a Espanha acabou por sair desse período depois de “anos e anos de desemprego elevado, desvalorização interna e queda dos custos”, ao passo que “Portugal teve uma recuperação sem isso”.
Em relação a futuros problemas, Paul Krugman indicou que, pelo facto de Portugal estar demasiado ligado à Europa, pode ser atingindo pelas crises dela, pois, por enquanto, “Portugal tem estado muito bem, mas a Europa não”.
Olhando para o passado, o economista recordou a primeira vez que esteve em Portugal, em 1976, uma altura em que o país “parecia mais um mercado emergente do que uma nação europeia”, o que “hoje não é de todo verdade”. E, na comparação com 2013 – ano em que disse que Portugal era um país pobre e com problemas estruturais –, agora Paul Krugman reconhece que são “muito menos” os problemas, atualmente. “Portugal teve um bom período de sucesso económico, após a revolução e, depois, uma espécie de paragem durante alguns anos, mas essa paragem parece ter chegado ao fim”, declarou ao Jornal de Negócios.
É de repisar a ideia de que, apesar do “milagre” português, é de ter em conta que a nossa economia está intrinsecamente ligada à europeia e, “se vai haver uma recessão europeia, Portugal é demasiado pequeno e está demasiado ligado”, até porque está bastante orientado para o exterior.
Por isso, o Nobel da Economia pensa que os riscos externos são grandes, porque Portugal tem estado muito bem, mas a Europa não está tão bem”, e lembra que os Portugueses “continuam a ser mais pobres do que muitos países da Europa, mas já não tão pobres”.
Apesar dos elogios (moderados) e das coisas que diz que Portugal está a fazer bem, Krugman afirma que a crise da habitação é um tema a que tem de ser dada atenção, para que não se torne um problema grave e lembra que “Portugal está a parecer-se com São Francisco, com um setor tecnológico em expansão e com a habitação a tornar-se inacessível”. “Em certa medida, é um problema feliz de se ter, mas requer alguma ação”, observa.
Já no plano da inflação, Paulo Krugman admite os erros de análise dos economistas e diz que esta acabou por ser transitória, embora tenha demorado mais do que o esperado.
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Na conferência que pronunciou sobre a efeméride, o economista considerou que a economia europeia segue a tendência americana, com um desfasamento de cerca de seis meses. “A situação europeia vai começar a parecer muito encorajadora dentro de alguns meses”, observou, falando sobre a evolução da inflação nos EUA e na Europa, considerando que a última segue a tendência norte-americana, com um desfasamento de cerca de seis meses.
Paul Krugman realçou que a economia europeia enfrentou um desafio maior do que a americana, nos últimos meses, devido à dependência de muitos países da energia russa.
O Nobel da Economia assinalou que os modelos económicos não são perfeitos e que os economistas têm falhado nas previsões de uma recessão. E, alertando que “os riscos externos são grandes”, disse que nem sempre é “um defensor de défices”. “É algo que se deve ter, se possível, quando há desemprego em grande escala e a economia precisa de estímulos, mas Portugal não precisa neste momento. Por outro lado, cria espaço orçamental para tempos futuros em que défices sejam de novo necessários”, explicitou.
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É óbvio que o teor discursivo do economista americano é reconfortante para o país, quando sublinha a capacidade que temos de recuperação e afirma que já não somos tão pobres.
Não obstante, ficam os alertas para os riscos da nossa situação periférica. Os riscos para a economia são reais e sérios. A recessão europeia é uma forte hipótese e Portugal não ficará imune a ela, porque somos um país economicamente dependente e orientado para o exterior. Esta orientação para o exterior comporta vantagens e sérios riscos, sendo o maior deles a excessiva permeabilidade. Por outro lado, como país periférico, estamos sujeitos à tendência da procura desenfreada de matérias-primas extrativas e outras, por parte de países ricos, que aproveitam os nossos recursos à custa de preços baixos e de magríssimos salários, embora pagando bem aos homens sanduíche. Exploram-nos até se cansarem de nós e ou até não precisarem de nós.
E o economista não é surdo à nossa crise da habitação, até alertou que pode redundar num grave problema, mas não lhe dissecou as causas, como a especulação, os baixos salários, os nómadas digitais, o crescimento do alojamento local, a falta de construção a cargo do setor público, a mobilidade de trabalhadores e de estudantes, etc.
Paul Krugman refere que a Europa, com a guerra na Ucrânia teve dificuldades na sua economia, dada a dependência da Rússia, mas esquece que a Europa seguiu, quase à risca, os EUA na imposição de sanções económicas à Rússia e os países da UE tiveram de aumentar o orçamento da Defesa, por causa do apoio humanitário e do discutível apoio bélico à Ucrânia. Ao mesmo tempo, sem outro recurso alternativo imediato, a Europa colocou-se na quase dependência dos interesses dos EUA, nomeadamente no setor dos combustíveis.
Em todo o caso, o ministro das Finanças vê-se confortado com o teor discursivo de Krugman, um economista que desmente as previsões dos economistas, tal como se vê satisfeito com a grande subida da nossa economia nas agências de rating. Por isso, reafirma a descida da dívida pública para menos de 100% do produto interno bruto (PIB) e o estrangulamento do défice. Não sei se o fundo orçamental para abater na dívida se manterá com a convulsão política.
Por fim, é de questionar como uma governação em roda livre, com casos e casinhos, servida pela “requentada” maioria, atacada ferozmente à direita, com um chefe de governo sob o olhar quase descredibilizado dos operadores da Justiça em causa, foi capaz de gerar o dito “milagre económico”. Das duas, uma: ou Krugman e as agências de rating não têm razão ou o grande ataque das oposições perde-se na espuma dos dias.
A ver vamos se a crise política da mediocridade deixará incólume a economia e se as contas certas virão, milagrosamente, encher o bolso dos Portugueses. Seremos governados pelos mesmos agentes políticos, que parecem valer pouco, ou teremos novos decisores, cujo valor não sabemos? Só é de esperar que não entremos em situação de ingovernabilidade. A experiência nada abona de favorável para o centro-esquerda e para a direita, que nos têm governado. No entanto, o povo sabe resistir (os políticos que o ouçam) e não precisa de um novo D. Sebastião, seja ele quem for!
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Nota do Director:
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23/11/2023