Passar de bestial a besta: nem oito nem oitenta

 Passar de bestial a besta: nem oito nem oitenta

(Créditos fotográficos: u_uelv82pg4b – Pixabay)

Sempre gostei dos provérbios populares, também conhecidos como adágios, sendo esta designação mais erudita para definir aquilo que a tradição e a sabedoria popular transformou do pragmatismo quase numa realidade científica, empiricamente provada!

Lemos, no portal Folclore de Portugal, que os “provérbios são frases curtas e de fácil compreensão que transmitem um ensinamento ou conselho popular”.  “Também conhecidos como ditados populares, adágios, rifões ou anexins, os provérbios são uma forma de sabedoria acumulada ao longo dos tempos e transmitida de geração em geração”, adianta esta página electrónica sobre o folclore português.

Procuro, às vezes, encontrar equivalente de um idioma para outro. Nem sempre é fácil. E, algumas vezes, tento fazê-lo quando o termo ou a expressão é intraduzível, quando o outro idioma nos entrega imagens e palavras completamente diferentes. A modo de exemplo, ao nosso provérbio “Deus ajuda a quem cedo madruga”, a língua inglesa propõe ideias totalmente díspares, sendo traduzido como “The early bird catches the worm”.Isto é: “O pássaro madrugador apanha a minhoca.”

(Créditos fotográficos: Jack Blueberry – Unsplash)

E haverá, sem dúvida, muito mais para ilustrar este tema.

Das expressões que gosto em Português, e que são muitas, nada mais ilustrativo do que as que dão título a este texto e que, parece, estão sempre actuais em qualquer momento.

Senão vejamos. “Passar de bestial a besta” aplica-se, efusivamente, tanto aos políticos como aos futebolistas. Na actualidade, recentemente, o ocorrido no Campeonato Europeu de Futebol, em relação ao craque Cristiano Ronaldo e ao afortunado e, pouco depois, infortunado guarda-redes Diogo Costa, enquanto defensor de três penaltis consecutivos e, posteriormente, em mais nenhum, em cenários muito próximos. E não falemos do João (in)Félix!

Relativamente aos políticos, o povo (e não só) congratula-se com a eleição de António Costa para o Conselho Europeu, quando o mesmo povo (e também figuras políticas), paradoxalmente, o desaprovam internamente.

E lembramos aqui o presidente de todos os afectos e de todas as selfies possíveis, que, por um acto de generosidade compassiva, se vê massivamente criticado no caso das meninas gémeas brasileiras. Caso que muita verborreia tem derramado na imprensa, na rádio e na televisão. Nem oito nem oitenta!1

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, conversando com uma menina cabo-verdiana, no âmbito de uma visita oficial a Cabo Verde, em 11 de Junho de 2019, na Ilha de São Vicente. (Créditos fotográficos: Rui Ochoa – © Presidência da República)

Confesso que o que se passou na Assembleia de República em nada nos dignificou. Como também é de destacar que pouco ou nada se fala sobre aquelas duas pequenas e do seu estado actual de saúde. Como estão elas, o tratamento está a dar ou deu resultado? Talvez isto em nada interesse àqueles que apenas querem vender manchetes e manter audiências!

Assim, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, passou de uma categoria para outra, violentamente, com a verbosidade e a ironia que caracterizam muita gente, talvez vítima das suas próprias virtudes e defeitos, como todos nós. “Pela boca morre o peixe”, diz igualmente, com sapiência, o povo.

(asbarcas.com)

Um graffitti pode ter tanta força como um provérbio. Ao sair da Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti e virando à direita, pela Rua Gil Vicente, mesmo em frente ao cruzamento com a Rua da Constituição, na cidade do Porto, alguém pintou nas paredes: ISRAHELL. Assim mesmo, como transcrevo, após dez meses da guerra em Gaza. Nada mais ilustrativo que esta mancha avermelhada na parede, paradoxalmente, grafitada nas proximidades da rua que nos recorda o dramaturgo português Gil Vicente, o qual nos ajudou a “navegar” com a sua trilogia das Barcas: o “Auto da Barca do Inferno”, o “Auto da Barca do Purgatório” e o “Auto da Barca da Glória”. 

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Nota:

1 – “Nem oito nem oitenta” é uma expressão que sugere “de forma moderada”, “nem muito nem pouco”, “sem exageros” ou “basta que se busque o equilíbrio”, etc.

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Nota do Director:

O jornal sinalAberto, embora assuma a responsabilidade de emitir opinião própria, de acordo com o respectivo Estatuto Editorial, ao pretender também assegurar a possibilidade de expressão e o confronto de diversas correntes de opinião, declina qualquer responsabilidade editorial pelo conteúdo dos seus artigos de autor.

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25/07/2024

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Roberto Merino

Roberto Merino Mercado nasceu no ano de 1952, em Concepción, província do Chile. Estudou Matemática na universidade local, mas tem-se dedicado ao teatro, desde a infância. Depois do Golpe Militar no Chile, exilou-se no estrangeiro. Inicialmente, na então República Federal Alemã (RFA) e, a partir de 1975, na cidade do Porto (Portugal). Dirigiu artisticamente o Teatro Experimental do Porto (TEP) até 1978, voltando em mais duas ocasiões a essa companhia profissional. Posteriormente, trabalhou nos Serviços Culturais da Câmara Municipal do Funchal e com o Grupo de Teatro Experimental do Funchal. Desde 1982, dirige o Curso Superior de Teatro da Escola Superior Artística do Porto. Colabora também como docente na Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, desde 1991. E foi professor da Balleteatro Escola Profissional durante três décadas. Como dramaturgo e encenador profissional, trabalhou no TEP, no Seiva Trupe, no Teatro Art´Imagem, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (UP) e na Faculdade de Direito da UP, entre outros palcos.

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