Estudo aponta excesso de óbitos de idosos por Covid-19 no Brasil

 Estudo aponta excesso de óbitos de idosos por Covid-19 no Brasil

“Os idosos representam 73% dos óbitos por Covid-19 no Brasil”, ou seja, cerca de 150 mil dos 200 mil mortos no país “têm mais de 60 anos” revela um estudo agora divulgado, sob a coordenação científica de Dalia Romero, especialista e pesquisadora do Laboratório de Informação em Saúde da Fiocruz. Em entrevista ao sinalAberto, a mesma responsável assume que “pouco ou nada” se diz e fala “sobre a saúde do idoso”, no Brasil, situação preocupante e a merecer toda a atenção. Especialista no tema e há décadas uma forte militante em defesa da visibilidade dessa população, em geral negligenciada e extremamente impactada pela pandemia de Covi-19, Dalia Romero defende a necessidade de aplicação de política públicas de saúde e de mais atenção, da parte da Academia. Poucos dias após a publicação de uma nota técnica intitulada  “O excesso de óbitos de idosos no município do Rio de Janeiro analisado segundo o local da ocorrência” publicada pelo Grupo de Informação em Saúde e Envelhecimento  (Gise/Fiocruz), de que é coordenadora, Dalia Romero deixa várias chamadas de atenção e muitos motivos de reflexão. Para minimizar a carência de informações e diretrizes para o cuidado e a saúde do idoso nesse momento de crise sanitária, o Gise também publicou um site com informações para gestores, profissionais de saúde, cuidadores e idosos contendo manuais, cartilhas, guias, notas técnicas, vídeos, podcasts, blogs, relatos de experiência e posicionamentos oficiais.

sinalAberto — Recentemente, o Grupo de Informação em Saúde e Envelhecimento (Gise/Fiocruz) publicou uma Nota Técnica sobre o excesso de óbitos de idosos no município e no Estado do Rio de Janeiro. O que motivou a pesquisa?

Dalia Romero — Essa pesquisa foi motivada para lançar luz sobre uma questão muito séria na pandemia, a saúde do idoso. Falta atenção não só da sociedade e da mídia a esse grupo, mas também da academia. Veja, nos editais de pesquisa publicados sobre a Covid-19 recentemente no Brasil, pouco ou nada se tem sobre a saúde do idoso. Não falo isso por ser meu tema de pesquisa. Quem trabalha com saúde tem que pensar no idoso, no envelhecimento, na especificidade desse grupo da população, extremamente vulnerável. Em termos de dado, de informação, trata-se de um grupo invisível, apesar de o país ter envelhecido muito rápido nos últimos 30 anos. Também não se encontra no Ministério da Saúde uma narrativa que inclua o idoso. Antes mesmo da pandemia, já percebíamos a morte acelerada dessa população.


sA — Qual a proposta da Nota Técnica?

DR — A Nota é uma contribuição do Gise ao Observatório Covid-19 da Fiocruz, um grande projeto da Fundação com propostas e soluções para o enfrentamento da pandemia. Nosso estudo analisou a evolução dos óbitos nos domicílios, sejam eles residências particulares ou coletivas, tais como as Instituições de Longa Permanência para Idosos, ILPI, popularmente conhecidas como asilos ou abrigos. Nosso objetivo foi contribuir para o aperfeiçoamento das ações de atenção e vigilância em saúde e também auxiliar a identificação do local de ocorrência desses óbitos no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Estado do Rio de Janeiro.


sA — Com que dados do SIM o Gise trabalhou?

DR — Utilizamos os dados da Declaração de Óbito (DO) consolidados no SIM do Rio de Janeiro. Com a DO conseguimos apurar se o óbito se deu em um hospital ou outro estabelecimento de saúde, em domicílio, via pública, ou ignorado, quando não é possível saber o local. O DO não identifica se o domicílio do falecido é particular ou coletivo, uma ILPI. Além disso, para identificar o “excesso de mortalidade” de idosos no período da pandemia no Estado e na capital, comparamos os óbitos entre abril a junho de 2020 com a média de mortes do mesmo grupo etário nas mesmas regiões e meses dos três anos anteriores (2017, 2018 e 2019).

sA — Recentemente, o Grupo de Informação em Saúde e Envelhecimento (Gise/Fiocruz) publicou uma Nota Técnica sobre o excesso de óbitos de idosos no município e no Estado do Rio de Janeiro. O que motivou a pesquisa?

DR — Essa pesquisa foi motivada para lançar luz sobre uma questão muito séria na pandemia, a saúde do idoso. Falta atenção não só da sociedade e da mídia a esse grupo, mas também da academia. Veja, nos editais de pesquisa publicados sobre a Covid-19 recentemente no Brasil, pouco ou nada se tem sobre a saúde do idoso. Não falo isso por ser meu tema de pesquisa. Quem trabalha com saúde tem que pensar no idoso, no envelhecimento, na especificidade desse grupo da população, extremamente vulnerável. Em termos de dado, de informação, trata-se de um grupo invisível, apesar de o país ter envelhecido muito rápido nos últimos 30 anos. Também não se encontra no Ministério da Saúde uma narrativa que inclua o idoso. Antes mesmo da pandemia, já percebíamos a morte acelerada dessa população.


sA — Qual a proposta da Nota Técnica?

DR — A Nota é uma contribuição do Gise ao Observatório Covid-19 da Fiocruz, um grande projeto da Fundação com propostas e soluções para o enfrentamento da pandemia. Nosso estudo analisou a evolução dos óbitos nos domicílios, sejam eles residências particulares ou coletivas, tais como as Instituições de Longa Permanência para Idosos, ILPI, popularmente conhecidas como asilos ou abrigos. Nosso objetivo foi contribuir para o aperfeiçoamento das ações de atenção e vigilância em saúde e também auxiliar a identificação do local de ocorrência desses óbitos no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Estado do Rio de Janeiro.


sA — Com que dados do SIM o Gise trabalhou?

DR — Utilizamos os dados da Declaração de Óbito (DO) consolidados no SIM do Rio de Janeiro. Com a DO conseguimos apurar se o óbito se deu em um hospital ou outro estabelecimento de saúde, em domicílio, via pública, ou ignorado, quando não é possível saber o local. O DO não identifica se o domicílio do falecido é particular ou coletivo, uma ILPI. Além disso, para identificar o “excesso de mortalidade” de idosos no período da pandemia no Estado e na capital, comparamos os óbitos entre abril a junho de 2020 com a média de mortes do mesmo grupo etário nas mesmas regiões e meses dos três anos anteriores (2017, 2018 e 2019).

sA — Por quê o Rio de Janeiro?

DR — Escolhemos o Estado do Rio por quatro razões. A primeira e mais importante é que o Estado e o município do Rio concentram uma das maiores taxas de mortalidade por Covid-19 do Brasil. O Rio é também o Estado com o segundo maior percentual de idosos do país, perdendo apenas para o Rio Grande do Sul. Terceiro, o Estado é o que oferece o maior número de dados no SIM, se comparado aos demais entes federativos. Por fim, o aumento de morte de idosos em domicílios, ou seja, fora dos estabelecimentos de saúde, mostrou-se muito elevado no município e no Estado.


sA — Que principais informações a pesquisa apurou?

DR — Segundo dados do SIM disponíveis na página da Secretaria Estadual de Saúde, o Estdo do Rio acumulou até 31 de agosto deste ano 16.735 óbitos por Covid-19, sendo 12.521 de pessoas idosas. Ou seja, 74,8% das mortes pelo novo Coronavírus foram de idosos. Esse percentual foi de 77% na capital do Estado. A população idosa negra teve maior excesso de mortalidade nos domicílios no ano 2020 do que a população branca, 109% e 78,2%, respectivamente. A dificuldade de acesso a serviços de saúde e as condições de vida da população negra dificultam o enfrentamento da pandemia e de seus desfechos negativos. Os altos percentuais evidenciam a desigualdade das mortes por Covid-19.


sA— O crescimento das mortes dos idosos nos domicílios foi pela Covid-19?

DR — Sim. Infelizmente, esse crescimento causado por uma doença altamente transmissível, que demanda internação para tratamento, inclusive intensivo, indica desassistência, falhas no sistema do sistema de saúde e na assistência social, como também carência de atenção oportuna e preventiva. Lembrando que morrer no domicílio não necessariamente é indicador de má atenção. Morrer no domicílio pode ser indicador de uma morte digna, de uma “boa morte”, quando acontece em razão de causas crônico-degenerativas e é acompanhada de cuidados paliativos.

sA — As mortes ocorreram mais em domicílios particulares ou nas ILPI?

DR Não foi possível diferenciar os óbitos em domicílio particular dos óbitos em domicílio coletivo. Não temos fontes oficiais que indiquem o número de idosos que moram em ILPI. Infelizmente, no Brasil as ILPI são invisíveis nos sistemas de informação em saúde. Não sabemos quantos estabelecimentos são, suas características. Muitos não têm registro, são clandestinos. O idoso que sai dessas residências para ser tratado em hospital, em geral público, preenche uma autorização de internação hospitalar que não solicita informação sobre a residência, se é particular ou coletiva. Ou seja, não temos como checar se, naquele endereço, a pessoa idosa mora sozinha, com a família, ou coletivamente.


sA — Como você vislumbra o futuro desse cenário?

DR A Nota técnica usou dados do Rio, mas os idosos representam 73% dos óbitos por Covid-19 no Brasil. No início da pandemia, não se pensou no idoso que precisava ser cuidado e nesses cuidadores que saem das periferias para cuidar dos idosos, sejam em residências particulares ou coletivas. Uma alta proporção faleceu e a gente não se sensibilizou. Na Europa, em maio já se sabia que 40% dos óbitos de idosos estavam ocorrendo nas ILPI.  Aqui no Brasil, o governo federal liberou R$ 160 milhões para as cerca de duas mil ILPI do país apenas em novembro, após quase oito meses de pandemia. Por isso precisamos de políticas públicas e da academia.

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Cristiane d'Avila

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